MUDANDO DE ROTA NO TRAJETO E SEGUINDO CAMINHOS NAS FRONTEIRAS DA ANTROPOLOGIA: entrevista com Maristela Andrade
CHANGING COURSE ON THE JOURNEY AND FOLLOWING PATHWAYS ON THE FRONTIERS OF ANTHROPOLOGY: interview with Maristela Andrade
Maristela Oliveira de Andrade *
Geziane do Nascimento Oliveira **
DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n31.68434.p338-361
Maristela Oliveira de Andrade é professora titular universitária aposentada, graduada em psicologia pela Universidade Católica de Pernambuco (1978). Tem pós-graduação em antropologia cultural (UFPE) (1984). Doutora em Études Latino-americaines/Anthropossociologie des Religions pela Université de Paris III (Sorbonne-Nouvelle) (1983). Seus estudos apresentam interfaces com as temáticas de território, populações tradicionais, desenvolvimento e meio ambiente, bem como no campo da religião e religiosidades, movimentos religiosos contemporâneos. Autora dos livros: 500 Anos de catolicismos & sincretismos no Brasil (2002); Cultura e tradição nordestina: ensaios de história cultural e intelectual (2000); Anotações sobre a obra etnográfica de Câmara Cascudo (1999), entre outros. Dentre os livros organizados destaque para Roger Bastide e o Brasil (2004) e o mais recente Relações entre universidades e comunidades: o circuito da dádiva e a sustentabilidade dos territórios (2021). Recebeu dois prêmios: em 1998, o Prêmio Manoel Ferreira Nobre pelo Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte; e em 1997, recebeu a Menção Honrosa na área de ciências humanas no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC, na Universidade Federal da Paraíba. Aposentou-se do magistério em 2016. Criou o Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Cultura, Sociedade e Ambiente (2012), do qual é coordenadora adjunta. A entrevista foi realizada a partir de um roteiro semiestruturado, e aconteceu de forma remota, via plataforma de vídeo conferência Zoom.us, no dia 29 de setembro de 2023.
Geziane — Primeiramente, gostaria de agradecer por sua disponibilidade, por ter aceitado a entrevista. Para a Caos é uma honra poder entrevistá-la e poder mostrar um pouco do seu trabalho, do que foi feito na universidade. Trabalhos que acho muito ricos, que vão contribuir tanto para quem tiver acesso a esta entrevista quanto para quem tiver curiosidade e for atrás dos seus trabalhos. Muito obrigada!
Maristela — Boa tarde, Geziane. Eu também agradeço muito ao colega Giovanni que me contatou para fazer a entrevista. De fato, eu lhe disse que não tinha muita coisa para dizer, mas ele insistiu que sim, que eu tinha muito o que dizer. Então eu fui tentando construir um roteirinho, porque eu sou muito de ir fazendo coisas e pronto, não fico me revendo. Eu sei que no meu memorial eu tive que fazer um pouco disso, mas o roteiro de perguntas que você me passou com antecedência, fez-me colocar algumas coisas a mais na minha trajetória na UFPB. É uma trajetória que não terminou porque ainda estou dando meus últimos passinhos, já que eu ainda estou com um vínculo bem informal. Com muito gosto mantenho ainda algumas atividades na UFPB.
Geziane — Ah, está certo. Então, assim, a gente vai começando, mas a senhora sinta-se livre. O roteiro é algo básico para gente se guiar, mas não precisamos ficar presas a ele. Para iniciar, poderia falar um pouco sobre a aluna Maristela, começando tudo do início.
Maristela — Geziane, eu vou falar, mas não vou falar muita coisa da aluna de graduação, porque eu fiz minha graduação no curso de psicologia, e ao longo do curso, eu fui descobrindo que não era — vamos dizer, aqueles assuntos que o curso me apresentava —bem o que eu tinha em mente para minha vida. Era um curso voltado para a psicologia clínica, para uma atuação bem no campo da saúde. E eu olhava a psicologia para outro lado, talvez, mais social. Porque eu fiz minha segunda opção para sociologia, quando fiz o vestibular na Universidade Católica de Pernambuco. Mas eu achava que a psicologia ia me dar uma bagagem e tal. É isso, eu acabei me desmotivando com o curso, mas, ao mesmo tempo, não queria começar outro curso, deixando as coisas pelo meio. Disse para mim mesma, eu vou buscar outro caminho na minha pós-graduação. Alguma coisa que tenha afinidade com esse campo. Então foi isso que eu fiz. Completei meu curso de psicologia e fui buscar uma pós-graduação numa área que me desse mais, que me instigasse mais a estudar, com mais vontade, com mais inspiração.
Geziane — A sua pós-graduação foi em antropologia?
Maristela — Eu fiz uma pós-graduação meio híbrida. Eu fui para a França. Foi uma oportunidade que eu tive, porque o meu marido — meu namorado na época — ganhou uma bolsa do Conselho Britânico para estudar num mestrado na Universidade de Edimburgo na Escócia. Então eu fui com ele e tentei fazer o mestrado de antropologia na mesma universidade. Mas eu não tive muito sucesso. Não me preparei tanto para conhecer e saber onde eu estava pisando. Então eu pensei em ir para a França, porque eu tinha uma colega da psicologia que estava lá, e ela me deu uma indicação para eu procurar o Instituto de Altos Estudos da América Latina, que fica em Paris. Assim eu poderia me conectar um pouco com o companheiro que estava lá na Escócia, porque Paris é uma cidade mais fácil para se conectar, de viagem e tudo mais. Então eu comecei meu curso nesse Instituto. A formação de lá fazia uma junção entre antropologia e sociologia. O professor que me aceitou também tinha essa coisa meio lá, meio cá. Ele me estimulava muito para ler Weber, para fundamentar meu estudo em Weber, que é uma referência forte da sociologia. O meu orientador, Auber Rabenoro, era de Madagascar, e embora viesse ali de pertinho da África, ele não estudava as religiões africanas, que foi o caminho que eu me interessei. Eu estava querendo ver, por meio das religiões afro, o Brasil por trás disso tudo, como uma espécie de uma raiz da nossa cultura, da nossa sociedade. Rabenoro estudava, na época, o pentecostalismo na América Latina, e me incentivou a fazer um campo aqui no Brasil dentro dessa vertente. Mas eu insisti com o meu tema, e ele acabou por me aceitar.
Rabenoro foi o sucessor de Roger Bastide no Instituto, e herdou vários de seus alunos, um deles foi Renato Ortiz, que se tornou muito reconhecido no Brasil. E ele tinha muita admiração pela tese de Renato Ortiz, então ele disse, “olha, vai ler a tese de Ortiz”. Foi uma das minhas primeiras leituras, eu lia e relia. E o engraçado é que, com a leitura de Ortiz, eu comecei a ver naquele caminho que ele fez para mostrar o processo de branqueamento da umbanda em São Paulo, uma possibilidade de olhar para o xangô — a religião afro do Recife, onde eu vivia — em um caminho inverso, já que elas estavam se reafricanizando, ou melhor reafirmando sua africanidade.
Então, na mesma época do branqueamento da umbanda em São Paulo, em Recife, as religiões afro estavam vivendo um processo de valorização dessa raiz, dessa memória de África. O livro de Ortiz (1999) foi que me inspirou a enxergar esse campo dessa forma e me fez construir as perguntas da minha tese. Como as religiões afro estavam buscando sua institucionalização frente ao campo religioso no Brasil? Como elas estavam conseguindo se legitimar? Isso era o início dos anos 1980, quando eu comecei minha pesquisa de campo. E aí, eu usei Turner (1974) para entender esses processos de institucionalização, ao lado de Weber, que foi importante para mim, para entender a busca de legitimação. Mas Turner me fez compreender melhor esse processo a partir da ideia de liminaridade. Eu achava que as religiões afro estavam saindo da liminaridade e ganhando visibilidade na sociedade. Eu tinha uma visão muito, vamos dizer, favorável a esse processo. Talvez não fosse tão dessa forma, mas como as religiões no Nordeste, na Bahia, Pernambuco, tiveram muitos pesquisadores das universidades que deram essa visibilidade para elas, principalmente ao levaram pais de santo para espaços acadêmicos para discutir com pesquisadores, então, havia uma espécie de uma troca, de um diálogo. Eu enxergava isso como uma possibilidade de legitimar aquela religião perante a sociedade. Embora, anos antes, elas tivessem sofrido grande perseguição, em que o país se empenhava no esforço de eliminação daquelas práticas consideradas incivilizadas, não civilizadas para um país que queria se modernizar. Então esse foi o mote, que estava me instigando para estudar as religiões afro do Recife: como era possível conciliar as duas forças de modernização e de valorização de raízes, no caso do Nordeste?
Foi esse o caminho que tomei na minha formação no doutorado. Eu voltei para o Brasil para fazer o campo, e no Brasil — a gente está sempre buscando com quem dialogar para desenvolver a pesquisa, e logo me indicaram o nome de Roberto Motta, que é também uma grande referência nos estudos afro em Recife, conhecido internacionalmente. Ele, na época, era coordenador do mestrado em antropologia cultural da UFPE. E ele se interessou pela minha proposta de pesquisa, mas disse que para me ajudar — eu estava propondo para ele ser uma espécie de um coorientador — que eu deveria fazer a seleção do mestrado da UFPE para cursar o mestrado com a orientação dele. Fui a campo, visitei as casas de mais renome do Recife, por onde Roberto Motta pesquisava. Ele teve um papel muito importante na minha tese, e sempre que eu precisava, ele estava disponível para conversar sobre o campo. Foi assim que eu fui construindo minha pesquisa de doutorado e, ao mesmo tempo, cursando o mestrado, que me levou a fortalecer a formação em antropologia, porque eu sentia algumas deficiências nessa área, devido à limitação por ter feito um curso de psicologia. Então eu encontrei na UFPE um programa que, até pelo nome, antropologia cultural, tinha uma, vamos dizer assim, uma tradição norte-americana da antropologia. Lá, eu conheci dois professores americanos. Um foi meu professor, Parry Scott, eu até fiz trabalhos para ele, estagiei numa pesquisa dele, foi um interlocutor muito rico para mim, embora ele não trabalhasse com religião, mas aprendi bastante com ele. Tinha a professora Judith Hoffnagel que, se eu fosse fazer o trabalho sobre pentecostalismo, era com quem iria buscar ajuda, porque era o campo dela na época. E o próprio Roberto Motta, cuja formação de doutorado foi na Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos. Então, eu tinha ali uma tradição antropológica bem norte-americana. Mas como meu foco era a tese, eu não concluí o mestrado, mas ele terminou sendo uma espécie de uma ponte para mim; eu gostaria de ter feito uma dissertação de mestrado, mas não tinha fôlego para isso. Quando eu terminei meu doutorado, eu estava grávida, então eu não tinha mesmo condição de retomar o mestrado para fazer a dissertação. Por outro lado, no Instituto eu estava diante de um campo de conhecimento que me apresentava as questões da América Latina: questões ligadas aos problemas socioeconômicos, às questões da colonialidade; tinha, vamos dizer assim, professores fortes na área dos estudos sobre o campo, as sociedades rurais, os latifúndios, eles trabalhavam nessa linha. Quanto às aulas ou seminários da formação, predominavam as temáticas ligadas ao desenvolvimento, à dependência da América Latina, que eram seminários com ênfase nos estudos da área sociológica e econômica.
Paralelamente, havia os seminários com o diretor de tese voltados para os autores clássicos da sociologia e da antropologia dentro daquela formação que a gente iria escolher no final. Como eu tinha muita bibliografia para ler, eu não frequentei as inúmeras conferências que eram divulgadas para os estudantes em Paris, eu perdi muita coisa, como as de Celso Furtado, que vivia em Paris, transitava ali pelas universidades, dava muitas conferências. Fernando Henrique Cardoso também vivia dando conferência por lá. Havia outro espaço também maravilhoso para se assistir às conferências, aberto ao público, no Collège de France, onde lecionava Lévi-Strauss. Eu estava descobrindo o campo das ciências sociais, e meu orientador me indicou um monte de bibliotecas, cada uma melhor do que a outra. Eu vivia nessas bibliotecas, especialmente na do Instituto, que era uma referência para pesquisa sobre América Latina.
Geziane — Ainda mais que a sua base de graduação não era dentro das ciências sociais.
Maristela — Exatamente. É por isso que eu sentia que eu tinha que correr mais do que os meus colegas do Instituto, que tinham uma formação mais ligada àquelas áreas que estávamos fazendo. Então me ocorreu pensar agora: como seria a minha trajetória se eu tivesse entrado na antropologia social britânica lá na Universidade de Edimburgo? Eram outras leituras, eu ia estudar sobre as sociedades africanas, polinésias, e ia ser aquela antropologia bem clássica. Eu fui para um Instituto com colegas que falavam muito espanhol, portunhol, e eu me senti muito bem recebida, bem acolhida por esses colegas latino-americanos. Foi um tempo de muita construção de aprendizado.
Geziane — A senhora entrou nas ciências sociais na França e deu continuidade no Brasil. Fazer ciências sociais na França e aqui no Brasil tem alguma diferença?
Maristela — Olha, como eu comecei lendo Durkheim, Weber de A ética protestante, de Economia e sociedade na França, aqui no Brasil também se lia. No mestrado de antropologia, a gente se deparava com leituras antropológicas clássicas, que comecei a fazer na UFPE. Eu acho que foi quase como uma continuidade, pois o Instituto de Altos Estudos não era um instituto de formação, vamos dizer, clássica da antropologia. Era um Instituto em que a gente estudava o mundo latino-americano em suas dimensões antropológica, sociológica e histórica. Havia muitos geógrafos e economistas no Instituto. Então, eu acho que essa minha vivência na França não me tirou tanto desse universo que a gente leva do Brasil. Só que a América Latina é uma região muito mais abrangente, de uma riqueza enorme, para dialogar e estudar autores latino-americanos. E eu, de alguma maneira, estou recuperando isso agora no final da minha carreira, já que eu fiquei distante dela por um bom tempo, mas agora no PPGA temos um convênio com o Ciesas [Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología Social], do México. Estou trabalhando muito com a professora visitante que veio de lá, Maria Elena Martinez, e aí a gente vê como as nossas formações em estudos latino-americanos nos aproximam.
Geziane — E como iniciou a trajetória da Maristela, professora?
Maristela — Quando terminei meu doutorado, tive minha filha, então eu fui atrás de trabalho. Tive a sorte de estarem acontecendo alguns concursos aqui na Paraíba, porque eu morava em Recife. Eu sou pernambucana-paraibana, porque meu pai é paraibano e minha mãe é pernambucana. Então, eu vivi na Paraíba na minha infância. Quando eu fiz meu concurso foi para ir para Campina Grande, uma cidade onde eu morei na minha infância. Foi um retorno. Por outro lado, foi uma cidade onde eu tive uma vida feliz, mas também me marcou tragicamente com a morte precoce do meu pai por causa de um infarto fulminante. Ele morreu muito jovem, então, a cidade trazia também uma lembrança não boa. Eu passei uns anos trabalhando lá, e foi, assim, uma experiência muito rica. Eu encontrei um corpo docente muito preparado: uma antropologia bem forte. Tinha colegas que pesquisavam campesinato, ou religião, como Regina Novaes. Tinha uns colegas de Minas, Antônio Greco e Gilda Greco que trabalhavam com antropologia médica. Mas o forte de Campina Grande era a sociologia rural, com as professoras Salete, Guy, Norma, Margot e Deolinda. E embora eu já tenha chegado com doutorado, e os colegas tentaram me aproximar do mestrado, eu estava muito empolgada com a graduação, com a área de antropologia, com muitas disciplinas de conteúdos variados que me exigiam muita leitura. A disciplina de antropologia do Brasil me estimulou de modo especial, comecei a levar autores intérpretes da cultura brasileira para os alunos lerem, entre eles Gilberto Freyre, e como ofereci vários semestres, eu pude começar a escrever alguns ensaios sobre essa temática. Então, foi um tempo que eu tive muita interação com os alunos da graduação. Os outros professores estavam muito empenhados no mestrado. Eles fizeram uma associação com o Departamento de Economia, por isso o curso transitava nos dois campos: sociologia e economia. Vinham alunos de todos os lugares do Brasil, era muito rico, professores visitantes vinham da Inglaterra, da Alemanha e do Brasil mesmo. A colega Salete Cavalcante tinha uma presença fortíssima, como uma pesquisadora da área do campesinato, das sociedades rurais. Ela estudou no Museu Nacional e em Manchester. Aliás, a formação dos professores que estavam lá era muito forte, vários fizeram no Museu Nacional, então eu aprendi muito com eles. Pedia-lhes os programas, as bibliografias. Uma quantidade de referências bibliográficas, eu fui tomar conhecimento lá, trocando aí com esses colegas. Eu era iniciante, mais jovem do que eles. Então, foi assim meu começo. Depois, a família me cobrando mais presença em João Pessoa, onde meu marido estava trabalhando. Também eu queria ter outro filho, ser mãe de novo, dar uma irmã ou irmão para a minha primeira filha. Por isso eu tive a garra de lutar para vir para cá, mas o coração acadêmico estava lá em Campina Grande. Eu gostava muito de trabalhar lá. Mas consegui vir para cá quando a minha segunda filha estava bebezinha. Novamente me ocorreu a pergunta: como seria se eu tivesse continuado fazendo carreira lá em Campina Grande? Eu teria ficado mais na antropologia, porque lá era forte, aqui em João Pessoa, quando eu cheguei, já não era, não tinha sequer uma graduação em ciências sociais. Foi uma construção que veio uns anos depois.
Aqui, eu acabei sendo chamada para o mestrado em ciências sociais, que não era tão fechado para uma sociologia rural como era o de lá, com as temáticas bem delimitadas, uma identidade bem própria e bem forte. O daqui era mais abrangente, então eu me senti mais à vontade de ir trabalhar no mestrado daqui. Comecei a fazer as primeiras orientações de mestrado. Fui mudando aos poucos, fui abrindo para outros campos. Recebi alunos com várias formações. Foi assim que eu passei uma temporada na pós-graduação de ciências sociais. Mas já pela metade dos anos de 1990, foi sendo construído um programa com o qual eu tenho um laço muito forte, que é o Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, o PRODEMA. Quando ele começou, eu fui chamada, até porque não havia tantos doutores na universidade na época. Assim, quando se criava uma pós-graduação, a gente era chamada para colaborar. Esse mestrado passou anos para ser construído, porque ele era uma rede, e uma rede de pós-graduação era totalmente nova, era pioneira, não existia no Brasil nada parecido. Quando a Capes o aprovou finalmente em 1996, após vários anos de rejeição da proposta da rede, eu comecei com a primeira turma.
Minhas últimas orientações do PRODEMA foram um doutorado em cotutela com o Institut des Hautes Études de L’Amérique Latine, em 2021, e uma orientação de tese em parceria com uma colega, concluída em 2022. Foi muito rico porque eram equipes multidisciplinares. Professores iam e vinham, e circulavam na rede que atuava em quase todos os estados do Nordeste. A gente dava aula em outras universidades. Eu conheci a Universidade Estadual de Santa Cruz, em Ilhéus, e fiz parceria com um professor sociólogo de lá, Salvador Trevisan, para oferecermos juntos a disciplina Comunidade e Ambiente, e organizamos um livro da rede. Íamos para bancas lá. Passei vários anos compartilhando uma disciplina com um professor da UFRN, dando aula em Natal. Era uma disciplina que os colegas não gostavam muito de dar, porque tinha muito a ver com epistemologia. Eu fui aos poucos mudando o formato dela. Ela foi proposta por um colega que era físico da UFAL. Era uma disciplina muito focada na epistemologia científica a partir de Popper, bem popperiana. Eu fui mexendo, trazendo-a para minha área, começando a questionar a existência de uma epistemologia ambiental. Propunha pensar nessa questão. Se tem ou se não tem. Fazer ciência no campo ambiental é fazer uma ciência interdisciplinar, que dialogue, que não tem as suas caixinhas fechadas. Ali era difícil porque muitos professores não tinham abertura para o diálogo. Uns diziam: “olha, eu faço minha engenharia ambiental”, “olha, eu faço o meu estudo de conservação da biodiversidade”, e ali se fechava. Eu dizia: “mas a gente tem que trabalhar com a legislação ambiental, a política ambiental, porque se tratava de um curso de desenvolvimento”.
O professor que iniciou a proposta do PRODEMA vinha de uma formação na França sob a orientação do professor Ignacy Sachs, um pesquisador economista que produziu estudos sobre ecodesenvolvimento na perspectiva da sustentabilidade.
Um colega da UFAL contou uma vez a história sobre a ideia original de como começou. Ele foi resultado de um grupo de estudantes brasileiros que voltaram para o Brasil imbuídos de construir esta formação em diferentes universidades brasileiras. Assim nasceu no Nordeste, o PRODEMA pela iniciativa de Rodrigo Ramalho, da UFAL.
Isso significou que eu estava deixando um pouco de lado os estudos de religião afro. Eu achei, inicialmente, que lá em Campina Grande não tivesse muita coisa na área.
Como eu morei lá até minha adolescência, a feira de Campina Grande me pareceu um bom campo para se fazer uma grande etnografia da feira. Comecei com leituras de autores nordestinos, como Câmara Cascudo. Essa história do prêmio, foi porque com essas leituras, eu escrevi uma monografia, um texto com o qual participei de um concurso.
Também comecei a ler muito Gilberto Freyre. Levava suas obras para os alunos lerem na disciplina de antropologia do Brasil. Ao longo de 10 anos, quer dizer, cinco em Campina Grande e continuando um pouco aqui em João Pessoa, eu desenvolvi vários trabalhos nessa temática da cultura nordestina, e organizei um livro que foi publicado em 1998. Eu estava tentando me firmar no campo da cultura nordestina. Mas, como você viu, eu entrei naquela história do PRODEMA, e se abriu uma outra janela de conhecimento, de saberes, para agregar à minha pasta, vamos dizer, de trabalho.
Geziane — A sua temática, que antes era dentro da religião de matriz africana, em Campina Grande, ela tomou forma para a cultura nordestina.
Maristela — Isso. Culturas populares.
Geziane — E quando chegou a João Pessoa, qual foi o direcionamento?
Maristela — Continuei. Mas, então, surgiu o PRODEMA, no qual eu fui aos poucos entrando, familiarizando-me aos poucos.
Nesse mesmo período em João Pessoa, eu comecei a integrar um grupo criado por inciativa de Neide Miele, colega do Departamento de Ciências Sociais, para discutir religião, religiosidades. Na época, estávamos vivenciando muitas narrativas do fim do mundo, com o fim do milênio. E ela achava que isso poderia gerar uma boa discussão, gerar pesquisas interessantes. Por causa disso, formamos um grupo de pesquisa, o Religare. Neide me pediu para coordená-lo, porque eu vinha de uma formação de pesquisa em religião. A gente trabalhou muito, com muitas frentes. Fazíamos debates, grupos de estudo, juntamente com colegas de outros departamentos, da psicologia, de letras. Organizamos os encontros de fim de milênio em 1998, 1999 e 2000. Em 2007, nasceu o Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da UFPB.
Em seguida, eu fui fazer um pós-doutorado com um projeto sobre as religiões no Brasil ao longo dos séculos, cujo intuito era construir um grande painel da cultura religiosa. Do pós-doutorado resultou o livro: 500 anos do catolicismo e sincretismo no Brasil (2001). O sincretismo acabou se tornando o eixo dessa pesquisa, mas ele não foi associado às religiões afro, como habitualmente ocorre, mas associado às estratégias da Igreja Católica de se abrir, para que os fiéis que não eram muito obedientes na sua fé, pudessem fazer suas combinações de práticas, de fé, e viessem para dentro da igreja. Queria pensar em uma espécie de cultura religiosa, na qual a Igreja Católica, que é a instituição de poder, permitia-se fazer concessões em alguns momentos da história desses 500 anos. Se era permissível por algum tempo, em outros momentos, ela perseguia. Então, era bem ambígua a postura da igreja nesse sentido. Isso tudo permitiu que, na religião, os fiéis se comportassem de uma maneira mais livre, vamos dizer assim, indo e voltando de um templo, de um terreiro, fazendo rituais de um lado e do outro, e, às vezes, até combinando. Uma madrinha de santo que levava um filho para batizar com um padre, e os padres, alguns deles, sabiam quem estavam batizando. Era uma forma de acolhimento, uma forma de aceitar essa fé menos ortodoxa.
Geziane — Esse trabalho virou livro.
Maristela — Virou um livro. Por causa dele, fui convidada para participar de dois eventos da Faculdade de Teologia Umbandista (FTU), localizada em São Paulo. Foi uma surpresa para mim, eu ter sido convidada. A FTU era um espaço muito rico, muito valioso. Eles estavam muito interessados em discutir sincretismo, porque eles praticavam uma umbanda esotérica, ou seja, ela não estava tão vinculada às tradições das matrizes africanas, mas também não as deixavam de lado. Eles traziam vários conhecimentos para a formação para lideranças religiosas, e é por isso que eles acharam interessante fazer uma faculdade para discutir a teologia da umbanda, como uma religião que busca construir sua escrita, diferentemente das religiões afro mais tradicionais, que não se baseiam na escrita, mas principalmente em tradições orais. Na faculdade, os organizadores tinham muito interesse pela escrita, deram-me livros enormes, em que buscavam a codificação da umbanda — usa-se muito esse termo codificação no espiritismo, na umbanda — com os seus ensinamentos. Todos esses conhecimentos estavam sendo escritos.
Mais adiante, eu saí do foco do sincretismo. Pensar em religião hoje, eu acho que é pensar em outras dinâmicas. Em vez de me fixar em estudos das tradições, parti para o estudo do movimento, estudo de processo, movimentos religiosos. Aí temos um campo mais rico. Eu comecei a questionar e fui questionada também, porque esse sincretismo estava fora de época, vamos dizer assim. Então, foi algo que também abandonei. Em meu livro, eu fiz uma reflexão abrangente e propus que o sincretismo não é uma tendência que seja exclusiva das religiões afro. Ela, por ser uma religião subalterna, para ser aceita, tinha que confundir para não ser perseguida. Disfarçava o culto, a religião com as festas e as brincadeiras. Apresentavam-se como católicos, fazendo aquelas junções dos orixás com os santos. Esse sincretismo passou a ser muito combatido pelas lideranças religiosas, como algumas ialorixás baianas que encabeçaram a luta contra ele.
Dez anos após a defesa de minha tese, ainda apresentei um trabalho sobre as religiões afro-brasileiras na Reunião Brasileira de Antropologia (RBA), realizada em Salvador, em 1996. Mas daí em diante, passei a buscar outras experiências do campo religioso. Com o Religare, eu conseguia esta abertura, porque o que estava muito em voga nesse momento da virada do milênio eram as religiões da chamada Nova Era. Um movimento que estava juntando Oriente com tradição indígena. Juntando tudo, tradições indígenas do Canadá, e não sei de onde, da Sibéria. Mesmo assim, o uso do termo sincrético já não era forte.
Geziane — A ideia já era outra, o sincretismo já não era mais tão presente.
Maristela — Não tinha força, porque os conceitos têm, vamos dizer, sua vigência. Como foi um conceito que foi muito questionado, hostilizado mesmo, então eu também comecei a enxergar as coisas por outros ângulos.
Geziane — Há pouco, a senhora estava falando sobre a trajetória no PRODEMA. Como se deu seu envolvimento com a temática do meio ambiente?
Maristela — Eu fui aprendendo aos poucos. E comecei, então, a ser procurada para orientar. Comecei a ver um caminho interessante para a antropologia lá dentro, que era trazer os estudos das populações tradicionais. Tem alguns autores, até da antropologia, que questionam a ideia de se considerar os indígenas como ecológicos. Tem alguma literatura sobre isso. Mas, ao mesmo tempo, tem outros que acreditam que todo ser humano perturba a natureza, causa impacto, não dá para pensar em uma natureza intocada. Qualquer coisa que o ser humano faça impacta a natureza. Então, a gente não pode ver só um lado.
Outra coisa interessante é pensar as questões ambientais na cidade, nos grandes aglomerados populacionais. Ao fazê-lo, você se depara com uma situação bem complexa. É muito mais difícil trabalhar essas urgências nas cidades do que nas áreas protegidas com legislações rigorosas. Quando eu comecei no PRODEMA, tinha muito a questão das multas que as pessoas da área rural recebiam, pois, às vezes, praticavam coisas consideradas criminosas, como a caça e as queimadas para começar uma nova plantação. Essas práticas, como parte da cultura dessas populações, passaram a ser criminalizadas e alvo de multas. Era preciso olhar para a população tradicional; ela tem uma cultura, um saber, e para eles, as práticas condenadas pela legislação ambiental não são destrutivas da natureza. Eu tive um aluno que contava bravatas: “Peguei os pescadores de lagosta e botei tudo na cadeia”. Eu lhe dizia: “É, mas você não foi lá pra ponta, atrás de quem compra a lagosta”.
Isso nos faz refletir sobre quem é que degrada mais. Certamente são os grandes barcos lagosteiros ou quem se aproveita desse grupo de pescadores. São eles que se arriscam cada vez mais fazendo uma pesca predatória, sendo sujeitos a serem presos, colocando suas vidas em risco, porque eles usam umas técnicas que podem causar a morte. A pesca de mergulho em que usam botijão de gás é muito arriscada. A condição de vida desses pescadores continua precária, porque quem ganha dinheiro em cima deles são os grandes empresários. Isto para dizer que observando essas atividades surge a dimensão dos conflitos. Conflitos socioambientais que revelam a visão divergente quanto ao que é o impacto, o que é a degradação para uns e outros. Quem provoca mais degradação? São os pobres, as populações tradicionais? É sempre um acusando o outro: “Quem degrada não somos nós, é o pessoal da cana-de-açúcar que está botando agrotóxico e a água está contaminada.”
É um campo que a gente tem que olhar a complexidade, da qual se fala muito no campo ambiental. Senão se simplifica muito e não se pode mais afirmar que “a” com “b” causa isso. A população tradicional, naquele ambiente, está causando impacto, mas por trás de tudo está o mundo capitalista de hoje. O pescador não está tirando a lagosta para comer; está tirando para ter um modo de ganhar a vida. Ele pode fazer até alguma festinha para comer a lagosta, mas pesca para vender. Eu não orientei nenhum trabalho sobre a lagosta, mas eu participei de bancas, por isso que eu falo um pouquinho sobre isso.
Trabalhar no PRODEMA me deu a oportunidade de conhecer muitos trabalhos diferentes. Ir para as bancas de áreas que eu não conhecia. Mesmo não conhecendo, mas aceitava porque eu poderia falar sobre a parte social, das pessoas que estavam envolvidas no trabalho.
Eles começaram a ter mais, vamos dizer, uma abertura para esse diálogo mais cultural e social, mas no fim eu lamentei, porque eles começaram a desligar os professores da área social. A justificativa era que a nossa produção científica não era em periódicos das ciências ambientais, nem era considerada numericamente suficiente. Vários colegas não ficaram lá, e o PRODEMA da UFPB ficou praticamente sem professores da área social.
Geziane — Perderam bastante, porque a discussão das dinâmicas sociais é quase que a base de todas essas relações.
Maristela — Recentemente, há dois anos, um professor visitante do PRODEMA/UFPB, Allan Iwama, procurou o nosso grupo de pesquisa, que eu criei somente em 2012, para se inserir em nossa pesquisa e trazer a sua expertise. O Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Cultura, Sociedade e Ambiente, com vários professores e várias frentes de pesquisa, passou a ser coordenado por Alícia Gonçalves depois que eu me aposentei. Ela estava atuando de forma muito dinâmica, conseguiu firmar o convênio com o Ciesas do México. Então, Allan Iwama ficou com a gente no grupo de pesquisa, pois ele sentiu que ali a discussão trazia mais contribuições para o trabalho dele e dos seus alunos. Ele trabalhava com mudanças climáticas, com mapeamento, georreferenciamento, coisas técnicas, tecnologias de mapeamento. Com a gente, ele foi participar da pesquisa com os Potiguara, junto ao projeto dos mapas sociais na terra indígena potiguara coordenado por Alícia. Esse projeto foi iniciado a partir da tese de Ivys Medeiros Costa (2019) do PRODEMA, cuja orientação eu dividi com Alícia. A partir daí, nasceu um projeto de extensão na terra indígena potiguara, que já vem sendo replicado há uns quatro ou cinco anos, e não parou mais. Este ano, foi submetido ao edital universal do CNPq e foi aprovado. É um projeto muito rico que tem fôlego para mais uns anos.
Allan trouxe um professor do Chile que pertence a outra rede, e com isso a gente vai entrando em novas redes. Tem uma colega da UFRN — Francisca Miller, da antropologia, participa do PRODEMA de lá — que coordena um grupo de pesquisa sobre população pesqueira da zona costeira, e coordena com frequência GT’s nos eventos de antropologia. Ela investiga tudo o que acontece nas regiões litorâneas, fazendo interlocução com pescador, turista, atingidos por empreendimentos de energia eólica e tudo mais. Temos tido parcerias importantes em bancas e publicações, e em participações nesses eventos com nossos alunos.
Geziane — No caso, pode-se dizer que a senhora trabalhou com três grandes temáticas: a religião, religião de matriz africana e o sincretismo religioso; a questão da cultura, especialmente a cultura nordestina; e o meio ambiente, que foi também um vasto trabalho. Qual o papel das ciências sociais diante dessas temáticas? Como a senhora vê a contribuição das ciências sociais para dinamizar essas discussões e gerar transformações?
Maristela — Vou falar sobre a discussão do meio ambiente dentro das ciências sociais, já que ela é marginal ainda. Ela acontece pelas bordas. Eu até fiz umas anotações aqui de autores que eu procurei usar nas minhas disciplinas, levar para os debates no grupo de pesquisa e para as bibliografias das dissertações e das teses. Quando você fala, acredito que seja sobre a disciplina de cultura e ambiente, que foi um marco, digamos, da entrada do PPGA em articulação com o PRODEMA, porque eu assumi a disciplina, juntei as turmas de um programa e do outro. Inclusive, ministrei na graduação, pois não podia juntar porque eram dois graus diferentes, e contei com a colaboração de uma aluna do PRODEMA que fazia estágio docência. Ali, eu levava a discussão das questões sociais em confronto com as do ambiente. Nas disciplinas, eu começava com a discussão sobre cultura e natureza de Lévi-Strauss (2012), e de Philippe Descola (2005), que também teoriza nesse campo. É uma discussão clássica. O tema da cultura e natureza traz os problemas das áreas protegidas, das populações tradicionais, dos povos indígenas, e vai puxar, inclusive, a questão dos conhecimentos tradicionais, conhecimentos locais. Eu tenho uns textos de Manuela Carneiro da Cunha (2017), que é sobre esse conhecimento tradicional associado ao conhecimento genético, o que interessa muito aos pesquisadores, às indústrias farmacêuticas. Nele, ela discute com uma abertura muito interessante para a questão da propriedade intelectual desse saber. Se é um saber coletivo, como proteger uma propriedade intelectual que é pensada como algo que pertence individualmente ou pertence a uma empresa? Eles se apropriam desse saber e o transformam em mercadoria, que entra no mercado com valores muito altos. E aquelas populações não podem consumir, não podem ter acesso.
Busco também uma interlocução com a ecologia política (MARTINEZ-ALLIER, 2002), para debater as questões da poluição, ou seja, outra problemática. A ecologia política investiga os conflitos distributivos em relação à poluição, porque quem mais sofre com a poluição são os mais pobres, pois vivem nas áreas próximas dos focos de poluição, onde estão localizadas as grandes indústrias poluidoras.
Há ainda as infraestruturas dos governos, como as usinas nucleares — a gente não tem muito aqui no Brasil. Quem vive perto delas, está sujeito a uma contaminação, caso haja um vazamento. Tem um livro interessante do antropólogo José Sérgio Leite Lopes (2004), que pesquisou os movimentos contra a poluição no Brasil. Esse livro é uma referência interessante para quem estuda a questão.
Então, eu vejo que há autores e há lugar para se pensar a relação cultura e natureza. Bruno Latour (2004), em seu livro Políticas da natureza, propõe pensar sobre a simetria entre cultura e natureza, "quem pode mais?" É a cultura ou a natureza? Quais são os porta-vozes de um lado e do outro? Tem discussões interessantes, importantes, que a gente vai pegando um pouco daqui, um pouco dali.
O que é mais estimulante é o campo. O que ele está mostrando para gente? Ele mostra essa complexidade das relações, seres humanos, natureza, populações tradicionais, empreendimentos capitalistas, Estado e legislações ambientais etc. A disputa pelos recursos em uma mesma área, como uma bacia hidrográfica, permite uma visão de todas essas perspectivas. No Rio São Francisco tem barragens para produção de energia e tem as grandes empresas produtoras de fruticultura, por exemplo, que consomem muita água para irrigação. Em contrapartida, há os pequenos produtores rurais sem acesso à água. Há também a grande obra de transposição — uma colega, engenheira do PRODEMA da UFPE, ensinou-me que não é para se usar o termo transposição, mas integração de bacias. É um termo técnico. Eles, engenheiros, têm uma visão técnica e a gente tem a visão de conflito. Pode chamar como quiser, mas o conflito existe.
Geziane — Existe e não dá para ignorar.
Maristela — É por isso que eu acho muito rico esse diálogo. É interessante ouvir desses professores da área técnica o reconhecimento de que, na remoção de populações para se fazer os lagos para as hidrelétricas, elas nem sequer têm direito à energia. É um absurdo!
As obras são feitas para fornecer energia para as populações do Nordeste, mas não é para àqueles que viviam ali na beira do rio. O próprio acesso à água não é para eles, é para os grandes produtores. É preciso entender o drama das populações locais, tradicionais, elas são as mais atingidas por todos esses empreendimentos. Então, na antropologia, tem alguns autores, como Parry Scott na UFPE, que pesquisou os impactos das hidrelétricas do São Francisco sobre as populações ribeirinhas atingidas. Há também os pesquisadores da UnB.
Uma vez eu participei, com o Parry Scott, de uma mesa da Reunião Equatorial de Antropologia (REA) em Fortaleza, substituindo uma professora que não pode ir. Eu levei resultados de algumas pesquisas que orientei no PRODEMA sobre os impactos de obras públicas e privadas sofridos por populações tradicionais. Nesse grupo de trabalho, havia pesquisadores, como a Andréa Zhouri, agora presidente da ABA, que pesquisa os atingidos por barragem, por hidrelétrica, em Minas Gerais. As grandes barragens para a produção de energia na Amazônia, como a Balbina e Belo Monte, também são alvo de pesquisa por antropólogos, as quais geraram graves impactos aos rios, o que prejudicou demais as populações. Então, há sim autores trabalhando com o tema, mas estão nas suas caixinhas, não conseguem a mesma visibilidade na antropologia quanto outras temáticas.
Geziane — Professora, ao longo desses anos como professora universitária, a senhora acha que a questão do status e do modus operandi de como funcionam as universidades federais mudou? E como a senhora avalia a ciência brasileira hoje?
Maristela — Eu vivo muito a instituição. Eu sou muito da universidade. É uma coisa que pode ser um defeito. Foram 31 anos trabalhando na ativa como professora. Quando me aposentei, entrei com processo para me tornar professora voluntária por mais cinco ou seis anos. Foi, então, que o atual reitorado criou uma resolução limitando o tempo de permanência do professor voluntário para apenas três anos. Acho que é uma medida que representa um retrocesso para a UFPB.
Mas eu queria falar de algumas mudanças que eu acompanhei. A primeira mudança foi essa coisa de você trabalhar em grupo. Os grupos de pesquisas foram se fortalecendo. Você não pode falar de uma pós-graduação sem falar em grupo de pesquisa. Um grupo de professores nucleia os estudantes para dentro das linhas de pesquisa por meio do grupo de pesquisa. E ali se encontram estudantes de vários graus. Tem laboratórios, principalmente na área tecnológica, que recebem estudantes do ensino médio no grupo de pesquisa. Isso é muito rico. O nosso grupo ainda não faz isso, mas acho que a gente precisa. Allan, o professor visitante ao qual já me referi, tinha experiência com essa integração, e, por isso, trouxe-nos a questão. Ele trabalha com a ciência cidadã, que agrupa os estudantes do ensino médio e traz para dentro da universidade. Isso é um jeito também de a universidade se abrir para fora dos muros. O grupo de pesquisa enriquece porque a gente trabalha com estudantes da graduação ao pós-doutorado, todo mundo junto, aprendendo a pesquisar, aprendendo a se debruçar sobre os dados, a construir os instrumentos da pesquisa, os questionários, tudo é feito ali dentro do grupo de pesquisa. Depois, os resultados são discutidos ali também.
É uma abordagem muito rica. Acredito que estamos realizando um tipo diferente de ciência, pois quando cheguei, tudo era bastante solitário. Você tinha seu próprio grupo, seus estudantes, sua pesquisa, e vai agregando ali, mas cada um na sua caixinha. Hoje, o grupo de pesquisa não é assim. Você traz pesquisadores de fora, tem vários professores, quatro, cinco, que participam do mesmo grupo de pesquisa com os seus estudantes.
Outra coisa que eu acho que mudou também na ciência, no fazer ciência, foram as redes, tanto a rede de pós-graduação como a rede de conhecimento. Pega-se um campo de conhecimento e se cria uma rede. O PRODEMA foi a primeira rede que a Capes reconheceu, e posteriormente, a própria Capes quis fomentar redes de pós-graduação. Chegaram até a dizer que foi a Capes que impulsionou o PRODEMA, mas não é verdade. Foram professores que se uniram a partir de Rodrigo Ramalho, um professor da UFAL, que procurou diversas universidades para criar um programa que fortalecesse as instituições de ensino superior do Nordeste. No início dos anos 1990, a região não estava muito consolidada na área de pós-graduação, ao contrário do Sul, que era mais forte nesse aspecto. Eu aprendi muito com o trabalho em rede.
Outra coisa que aconteceu quando eu estava quase me aposentando foi começar a atuar na extensão universitária e perceber a importância dela. O investimento que a universidade está fazendo em extensão é uma coisa maravilhosa. A universidade está indo para as comunidades, levando os estudantes para lá, e a comunidade também é convidada a vir para a universidade, em alguns eventos. Essa interação está crescendo cada vez mais. As atividades de extensão estão sendo premiadas, e estão recebendo muita visibilidade. Os alunos aprendem muito na extensão, muito, muito mesmo.
Eu acho que hoje os PROBEX estão, talvez, ganhando mais visibilidade do que o PIBIC, porque quando eu entrei na universidade, o forte era o PIBIC. E tinha aqueles eventos em que vinha o pessoal da Capes para avaliar os trabalhos. Eu participei de PIBIC, mas hoje não sei mais como está, porém os PROBEX, dos quais participei, eu achei uma experiência mais valiosa, muito bom. Os trabalhos do PROBEX são outra forma de se fazer ciência, de agir, de transformar, no campo (GONÇALVES et al, 2021).
Outra coisa que eu queria destacar nessa novidade são as cotas: a política afirmativa que abriu a universidade para os grupos discriminados. As problemáticas envolvendo as relações raciais, a discriminação, o racismo, o colonialismo, os processos de decolonialidade, tudo vem nesse roteiro da presença de estudantes cotistas na universidade. Eu digo que foi uma coisa tardia, porque só foi implantada em 2012, enquanto nos Estados Unidos começou na década de 1960. Quanto ao Brasil, implantada na UFPB, resistiu-se por décadas para começar.
Como resultado dessa política, uma coisa bem recente está acontecendo na ciência: já está começando a ter indígenas, quilombolas fazendo ciência. Eu tive uma oportunidade muito boa de conhecer esta realidade quando fui convidada, no ano passado, para participar da comissão do Prêmio Capes de teses, em que a premiação de primeiro lugar foi para um indígena, com uma tese sobre o tema da saúde indígena, sobre os saberes médicos de uma tradição do conhecimento da floresta. Então, ele está fazendo ciência. Eles estão produzindo sua ciência a partir desse diálogo, entre um saber científico formal com um saber que é ancestral, que é experimentado lá por muito tempo. E como se acertam essas duas sabedorias? Eu sempre procuro ver o lado positivo das coisas, e são essas coisas que eu acho que enriquece a ciência brasileira.
Dentro dessa discussão, eu queria dizer que eu estou refletindo mais sobre isso, porque tenho uma doutoranda do PPGA que está trabalhando com o tema da presença de estudantes indígenas na UFPB. Ela vem reunindo relatos de experiências que eles têm tido nessa relação com a academia, com as discriminações que eles vêm sofrendo, ou com o possível apagamento desse saber ancestral com a assimilação de um novo saber. Como eles tratam isso? Como eles se colocam diante disso?
Geziane — Bom, a senhora já respondeu um pouco à próxima questão que eu iria fazer: se ainda há espaço nas universidades para novas antropologias. Eu creio que esse é um espaço de uma nova discussão, por assim dizer, antropológica que pode aparecer. Mas o que a senhora poderia dizer a quem está chegando à universidade agora?
Maristela — Olha, de fato, a antropologia é uma ciência que se pensa o tempo todo. Ela se reformula o tempo todo. Faz uma autocrítica, revisão de si própria, e nisso ela começa a rever algumas coisas e expandir para todos os lados, porque o mundo não para, e os antropólogos têm mil facetas da realidade para investir, pesquisar, investigar. Eu acho que, de minha parte, eu continuo um pouco presa a esses campinhos que eu abri, não que eu os tenha aberto, eu entrei, pois já estavam postos. Eu apenas estou tentando me situar dentro deles, e colaborar com quem está se formando agora, quem está construindo os seus próprios caminhos dentro desses saberes contidos na antropologia.
Geziane — E o que a senhora falaria para as pessoas que estão fazendo ciência agora?
Maristela — Seguir essas oportunidades que a universidade oferece, investindo nas redes, nesses programas institucionais, como a extensão, porque eu acho que a extensão é uma formação que coloca a academia em contato com o mundo, deixando de ser uma universidade que vai produzindo e se fechando nas reflexões teóricas. Mas para quem é a ciência? A ciência é posta para o mundo, então tem que ter essa interlocução com quem age. É por isso que no PPGA tive a oportunidade, quando estava na coordenação, junto com os colegas, de criar uma linha de pesquisa nova, que é a linha de políticas sociais e desenvolvimento. A antropologia está trabalhando nesse campo, nos estudos das instituições, como elas estão construindo essas políticas e como os movimentos sociais alimentam essa transformação dentro e fora da instituição. A ideia de governança começa a ser alvo de reflexão na antropologia. Aliás, saiu um volume da revista da ABA, a Vibrant (2023), sobre essa temática. Nós temos um aluno que terminou um doutorado em regime de cotutela, e o trabalho dele foi publicado nesse volume da revista. Ele trabalhou com uma política pública e com a governança, a partir do caso da gestão de uma instituição de saúde. É um trabalho bem interessante com esta nova perspectiva da antropologia.
As políticas estão aí e a antropologia também está lá dentro. Tem muitos antropólogos que são chamados a construir a política; na política nacional das populações tradicionais, tinha antropólogos trabalhando nela. Ela tem uma conceituação do que são povos tradicionais. Eles estão refletindo, pensando sobre o que a política vai levar para esses grupos. Estamos todos nesse trabalho, para tentar construir um mundo melhor.
Geziane — Com certeza! No caso, a senhora já se aposentou há quanto tempo?
Maristela — Eu me aposentei em 2016. Estamos em 2023, já tem mais de 6 anos.
Geziane — Eu imagino que a senhora já tenha realizado alguns planos nesse período. O que a senhora já realizou após a aposentadoria?
Maristela — Olha, eu acho que eu não tinha planos. Eu me aposentei para dar assistência para a minha mãe que estava com uma doença degenerativa. Eu queria ter mais tempo para cuidar dela. Foi isso que me motivou (ela faleceu no ano passado). Por isso que eu continuo de alguma maneira apegada. Eu não desapeguei ainda desse trabalho acadêmico. E olha que a minha família cresceu, tenho três netinhos. Agora, eu estou querendo me dedicar o máximo que eu posso a eles, mas ainda não desconectei totalmente; não tirei meu plugue. A universidade está dentro de mim ainda.
Geziane — No caso, a senhora está como professora voluntária?
Maristela — Na verdade, continuo no PPGA; ainda estou como colaboradora. Este ano, eles me convidaram para um trabalho muito estimulante, similar ao que Giovanni faz como editor da Revista Caos. Convidaram-me para ser editora da revista do PPGA, a Áltera. Uma colega me chamou para substituí-la, e eu terminei aceitando. É uma responsabilidade grande, um trabalho bem intenso, mas temos uma equipe de estudantes do PPGA que nos assessora com muita competência. Como a gente vive sempre nos contatos por via remota, nós temos reuniões remotas o tempo todo, fica mais fácil.
Geziane — Mais flexível.
Maristela — Sim, mais flexível. Tem outra coisa em que eu também entrei que é interessante. Como eu perdi o vínculo com a rede PRODEMA, eu entrei numa rede coordenada por Maria Lucia Alves (UFRN), que participou do Religare no seu início, quando ela ainda estava na UFPB. Ela criou em 2019 uma rede que se chama Rede de Pesquisa em Turismo Religioso, REPETUR. Quando ela me falou da rede, eu disse: — Eu posso entrar na sua rede? Eu me ofereci, e agora estou lá.
Geziane — Então a gente ainda vai ver a professora Maristela atuando bastante.
Maristela — Menina, eu estou querendo ficar um pouco nas margens. Fazendo um pouquinho menos. Fazendo menos, mas mantendo um laço, porque eu estava refletindo aqui, essa rede de turismo religioso é muito ampla em termos do que eles fazem. Não é só turismo, não é só peregrinação, romarias, eles querem agregar vários tipos de práticas religiosas, não só católicas. Eles estão abrindo bastante. E eu sinto que vou me conectando de novo com a religião, com a questão ambiental, porque tem gente lá que também mexe com toda essa atividade de festas e romarias, que têm impactos ambientais, e aí já tem ações governamentais que atuam junto com as festas, com essas aglomerações grandes de pessoas. Eu me sinto mais ativa com essas coisas, mas já querendo agregar colegas, porque eu entrei, mas não tinha outras pessoas da Paraíba. Tinha uma colega da UFPB, do curso de turismo, que pediu para sair, e agora eu estou segurando por todos os meios com uma orientanda do PPGA, mas querendo chamar outras colegas para não ficar sozinha, porque eu não posso ficar só com as demandas da rede nas costas, pois eu não estou mais com fôlego para isso.
Estou vivendo dessa forma. Não sei quando vou parar, mas estou parando aos poucos. Essa revista está me dando um ânimo novo de trabalhar, porque é muita atividade, vários dossiês a colocar no ar.
Geziane — A senhora é editora da revista?
Maristela — Eu estou dividindo a coordenação com Maria Elena, a professora mexicana. Formamos uma ótima equipe de editores e estudantes do PPGA. A Áltera tem dois editores, dois professores. Há um terceiro que vai caminhando para substituir algum desses. A gente está trabalhando nesse formato para não haver descontinuidade. O que eu achei bem interessante.
Geziane — Entendi. O trabalho da revista é bem interessante mesmo. Eu estou também como editora, assistente editorial da Caos, desde o início deste ano. Então, é bem assim. As submissões vão chegando, uma atrás da outra, e a gente vai dando seguimento.
Maristela — Olha, os editores assistentes são tudo. A gente só faz direcionar o que deve ser feito. O trabalho pesado cai nas costas de vocês. Mas é muito rico. Realmente, a gente não aguenta por muito tempo; são dois anos, e passa para frente, porque é muito fôlego.
Geziane — Mas é uma experiência rica, é uma experiência muito boa.
Maristela — Pois é, a gente não para de aprender. Eu já estou com o pé fora e sou chamada para uma coisa dessa.
Geziane — No caso, então, a gente ainda vai ver a professora Maristela por um tempinho.
Maristela — É. Mais no remoto, muitas vezes no remoto.
Geziane — Está certo, professora. A senhora quer falar mais alguma coisa?
Maristela — Não, Geziane. Eu fiz umas anotações, mas eu acho que eu dei conta. Para não perder muito do que eu queria falar. Eu acho que vai dar trabalho para você organizar, porque eu saí para um lado, saí para outro.
Geziane — Muito obrigada, professora, por seu tempo, pela entrevista. A Revista Caos agradece muito sua colaboração e sua disponibilidade em aceitar a nossa conversa.
Maristela — Gostei muito dessa nossa conversa. Esta tarde foi muito rica, realmente. Você é uma ótima entrevistadora. As perguntas que você me mandou, estimularam-me, embora a entrevista tenha sido conduzida de forma mais espontânea, sem seguir de fato o roteiro. Parabéns.
Geziane — Posso dizer que eu aprendi muito com a senhora. Muito obrigada! Tchau, professora! Muito obrigada pela companhia desta tarde.
Maristela — Foi uma ótima companhia. Tchau!
Referências
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* Professora aposentada do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba. Doutora em Études Latino-americaines/Anthropossociologie des Religions – Institut de Hautes Études de l'Amérique Latine (IHEAL), pela Université de Paris III (Sorbonne-Nouvelle). E-mail: maristela.odeandrade@gmail.com.
** Mestre em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba, Brasil. Editora da Caos. E-mail: gezianeoliveira91@outlook.com.
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