A POLÍTICA DE ESTABILIZAÇÃO DE PREÇOS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É JUSTA?
Uma aplicação da teoria de John Rawls

IS THE BRAZILLIAN CENTRAL BANK’S “PRICE STABILITY POLICY FAIR”?
An application of John Rawls’ theory

 

Pedro Marques *

 


DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n26.55897.p198-218

Resumo

Esse artigo busca aplicar a filosofia de John Rawls sobre um tema contemporâneo de que ele não tratou diretamente: a política de estabilização de preços. Partindo do caso brasileiro, estuda-se a aplicação de juros de curto prazo, pelo Banco Central do Brasil (BCB), como instrumento para estabilizar os preços. Argumenta-se que tal intervenção gera uma redistribuição desigual de recursos, o que motiva a julgá-la à luz de um dos critérios rawlsianos de justiça, segundo o qual, uma instituição é justa se suas desigualdades são justificáveis em virtude dos benefícios que trazem aos grupos menos favorecidos. Mediante a estimação de um modelo de vetores autorregressivos, explora-se a suposição de que tal política esteja, de fato, associada ao benefício coletivo que prevê (a saber, estabilidade de preços). Finalmente, a discussão teórica e empírica constata a pertinência da teoria de Rawls sobre esse objeto, e conclui que a política do BCB não é justa.

Palavras-chave: John Rawls; Teoria da Justiça; Análise de Políticas Públicas; VAR.

 

Abstract

This paper seeks to apply John Rawls' philosophy to a contemporary issue which he did not directly address: price stability policy. Based on the Brazilian context, it examines the adoption of short-term interest rates, by the Central Bank of Brazil (BCB), as an instrument to stabilize prices. It is argued that such an intervention generates an unequal redistribution of resources, which is a reason to judge it in the light of one of the Rawlsian criteria of justice, according to which an institution is fair if its inequalities are justified by virtue of the benefits they bring to the less favored groups. By means of an “Auto-regressive Vectors model”, it explores the assumption that this policy is, in fact, associated with the collective benefit it foresees (namely, price stability). Finally, the theoretical and empirical discussion corroborates the relevance of Rawls' theory on this issue and concludes that the BCB's policy is not fair.

Keywords: John Rawls; Theory of Justice; Public Policy Analysis; VAR.

 

 

1 Introdução

 

Em 1971, o filósofo estado-unidense John Bordley Rawls publicava Uma teoria da justiça, sua primeira grande obra no campo da ética e da filosofia política. De modo geral, esse trabalho constituiu um esforço em consolidar um paradigma de avaliação de leis e instituições contemporâneas, mediante as quais se poderia classificá-las como justas ou injustas.[1] Influenciado pela vertente filosófica contratualista e pela ética kantiana, Rawls defendia princípios de justiça os quais, segundo ele, invariavelmente seriam escolhidos pela sociedade em condições ideais de contrato social. Para o filósofo, a aplicação efetiva de tais princípios aproximaria as sociedades de um sistema equitativo de cooperação e, por extensão, de uma experiência coletiva ética.

Uma teoria da justiça foi um livro bastante influente, especialmente quando situado no debate a respeito de reformas do sistema capitalista. Tomada em seu contexto, sua obra buscou estabelecer parâmetros de organização das sociedades democráticas modernas que não se pautassem meramente na maximização desigual do crescimento econômico. Longe disso, Rawls defendia que uma dada sociedade não pode ser considerada justa se a desigualdade de condições não for compensada pela melhoria na qualidade de vida, em especial daqueles que se encontram na base da pirâmide social. Não obstante, sem o pleno gozo de seus direitos e liberdades, também não se poderia dizer que os indivíduos vivenciam uma experiência coletiva ética, independentemente de haver êxito econômico igualitário.

Suas contribuições são pertinentes, em particular, ao paradigma da social-democracia. Tal perspectiva, além de sustentar um regime democrático, sugere que as forças de livre mercado, por si só, não são capazes de gerar bem-estar social. Isso exigiria que o Estado não apenas regulasse as externalidades negativas[2] produzidas pelo mercado, mas atuasse ativamente na garantia de direitos sociais.[3] Não obstante, o autor também reconhece os limites do arquétipo de Estado de bem-estar social, apontando, dentre outas coisas, a necessidade de desconcentrar a propriedade do capital.[4]

Segundo o próprio autor, sua teoria não tem a ambição de se aplicar a absolutamente qualquer caso, apesar de estar aberta a qualquer objeto que lhe seja pertinente. Tal como se encontram, seus princípios de justiça não abarcam diretamente certas questões importantes, como: democracia nas empresas, justiça entre Estados, relação com o meio ambiente etc. (RAWLS, 2000, p. 36). A menos que haja um esforço deliberado em estender seus conceitos a novas situações, suas elaborações vinculam-se a temas tradicionais da teoria política, a saber: direito à propriedade, equidade, liberdades civis e políticas etc. Partindo daí, o presente artigo argumenta a favor da compatibilidade da teoria de Rawls com um caso específico não tratado diretamente pelo autor: a política pública de estabilização de preços do Banco Central[5]; dando-se ênfase ao caso brasileiro.

Essa política tem como prerrogativa debelar aumentos bruscos na inflação, de modo a gerar um benefício coletivo: preservar o poder de compra de toda a população. Na prática, para alcançar esse objetivo, o Banco Central do Brasil (BCB) utiliza-se majoritariamente da taxa básica de juros (SELIC) [6], que é referência para todas as demais taxas, sendo ela, portanto, o instrumento de governo empregado para operacionalizar sua intervenção pública. Conforme a teoria que lhe fundamenta, aumentando-se a SELIC e, portanto, os juros de curto prazo, é possível restringir o consumo da população ao tornar o crédito mais caro, o que, por sua vez, faria o nível geral de preços cair em razão de uma demanda menor da população por bens e serviços (RESENDE, 2017).

Apesar de preços estáveis beneficiarem a todos, caracterizando-se como um bem público, a aplicação do instrumento de juros de curto prazo implica uma redistribuição desigual de recursos. No Brasil, grande parte dos títulos da dívida pública são remunerados pela taxa SELIC (CARVALHO, 2018) e, portanto, aumentos consecutivos da taxa básica de juros oneram a dívida e beneficiam financeiramente seus grandes detentores, provocando iniquidades. Diante dessas circunstâncias, este trabalho também se propõe a modelar estatisticamente a relação entre o instrumento de governo do BCB e a inflação como tentativa de responder ao problema rawlsiano: as desigualdades provenientes da execução dessa política pública são justificáveis por um ganho coletivo de preços estáveis? Mais especificamente, emprega-se um modelo de vetores autorregressivos (VAR) para estimar como a inflação e a SELIC se interrelacionam no tempo, adotando um recorte de 1999 a 2019.[7]

Vale, ainda, ressaltar que o verdadeiro objetivo deste artigo não é compreender a política pública de juros, mas sim avançar no entendimento da obra de Rawls mediante a aplicação de sua abordagem a instituições das quais ele não tratou explicitamente. A teoria formulada pelo filósofo não está livre de controvérsias e, neste sentido, não se está pressupondo, sem ressalvas, que seus princípios de justiça sejam os mais apropriados para discutir ética no âmbito da estrutura social. Em última instância, a proposta é apenas deslocar a filosofia de Rawls de seu lugar de abstração para um caso concreto e demonstrar sua pertinência.

Para fins de organização, o artigo encontra-se dividido em cinco partes, incluindo esta introdução. Na próxima seção, os conceitos de Rawls são explorados com maior detalhe. Subsequentemente, a política de estabilização de preços é descrita com mais profundidade, problematizando-a dentro do contexto brasileiro. Na quarta seção, define-se a metodologia empregada na análise empírica e os resultados estatísticos são apresentados. Por fim, o artigo termina reforçando a compatibilidade entre o trabalho de Rawls e a política pública do BCB, julgando-a conforme seus parâmetros de justiça.

 

2 Justiça como equidade

 

Quando Rawls mediu os esforços descritos anteriormente para formular sua concepção de justiça social, ele o fez tendo em mente uma estrutura básica da sociedade, que, em seu entendimento, constituiria o objeto da justiça por excelência. Com esse termo, o filósofo se refere às instituições basilares que determinam não somente os direitos fundamentais do indivíduo, mas também a distribuição de recursos e oportunidades entre eles. Tomando as repúblicas democráticas modernas como exemplo, têm-se os direitos fundamentais previstos na carta constitucional, a formulação de leis pelos representantes eleitos e, ainda, os mecanismos práticos de sua efetivação. Já os recursos e oportunidades são alocados tanto pelo mercado, quanto pela intervenção do Estado na economia. Por extensão, o objetivo de Rawls era formular uma concepção de justiça que se aplicasse como parâmetro para julgar essa estrutura básica.

 

2.1 Os princípios da justiça como equidade

 

À sua concepção particular de justiça, Ralws deu o nome de justiça como equidade, termo este que é bem sugestivo dos dois princípios que lhe compreendem: I) princípio da igualdade e II) princípio da diferença. O primeiro (e prioritário) refere-se à igualdade dos indivíduos no pleno gozo de direitos e liberdades políticas.[8] Não obstante, tais direitos e liberdades não podem ser puramente formais, os indivíduos devem dispor das condições mínimas para exercê-los na prática. Por conseguinte, o segundo trata-se do princípio da diferença, e é assim denominado por referir-se às desigualdades sociais e econômicas, elegendo critérios segundo os quais tais iniquidades possam ser consideradas justas ou injustas. Nesse sentido, Rawls afirma que uma desigualdade só é eticamente aceitável se: a) todas as posições sociais puderem ser disputadas por todos em condição equitativa de oportunidades; e se: b) a desigualdade puder beneficiar o conjunto da sociedade. O esforço que o filósofo faz para reforçar que direitos e liberdades não sejam meramente formais, e para que a desigualdade beneficie a todos, além de ser mediada pela igualdade de oportunidades, expressa o caráter equitativo de sua concepção de justiça, pois não pressupõe uma igualdade absoluta, mas uma desigualdade equilibrada.

No entanto, ainda no que concerne ao princípio da diferença, um problema pode se evidenciar: e se o benefício gerado por certo tipo de desigualdade não favorecer estratos específicos da sociedade? Rawls acreditava que, em se tratando de um sistema justo, é improvável que a desigualdade não seja naturalmente convertida em qualidade de vida na sociedade como um todo. Nessas circunstâncias, uma maior expectativa de elevação do padrão de vida dos mais favorecidos é sempre acompanhada por maiores expectativas entre os estratos intermediários e menos favorecidos da coletividade (RAWLS, [1971] 2008, p. 97-101).

A pressuposição do que Rawls denominava de ligação em cadeia ilustra bem o imaginário de que uma alta da taxa básica de juros possa ser justa, na medida em que assegura o poder de barganha de todos. Isto é, a concentração de renda decorrente dos altos rendimentos dos titulares da dívida pública seria acompanhada por uma redução do nível geral de preços e, assim, tal qual uma reação em cadeia, as clivagens econômicas intermediárias e menos favorecidas seriam beneficiadas. Apesar disso, adverte Rawls, a pressuposição da ligação em cadeia é uma simplificação (RAWLS, [1971] 2008, p.100), dado que os mais desfavorecidos, não necessariamente, estão melhorando sua posição. Em razão disso, Rawls sugere que o princípio da diferença seja pensado sempre a partir do elo mais frágil da cadeia.

 

2.2 O método racionalista de Rawls

 

Ligeiramente, essa concepção de justiça social pode parecer satisfatória do ponto de vista do bem-estar social da coletividade; mas ela também pode parecer arbitrária em um primeiro momento. De fato, seria pouco convincente se ele estacionasse aí e não oferece nenhuma explicação de por que esta concepção de justiça deve nortear a conduta coletiva em vez de outras concepções. Mas esta não é uma lacuna em sua obra: se a justiça como equidade deveria reger a conduta social é porque, dadas as condições ideais, sua adoção seria a escolha mais provável entre indivíduos que projetam, para si mesmos, uma sociedade na qual desejam viver bem.

Vale iniciar esta explanação enfatizando que Rawls é um desses pensadores que se identificam pela tradição filosófica do contratualismo. Nesse sentido, analogamente a como Hobbes, Locke e Rousseau procederam em suas divagações, Rawls se apropria da ideia de contrato social para explicar ou justificar a emergência de determinada ordem societal. Para os demais pensadores citados, o contrato é encarado como um acordo estabelecido por indivíduos para superar os inconvenientes da sua condição primitiva de estado de natureza. Sob esta condição, que é anterior ao estado civil, a ausência de um estatuto jurídico gera uma dificuldade em manter a propriedade e a integridade física.

Em Hobbes, por exemplo, a condição de natureza favoreceria uma guerra de todos contra todos: cada indivíduo ou grupo viveria sob a constante ameaça de violência perpetrada por seus pares na busca de seus próprios interesses (HOBBES, [1651] 1979). Em Locke, o estado de natureza representa um período histórico da humanidade anterior à sociedade civil no qual a ausência do império da lei impossibilitaria o indivíduo de preservar os direitos que a natureza lhe concedeu: o direito à propriedade, que se constitui pelo tripé da liberdade, da vida e do seu próprio corpo (LOCKE, [1690] 1978). Já em Rousseau, o conflito generalizado deriva da propriedade que os homens passam a ter sobre as coisas em dado momento. Essa delimitação da posse se traduziria na riqueza de uns em função da miséria do outro; ou pela dominação de uns em função da servidão de outros (ROUSSEAU, [1755] 1978), perpetuando um conflito que só poderia ser remediado pela autoimposição de restrições pela própria comunidade (ROUSSEAU, [1762] 1978).

Seu trabalho também faz forte referência a Immanuel Kant, um contratualista menos antigo. Tal filósofo argumentava que, estabelecidas as instituições civis por meio de contrato, as decisões humanas não devem se orientar exclusivamente por seus desejos individuais, pois nem sempre esses impulsos são compatíveis a uma conduta moral. Segundo Kant, para um comportamento ser moral, as ações devem obedecer a imperativos categóricos, que se caracterizam pela obrigação de um indivíduo em se portar da maneira que ele acredita que todos os demais deveriam fazê-lo agir (KANT, 1785 apud ANDRADE, 2001). Recorrendo tão somente à razão, seria possível extrair leis morais a priori cuja condução levaria o indivíduo ao comportamento moral, mesmo que ao custo eventual de seus interesses pessoais. Esses parâmetros racionais têm, por conseguinte, implicações para se pensar a constituição política de um povo e a atuação de seus legisladores. Já em Rawls, comprometer-se com uma sociedade justa significa comprometer-se aos princípios de justiça, que correspondem à sua própria leitura dos imperativos categóricos.

Por extensão, esses pensadores encaram o contrato como este acordo mediante o qual os indivíduos decidem viver sob a autoridade das instituições, de modo que se favoreça a segurança jurídica nas relações humanas. Diversamente a esta narrativa, no entanto, Rawls não se refere explicitamente a uma passagem do estado de natureza ao estado civil, mas se vale da hipótese lógica de um contrato social para enfatizar a legitimidade de sua própria concepção de justiça. Assim, ele não é caracterizado como um contratualista tradicional.

De fato, Rawls limita-se a propor o exercício mental de se imaginar que tipo de contrato social seria acordado pelos indivíduos se estes fossem ignorantes de suas próprias circunstâncias, caso se encontrassem em uma posição original. Essa posição não é uma realidade empírica, mas um artifício lógico capaz de representar as aspirações da coletividade. Em tal condição hipotética, indivíduos se reuniriam para decidir os princípios que conformariam sua estrutura básica, mas o fariam ignorantes de suas características físicas e de sua futura posição social. Além disso, encontrar-se-iam destituídos de doutrinas abrangentes: preferências filosóficas e religiosas que se aplicam a inúmeros aspectos da vida humana (RAWLS, 2000). Por força dessa ocasião, portanto, os contratantes se veriam limitados por um véu de ignorância e, só podendo apelar às suas faculdades racionais inatas, Rawls argumenta que estes indivíduos escolheriam viver em uma sociedade na qual sua posição social ou suas características físicas não comprometessem seu bem-estar e sua perspectiva de crescimento individual. Logo, o princípio da igualdade e o princípio da diferença expressariam essa vontade, e sua aplicação às instituições fundamentais levariam a uma sociedade justa.

 

2.3 A importância da justiça como equidade

 

A teoria de Rawls possui seus méritos e suas controvérsias. Dentre seus méritos, pode-se apontar seu esforço em propor um padrão de justiça para as sociedades de mercado, as quais, estando organizadas pelas lógicas da eficiência e da racionalidade econômica, fazem surgir externalidades negativas cuja solução demanda intervenção coletiva. Tomando a obra em seu contexto, Rawls argumenta em favor de uma economia política moral, ressaltando que não adianta construir uma sociedade com alto desempenho econômico e eficiência se isso se dá ao custo da equidade de oportunidades, dos direitos civis e políticos ou do bem-estar das camadas mais desfavorecidas.

Por outro lado, o experimento mental da posição original, que dá sustentação a suas ideias, assenta-se em hipóteses irrealistas. Pressupor que os contratantes, privados de suas doutrinas abrangentes, e ignorantes de suas circunstâncias, optariam pelos princípios equitativos, apelando apenas para suas faculdades racionais inatas, é realizar um salto que ainda mantém lacunas. Em resposta a críticas desse gênero, por sua vez, Rawls reforça que os contratantes da posição original não se confundem com os indivíduos do mundo real (RAWLS, 2000, p.73-75). Insiste, portanto, no caráter artificial de seu experimento e adiciona que, longe de se tratar de um esforço diletante, a posição original possui fins práticos: instrumentalizam os cidadãos e seus representantes a balizarem suas decisões em virtude de uma sociedade mais justa (RAWLS, 2000, p. 69).

Compreendida a teoria de Rawls, cabe descer da abstração ao caso específico: a política pública de estabilização de preços no Brasil.

 

3 A política pública de estabilização de preços no Brasil

 

Para dar conta de contextualizar a política de juros brasileira, esta seção é subdividida em três tópicos. No primeiro subitem, elabora-se sobre o status geral de política pública dessa intervenção do Estado brasileiro e descreve-se, brevemente, seus fundamentos e sua aplicação pelo BCB. Por sua vez, no segundo, discutem-se as decisões do BCB, argumentando que a taxa SELIC tem sido, historicamente, elevada. Finalmente, são apresentados alguns dados sobre a distribuição de títulos da dívida pública, ilustrando como a política de juros pode concentrar renda mediante a detenção desses papéis.

 

3.1 Teoria e prática[9]

 

Entre suas diversas definições, políticas públicas podem brevemente ser caracterizadas como a atuação do governo sobre a sociedade (MARQUES,2013). Mais especificamente, podem ser conceituadas como as medidas adotadas pelo Estado com vias a mitigar determinados problemas que ascenderam à agenda política. Por sua vez, o que é considerado ou não um problema que justifique atuação do governo cabe aos próprios formuladores de políticas públicas e à pressão da sociedade civil (SECCHI, 2013). Em alguns casos, as intervenções promovidas pelo Estado podem se aproximar do que seriam bens públicos puros: benefícios de que todos podem gozar ao mesmo tempo, sem rivalidade e sem exclusão de seu consumo, ao contrário dos bens privados (ROSEN; GAYER, 2015). Em outros casos, pode atender prioritariamente a alguns segmentos da sociedade com ou sem prejuízo aos demais. Mas normalmente os serviços prestados pelo governo encontram-se entre esses dois polos.

No debate público, a estabilidade de preços costuma figurar como um serviço público importante, competindo aos governos garanti-lo. De fato, quando os preços aceleram de maneira contínua e generalizada (inflação), a população sente sua qualidade de vida cair, pois sua renda torna-se insuficiente para ter acesso à mesma quantidade de bens e serviços que se tinha anteriormente à aceleração dos preços (VICECONTI; NEVES, 2000). Por sua vez, esse problema levanta questões distributivas, dado que os setores menos favorecidos da sociedade são os mais prejudicados, além de prejudicar as expectativas dos indivíduos sobre seu poder de barganha futuro, podendo desarticular o desempenho econômico em geral.

O reconhecimento de todos esses aspectos da inflação a consagra como um objeto fundamental de intervenção pública, suscitando diversos debates sobre que tipo de política pública deveria ser formulada para estabilizá-la. Isso leva à proposição de diversos instrumentos governamentais, isto é, de abordagens práticas para conduzir o comportamento coletivo para atender aos objetivos subjacentes (OLLAIK; MEDEIROS, 2011).

No Brasil, desde junho de 1999, a política pública de combate à inflação vem recorrendo primariamente aos chamados instrumentos baseados em preços.[10] Tais métodos de estabilização se caracterizam por tornar o crédito mais caro mediante elevação dos juros de curto prazo, com a intenção de desestimular o consumo familiar e aliviar a pressão sobre os preços pelo lado da demanda. No Brasil, a institucionalização dessa estratégia foi reforçada pela adoção de um Regime de Metas de Inflação (RMI), que se trata do comprometimento do poder público em convergir a inflação para metas pré-estabelecidas (TRUMAN, 2003). Tal regime pode também ser definido como uma instituição política que orienta o Banco Central a ajustar constantemente sua taxa básica de juros em função de tais metas. Em tese, isso limita a arbitrariedade do órgão, favorecendo a execução esperada da política pública.

O modelo da curva de Phillips foi um marco importante para esse entendimento. Sua origem remete a um trabalho seminal de William Phillips nos anos 1950, sobre inflação e nível de desemprego no Reino Unido, verificando-se que essas duas variáveis mantinham uma relação inversa. Uma interpretação dessa abordagem prevê que níveis maiores de desemprego estão associados a um menor consumo da população e, por essa razão, o preço de bens e serviços caem para torná-los novamente atrativos à população.

Tal política pública vem, portanto, associada a dois inconvenientes. Primeiramente, juros mais caros não só estão associados a menor consumo, mas simultaneamente a maior desemprego. Portanto a estabilidade de preços não está isenta de contrapartidas, afastando-se de um “almoço grátis” (ANDERSON, 2001). E, mais importante, redistribui renda na medida em que a taxa básica de juros (SELIC) remunera os grandes titulares da dívida pública, gerando iniquidades.

 

3.2 Evolução das decisões do BCB

 

No Brasil, tais taxas já foram consideravelmente altas, traduzindo-se proporcionalmente em grandes remunerações para os detentores da dívida pública. No gráfico 1, pode-se visualizar a evolução das séries históricas de SELIC, IPCA acumulado de 12 meses e taxa de desemprego de fim de período. Vale notar que, praticamente nos dez primeiros anos de RMI, a taxa básica de juros manteve-se num patamar de 2 dígitos e, quando muito, chegando à ordem de 20%. Com exceção dos dois primeiros anos da série, também é vagamente perceptível que há uma correspondência entre taxa de inflação e juros ao longo do tempo: os picos de inflação e juros convergem em diversos momentos, ainda que não esteja claro se o nível de preços aumenta em decorrência da SELIC ou vice-versa.

Resende (2017) argumenta que o patamar caracteristicamente alto da taxa básica de juros, no Brasil, é difícil de ser justificado, especialmente levando em consideração o elevado nível de desemprego nos últimos anos. De fato, desde 2015, o desemprego vem subindo quase que continuamente, enquanto a SELIC permaneceu alta durante muitos meses até atingir os valores relativamente baixos de 2019. Beluzzo e Galípolo (2017) também fazem observações contundentes sobre a condução da política pública de juros em 2015. Embora o nível geral estivesse aumentando à época, a inflação não era de demanda, pois o nível de atividade econômica estava se reduzindo. A despeito disso, o BCB realizou aumentos consecutivos da SELIC desde 2013, até atingir o patamar nominal mais alto da década (14,25%). Por sua vez, Carvalho (2018) constata que o aumento expressivo da inflação entre 2014 e 2015 decorreu, em grande parte, da elevação de preços administrados que haviam sido represados no primeiro mandato de Dilma Rouseff. No entanto, esses preços não são sensíveis à política de juros do BCB, pois são definidos pelo Estado e não pela iniciativa privada.

 

Gráfico 1 – Séries temporais de IPCA acumulado, SELIC e taxa de desemprego de fim de ano (jun./1999-dez./2019)

 


Fonte: reprodução de Marques (2021, p. 64).

 

 

3.3 Quem lucra com juros altos

 

Retornando ao princípio da diferença de Rawls, pode-se argumentar que essas altas taxas de juros podem beneficiar os membros de fundos de previdência, dentre os quais pode haver grupos desfavorecidos. Uma vez que alguns desses fundos, de fato, adquirem títulos públicos para financiar seus serviços, todos os associados seriam contemplados com um rendimento mais alto e, portanto, o efeito redistributivo dos juros seria perfeitamente justo. No entanto, a participação proporcional desse empreendimento na posse da dívida pública não é tão alta como se pode supor.

No gráfico 2, isso pode ser ilustrado ao se analisar como evoluíram as médias anuais de participação de quatro segmentos sociais na posse de títulos. Por um lado, é possível constatar que a participação dos fundos previdenciários brasileiros aumentou continuamente desde 2007, estabilizando-se nos últimos três anos. Se em 2010, em média, os serviços previdenciários foram responsáveis por 15% da detenção de títulos, esse valor agora se encontra em 25%, sugerindo que a posse da dívida se tornou mais acessível a setores populares. Por outro lado, fundos de investimento lideram a participação na dívida, após se recuperarem de um período de redução constante na compra dos títulos (2011-2015). Portanto a maior fatia do rendimento da dívida pública não é assimilada por quem é sócio de fundos previdenciários, mas por investidores do mercado financeiro.

 

Gráfico 2 – Participação anual média dos maiores detentores de títulos públicos federais (2007-2019)

 

 

            Fonte: elaboração própria com dados do Relatório Mensal da Dívida (Tesouro Transparente).

 

 

Em seu turno, instituições financeiras apresentaram uma perda considerável de participação. Entre 2007 e 2015, destacavam-se como os maiores compradores de títulos da dívida, mas em 2019 sua colocação caiu para terceiro lugar em termos nominais. Já a compra de títulos por não residentes aumentou significativamente desde o início do recorte temporal: saindo de 3% e alcançando seu pico de 20% em 2015. A partir de 2016, tal participação se reduz, o que ocorre de maneira simultânea aos cortes consecutivos na SELIC durante os últimos anos. Não compete ao presente artigo testar tal suposição, porém se pode conjecturar que esses estrangeiros migraram seu investimento na dívida pública brasileira para países em que a remuneração dos títulos estivesse mais favorável. Ainda assim, o percentual de detenção por não residentes permanece em dois dígitos.

Já no gráfico 3, compara-se a participação média de todos os segmentos detentores de títulos públicos para o ano de 2019. Além dos quatro setores mencionados anteriormente, o governo e as seguradoras detêm, cada qual, 4% da dívida; enquanto o restante não especificado detém 6%. Tem-se, portanto, que os fundos previdenciários brasileiros mantêm posse de 25% contra 75% de outras entidades, evidenciando a redistribuição desigual de quem é mais bem servido pela remuneração da taxa básica de juros.

 

         Gráfico 3 – Participação média de todos os detentores de títulos públicos em 2019

 

 

                     Fonte: elaboração própria com dados do Relatório Mensal da Dívida (Tesouro Transparente).

 

 

Mas como foi salientado pelo próprio Rawls, a desigualdade por si só não é um problema. A injustiça se faz observar quando a iniquidade não beneficia as camadas da sociedade mais desfavorecidas economicamente. Diante disso, levanta-se a seguinte provocação: tais desigualdades justificam a suposta estabilização da inflação que o aumento da taxa básica de juros provoca? Para ajudar a responder a essa pergunta, cabe inicialmente verificar se essas duas variáveis covariam em direção oposta, isto é, se uma taxa SELIC mais alta corresponde a uma taxa de inflação mais baixa.

 

4 Evidências empíricas sobre a relação entre taxa básica de juros e inflação no Brasil

 

Aqui são apresentadas algumas evidências estatísticas sobre como a política pública do BCB e o nível de preços interagem. Esses resultados são reprodução parcial de Marques (2021), e desempenham um papel auxiliar nas reflexões sobre a aplicabilidade da teoria de John Rawls à principal intervenção do Estado brasileiro sobre os juros de curto prazo.

 

4.1 Metodologia e dados

 

Para encontrar evidências sobre a relação entre política de estabilização de preços e inflação, utilizou-se de um modelo de vetores autorregressivos simples (VAR). Esse é um procedimento de análise de séries temporais que permite captar a interdependência entre dois indicadores cuja variação seja essencialmente histórica. Por essa mesma razão, o VAR não identifica a influência causal de uma variável exógena sobre uma variável endógena como é típico em alguns modelos de regressão. De fato, a própria distinção entre indicadores exógenos e endógenos desaparece em tal metodologia (GUJARATI; PORTER, 2011). Assim, este trabalho limita-se a testar a seguinte hipótese: H1 = A taxa básica de juros e a taxa de inflação covariam inversamente ao longo do tempo.

 

Essa estratégia é também caracterizada por dois aspectos principais: análise autorregressiva e análise vetorial. O primeiro refere-se à capacidade do modelo em estimar como os valores correntes das séries históricas são condicionados por seus valores defasados no tempo (lags), isto é, por sua própria história. Quanto ao segundo aspecto, o VAR também estima como as variáveis se afetam mutuamente através dos valores atrasados de cada uma. Tais características são fundamentais para compreender a política pública do BCB, dado que sua execução não tem efeitos imediatos, mas sim defasados. Por essa mesma razão, a quantidade de atrasos a serem incluídas na análise precisa ser parcimoniosa, evitando-se que se incluam lags em excesso, sobrecarregando o modelo. A quantidade de atrasos escolhida para os propósitos desse artigo foram 2 meses, conforme recomendado pelo Critério de Informação Bayesiano (SBIC).

Ainda, os indicadores utilizados na análise foram o Índice Geral de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mensal e a própria taxa SELIC. O IPCA utilizado cobre apenas itens livres, excluindo preços administrados pelo governo, e foi coletado no portal de dados abertos do Banco Central do Brasil. Já os dados para a SELIC foram disponibilizados pelo Bank for International Settlements (BIS), mas precisaram passar pelo tratamento da primeira diferença, tendo em vista que a série possui uma tendência de decrescimento que enviesaria os resultados.[11] Empregaram-se dados de junho de 1999 a dezembro de 2019, mas a interpretação dos resultados, a rigor, exclui os dois primeiros meses em decorrência das duas defasagens. O recorte justifica-se pelo fato de o RMI ter sido adotado no início deste intervalo histórico.

As duas equações abaixo compõem o modelo estimado:

 

[1]       

[2]       

 

A primeira indica que a inflação (π) em um ponto específico no tempo (t) é condicionada pela inflação dos dois meses anteriores (πt-1 e πt-2) e pela taxa básica de juros (i) também de dois períodos pregressos (it-1 e it-2). A notação γ representa a constante, ou seja, o valor estimado de  se os demais termos da equação fossem iguais a zero. Por sua vez, ε indica o termo de erro, sendo mensurado a partir da distância entre os valores preditos pelo modelo e os valores reais da série temporal. Os coeficientes alfa (α) e beta (β) estimam os efeitos defasados sobre o nível geral de preços corrente.

A segunda equação segue a mesma lógica, mas pelo lado inverso do modelo: pela taxa básica de juros (it).

 

4.2 Análise empírica

 

Conforme os resultados apresentados na tabela 1, não se encontram evidências para a hipótese () de que o instrumento de política de estabilização de preços do BCB, a saber, a taxa SELIC, esteja inversamente relacionada à taxa de inflação. Pelo contrário, a primeira coluna sugere que o aumento unitário defasado da taxa básica de juros está associada a uma pressão inflacionária de 0,10% nos preços correntes. Também se pode destacar que o IPCA é notoriamente influenciado pelo seu próprio passado (no patamar de 0,70%).

Já na segunda coluna, estima-se que o BCB reage a um aumento da inflação incrementando a SELIC em 0,30% em relação ao mês anterior. Mas a resposta da instituição a mudanças no IPCA de dois meses anteriores não foi estatisticamente significante sequer a 90% de confiança. Finalmente, a autoridade monetária costuma elevar a taxa de juros a um aumento dela mesma no passado. Isso sugere uma tradição contracionista por parte da instituição do BCB e de seus quadros técnicos, uma vez que se costuma sustentar os aumentos na taxa SELIC.

 

Tabela 1 Estimação do modelo VAR (ago./1999 – dez./2019)

 

Estimadores

0,21***

(0,034)

-0,17***

(0,053)

0,70***

(0,066)

0,42***
(0,102)

-0,11*

(0,068)

-0,12

(0,105)

0,10**
(0,040)

0,30***
(0,062)

0

(0,037)

0,26***

(0,058)

0,47

0,40

Observações

245

245

Fonte: reprodução parcial de Marques (2021, p. 66).
Nota: * p-valor < 0,1; ** p-valor < 0,05; *** p-valor < 0,01. Erro-padrão entre parênteses.

 

 

 

        Gráfico 4 – Funções impulso-resposta do IPCA para uma previsão de 12 meses

 

 

  Fonte: reprodução de Marques (2021, p. 67).

 

 

 Adicionalmente, o par de gráficos 4 apresenta resultados de pós-estimação sobre a relação entre IPCA e SELIC através de funções impulso-resposta. Mediante esse procedimento, estima-se como o comportamento da taxa de inflação reage a um aumento brusco de si mesmo e da SELIC em um horizonte de previsão de 12 meses à frente. Conforme o gráfico esquerdo, prevê-se que o nível geral de preços elevar-se-ia em 0,04% um mês após um choque brusco da SELIC. No entanto, esse efeito dissipa-se em pouco mais de quatro meses, como pode ser observado pelo fato de que o intervalo de confiança tangencia o valor nulo a partir do quinto mês. Ainda, é de destacar que as bandas desse intervalo são bastante largas, indicando imprecisão na relação entre as duas séries. Já no gráfico à direita, tem-se que o IPCA eleva-se imediatamente a uma pressão de si mesmo. A absorção desse efeito também parece durar aproximadamente quatro meses, indicando uma persistência do nível geral de preços ao longo do tempo.

Mais uma vez, tais resultados não favorecem a suposição de que a política do BCB apresente um bom desempenho em manter a inflação em patamar estável. Pelo contrário, a inflação é, em grande medida, condicionada por si mesma, e apresenta uma covariação positiva com as decisões da instituição de regulação financeira em aumentar a SELIC. Mas também vale fazer algumas ressalvas a respeito da metodologia utilizada.

Apesar de VAR simples ser considerado muito útil para análise de políticas públicas (GUJARATI; PORTER, 2011), trata-se de um procedimento estatístico muito limitado. Runkle (1987) menciona a vantagem dos modelos VAR em não impor muitas restrições teóricas na sua construção, porém ressalta que as previsões realizadas com seus resultados guardam grande imprecisão, como evidenciado por intervalos de confiança muitas vezes largos. De todo modo, a estimação aqui realizada não tem grandes pretensões metodológicas senão servir de apoio para discutir a teoria de Rawls levando em consideração assuntos não trabalhados diretamente pelo filósofo.

 

5 Conclusão

 

O veredicto deste artigo é de que a execução da política pública de estabilização de preços, no Brasil, é injusta, por não estar em conformidade com o princípio da diferença na teoria moral de Rawls. Segundo sua concepção de justiça como equidade, a existência das desigualdades só pode ser justificada quando aumenta o bem-estar da coletividade. Não podendo, no entanto, toda a coletividade ser beneficiada, ao menos os mais desfavorecidos deveriam ter melhorias em sua qualidade de vida. A política do BCB, por outro lado, não atende a essas condições.

Primeiramente, as evidências estatísticas aqui apresentadas (com suas eventuais limitações) não corroboram a tese de que a política pública de juros favoreça uma estabilidade de preços. Em segundo lugar, como grande parte da dívida pública é remunerada pela taxa básica de juros, essa intervenção do governo estimula uma redistribuição desigual de recursos. Isso pode ser atestado pelo fato de boa parte dos títulos da dívida estarem sob posse de investidores, de instituições financeiras e de estrangeiros. Em terceiro lugar, a SELIC apresentou valores caracteristicamente altos ao longo da história recente, convertendo-se, portanto, em uma quantia de remuneração considerável a esses segmentos. Logo, nem a coletividade como um todo, nem os estratos mais desfavorecidos aparentam ser beneficiados pela política do BCB.

Vale reiterar que este artigo é menos sobre essa intervenção do governo em si do que sobre a teoria de Rawls. Este artigo trata-se da tentativa, ao que tudo indica satisfatória, de ampliar o leque de aplicabilidade da teoria rawlsiana sobre temas que não lhe competiram à época. Embora a teoria de Rawls tenha sido elaborada para tratar de temas muito gerais e tradicionais da filosofia política, o exercício aqui empreendido demonstra que sua obra permanece pertinente para tratar de instituições contemporâneas. Longe de encerrar-se em puro diletantismo, esse empreendimento também possui uma importância prática, pois a formulação e a execução de políticas públicas esbarram constantemente em dilemas éticos, exigindo que os representantes eleitos democraticamente e a sociedade civil possam julgar adequadamente as decisões tomadas em âmbito público. O arcabouço ralwsiano de justiça surge, então, como uma alternativa viável para que se formem tais julgamentos sobre as instituições, tendo em vista o avanço de uma sociedade efetivamente justa.

 

Referências

 

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Recebido em: 22/10/20.

Aceito em: 05/04/21.

DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n26.55897.p198-218

 



* Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP), UFPE/Brasil. E-mail: pedrocarsamar@gmail.com.

[1] Sua teoria, portanto, é normativa. Em outras palavras, não se propõe a descrever certos aspectos da realidade humana esquivando-se de juízos de valor. Ao contrário, procura estabelecer parâmetros de orientação para a conduta humana.

[2] Referem-se às ocorrências de mal-estar geradas por ação da livre iniciativa privada sobre terceiros sem que os responsáveis internalizem o custo de seu comportamento (MITCHELL; SIMMONS, 2003).

[3] Referem-se aos direitos econômicos no sentido de garantia de bem-estar social. Diferem-se, portanto, dos direitos civis ou negativos (que possibilitam o exercício da liberdade individual) e dos direitos políticos (que possibilitam a participação do indivíduo na polity) (MARSHALL, 1967).

[4] Rawls trata mais explicitamente disso no prefácio da edição revisada, lançada nos Estados Unidos, em que busca contrastar sua concepção de democracia de cidadãos proprietários com o conceito de Estado de bem-estar social (RAWLS, 1999).

[5] Instituição encarregada de coordenar o sistema financeiro.

[6] A sigla significa Sistema Especial de Liquidação e Custódia.

[7] Este trabalho é um desdobramento da dissertação do próprio autor (MARQUES, 2021). Reproduzem-se aqui seus resultados empíricos, mas cabe ressaltar que as reflexões rawlsianas contidas neste artigo são inéditas. Outras contribuições provenientes de Marques (2021) serão indicadas quando cabível.

[8] Por exemplo: “direito ao voto e a exercer cargo público; a liberdade de expressão e reunião; a liberdade de consciência e de pensamento; [...] proteção contra a opressão psicológica, a agressão e a mutilação; [...] direito à propriedade pessoal e a proteção contra prisão e detenção arbitrárias” (RAWLS, [1971] 2008, p. 74).

[9] Para um detalhamento sobre o uso da taxa de juros como instrumento de política pública, ver Marques (2021), que se deteve exclusivamente sobre o tema.

[10] Essa denominação pode ser encontrada em Haldane (2014) e contrasta com os instrumentos baseados em quantidade, mais relacionados à Teoria Quantitativa da Moeda.

[11] A existência de tendência não foi rejeitada pelo teste de Dickey-Fuller Aumentado e pelo teste de Phillips-Perron aos níveis de 99% e 90% de confiança, respectivamente. Os resultados dos testes de especificação estão todos em Marques (2021).

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