CONSUMO DE CANNABIS, CONTROLES SOCIAIS E SEUS EFEITOS

CANNABIS CONSUMPTION, SOCIAL CONTROLS AND THEIR EFFECTS

 

Ricardo Bandeira de Melo *

 

 

DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n31.67626.p20-44

 

 

 

Resumo

Esta pesquisa foi realizada em São Lourenço da Mata entre 2018 e 2019. A partir de entrevistas semiestruturadas com consumidores recreativos de cannabis, apresentando um estudo comparado, baseado em diversificação interna, entre usuários das camadas populares. Durante a análise dos dados (análise temática), foi percebido que a escolaridade era a variável que gerava nas respostas uma grande distinção. Desse modo, as entrevistas foram divididas em dois conjuntos, sendo o A, formado por estudantes do ensino superior ou graduados, e o B, constituído por pessoas com no máximo o ensino médio completo. Foram analisados os perfis dos consumidores, os perfis de consumo e os controles sociais sobre a prática, exercidos pelos núcleos familiares, a vizinhança, as pessoas em geral e aqueles desempenhados pelo Estado. Entre os consumidores do conjunto B, pôde ser percebida maior intensidade no consumo, menor controle parental, menor preocupação com a vizinhança e baixa ou nenhuma estratégia em relação à polícia. Já no conjunto A, a prática se mostrou mais cautelosa. Quanto à atuação violenta da polícia, os mais vulneráveis se mostraram alvos preferenciais.

Palavras-chave: consumo de maconha; desigualdades sociais; interseccionalidade; violência policial.

 

Abstract

This study was conducted in São Lourenço da Mata, between the years of 2018 and 2019. It is based on semi-structured interviews with recreational cannabis consumers and aims to present a comparative study, based on internal diversification, among low income users. Throughout the data analysis (thematic analysis), it was perceived that the variable “schooling” was the one that generated a great distinction among the respondents. Thus, the interviews were organized into two sets: Set A, consisting of interviews with university students or graduates; and Set B, consisting of interviews with people who had completed at most upper secondary education. The consumers' profiles were analyzed, as well as the consumption profiles and social regulation of the activity by families, neighbours, individuals in general and the State. Among the consumers in Set B, it was noted a higher intensity of consumption, less parental control, less concern towards the neighbours and low or no strategies in regards to the police. As for Set A, on the other hand, the practice was shown to be more cautious. Regarding police violence the most vulnerable individuals were the preferred targets.

Keywords: marijuana consumption; social inequalities; intersectionality; police violence.

 

Introdução

 

A presente pesquisa analisa os descompassos existentes nas formas de controles sociais sobre uma prática específica — o consumo de maconha —, exercidas sobre consumidores com diferentes perfis; indo desde aquelas praticadas pela família, passando pela vizinhança e pessoas em geral, até o nível de controle exercido pelas instituições do Estado. Os relatos dos meus interlocutores permitiram captar grande variedade nesses componentes.

Entre outros elementos, estão presentes a frequência de uso, os locais nos quais a substância é utilizada e o nível de exposição implicado neles. A nomenclatura adotada: locais abertos ou fechados; cobertos ou descobertos (e as possíveis combinações), é uma adaptação de um estudo sobre as atividades de tráfico, realizado por Jean Daudelin e José Luiz Ratton (2017). Nessa pesquisa, realizada entre 2015 e 2016, foi dada atenção especial ao mercado de crack e aos mercados de drogas de classe média no Recife. Os autores mostraram que os mercados de drogas podem ser abertos (aqueles nos quais estranhos podem interagir) ou fechados (aqueles em que apenas pessoas que se conhecem e confiam umas nas outras participam). Esses mercados abertos ou fechados ocorrem em diferentes níveis. Além disso, eles podem ser descobertos (que envolvem trocas físicas públicas e visíveis) ou cobertos (que possuem trocas em locais privados ou em ambientes virtuais). As atividades podem ser cobertas ou descobertas também em diferentes níveis. Em vez de nos referirmos, na presente pesquisa, a trocas comerciais, faremos referência ao consumo. Os demais elementos permanecem inalterados.

A pesquisa foi desenvolvida em São Lourenço da Mata, cidade situada na Região Metropolitana do Recife, em Pernambuco; conta, de acordo com o Censo de 2022, com 111,243 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2022). Apesar de sua proximidade com a capital, a cidade não possui prédios luxuosos ou casas exuberantes em nenhum de seus bairros. Em vez disso, ao visualizá-la, podemos perceber claramente a sua simplicidade. Apesar da falta de homogeneidade, em linhas gerais, o município pertence à periferia urbana. Esse elemento, sem dúvidas, impacta nos mecanismos de segurança: não encontraremos em grande extensão regiões monitoradas por câmeras, seguranças privadas e aportes do Estado.

Por seu caráter comparativo, a pesquisa permite elucidar com maior clareza questões de natureza estrutural, como a seletividade repressiva e sua manifestação relacionada às diferentes formas de desigualdade social. Além disso, possibilita compreender de que maneira os consumidores são tipificados, rotulados e estigmatizados de acordo com seus perfis.

 

Metodologia

 

Embora reconheça que, contextualmente, diferentes nomes são atribuídos a essa planta, dependendo dos usos sociais e dos significados associados, utilizo, sobretudo por não se tratar de um estudo sobre os significados, de maneira intercambiável os termos maconha e cannabis. Em outras situações de análise, pode vir a ser importante realizar a devida distinção, já que a planta em questão pode ser chamada de formas específicas dentro de contextos religiosos, recreativos, legais e medicinais. A equivalência entre as expressões para determinados casos não é novidade no debate, também pode ser encontrada, por exemplo, em Marcílio Dantas Brandão (2014).  Dito isso, passemos então aos informantes.

Os entrevistados são jovens das camadas populares. Não havia entre eles grandes distinções raciais nem de renda, embora houvesse em termos de tipo de ocupação. A grande diferença estava no nível de escolaridade. Ao comparar os resultados das entrevistas, dividindo por nível de escolaridade, um abismo surgia. De um lado, estudantes universitários e egressos do ensino superior. Do outro, jovens com no máximo o ensino médio completo. A diferença gritante — no perfil de consumo e na reação social — poderá ser acompanhada ao longo do artigo.

Com isso, é importante destacar que não estou indicando que a categoria raça seja menos relevante para a compreensão do assunto. Aqui, isto sim, busco diferenciar o peso circunstancial de cada uma delas: a classe, por meio dos estilos de vida e formas particulares de consumo dos quais derivam, torna indivíduos e grupos mais ou menos expostos — de maneira literal — aos controles sociais. Já a raça, enquanto elemento estanque em nossas vidas pessoais, incidirá de maneira mais restrita no tipo particular de reação à prática. É fundamental também mencionar que a proibição do consumo dessa substância está historicamente relacionada com o problema do racismo em nosso país, pois, como apontaram Eduard MacRae e Júlio Simões (2000), longe de ser um hábito recente, a utilização social das propriedades psicotrópicas da cannabis sativa, acredita-se, foi introduzida no Brasil por africanos escravizados no processo de colonização. Mas foi apenas no século XX que a maconha se tornou uma questão pública. O avanço do uso por estratos populares em centros urbanos, que ultrapassou os padrões tradicionais das antigas rodas de fumo típicas do Nordeste, chamou a atenção das autoridades médicas e policiais brasileiras, que por meio de seus laudos, fizeram tomar corpo a associação entre preto, pobre, maconheiro, bandido. Além disso, os estudos apontavam aqueles que a consumiam simultaneamente como doentes e marginais e, com o crescente número de opositores, o consumo passou, em 1934, a ser penalizado em lei.

Apesar da aparente regularidade da amostra deste estudo, várias camadas de desigualdade puderam ser observadas. Este trabalho assume, tendo recebido influências da teoria interseccional, o patriarcado, o racismo e o capitalismo como sistemas articulados de dominação, opressão e exploração, e não como elementos singulares que podem se somar. Desse modo, aqui são tratadas de maneira conjunta e contextual, o gênero, a raça e a classe.

Embora o cruzamento das diferentes formas de desigualdade já existisse, foi a partir da obra de Kimberlé Crenshaw (1989), jurista americana, que tivemos um marco significativo. Ao não tratar a raça e o gênero como categorias separadas de experiência e análise, Crenshaw partiu em busca de uma categorização sintética, de baixo para cima, tratando de maneira interseccional as desigualdades, como no caso das mulheres negras. Isso nos conduz imediatamente a pensar no feminismo negro e em uma visão sistêmica da dominação.

Como apontou Bruna Cristina Jaquetto Pereira (2021), na qualidade de herdeira das teorias feminista e racial crítica, a interseccionalidade traz para um mesmo plano elementos teóricos e políticos. Aqui teremos esses diferentes eixos de dominação pensados conjuntamente, tratados em termos situacionais concretos. Mulheres negras; jovens semianalfabetos; rapazes brancos etc. Cada um, à sua maneira, diante das contingências da vida.

A noção operada aqui de amostra é a da escolha bem definida de uma parcela de uma população (usuários de maconha que residem em São Lourenço da Mata), dada a impossibilidade de abranger a totalidade dos indivíduos incluídos nesses critérios. Álvaro P. Pires (2014) definiu essa estrutura de pesquisa como fechada ou convencional.

Deve ser destacado que a seleção das variáveis que serviram de apoio à construção analítica dos dois conjuntos não ocorreu a priori; ela se deu durante a coleta de dados e os primeiros procedimentos de análise, quando pôde ser verificada a construção de um padrão.

O critério de definição do número de entrevistados — que resultou em vinte entrevistas, cada conjunto possuindo dez — obedeceu ao princípio de saturação empírica, designando a compreensão, com base nas últimas entrevistas e observações, de que os dados não trazem informações satisfatoriamente novas para justificar uma ampliação na coleta; embora lembrando que a saturação não quer dizer o esgotamento empírico em sua totalidade, o que é impossível (PIRES, 2014).

Por uma questão de rigor, a saturação empírica não deve ser tomada como um senso de pesquisa, em que, por meio da experiência ou faro de quem analisa os dados, é sentido quando deve parar. É necessário, para saber se as informações estão ou não esgotadas sobre o tema de pesquisa, analisar as entrevistas uma a uma. Nisso entramos no procedimento de análise das entrevistas: a análise de conteúdo, ou mais precisamente neste caso, a análise categorial.

A técnica deve, de acordo com Laurence Bardin (1977), obedecer a alguns critérios para a obtenção de resultados seguros: o material coletado deve ser homogêneo; deve esgotar a totalidade do texto; deve ser exaustiva; objetiva, o que quer dizer que, independentemente dos codificadores adotados, deve-se chegar aos mesmos resultados e, por fim, deve haver boa adaptação ao conteúdo e aos objetivos.

O método de análise categorial consiste na classificação em gavetas através da manifestação de temas (assumindo aqui a presença e não a frequência). É um método que permite introduzir uma ordem na desordem aparente (BARDIN, 1977).

Seguindo esses procedimentos, foi atingido o número de vinte entrevistas, realizadas entre 2018 e 2019, do tipo semiestruturadas, realizadas presencialmente. Os entrevistados foram acessados por meio de indicações.   A variável utilizada a posteriori para dividir as entrevistas, por ter apresentado força interativa com os resultados, foi o nível de escolaridade.

 

Avaliação situacional do consumo[1]

 

Embora Howard S. Becker (2008), autor que trouxe contribuições muito importantes para o estudo do desvio, tenha se referido a variações na aplicação de  normas a ações idênticas praticadas por indivíduos com classes e raças distintas, seu trabalho não apresenta uma ponte clara entre a interação social e o nível estrutural. Caminho semelhante pode ser localizado na obra de Gilberto Velho (1998). No entanto, ainda sobre esse antropólogo, cabe destaque à sua importante contribuição sobre as categorias de acusação, entre elas a de drogado. Ele buscou nos mostrar como a acusação desliza do ato praticado para atingir quem o praticou, assumindo um espectro moral mais amplo: o drogado pode ser considerado “doente”, “improdutivo para o trabalho”, “contrário aos valores da família” e, de maneira ambígua, “manipulado” ou “subversivo”, dentro de contextos específicos (VELHO, 1981).

 Com o objetivo de superar esse limite entre os níveis interacionais e estruturais, Michel Misse (2010) buscou elucidar como certos tipos sociais “demarcados (e acusados) socialmente pela pobreza, pela cor ou pelo estilo de vida” (MISSE, 2010, p. 18), em contextos sócio-históricos determinados, são, para além de seus atos, postos em um processo de “criminação”, dada a forma como são construídos e representados.

A punição desliza do crime para quem o praticou, partindo de justificativas como a sua  irrecuperabilidade potencial, desvio de caráter ou, de forma resumida: “sua subjetividade essencialmente criminosa” (MISSE, 2010, p. 19).

No caso da sujeição criminal, para esse autor, não se trata de uma simples violação de uma norma estabelecida, e com isso a aplicação de um rótulo, e sim de uma significação moral que condensa determinados agentes e suas práticas por meio de processos de rotulação, estigmatização e tipificação em classificações sociais relativamente estáveis e legítimas (MISSE, 2010).

Nem toda incriminação resulta em sujeição criminal. A aplicação bem-sucedida de uma norma estabelecida em lei não é, por si só, capaz de produzir como resultado um carisma negativo em um indivíduo e, mesmo que o fosse, não o faria identificar-se com esse status social negativo que lhe foi atribuído. O mesmo se aplica à reincidência. Pode haver reincidência sem que haja sujeição, assim como pode haver sujeição sem que haja reincidência judicialmente registrada (MISSE, 2010).

uma estratificação social do bandido/não bandido como polos extremos da sujeição criminal. Ela acompanha, em primeiro lugar, as representações sociais do ilícito, do ilegal e do criminal e, em segundo lugar, ela acompanha as linhas da estratificação social mais abrangente (MISSE, 2010).

No limite da sujeição criminal, a autorrepresentação e a representação social encontram-se alinhadas, criando um quadro de justificativas e autojustificativas que caminham na direção da índole perversa. Podendo chegar, em pontos extremos, “a assumir publicamente sua identidade como ‘mau’ ou se tornar inteiramente indiferente ao status negativo que continuam a lhe atribuir” (MISSE, 2010, p. 29).

Essa assimetria na aplicação de rótulos, na atuação policial, na relação com familiares e vizinhos poderá ser percebida com facilidade nos dados que seguem.

Entre os entrevistados do conjunto A, apenas três deles, Douglas, Pedro e Wagner, consomem maconha com o conhecimento dos pais. A única pessoa da família de Júlia que tem conhecimento de seu  hábito é uma prima; de Eduardo, a irmã. João não possui nenhum parente consanguíneo que tenha conhecimento de seu consumo, apenas a sua esposa. Já na linha colateral, percebemos maior abertura: dos dez entrevistados, cinco consomem com o conhecimento dos irmãos, e três  com o conhecimento dos primos. Podemos notar, desse modo, que há uma preocupação em manter a prática em segredo pela maioria dos entrevistados, sobretudo no parentesco em linha direta.

Esse dado é relevante, pois informa a autonomia em relação ao núcleo familiar. Dos dez entrevistados, seis moram com os pais. Nove possuem trabalho remunerado. O dado prevalente de atividade remunerada no conjunto os conecta a diferentes teias sociais, o que pode colaborar ou atrapalhar na prática. No entanto, facilita o acesso em um ponto: disporem de  dinheiro para aquisição da substância sem recorrer aos pais. Todavia, por seis deles ainda estarem sob a tutela dos familiares, havendo discordância sobre o hábito, ele terá que ser mantido em segredo.

Essas combinações de variáveis produziram a seguinte tipologia[2]: consumo secreto: Antônio, Daniel, Eduardo, Everton, João, Júlia e Sol. Consumo estigmatizado: Douglas e Wagner. Por fim, o consumo livre: Pedro. As declarações abaixo irão ajudar a compreender esse quadro:

Consumo secreto:

 

Eu penso principalmente nos meus pais. Porque quando eu comecei a beber, era difícil lá em casa, sabe? De eu chegar em casa e mainha ficar: “deixa eu vê se você bebeu”. Eu sair e ela dizer: “não quero que você beba, não” e tal. Depois eles acabaram se acostumando. E assim, eh, o preconceito é muito maior com relação à maconha. Se eu enfrentei uma dificuldade porque eu bebia; uma coisa que todo  mundo faz abertamente, imagine com a maconha... Eu realmente, tipo, prefiro manter  isso em segredo a sete chaves. (informação verbal)[3]

 

Consumo estigmatizado:

 

Pô, foi um momento bem chato, na verdade. Eu era adolescente e, enfim, dependia dos pais, e querendo ou não, eu tinha que seguir certas regras na casa deles. Mas depois que eu fiquei de maior e comecei a trabalhar, assim, poder comprar as minhas        próprias coisas, tipo, diminuiu bastante essa intolerância. Hoje é bem mais de boas. […] Acaba gerando um certo problema com os pais, né? Os pais não aceitam, não  gostam e tal. (informação verbal)[4]

 

Consumo livre:

 

Minha esposa sabe; minha mãe; meu irmão. Essas pessoas mais próximas de mim, assim, sabem que eu uso. Até mesmo porque eu trabalho; eu não deixo de viver minha vida; eu não sou irresponsável. (informação verbal)[5]

 

João, assim como Pedro, é casado, possui trabalho remunerado e não mora mais com os pais. No entanto, em seu caso, o principal controle é o do ambiente de trabalho. Motivo pelo qual o seu consumo é secreto. Sobre não revelar aos pais, ele declarou:

 

Hoje em dia, se de repente a minha família souber, eu não tenho a minha independência? Moro com a minha esposa e tal, então, se as pessoas soubessem, tal... Tanto é que não é algo tão escondido. (informação verbal)[6]

 

Como motivo principal para manter a prática em segredo, João apontou:

 

[...] Por conta ainda do preconceito. Eu não sei como é que as pessoas vão me ver. A gente tem um trabalho... Por exemplo, eu trabalho com crianças, né? Trabalho numa escola; dou aula pra crianças. E aí, por exemplo, se a mãe de uma criança daquela sabe; professores... Porque trabalho numa comunidade... A maconha na comunidade lá é assim, tá ligada ao tráfico, tá ligada a mais violência; tá ligada a pessoas que são presas. Então, se uma mãe, por exemplo, o público daquela escola disser: “Eita, esse professor fuma maconha”, parece que, eh, muda a visão que as pessoas tem, né? prefiro manter em segredo pra maioria das pessoas. (informação verbal)[7]

 

Como mencionado anteriormente, Douglas e Wagner têm sua prática reprovada pelos pais. Antônio, Daniel, Eduardo, Everton, João, Júlia e Sol não se sentem estigmatizados, dado  o caráter secreto de suas práticas desviantes. Pedro, por fim, afirmou não se sentir estigmatizado, embora sua família tenha conhecimento. Também como visto anteriormente, a aceitação da família se deve pelo menos em parte por ele ser responsável e trabalhar.

Entre os entrevistados do conjunto B, sete deles consomem com o conhecimento de seus núcleos familiares e outros parentes: Coringa, Ernesto, Fábio, Flávia, Igor, Marcelo e Maria.  Ulisses, Humberto e Jonas consomem de forma secreta em relação aos pais; embora outros familiares, como irmãos, primos ou tios tenham conhecimento.

O consumo se mostrou mais frequente entre os entrevistados do conjunto B do que no conjunto A, possivelmente por, entre outros motivos, os controles sociais terem se mostrado mais frouxos entre os mais vulneráveis. No entanto, é importante destacar que, embora possuam menor alcance, os controles familiares ainda existem. Apesar de terem deixado, em sua maioria, de morar com os pais, os consumidores relataram a persistência de tentativas por parte de seus genitores de coagir a prática. Mais adiante  retomaremos esses elementos.

Nesse conjunto de entrevistados, apenas três vivem com os pais: Ulisses, Jonas e Igor. E apenas o último não possui atividade remunerada. Cabe destacar que tratar dos controles sociais como sendo mais frouxos nesse conjunto — iniciaram a prática mais cedo, por exemplo —, não implica em crítica velada: a ideia de que a culpa é dos pais por seus filhos cometerem essa prática classificada judicialmente como crime. Sobre o controle parental, é importante frisar que ele não se resume a atos de vontade, também  entrando na equação as condições reais, como a disponibilidade de tempo para exercer controle. Como último elemento, merece ser pontuado que, mesmo quando esse controle é forte, o consumo pode ser retardado ou pode seguir em segredo, mas não há garantia de sua não ocorrência.

Dessas variáveis, a seguinte tipologia foi produzida: consumo secreto: Humberto, Marcelo e Ulisses. Consumo estigmatizado: Coringa, Fábio, Flávia, Igor, Jonas e Maria. Por fim, o consumo livre: Ernesto.

Consumo secreto:

 

São duas pessoas evangélicas, muito primitivas. Defendem muito, né, aquela coisa de... Mas também creio que por uma parte eles não têm entendimento do uso disso, sabe? São pessoas que são fechadas para se abrir em relação a isso daí. Se eu fosse falar em relação a isso, eles provavelmente seriam dispostos a não querer entender a minha situação. Então, por isso, eu prefiro respeitar; prefiro ser sigiloso, na minha, tranquilo. Prefiro evitar comentários, entendeu? É mais por uma parte de respeito meu por eles, mesmo. (informação verbal)[8]

 

Consumo estigmatizado:

 

Tem sim, todos os meus familiares sabem que eu uso. Todos eles sabem e assim, tem as críticas, né? Familiar não vai querer isso pra você, mas todos eles sabem que eu uso e também...Têm as suas críticas, né? Mas, por aqui, tudo bem. (informação verbal)[9]

 

Consumo livre:

Todo mundo! Todos eles! Dois irmãos: uma irmã e um irmão; meus pais, meus primos, meus tios, minha avó... Todo mundo. [...] Meus pais nunca me, nunca me embaçaram na minha pra eu não fumar... Falavam pra eu não fumar em casa, somente, aí desde então eu venho fumando... (informação verbal)[10]

 

Há, como pôde ser visto em algumas das falas, desaprovação por parte dos pais ou suposição dela. Fábio, além disso, foi preso por tráfico, o que lhe rendeu, em suas palavras, “uma ficha meio suja”. Igor, Jonas, Maria e Coringa apresentaram em suas falas a presença de estigma imposto de forma pública. Ulisses e Humberto não se sentem estigmatizados, pois escolhem os contextos e sujeitos que, ao saberem, não lhes imporia status  negativos, como nos ambientes de trabalho. Marcelo afirmou já ter se sentido estigmatizado, mas por ter mudado de endereço e buscado ser discreto nele e ter adotado novo visual. Afirmou, porém, não sentir mais essa rotulação negativa. Ernesto, por fim, afirmou que, embora todos os seus familiares e vizinhos saibam de sua prática desviante, isso nunca acarretou um tratamento diferenciado.

Como no conjunto A, também no conjunto B se mostraram relevantes na definição da necessidade/não necessidade de manter em sigilo para os familiares dois elementos: se possuem trabalho remunerado e se vivem com os pais. As duas variáveis (emprego e moradia) aparecem  de forma nítida nessa fala de Humberto:

 

Minha mãe suspeita, meu tio é policial, tomara que ele nunca saiba, porque ele é meio pesado, meio ignorante... Entendesse? Então, tomara que ele nunca saiba. E se ele souber, eu vivendo minha vida. Hoje eu não tenho mais quatorze, quinze, dezesseis anos, hoje eu tenho os meus dois filhos, tenho minha esposa, tenho minha casa; tô montando meu negócio, então hoje eu ando com minhas próprias pernas. Então, se ele souber e vier bater na minha porta e me estressar, eu vou dizer: “cara, não se estresse comigo, não”. (informação verbal)[11]

 

Mais adiante, temos, primeiro para o conjunto A e na sequência o B, os posicionamentos dos entrevistados sobre a necessidade/não necessidade de manter em segredo a prática para a vizinhança e as pessoas em geral; seguidas das suas motivações.

Sim, para evitar estigma ou consequências negativas:

 

Totalmente. Justamente como eu disse, né? Você é julgado se você é ou não é usuário.  Eles não vão olhar pra mim, por mais que eu seja, o trabalhador; o cara que sai pra trabalhar; o cara que volta do trabalho. Eles vão ficar... Se alguém souber, vai ficar dizendo: “oh o maconheiro, oh o maconheiro, oh o maconheiro; usuário!”. Então,  eu evito. (informação verbal)[12]

 

Sim, para evitar danos ao trabalho por conta do preconceito:

O problema hoje é que, sei lá, eu mesmo, por eu ter dreads e tal, muita gente já me julga e tal. E eu tento passar pras pessoas que eu não uso, mas eu tenho que passar isso por conta do meu trabalho, eu trabalho com o público, porque quero receber do público de diversas mentes, e nem todo mundo aceita... (informação verbal)[13]

 

Sim, para evitar que chegue ao conhecimento dos pais:

 

Eh, eu acho que, se tivesse preconceito, o que eu ia me preocupar mesmo é com a minha família, só. Com as pessoas, não. Não chegando no ouvido de minha família, pra mim estaria tranquilo. (informação verbal)[14]

 

Vemos, então, que uma preocupação manifestada por todos em evitar danos relacionados à maneira como as pessoas poderiam reagir ao consumo, levando o conjunto entrevistado a manter em segredo sua prática; seja por danos ao trabalho, medo do estigma ou para evitar que os pais tomem conhecimento. Já quanto ao conjunto B, temos:

Sim, para evitar estigma ou consequências negativas:

 

Eu, eu tento seguir ali de boa, sem estresse, porque não é bem-visto. Tem muita gente  ainda que não, não, não vai de acordo, acha que é um bicho de sete cabeças e tal, isso, aquilo outro, tudinho. Principalmente os conservadores, né? (informação verbal)[15]

 

Sim, para não incomodar os vizinhos:

 

É, acho sim, porque assim, por uma parte eu respeito, né? Porque tem muita gente que não gosta, não curte, se incomoda com o cheiro. (informação verbal)[16]

 

Depende do posicionamento singular de cada vizinho sobre o assunto:

 

Depende do ponto de vista de cada um vizinho, o que ele pensa, né, véi!? Porque tem gente que não vai de acordo com a situação, mas também tem gente que é tranquilo, que não nem aí, como eu muita das vezes já conversei, fumei com vizinhos. (informação verbal) [17]

 

Acha importante manter a discrição, embora os vizinhos tenham conhecimento:

 

Sabe, mai a gente num fuma na frente delas... (informação verbal)[18]

 

Não (para deixar tudo claro entre os vizinhos e evitar boatos):

 

É melhor que todo mundo saiba, pelo menos a turma ligada, já; ciente... O cara fuma o bagulho e tá tranquilo... Do que ficar escondendo e rolar umas merda lá, depois a turma saber lá que o cara tá fumando maconha, aí já quer associar a outras coisas, tá ligado? (informação verbal)[19]

 

Não, por não se importar:

 

Tanto faz, porque assim, eu não ligo pro que o povo saiba ou não. Porque tipo, eu não peço a ninguém, né? Não saio pedindo a ninguém pra fumar, eu mesmo dou meu  jeito, faço meus corre, de um jeito ou de outro e fumo. Aí eu não ligo pro que o povo vão dizer, ou vão pensar... ligo não. (informação verbal)[20]

 

Não, por se sentir estigmatizada independente do consumo:

 

Rapaz, eu em si, não mantenho segredo, até porque aonde eu moro, o povo fala muito, entendeu? Mesmo que eu não faça, se eu tiver perto de alguém que faça eu vou tá ligeiramente fazendo, entendeu? (informação verbal)[21]

 

A preocupação em manter em segredo para os vizinhos e as pessoas em geral se mostrou  mais fraca no conjunto B. Ernesto, Igor, Maria, Coringa e Jonas não mantêm em segredo, embora esse último tenha afirmado preferir evitar consumir na presença de sua vizinhança. Ulisses oculta apenas para uma parcela dos vizinhos, levando em conta os posicionamentos individuais sobre o assunto. Flávia e Fábio, embora mantenham em segredo, não mencionaram  eventuais danos, apenas que é preferível ser discreto, além de que a prática pode incomodar. Apenas Humberto e Marcelo manifestaram, de forma espontânea, o medo de serem estigmatizados ou de sofrerem alguma consequência indesejada. De forma bastante simplificada, apenas quatro acham necessário manter a prática em segredo. Seis o fazem apenas parcialmente ou consomem de forma completamente aberta.

Passaremos agora a verificar quais as estratégias adotadas para evitar a polícia, como elas variam entre os grupos e quais os efeitos disso. Inicialmente, para o conjunto A, temos o seguinte quadro:

Local fechado e coberto (ex.: em casa; casa de amigos/as; casa de praia):

 

Sim. Geralmente eu consumo, eh, na casa de amigos, né? Em ambientes fechados. Justamente pra não ficar exposto na rua e não ter nenhum contratempo. Algumas vezes, em algumas festas. Mas não é frequente que eu consumo; e, geralmente, quando eu consumo, é em lugares fechados. (informação verbal)[22]

 

Locais abertos e cobertos (ex.: bares, festas e shows, faculdades):

 

Pô, tento fumar em casa, já pra não ficar à mercê desses caras, e lá na faculdade também é de boa porque não tem polícia, os seguranças, é tranquilo. (informação verbal)[23]

 

Evitar andar portando a substância:

 

Eu não ando com drogas, né?! Quando a polícia vem, eu tô de boa. Quase não tem nada. aconteceu de eu vim de ônibus com a quantidade de uns cinco “g” [gramas] na bolsa, mas tava muito bem guardado. E quando eu venho de ônibus, que eu trago alguma maconha, eu tenho algumas técnicas pra ludibriar, caso a polícia me pare. Mas eu nunca fui parado pela polícia, entendeu? (informação verbal)[24]

 

Evitar ambientes abertos e descobertos “escancarados”:

 

Só, eh, procurar um local que não seja tão escancarado. [...] A gente sempre teve essa preocupação de tá num determinado local, mas que fosse visível, né? Se viesse uma polícia, se viesse... [...] Se tem uma parte assim, numa rua, sempre fica num local onde a gente possa visualizar se vai chegar alguém, se não vai. Nunca é no espaço mais público, assim. Nunca vai ser tão tranquilo quanto se estivesse em uma casa de praia. (informação verbal)[25]

 

Evitar fumar acompanhado de muita gente:

 

Eh, então, pra evitar a polícia, eu evito fumar em lugares públicos. Ou tá com muita gente. Como eu disse pra você, eu fumo com pessoas, e quando eu tô com essas pessoas, que são pessoas mais próximas, a gente fuma ou na minha casa, ou na  casa deles. (informação verbal)[26]

 

Entre os entrevistados, apenas três fumam maconha com o conhecimento dos pais, e apenas dois com o consentimento. Todos evitam que a vizinhança e as pessoas em geral saibam.  Há, para cada respondente, um conjunto de estratégias para evitar a polícia: para oito deles, a escolha dos locais; para um, evitar aglomerações; outros três, por fim, não andar portando a substância. A escolha dos locais se mostrou prevalente. E a tentativa de evitar a polícia, unânime. Em relação ao conjunto B:

Não faz nada para evitar a polícia:

 

Não. Porque tipo, eles perguntaram se eu fumava, eu disse que sim. É, o negócio é a  pessoa falar a verdade. Se tiver fumado, a pessoa diz que sim, que eles percebe, eles num é otário. E se tiver com alguma coisa, a pessoa diz que sim. Só o negócio não é mentir pra eles. (informação verbal)[27]

 

Consumir em locais fechados e cobertos (ex.: em casa ou na casa de amigos) e evitar ambientes de consumo e venda de drogas:

 

Evito muito tá em meio de antro, em boca de fumo principalmente pra não demorar a pega uma ideinha, não tá demorando, moscando na situação, pra não acabar se prejudicando, né? Que já justamente, eu já me prejudiquei, eu não quero mais não, isso pra mim mais não. (informação verbal)[28]

 

Quando sai portando droga, prepara o cigarro, para não ser confundido com traficante:

 

Sim. Cara, eu assim, né... Eu não costumo tá andando com maconha, sabe? Quando eu ando, eu já faço o meu cigarrinho de maconha, o meu baseado, e deixo pronto e saio só com aquela quantidade, sabe? Porque, se eu sou parado, né, eu posso conversar com o cara, o policial, e explicar minha situação, que eu sou usuário, mas que eu não tô traficando, né?! Que eu não tô incentivando outras pessoas a fumar, que eu usando de forma medicinal mesmo, assim, né? (informação verbal)[29]

 

Apenas entre os entrevistados do conjunto B esteve presente a postura de não fazer nada para evitar a polícia, encontrada em Ernesto, Coringa, Igor e Maria. Para eles, desde que sejam apresentados indícios de que você é apenas usuário, e sendo adotada postura cooperativa com os policiais, não há riscos. A fala de Marcelo percorreu o mesmo caminho. Embora tenha informado buscar evitar a polícia, seu mecanismo não envolve impedir o contato, mas sim apresentar sinais de que não está traficando: sair com apenas um cigarro, já feito, e com argumentos na ponta da língua para não ser taxado de traficante. Como veremos um pouco adiante, isso não impediu que ele fosse alvo de violência policial. Para os demais respondentes  do conjunto B, a escolha dos locais se apresenta de forma semelhante ao conjunto A, como o mecanismo  encontrado para não correrem riscos. No entanto, enquanto esses últimos apresentaram vários ambientes nos quais se sentiam seguros, os mais vulneráveis mostraram-se limitados ao uso doméstico e evitavam a permanência prolongada em locais de venda de drogas.

Entre os dez entrevistados do conjunto A, apenas três foram abordados pela polícia. Deles, dois sofreram algum tipo de abuso: Wagner e Douglas. Nessas três abordagens, perceberemos formas bastante distintas de atuação da polícia.

Recolheu a droga e liberou os usuários:

 

Já... eu já fui abordado. Na Boa Vista. Eu tava numa rua bem LGBT, que é a rua Metrópole. Eu tava lá, e a polícia abordou a gente e tal, e perguntou o que tinha, tava eu e mais dois amigos, um era digamos um negro claro e o outro era branco, e ele abordou eu que sou negro e o outro também, tá ligado? O branco, ele tipo que “vá pra lá”, entendesse? E aí foi de boa, meio que de boa... de certa forma, eu meio que vergonha porque você tava no meio de várias pessoas, e as pessoas, querendo ou não, né... já lhe julgam só por você aparecer, por você existir, e você vê que as pessoas começam a lhe julgar. Apesar que eu não tenho problema nenhum com julgamento, quiser me julgar, pode julgar... (informação verbal)[30]

 

Tentou extorquir dinheiro ou favorecimentos:

 

Veja só: eh, no dia desse incidente, ele chamou o pai, o cara que tava comigo vendendo a droga. Aí pediu pra eu chamar o meu pai. Aí eu disse a ele que não chamaria. Aí ele: “não, você tem que chamar o seu pai porque...”. Eu disse: “oh, eu sou de maior, então eu vou responder por mim”. Aí, enfim, painho é policial, tá ligado? Se meu pai fosse lá, ia ser uma escama pra cima de mim que eu não queria passar por essa situação. Aí eu tentei deixar o meu pai fora de todos os planos. E eu fui tentar falar a realidade do que aconteceu pra ver se eu tinha uma diminuição daquele problema. Enfim, um dos parentes do menino que tava lá em minha casa, ele  tinha um conhecimento com um pessoal que trabalhava na Secretaria de Defesa do Estado, e essa pessoa poderia fazer, tipo, tirar um dos policiais que tava no dia pra outro batalhão; porque o plano A que eles ofereceram era tipo, por três mil reais. Cada policial ia ganhar mil reais e eles liberavam. Aí o cara disse que não tinha dinheiro pra essa situação, tá ligado? Enfim, aí fizeram esse acordo e iam liberar a gente se ele realmente fizesse isso. Aí, no dia, o cara fez o acordo com eles. Eles toparam; apertaram a mão, aquela resenha de sempre e a gente foi na delegacia; eles contaram uma história diferente do que aconteceu realmente, e depois liberou todo mundo. (informação verbal)[31]

 

Violência física:

 

Eu tava numa praça em Camaragibe[32] e tava eu e meus amigos, né, eu e meu amigo  tava com um pouco, mas aí ele veio perguntar, mas aí como a gente tava bem escondido, a gente achou que ele não ia achar, né? Aí quando ele perguntou o que que a gente tinha, a gente disse “nada, num sei o quê.”, “beleza”, ai começou a procurar, procurar, aí achou né? Quando ele achou, ele deu uma tapa em mim, que tava comigo, meu amigo também, que tava com ele, deu uma tapa e falou que a gente  ia ser preso, que a gente ia assinar B.O. Aí a gente falou e explicou que era pouca quantidade, a gente, como diz aqui em Pernambuco, “pagamos de doido”, inventamos uma história e a gente se saiu... Tomou e mandou a gente embora. Acho que abordagem, umas quinze já. Agora, por eu ter dread e tal, os policiais vêm, e na mente deles, ficam com certeza que eu tenho algo. Então, eu já sofri abordagens que tipo, sem necessidade deles me mandarem fazer certas coisas, e eu tive que fazer, entendesse? Tipo, tirar o sapato, tipo desamarrar o cabelo pra ver se tava no cabelo, entendesse? Ele procurar em bancos assim, mesmo sem eu tá com nada, mas só pelo meu estilo e tal. Mas é porque quando a gente é abordado, os policiais querem total sinceridade. Se você chegar e falar, começar a explicar e tal, eles tratam você numa boa. Mas se você..., vamos supor, perguntar se você tem algo, você mentir, ele procurar e achar, aí é como se dizem: é pau... (informação verbal)[33]

 

Entre os entrevistados, apenas quatro informaram realizar uso intenso da maconha: Douglas, Pedro, Everton e Wagner. Deles, apenas Douglas e Everton o fazem em locais abertos e descobertos, eventualmente acompanhados por grupos pequenos e grandes, com pessoas conhecidas e desconhecidas. Esses elementos ajudam a compreender sua maior vulnerabilidade  em relação aos demais membros do conjunto A. De todo modo, merece destaque a baixa presença de violência física policial ou outros danos graves, se comparados aos encontrados no conjunto B. A polícia buscou, segundo o relato de Douglas, obter ganhos ilícitos se valendo de  sua posição situacional desvantajosa. Everton foi repreendido e liberado. Em uma das várias abordagens policiais sofridas, Wagner foi agredido fisicamente.

O conjunto B apresentou, quanto às abordagens policiais, índices diametralmente opostos ao conjunto A. Apenas Flávia não foi abordada pela polícia. Entre os demais, todos foram abordados e, nisso, cinco deles: Fábio, Humberto, Ulisses, Jonas e Marcelo sofreram algum tipo de abuso policial. Nessas abordagens, encontramos as seguintes situações: abordagem sem  violência policial; abordagem por tráfico com abuso policial; abordagem por consumo com abuso policial.

Buscando elucidar a violência policial e encontrar quais as suas relações com a nova lei de drogas (BRASIL, 2006), Marcos Veríssimo (2010), por meio de pesquisa empírica realizada entre usuários e traficantes do Rio de Janeiro e sua região metropolitana, notou que, com o novo tratamento em lei dado ao consumo, além de não resultar em avanços, trouxe consequências negativas sobre a atuação policial. Com a nova lei em vigor, o número de casos levados à justiça caiu drasticamente, o que o conduziu à hipótese de que houve um desinteresse por parte da esfera jurídica a esse conjunto de delitos, por não haver penas restritivas de liberdade para ele. Desse modo, no seu entendimento, esse tipo de delito teria ficado, em termos práticos, quase que restrito à atuação policial. Nesse sentido, a lei teria influenciado a criação de mecanismos de resolução na rua. Esses métodos caminham entre a informalidade e a ilegalidade. De acordo  com suas observações, a maneira como os policiais agem pode ir da extorsão, principalmente entre usuários de classe média, à aplicação de castigos físicos e morais, sobretudo entre os consumidores mais pobres.

A pesquisa também identificou outras formas de violência, como o que ficou conhecido entre suas vítimas como terror psicológico: um variado repertório de ameaças, insultos e suplícios físicos. O objetivo é fragilizar o espírito daquele que sofre o ataque, buscando retirar dele informações ou fazê-lo assumir a autoria de algum fato (verídico ou não) (VERÍSSIMO, 2010).

Aqui, como em outros casos, são as linhas gerais da estratificação de nossa sociedade que irão orientar o tipo de atuação dos operadores de justiça, que podem ir do legal, passando pelo informal, até o ilegal. Abaixo, seguem os relatos dos entrevistados:

Abordagem sem violência:

 

Normal, visse? As três foi normal, perguntava se eu tinha passagem, eu respondia que não, dava meu documento, ainda ligava pra delegacia pra puxar meu nome e tal, mai nada, deu em nada. (informação verbal)[34]

 

Abordagem por tráfico com violência policial:

 

Só quando eu fui preso mesmo, que foi um massacre do carai que eu levei. Eu levei uma pisa que, quem não quer apanhar da mãe e do pai é melhor apanhar, viu? Porque se a polícia pegar, viu? [...] Rapaz, nesse dia eu não tava nem traficando! Eu tava na quebrada, com uns... vamo dizer assim, com uns conhecido. [...] Nesse dia eu não tava nem traficando. Mas só que eu tinha o hábito safado, né, de que... nesse tempo eu gerava com uns menino aí, mas que tem muito rato, como assim, vou dizer assim na minha linguagem pra você entender, que... ladrão, né. Vê onde você guarda seu fragrante, vai lá e lhe rateia. Eu já vi muito menino lá que gerava comigo lá, acontecer isso. Aí, pra não acontecer de eu ter prejuízo, eu sempre andava comigo... sete, cinco, oito dólar na cueca. Quando eu voltei pra pegar o telefone [em sua residência], o policial... acho que uns, uns três metros, já me abordou com uma pistola na mão me pedindo que eu deitasse no chão. Daí eu me virei tentando tirar o fragrante, mas que eu não consegui mais tirar o fragrante. Daí me abordaram, me torturaram, botaram mais crack pra mim, botaram uma trinta e oito, um trinta e dois velho, tiraram foto e me disseram que se não desse com a mão de quem era aquela droga ia empurrar tudo pra mim. Aí eu disse: “isso é meu, isso é meu, é pro meu consumo... eu trabalho. — “Você veio de onde?” — Eu vim da casa da minha mulé! — Viesse da casa da tua mulé?’ Mas antes me torturaram demais, torturaram demais mesmo, foi muita pisa, muita pisa mesmo. [...] Botou pra fazer o terror mesmo, pra  pessoa entregar. Aí eu desci... “Tá na sua casa as suas coisas?”. “Então!”. “Entra lá. Se tiver nem que seja uma dola vai rodar todo mundo. Tu; o que tiver, vai rodar também.”. Aí desceu pra lá. Quando desceu pra lá, eu já chamei o nome dela, né? Me enforcou: “oxe, tu tá fazendo alerta, é?”. “Vai por lá, zero dois; arrudeia aí; aborda pela frente lá!”. foi me levando. Zero um foi me levando na frente e o zero três atrás. É assim que se chamam numa abordagem. Conversou pra lá, conversou pra cá. Ela se acovardou comigo, dizendo que não tava comigo mais. Virou a casa de cabeça pra baixo e não encontrou nada. Aí já me algemou e já me levou já  pra delegacia de Camaragibe, e de fui transferido pra o IML fazer corpo de delito. De lá, fui pra triagem, COTEL. Passei dois anos e seis meses. Um ano no COTEL e um ano e seis mêi no Aníbal Bruno. Dois mil e... Passei 2014, 2015 e a metade de 2016. Ainda tô respondendo em liberdade. Já tive seis audiências e vou pra sétima audiência agora, e esperando em Jesus.[35] (informação verbal)[36]

 

Abordagem por consumo com violência policial:

 

Primeiro que a gente tava fumando num lugar inadequado, né!? Totalmente errado. Tava fumando do lado do Alto da Igreja, e a gente foi pego por três policiais da ROCAM. Daí ele perguntou se a gente tava com alguma coisa. A gente tava, realmente tava com uma coisinha acochada. E a gente disse que não tava, a gente tinha jogado a coisinha antes que ele chegasse perto da gente. Daí ele perguntou: “se a gente procurar e achar vai ser pau”. “Beleza”. E eles acharam, ligado? nisso, no que ele achou, ficou lá fazendo uma pressão psicológica. Viu que era pouca maconha, ficou perguntando de quem era... Daí cada um levou um chute. Teve um parceiro meu que levou dois. Ele colocou spray de pimenta na cara da gente e ainda  fez a gente orar o Pai Nosso. [...] Tiraram onda mesmo, esculacharam. Aproveitaram  que não tinha ninguém na situação por perto... Eu tava em um grupo de quatro pessoas, na outra cadeira tinha um grupo de três meninos que a gente não conhecia. Ele reuniu os sete e deu baculejo nos sete. [...] Todo mundo só colocou a mão na cabeça. Aí eles começaram a falar um bocado de coisa, pressionar, falar palavrão e  tal. Chegou a furar os dois pneu da bicicleta do brother lá que falou que a maconha era dele. Ficou perguntando até um dizer quem era, de quem era a maconha. o que  disse era o que tava com a bicicleta. Ele foi e furou os dois pneu da bicicleta dele. (informação verbal)[37]

 

Abordagem policial com extorsão:

 

[...] A vez que eu tava lá em Porto de Galinhas foi mais sinistro assim, né... Porque a gente tava com uma quantidade a mais assim de maconha, e aí o policial queria levar a gente pra delegacia, né... E tinha um brother nosso que faz faculdade e ia se queimar com isso, né?! Por causa do B.O, do TCO que ele ia assinar lá, e tal. E aí ele começou a entrar em desespero e pediu por tudo assim pra o policial não levar ele e tal pra ele não ter que assinar lá TCO, e aí o policial ficou botando pressão na gente. E o que eu percebi é que esse lance de policial é o seguinte, sempre é uma equipe, né... Quatro policiais, dois são filhos da mãe assim, que vão chegar escrotando, botando o maior terror em tu, e outros dois são mais tranquilos, ligado? Depois que rola esse terror vem os outros policiais pra acalmar a situação, né... “Não, meu irmão, aconteceu isso e tal, mas a gente vai conversar e tal, tudinho...”. Eu acho que a tática da polícia é essa, ligado, sempre  tem que ter um cara que vai chegar botando o terror assim, ligado, e passando esse  medo. E meu amigo ficou no pânico e véi... Os cabra pegou — sei nem se eu posso  relatar isso, mas... —, os cara pegou nossa carteira, mano, e tirou todo o dinheiro de dentro e levou nossa carteira, levou nosso dinheiro, levou nossa erva e ainda levou a  carteira de cigarro do brother, tá ligado? Aí tipo, eu fiquei pensando, “os cara são policial ou os cara são ladrão, véi?” Saca? Não quero nem tá julgando isso, sabe? Mas foi o que aconteceu. (informação verbal)[38]

 

A maior vulnerabilidade do conjunto B é nítida: enquanto no conjunto A apenas três foram abordados pela polícia, tendo havido abusos em dois deles; nove entrevistados do conjunto B foram abordados, tendo cinco sofrido violações legais. Em quase todas essas situações apresentadas para esse grupo, os respondentes estavam acompanhados de outras pessoas, em locais abertos e descobertos.

 

Considerações finais

 

O conjunto A demonstrou maior cautela em toda a sua trajetória de consumo, optando, em sua maioria, por locais privados (sem circulação de desconhecidos e distante dos olhares estranhos). Em alguns casos, em locais com circulação de  estranhos, mas fechados, como bares, shows etc. O conjunto B consumia, em sua maioria, quando iniciaram a prática, em locais com circulação de estranhos e visíveis a todos, como em  ruas e praças (seis dos dez). Na ocasião da pesquisa, a maioria deles passou a consumir em ambientes privados, como em casa ou na casa de amigos (seis dos dez).

Sobre a necessidade/não necessidade de manter em segredo a prática, o conjunto A se mostrou muito mais empenhado em ocultá-la do que o conjunto B, seja entre familiares, vizinhança ou pessoas em geral. A respeito das estratégias para evitar a polícia, os primeiros também se mostraram muito mais empenhados do que os segundos.

Sobre o estigma, apenas dois entrevistados do conjunto A informaram sentir recair sobre eles rotulações negativas. Já no conjunto B, seis se sentem estigmatizados. Desse modo, prevaleceu no primeiro bloco de entrevistas o consumo oculto, enquanto no segundo, o consumo estigmatizado

Sobre as abordagens policiais, percebemos um grande abismo entre os dois blocos de entrevistas: no conjunto A, dos dez entrevistados, apenas três foram abordados, tendo sido observadas duas ocorrências de abusos policiais: uma obtenção de vantagens ilícitas pelos agentes, em um caso, e violência física, em outro. No conjunto B, dos dez entrevistados, nove foram abordados pela polícia; desses, cinco foram vítimas de algum tipo de abuso legal, como extorsão ou, na maioria dos casos, violência física e humilhações.

Em diversas situações, parte dos entrevistados apontou o racismo como elemento motivador de abordagens policiais e dos abusos sofridos. Wagner e Marcelo apontaram o visual rasta como fonte de preconceito e perseguição policial. Para desemaranhar esses dados, dois elementos devem ser tomados: a configuração do consumo e a configuração do racismo no Brasil, que apresenta forte afinidade com outros marcadores sociais da diferença. O racismo é inegável, mas no caso brasileiro, como apontou Oracy Nogueira (2007), está intimamente relacionado com a classe.

Dito de outro modo, foi possível perceber, por meio das características do consumo, que a classe informa as circunstâncias que facilitam ou dificultam a atuação da polícia; ou que demonstram maiores ou menores chances de obtenção de sucesso por parte dos controles parentais e de vizinhança. No caso da polícia, se andam portando a substância, se fumam em lugares com circulação de estranhos, se realizam trocas comerciais (aquisição) em ambientes sujeitos à vigilância ou realizam atividades contextualmente tidas como suspeitas, como andar em grupos em locais onde há o consumo dessa planta. A aprendizagem dessas estratégias, estando associada ao nível de escolaridade, mostra-se claramente como elemento de classe. São desenvolvimentos informados de estilos particulares de vida. O controle parental também se mostrou mais fraco entre os informantes com no máximo o ensino médio completo. Em alguns casos, deve-se ao tipo particular de compreensão sobre os usos recreativos da maconha, em outros, incapacidade de exercer o controle (muitas vezes por jornadas extensas de trabalho ou outros elementos relativos às condições objetivas de vida). A integração social entre vizinhança e usuários se mostrou mais fraca entre os entrevistados do conjunto B, por eles terem, por ocasião da necessidade de ingresso precoce em atividades laborais e constituição de novos núcleos familiares, deixado a casa dos pais e se mudado para novas vizinhanças, tendo laços ainda recentes e pouco estabelecidos, o que impacta nos mecanismos de controle por parte desse grupo.

 Pierre Bourdieu (2019) tratou dessas questões envolvendo a juventude. Para ele, a divisão entre as idades é arbitrária, sendo a fronteira entre a juventude e a velhice controversa em todas as sociedades. A representação ideológica da juventude lhe concede coisas e, em contrapartida, retira deles uma série de outras. Essa divisão é, então, uma cisão de poder. Comparando pessoas nas mesmas idades biológicas, temos uma grande diversidade na disponibilidade de tempo, mercado de trabalho e condições de existência, de modo geral. Uns são estudantes e possuem entradas com descontos para cinemas e teatros; já outros estão inseridos no mundo do trabalho, lidando com dificuldades severas. Para os primeiros, há de forma prolongada a adolescência, entendida por ele como uma forma de “irresponsabilidade provisória”: são adultos para algumas coisas, crianças para outras. O desejo, na forma infraconsciente, é ajustado ao horizonte dos possíveis objetivos: o filho da classe operária aguarda ansioso pela entrada no mundo do trabalho. No entanto, o ajuste entre possibilidades reais e desejos nem sempre estão em acordo. O exemplo dado por Bourdieu se aplica ao Brasil de nossos dias e, em particular, a essa pesquisa: bacharéis e licenciados desempregados ou com empregos não desejados; almejando aqueles possuídos pelos mais velhos, muitas vezes atingidos como ponto de chegada para eles; pretendidos como partida para os mais novos. Nesse desajuste geracional, podemos ver um mal-estar entre “jovens” e “velhos”, em que os mais novos são, por força das necessidades objetivas, empurrados para a “juventude”. E se compararmos esses estudantes ou recém-formados com os que estão no mundo do subemprego, encontramos uma vida lúdica para os primeiros, e dura demais para os segundos. O conceito é construído, manipulado: deve sempre ser pensado por meio das relações.

As faixas de idade são informativas, mas sozinhas, dizem muito pouco. Se para uns, o convívio com os pais é prolongado durante o período universitário e, muitas vezes, para além dele; para outros, rapidamente os mundos do trabalho se impõem: as atividades rotineiras de carteira assinada; os contratos informais; atividades autônomas ou bicos. Aos primeiros, a fase dos namoros se estende longamente; já para os segundos, a formação de novos núcleos familiares ocorre com certa rapidez. A proteção e controle dos pais cessa, ou pelo menos perde densidade, restando a tarefa aos mais desprivilegiados de enfrentar as adversidades de toda sorte por suas próprias mãos: lidar com as polícias e o sistema de justiça; suas imagens frente as vizinhanças; os dilemas de suas novas famílias; a consequente redução do tempo para se encontrar com amigos. Desse modo, tomando a idade e as posições objetivas ocupadas no espaço social, percebemos que entre os mais pobres há um momento de inflexão próximo à maioridade civil.

Sobre os elementos de raça, embora analiticamente não operantes para a divisão da amostra, não se mostraram menos importantes: nos dois conjuntos foi possível localizar a presença do racismo, o que ajuda a revelar a gravidade do problema. Como destacado ao longo do texto, a raça está intimamente relacionada ao consumo de maconha no Brasil, assim como com a sua proibição. São questões imbricadas.

Transformações nos interesses ligados à economia, ciência — como as discussões médicas —, segurança pública e liberdades individuais são responsáveis, em larga medida, pela mobilização da atenção dada à maconha no país hoje (BRANDÃO, 2014). Positiva ou negativamente, direta ou indiretamente, as pessoas se sentem afetadas pela política de drogas em vigor. Aqui foram abordados principalmente temas ligados às liberdades individuais e à inoperância democrática na atuação das forças policiais.

 

Referências

 

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Recebido em: 13/08/2023.

Aceito em: 20/11/2023.

 

 



* Mestre em sociologia pela Universidade Federal da Paraíba, Brasil. Professor da Rede Estadual de Ensino do Estado de Pernambuco. E-mail: ricardobandeira_cs@hotmail.com.

[1] Os nomes utilizados aqui para se referir aos participantes da pesquisa são fictícios, com a finalidade de preservar as suas identidades.

[2] Aqui será considerado o sigilo apenas em relação aos pais (por representarem um controle forte se comparados  aos irmãos ou primos dos consumidores).

[3] Trecho de entrevista concedida por Júlia em São Lourenço da Mata, 2019. Mulher branca, 26 anos de idade.

[4] Trecho de entrevista concedida por Douglas em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 25 anos de idade.

[5] Trecho de entrevista concedida por Pedro em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 30 anos de idade.

[6] Trecho de entrevista concedida por João em São Lourenço da Mata, 2018. Homem preto, 33 anos de idade.

[7] Idem.

[8] Trecho de entrevista concedida por Ulisses em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 27 anos de idade.

[9] Trecho de entrevista concedida por Flávia em São Lourenço da Mata, 2019. Mulher preta, 28 anos de idade.

[10] Trecho de entrevista concedida por Ernesto em São Lourenço da Mata, 2018. Homem preto, 28 anos de idade.

[11] Trecho de entrevista concedida por Humberto em São Lourenço da Mata, 2018. Homem branco, 31 anos de idade.

[12] Trecho de entrevista concedida por Pedro em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 30 anos de idade.

[13] Trecho de entrevista concedida por Wagner em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 22 anos de idade.

[14] Trecho de entrevista concedida por Julia em São Lourenço da Mata, 2019. Mulher branca, 26 anos de idade.

[15] Trecho de entrevista concedida por Humberto em São Lourenço da Mata, 2018. Homem branco, 31 anos de idade.

[16] Trecho de entrevista concedida por Flávia em São Lourenço da Mata, 2019. Mulher preta, 28 anos de idade.

[17] Trecho de entrevista concedida por Ulisses em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 27 anos de idade

[18] Trecho de entrevista concedida por Jonas em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 24 anos de idade.

[19] Trecho de entrevista concedida por Ernesto em São Lourenço da Mata, 2018. Homem preto, 28 anos de idade.

[20] Trecho de entrevista concedida por Coringa em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 22 anos de idade.

[21] Trecho de entrevista concedida por Maria  em São Lourenço da Mata, 2019. Mulher preta, 24 anos de idade.

[22] Trecho de entrevista concedida por Eduardo em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 26 anos de idade.

[23] Trecho de entrevista concedida por Douglas em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 25 anos de idade.

[24] Trecho de entrevista concedida por Antônio em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 26 anos de idade.

[25] Trecho de entrevista concedida por João em São Lourenço da Mata, 2018. Homem preto, 33 anos de idade.

[26] Trecho de entrevista concedida por Pedro em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 30 anos de idade.

[27] Trecho de entrevista concedida por Coringa em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 22 anos de idade.

[28] Trecho da entrevista concedida por Fábio em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 30 anos de idade.

[29] Trecho da entrevista concedida por Marcelo em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 28 anos de idade.

[30] Trecho de entrevista concedida por Everton em São Lourenço da Mata, 2019.

[31] Trecho de entrevista concedida por Douglas em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 25 anos de idade.

[32] Cidade da Região Metropolitana do Recife. Faz fronteira com São Lourenço da Mata e a capital.

[33] Trecho de entrevista concedida por Wagner em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 22 anos de idade.

[34] Trecho de entrevista concedida por Igor em São Lourenço da Mata, 2019. Homem preto, 22 anos de idade.

[35] Fábio relatou ter sido preso portando duas pedras de crack e onze “big bigs” (pequena quantidade da erva embrulhada em plástico, papel alumínio etc.) de maconha; o que, de acordo com ele, era inferior a trinta gramas.

[36] Trecho de entrevista concedida por Fábio em Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 30 anos de idade.

[37] Trecho de entrevista concedida por Ulisses em São Lourenço da Mata, 2019. Homem pardo, 27 anos de idade.

[38] Trecho da entrevista concedida por Marcelo em São Lourenço da Mata, 2019. Homem branco, 28 anos de idade.

 

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Desenho de um círculo

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