RAÇA, MISCIGENAÇÃO E O PROBLEMA NACIONAL EM CASA-GRANDE & SENZALA[1]
RACE, MISCEGENATION AND THE NATIONAL PROBLEM IN CASA-GRANDE & SENZALA
Anderson dos Santos Cordeiro *
DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n32.69276.p16-35
Resumo
Este artigo é derivado da pesquisa monográfica que teve como objetivo analisar Casa-Grande & Senzala, obra publicada em 1933 pelo sociólogo e intelectual pernambucano Gilberto Freyre. A obra que está para completar 91 anos desde sua primeira publicação foi objeto de críticas pelo uso da linguagem sexualizada, da relativização do colonialismo e das tensões entre poder e raça presentes nos antagonismos entre senhor e escravo; senzala e casa-grande; liberdade e escravidão. Ao mesmo tempo, sua contribuição metodológica e sociológica foi enfatizada, com o uso das fontes orais, materiais de campo e sua análise da raça pela ótica social. Assim, este trabalho busca expor alguns dos resultados obtidos na monografia a partir da questão racial, mais precisamente sobre a mestiçagem enquanto objeto, compreendendo como o autor situou esta lógica. Ao final, a partir de algumas inferências não incluídas na monografia, exemplificaremos como as nomenclaturas são utilizadas, empregues e operadas por Freyre para compreender as dinâmicas da miscigenação e das relações raciais.
Palavras-chave: sociologia brasileira; mestiçagem; raça; Gilberto Freyre.
Abstract
This article is derived from the monographic research that aimed to analyze "Casa-Grande & Senzala," a work published in 1933 by the sociologist and intellectual from Pernambuco, Gilberto Freyre. The work, which is about to celebrate its 91st anniversary since its first publication, has been the subject of criticism for its use of sexualized language, the relativization of colonialism, and the tensions between power and race present in the antagonisms between master and slave; senzala and casa-grande; freedom and slavery. Additionally, it emphasized its methodological and sociological contribution with the use of oral sources, field materials, and its analysis of race from a social perspective. Thus, this paper seeks to present some of the results obtained in the monograph from the racial question, more precisely from miscegenation as an object, understanding how the author situated this logic. Finally, based on some non-included inferences, we will exemplify how the naming terms are used, employed, and operated by Freyre to understand the dynamics of miscegenation and racial relations.
Keywords: Brazilian sociology; miscegenation; race; Gilberto Freyre.
Introdução
“O Brasil foi como uma carta de paus puxada em um jogo de trunfo de ouros.”
(Gilberto Freyre, 2006, p. 275)
Revisitar Casa-Grande & Senzala e mostrar suas influências e críticas não é uma tarefa fácil, dada a longevidade da obra, que está prestes a completar 91 anos desde sua primeira publicação. Gilberto Freyre, o intelectual pernambucano conhecido como o “mestre de Apipucos”, como relata Vamireh Chacon (1993), continua sendo um dos autores mais inquietantes e, talvez, contestados do contexto científico das ciências sociais e humanas brasileiras. Suas ideias obtiveram ressonâncias positivas e negativas que se personificaram em sua persona política, intelectual, cultural e na própria maneira como suas obras seriam lidas e criticadas (Fonseca, 1985).
O intuito deste artigo é apresentar os apontamentos, as influências, construções e aparatos utilizados por Gilberto Freyre para analisar a questão racial no Brasil colonial em pleno século XX. A partir das teorias raciais que gestaram o entendimento das elites pensantes em finais do século XIX, até a primeira publicação de Casa-Grande & Senzala em 1933, Freyre vai construir argumentos e proposições sobre o modelo racial e estrutural do que intitulou de “família patriarcal no Brasil”. E, ao contrastar com as teorias deste contexto, o autor vai argumentar e se diferenciar — mesmo que tangencialmente — em relação à posição corrente dos estudos que atrelavam a miscigenação como o malefício que impedia o país de alcançar o status de moderno.
As teorias raciais produzidas ao longo do século XIX, buscaram inferiorizar e justificar a diferença entre brancos, pretos e indígenas com base nos modelos científicos europeus que encontraram solo fértil no Brasil (Leite, 1969). Estes modelos teóricos serviram de suporte — ora como refutação, adoção ou motivação — para alguns intelectuais, como no caso de Freyre, para mostrar os traços e taras que a miscigenação incumbia no indivíduo enquanto fator sociocultural e não somente genético.
Segundo Freyre, a questão que movimentaria toda sua geração em busca da descoberta do brasileiro e da sua identidade estaria contemplada em sua grande obra mestra: Casa-grande & senzala, na qual procurou mostrar a diferença entre raça biológica, ditada pelas ciências naturais, e as raças[2] sociais e culturais analisadas pela ótica da sociologia e da antropologia. Assim, a posição tomada por Gilberto Freyre ia ao desencontro das correntes que se estabeleciam no meio intelectual, atestando um caráter positivo para a miscigenação e o arranjo racial no Brasil.
Resulta nesta lógica uma dualidade que, até então, Gilberto Freyre consegue caracterizá-la melhor do que os demais autores que figuraram naquele contexto, a exemplo de Sílvio Romero que — mesmo sendo de geração anterior — ainda encontrava ecos de seus argumentos pela maneira como analisou a questão da miscigenação e da própria Escola de Recife, da qual foi expoente.
Primeiro, os caracteres genéticos não são estáticos a ponto de resultar numa negação dos traços da raça, sendo formados pelo meio e pela miscigenação. Em segundo lugar, eles também são frutos da construção social, permeada pela geografia, pela cultura e códigos culturais que ditam as proposições sociais do que se entendia por raça, saúde, infância, política e ambiente. Esta argumentação, amparada nos estudos culturalistas é o que vai fazer de sua obra, uma literatura de exaltação e, em alguma medida, contestação das teorias racistas do início do século XX.
Ao final, a partir de algumas inferências retiradas da obra, consegui mapear, tendo como base a análise de conteúdo, como Gilberto Freyre utilizou algumas nomenclaturas raciais para especificar as nuances da questão racial no Brasil, assim como dos aspectos políticos, morais e sociais da miscigenação em solo brasileiro. Sendo possível, então, argumentar como sua obra, que está prestes a completar um século, ainda contribui para se pensar as questões que têm como pano de fundo as noções de brasilidade, identidade, racialidade e relações sociais, mesmo diante das críticas relevantes que recebe.
Um problema nacional e várias repostas
“O que somos, ou melhor, o que estamos sendo, como nação, não é, apenas, uma resultante do que fomos, mas do que pretendemos e queremos ser.”
(Roland Corbisier, 1960, p. 58)
Falar de um problema nacional, contextualizando o final do século XIX e início do XX a partir de uma obra como Casa-grande & senzala, é incorrer em uma série de questões que se permeiam o âmbito científico, social, intelectual, político, literário, histórico e, sobretudo, racial. A produção científica desse período mobilizou diversas correntes teóricas, aparatos metodológicos e até implementos, como a frenologia e os estudos criminais, vinculados aos estudos eugênicos, para justificar o que outrora fora descrito como a incógnita, o dilema e a mazela do Brasil, a miscigenação entre diversas raças.
O argumento, como descreveu Lília Schwarcz (1993), de que o Brasil se define pela raça, será um dos temas comuns nas produções deste período que vai de 1870 a 1950[3], produzindo constantemente análises sobre a dimensão racial do brasileiro. Essas formulações e teorias fundamentavam, no plano político, as justificavas e ações do Estado; no plano religioso, o predomínio do catolicismo; no plano sanitário, a adoção de medidas eugênicas; e, no plano cultural, o exotismo das práticas culturais existentes no país. Tudo isso colocando como norte e ponto focal a população negra e mestiça, bem como os desdobramentos do futuro da nação brasileira, que era incompatível com o modelo europeu de civilização que se fundamentou controversamente com o processo de colonização aqui no país.
Alguns autores europeus como Arthur de Gobineau, Francis Galton, Cesare Lombroso, George Vacher Lapouge, entre outros, obtiveram influência e participação direta vindo ao território brasileiro, caracterizando o Brasil como um grande país errático no tocante à questão racial. E, indiretamente, por meio da adoção de suas teorias, endossaram-se as justificativas acerca da mestiçagem como um grande problema que impedia o país de atingir o grau de civilidade que as demais culturas europeias haviam conseguido com sua pureza étnica e cultural. Um exemplo disso foi Arthur de Gobineau, que veio ao Brasil e atestou essa “questão deletéria” como marca registrada da população brasileira. Gobineau, ao ancorar no país ainda no período colonial, destacou que o país estava fadado à decadência (Cordeiro, 2023; Gobineau, 2021). Ele argumentou que, devido às infindáveis misturas étnicas que aqui se processavam, tal efeito era nítido nos altos índices de mortalidade infantil que havia no Brasil (Sousa, 2013).
Como descreveu Nancy Stepan (2004), as constantes dúvidas dos intelectuais brasileiros acerca da questão racial eram fortemente marcadas pelas presunções dos cientistas europeus. Isso fazia com que toda produção teórica nacional tivesse como base os estudos que vinham importados, que eram utilizados sem adequação ou erroneamente, a partir da realidade brasileira no contexto científico do século XIX e XX. Assim, “os intelectuais tinham de lutar com o fato de que, em texto após texto de análises sociais e científicas europeias, o Brasil era tido como um exemplo ideal de ‘degeneração’ que ocorria em nações tropicais racialmente hibridas” (Stepan, 2004, p. 338).
Se, em finais do séc. XIX, a teorização dos intelectuais esteve pleiteada pelas doutrinas europeias, no início do século XX, com o alvorecer da nova república instaurada em 1891, discursos para viabilizar uma ideia homogênea de nação começam a ser gestados pelos intelectuais brasileiros (Schwarcz, 1993). A tese apresentada por João Batista Lacerda, no I Congresso Internacional das raças, ocorrido em 1911, vai ser um marco, pois enquanto representante do Museu Nacional, o intelectual vai destacar como o Brasil deveria ser visto pelas potências civilizadas: um país na busca pela sua “melhora racial”. O trabalho intitulado Sur les metis au Bresil destacava o caráter ambíguo da condição brasileira. No entanto, enfatizava que a política de imigração brasileira, adotada como política de Estado, iria impulsionar o apagamento da raça preta e mestiça.
La population mixte du Brésil devra donc avoir, dans un siècle, un aspect bien différent de l’actuel. Les courants d'immigration européenne, augmentant chaque jour davantage I’élément blanc de cette population, finiront, au bout d'un certain temps, par suffoquer les éléments chez lesquels pourraient persister encore quelques traits du négre. (Lacerda, 1911, p.19)[4]
Ainda que influenciados pelas doutrinas liberais e raciais da Europa, a própria autonomia intelectual e cultural da recém-república exigia estratos autônomos para difundir uma ideia de nação que englobasse a diversidade existente no território nacional (Skidmore, 1976). Com a aurora do séc. XX, os ditames raciais e políticos do Brasil vão sendo guiados pela lógica burguesa para e com a população negra, mas a dúvida que circundava os intelectuais era a mesma: quem era, afinal, o povo brasileiro? Como a história de um povo miscigenado, plural e diferente poderia ser descrita de maneira uníssona a todos, seja ela positiva ou negativa? — Gilberto Freyre, no prefácio da primeira edição de Casa-grande & senzala, afirma que as respostas às perguntas relativas ao povo brasileiro era um problema de sua geração. Esse problema podia ser identificado na busca por respostas para as lacunas que fomentavam toda a discussão acerca do indivíduo brasileiro e da identidade nacional.
Creio que nenhum estudante russo, dos românticos, do século XIX, preocupou-se mais intensamente pelos destinos da Rússia do que eu pelos do Brasil [...] Era como se tudo dependesse de mim e dos de minha geração; da nossa maneira de resolver questões seculares. E dos problemas brasileiros, nenhum me inquietasse tanto como o da miscigenação (Freyre, p. 31, 2006).
Freyre, ao se colocar como alguém proposto a responder a essa questão, que estava envolta nas circunstâncias históricas e sociais de sua geração, consagra seu nome com a primeira publicação de CGS[5], em 1933, expondo as engrenagens que circundavam as relações sociais entre a casa grande e a senzala, entre o opressor e o oprimido. Como Gildo Marçal Brandão (2010) evidencia, a lógica de interpretar um país está sujeita não apenas às suas circunstâncias históricas e sociais, mas também às suas “possibilidades objetivas”. Gilberto Freyre, oriundo da antiga oligarquia canavieira pernambucana, que viveu o auge e a derrocada da era da cana-de-açúcar, constrói sua narrativa ensaística a partir desse passado em ruínas. Ele analisa a questão da miscigenação sob a lógica do que pouco se evidencia de CGS, que é o seu subtítulo: formação da família brasileira sob o regime de economia patriarcal. Desse modo, a possibilidade objetiva que Freyre nos sugere é justamente o que consagraria a forma como sua análise iria contextualizar o período, ao descrever que “formou-se na América tropical uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração econômica, híbrida de índio — e mais tarde de negro — na composição”, combinando, assim, dentro da “economia patriarcal”, um regime cujos fenômenos vão além do biológico, incluindo o social, o político, racial, cultural e moral. (Freyre, 2006, p. 65).
A obra, que chocou os estratos cultos por sua linguagem envolvente e pouco usual, apontada como sexual para os padrões intelectuais de sua época (Bastos, 2006; Pallares-Burke, 2005), ganhou proeminência por evidenciar — a partir de uma inovadora variabilidade de métodos e relatos orais — como a cultura, a miscigenação e o povo brasileiro foram se constituindo como um amálgama. A obra destaca a mistura, a objetividade e centralidade da raça na formação do brasileiro. Sendo a questão da mestiçagem o diferencial, desta vez positivo, que constituiu o Brasil em todos os quesitos possíveis (Freyre, 2006).
No entanto, é importante ressaltar que, embora Freyre atue para desmistificar, em certa medida, a miscigenação como uma característica deletéria da população brasileira, o debate acerca do tema era notavelmente marcado pelo pessimismo. As correntes, como eugenismo, darwinismo social, positivismo e o racismo científico atuaram como teorias que tiveram aceitação e corpo até meados da década de 1950, atestando o caráter negativo de toda e qualquer forma de mistura étnica e cultural.
Autores como Nina Rodrigues, Paulo Prado e Oliveira Viana, só para citar alguns, justificaram, no plano social e racial, os feitos e efeitos da raça enquanto molde depreciativo para o país, utilizando como exemplo negativo os negros e mestiços. Enquanto Freyre, em larga medida, justifica não apenas a miscigenação como fator positivo, descreve que “a teoria da superioridade dos dólico-louros tem recebido golpes profundos nos seus próprios redutos” (Freyre, 2006, p. 378). E que controversamente como atestavam os intelectuais contrários à miscigenação, não haveria “nada mais anticientífico que falar-se da inferioridade do negro africano em relação ao ameríndio sem discriminar-se antes que ameríndio; sem distinguir-se que negro” (2006, p. 370).
Mas isso não significa que a leitura de CGS, hoje, vincule o autor como um intelectual antirracista. Nesse sentido, Ricupero, ao recuperar o argumento de Élide Rugai Bastos, afirma que Freyre “é o principal ideólogo da modernização conservadora brasileira, isto é, do processo de transformação social sem ruptura com o passado que o país passa a viver a partir de 1930” (Ricupero, 2011, p. 79). Mesmo que o contexto de publicação de sua obra tenha sido favorável ao que tange a positividade da raça como fator positivo e social, as ideias que ele expressa na sua famosa trilogia — Casa-grande & senzala; Sobrados e mucambos; Ordem e progresso — ou em obras publicadas depois da década de 1960, colocam-no como um autor conservador, que justifica o colonialismo e o processo colonial. Não é à toa que tenha dedicado seu livro O mundo que o português criou (Freyre, 2010) aos aspectos positivos da lusofonia na comunhão e formação do brasileiro.
Além das suas posições, referentes às ambiguidades que o lusotropicalismo orientou ao caracterizar o português como mais suscetível à adaptação (leia-se colonização) nos trópicos, da democracia racial, do apoio ao regime civil-militar de 1964 e as perspectivas modernizante e romântica de suas obras, tudo isso teria repercussões na sua persona política. Como intelectual público, ele estava constantemente envolvido em disputas e divergências sobre suas posições enquanto sociólogo (Chacon, 1993). Dada as críticas a CGS, Freyre enfatiza que — como descreveu em sua (auto)biografia[6] — “a caracterização pura e simples de ‘romântico’ não me ofende, ao contrário, agrada-me. [...]. Daí alguns críticos irem ao extremo de me considerarem por vezes ‘romanesco’” (Freyre, 1968, p. 64). Nesse sentido, CGS articula literatura e história, sociologia e antropologia para formar uma memória sobre o passado colonial, mesmo não fazendo as devidas críticas ao regime colonialista.
Em CGS, Freyre não aborda a miscigenação como um processo isolado. Ele considera a nutrição do regime colonial, questões persistentes de saúde como a sífilis, a monocultura e o clima, analisando-os em conjunto. Isso é feito devido à importância desses fatores para a compreensão da estrutura do sistema que se estabeleceu no Brasil, e mais especificamente no Nordeste, que é o foco de seu ensaio.
A macrossociologia freyreana parte do Nordeste para analisar o regime colonial de maneira histórica, mas utiliza descrições que englobam outras partes do país para mostrar que o regime colonial e os latifúndios tinham suas características estruturantes que fundamentavam o regime como um todo. Ainda assim, sua habilidade de escrita e os multimétodos adotados em CGS, não o limitaram a uma única técnica; ele também utiliza a microssociologia para analisar o que Fernando Henrique Cardoso mencionou, que vale a pena descrever na íntegra:
Gilberto Freyre inova nas análises sociais da época: sua sociologia incorpora a vida cotidiana. Não apenas a vida pública ou o exercício de funções sociais definidas (do senhor de engenho, do latifundiário, do escravo, do bacharel), mas a vida privada. Hoje ninguém mais se espanta com a sociologia da vida privada. Há até histórias famosas sobre a vida cotidiana. Mas, nos anos 30, descrever a cozinha, os gostos alimentares, mesmo a arquitetura e, sobretudo a vida sexual, era inusitado. (Cardoso, 2006, p. 22)
É com essa variedade de métodos que Freyre desmistifica as ideias equivocadas de riqueza alimentar e abundância que se ponderou sob a família patriarcal e o regime colonial. Ele atesta que a ideia de fartura, muitas vezes, era uma falácia de origens europeias sobre a lógica de civilização, observada no corpo e no biotipo dos senhores donos de engenhos. Isso vai além da monocultura, que era prática comum no sistema colonial e que impossibilitava uma cultura agrária diversificada.
Muito da inferioridade física do brasileiro, em geral atribuída toda à raça, ou vaga e muçulmanamente ao clima, deriva-se do mau aproveitamento dos nossos recursos naturais de nutrição. [...] É ilusão supor-se a sociedade colonial, na sua maioria, uma sociedade de gente bem alimentada.
Nada perturba mais o equilíbrio da natureza que a monocultura, principalmente quando é de fora a planta que vem dominar a região. [...] Na formação da nossa sociedade, o mau regime alimentar decorrente da monocultura, por um lado, e por outro da inaptidão ao clima (Freyre, 2006, p. 95-96).
Gilberto Freyre só chega a estas conclusões graças a sua jornada de estudos e, posteriormente, às viagens que fez aos Estados Unidos, Portugal e África ao longo da década de 1920. Esse período, no qual descreve como “rico para seu amadurecimento” (Freyre, 2006), é fruto de sua insistência em sair da pequena Recife, que considerava pequena demais para seu progresso intelectual e político. É por essa razão que a biografia de Freyre é interessante para contextualizar a própria obra, que será publicada em 1933 com fins políticos e, sobretudo, histórico. Segundo o autor pernambucano, a falta de respostas para as questões sobre a história do brasileiro e as perguntas seculares que o país haveria de encontrar para se adequar à lógica de civilização, deveriam ser evocadas de maneira uníssona e homogênea por parte da população. Dessa forma, as experiências com professores ingleses e americanos marcaram sua trajetória acadêmica. A partir das teorias que estavam em voga naquele cenário, ele identificou a possibilidade de analisar uma questão específica: a miscigenação no âmago da família patriarcal.
O convívio em Columbia com intelectuais, como Franz Boas, que foi seu orientador do mestrado[7], fez com que ele repensasse e se dedicasse a uma obra que inicialmente tinha como objetivo falar sobre a infância no Brasil (Burke; Pallares-Burke, 2009). Com a relação e aproximação desenvolvida com a teoria de Boas nos Estados Unidos, Freyre começa a pesquisar e recolher diversas fontes e materiais que seriam utilizados em sua ampla e complexa pesquisa, a fim de dar conta da pergunta que representaria o cerne do desenvolvimento de CGS: a miscigenação.
Como evidenciou Antonio Candido (2014), ao prefaciar o livro Raízes do Brasil, o livro de Gilberto Freyre, publicado em 1933, trouxe ganhos significativos ao entendimento do Brasil pelo seu povo e os de sua geração. Um livro que ensinou os homens a “refletir e se interessar pelo Brasil em termos de passado”, uma literatura que, segundo o próprio Freyre, procurou assimilar valores e ritmos clássicos ao seu modo romântico, mas sobretudo clássico (Freyre, 1968, p. 124).
Ainda assim, sua obra não foi colocada a escrutínio da crítica por simples e demasiada fantasia romântica. O livro, que segundo Fernando Henrique Cardoso já nasceu clássico porque “reinterpretou a raça pela cultura e até pelo meio físico” (Cardoso, 2006, p. 28), não se atentou às questões prementes que a questão racial desenvolveu. Seus posicionamentos na obra deixam claro sua relutância em admitir que o passado idílico e arcaico feito sob a figura do pater famílias contribuiu para as mazelas da desigualdade, fazendo do colonialismo o artefato exclusivo das classes dirigentes para se manterem no poder. As críticas a CGS foram e são o ponto chave para entender como tal obra foi lida e utilizada por estratos conservadores para justificar e acentuar as características do mundo que o português criou (Lehmann, 2008).
Sua análise do sistema patriarcal, composto pela relativização das relações entre senhores e escravos, contribuiu para que a democracia racial — que visava mostrar as supostas relações amistosas que existiam entre segmentos antagônicos — projetasse o sadismo dessas relações como formas de apaziguar e negar as violências do regime escravocrata dentro de uma estrutura patriarcal e política desenvolvida ao longo do período colonial.
Mesmo que Gilberto Freyre não utilize o conceito de democracia racial em sua obra, como atesta o pesquisador Antonio Sérgio Alfredo Guimarães (2002), é possível encontrar nela a gênese do que Freyre chamou de democracia social. Em contraposição, Souza (2000) argumenta que o autor pernambucano teria sido o responsável pela difusão do conceito, seja pela forma como sua obra acentuou as características tidas como “positivas” nas relações que existiam no sistema colonial, ou pela sua crença na miscigenação como forma de conciliar as dinâmicas de poder entre segmentos antagônicos. Ainda de acordo com Jessé Souza,
Gilberto teria sido o criador do conceito mesmo de “democracia racial”, o qual agiu e ainda age como principal impedimento da possibilidade da construção de uma consciência de raça por parte dos negros. Gilberto teria construído a contrapartida teórica de uma noção rósea e humanitária do passado escravista brasileiro, abrindo a possibilidade de constituição de uma ideologia social apenas aparentemente inclusiva e extremamente eficiente. (Souza, 2000, p. 136)
O dualismo presente na obra de Freyre, que contrasta e associa a vida pública com a vida intima e privada, também se manifesta na acepção de cultura e de raça que o autor descreve ao falar sobre o português. Para ele, o europeu colonizador era um produto inacabado da miscigenação que ocorreu outrora em Portugal, não restavam dúvidas que a mestiçagem se fazia presente entre os europeus. Em contrapartida, a miscigenação no Brasil, segundo o autor, acentuou-se devido à lascividade das índias e, posteriormente, das negras. Desde a amamentação pelas amas de leite até a fetichização da mulher negra, Freyre utiliza o sexismo e a sexualização para enfatizar como ocorreu o processo de colonização. Para ele, “não há escravidão sem depravação sexual” (Freyre, 2006, p. 399).
Essa percepção fundiu-se com a ideia corrente de que no Brasil haveria “[...] senhores desabusados e sádicos com escravas passivas”, que ao contato interétnico, “[...] adoçaram-se, entretanto, com a necessidade experimentada por muitos colonos de constituírem família dentro dessas circunstâncias e sobre essa base” (2006, p. 33). Assim, não haveria diferenças estruturais entre estes grupos, uma vez que “a miscigenação que largamente se praticou aqui corrigiu a distância social que de outro modo se teria conservado enorme entre a casa-grande e a mata tropical; entre a casa-grande e a senzala” (Freyre, 2006, p. 33).
Se Freyre apresentou contribuições às ciências sociais e humanas, devido à forma como ele interpretou positivamente a miscigenação, do trato com os dados, contribuindo para o aprimoramento das técnicas metodológicas, da mesma forma colaborou para que sua obra fosse utilizada para justificar determinadas premissas que acentuaram e compactuam com o racismo, a segregação, exclusão, exotização e estigmatização da população negra e indígena no Brasil. Nesse sentido, se a sexualização entra como objeto de análise para descrever como ocorreram os “intercursos sexuais” no Brasil (Freyre, 2006), a própria dinâmica entre raça, saúde, agricultura e clima também foram suscitadas pelo pernambucano para descrever que a mestiçagem, na qual se fundamentou o passado e a história do Brasil, é fruto das construções sociais, descritas a partir do meio, da cultura e sobretudo das condições históricas. Estas condições sui generis, segundo o autor, formaram o brasileiro na sua identidade, subjetividade e, sobretudo, na sua racialidade. Freyre é enfático na abertura do quarto capítulo de CGS ao descrever o brasileiro como alguém que “[...] mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo — há muita gente de jenipapo ou mancha mongólica pelo Brasil — a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro” (Freyre, 2006, p. 367).
Para demonstrar como Freyre articulou as questões da raça em sua obra, utilizei a análise de conteúdo em CGS[8], sendo possível compreender, a partir de algumas inferências retiradas do livro, como a mestiçagem e a questão da miscigenação aparecem na obra.
Sendo pertinente, a partir das nomenclaturas raciais, que o autor mobilizou e adequou na sua narrativa, apresentá-las, já que aparecem para justificar e ressaltar a miscigenação como algo positivo, mesmo com as variedades de termos e modos de identificação circunscritas historicamente no contexto da década de 1930.
Gráfico 1 – Termos utilizados em Casa-grande & senzala
Fonte: compilado pelo autor
Os termos expostos no gráfico 1 representam a variabilidade utilizada por Freyre para definir e acentuar a heterogeneidade da miscigenação enquanto fator positivo para se entender as diferenças e similitudes do povo brasileiro. Mesmo com a alternância dos termos, representando expressões e terminologias diferentes, tais conceitos exprimem o teor do que a corrente científica criticava e repudiava: um povo misturado, miscigenado, para o qual não havia um termo racial capaz de identificar os brasileiros.
Gilberto Freyre rompe com essa perspectiva ao mostrar que a mestiçagem reunia o melhor do que havia de positivo, e destaca que a junção do português, do africano e do indígena resultou numa combinação única no sentido alimentar, cultural, sexual, racial, mas sobretudo identitário. Dentre todas as nomenclaturas utilizadas, uma se destaca pelo número de citações, o termo negro. Uma vez que, segundo Enrique Rodríguez Larreta e Guillermo Giucci, o elogio ao negro foi motivo para um choque intelectual que recebeu corpo e aceitação na década de 1930.
Esse ponto se revela de fundamental importância na história da recepção. Fundamental não só porque supõe a inversão de uma tradição que via no negro uma das causas do fracasso do Brasil, como porque, na revalorização da contribuição do negro para a cultura brasileira, apóia-se na distinção teórica raça/cultura, que constitui o arcabouço de Casa-Grande & Senzala. (Larreta; Giucci, 2007, p. 443)
Ainda de acordo com o gráfico 1, é possível perceber que os termos relativos à miscigenação, como mulatos, cafuzos, mestiço e caboclos aparecem timidamente ao longo das mais de 700 páginas da obra. Salvo a exceção da expressão mulata, que para citar a questão da sexualidade no período colonial, o autor utiliza o termo para se referir aos frutos da mistura entre o branco colonizador e a mulher negra africana. Resultando numa percepção sexista e abjeta, na qual o próprio Freyre destaca o ditado que se utilizava para exemplificar como as mulheres, fruto do estrupo e violência dos senhores brancos, eram retratadas: “com relação ao Brasil, que o diga o ditado: Branca para casar, mulata para f...., negra para trabalhar” (Freyre, 2006, p. 76).
Embora o autor utilize alguns termos mais frequentemente do que outros, ele engloba todos eles para mostrar que a heterogeneidade racial no Brasil produziu e continua produzindo diferentes contextos. Sejam eles regionais ou culturais, esses contextos se fundamentam nas experiências cotidianas de cada brasileiro, em cada estado ou região. Dentre todos esses termos, três em especial ganham destaque na argumentação de Freyre por mostrarem a base do processo de miscigenação sob o regime patriarcal, sendo eles: negro(a), branco e indígena.[9]
No processo de análise, destaco que optei por diferenciar os termos negros e negras por dois aspectos gerais que podem ser observados na obra. O primeiro diz respeito ao termo masculino, geralmente utilizado para falar do escravo, sendo empregado para generalizar todo o contexto estrutural na acepção masculina. O segundo, embora Freyre não faça uma discussão sobre gênero propriamente dito, diz respeito à utilização do termo negra sempre em questões pejorativas e sexuais, assim como o termo “mulata”. Isso demonstra a forma como o autor utiliza as palavras em CGS. Atribui sentidos e contextos diferentes quando tem como proposta mostrar ou o processo colonial e latifundiário como um todo, no caso dos termos masculinos. Inversamente, quando quer colocar e evidenciar a questão sexual a partir das mulheres, ele usa a flexão feminina.
Gráfico 2 – Citações por capítulos
Fonte: compilado pelo autor.
Os três termos fundamentam a percepção de que a estrutura racial do país foi constituída sobre três núcleos fundantes: o branco, o negro(a) e o indígena, sendo estes os motores que perfeitamente controlaram os antagonismos e salientaram as suas características positivas como a cultura, a língua, a culinária, a religiosidade e a raça na junção do brasileiro, da identidade e da mistura étnica, feito que nenhum outro país foi capaz de realizar.
Note-se que os termos mestiço e mestiçagem não se enquadram entre os termos mais utilizados por Freyre. Provavelmente, isso se deve ao fato de que a corrente científica da época utilizava de forma pejorativa tais nomenclaturas (Schwarcz, 1994). Diante dessa percepção, o autor de CGS opta por utilizar os termos referentes às misturas étnicas que serviriam de pretexto para enaltecer os atributos desses indivíduos que se intitulavam ou eram representados por tais termos.
Mesmo que as inferências representem apenas notas introdutórias, que poderiam ser mais bem exemplificados a partir de inúmeros pontos focais vinculadas à obra freyreana, os dados expostos aqui tiveram como particularidade demonstrar a especificidade do argumento do autor, utilizando como norte a questão da miscigenação.
Diante das inúmeras questões que estão no debate sobre o mestiço e a mestiçagem no Brasil, Kabengele Munanga (2020, p. 24) acerta ao dizer que “a noção de mestiçagem, cujo uso é ao mesmo tempo científico e popular, está saturada de ideologia”, não sendo possível identificá-la apenas pelo caráter biológico quando se tem outras características que fundamentam a questão racial, como no caso das questões sociais. No Brasil, inúmeros intelectuais identificaram estas questões, e Gilberto Freyre consagrou uma visão e ideal do que seria o brasileiro nato, oriundo do processo de miscigenação, sem atrelá-lo aos fatores negativos e pejorativos que estavam vinculados ao contexto intelectual e político da época. Mesmo com as críticas que pairaram sobre a obra e a recepção dela, os pesquisadores da obra de Freyre assertam que ela continua influente. Ela delineia e contribui para a concepção de identidade nacional, mesmo sendo uma obra conservadora.
Conclusão
Com base no que foi exposto, este artigo teve como proposta mostrar como o autor pernambucano analisou e identificou na miscigenação a base para se entender o brasileiro. A mistura étnica que se fundamentava em território nacional é um aspecto chave dessa análise. Embora os críticos destaquem que a obra de Freyre seja conservadora em inúmeros aspectos, e concordo com essa afirmação, as análises desempenhadas por Freyre dentro de uma lente histórica foram inovadoras. Elas auxiliaram novas formas de analisar os ditames raciais que modificam a questão racial no Brasil de tempos em tempos.
A originalidade de Casa-grande & senzala está nas questões que ela enfatiza e traz ainda na década de 1930. Ela se tornou uma obra clássica do pensamento social brasileiro, não por simples vaidade e erudição (Chacon, 2001), mas por evidenciar o regime do latifúndio, o sistema colonial, os aspectos do racismo e da raça a partir da cultura para além do campo biológico.
As posições tomadas por Gilberto Freyre em CGS são conservadoras e demonstram a percepção da branquitude em relação à história do Brasil. Mesmo destacando a força da população negra e escravizada no processo da formação nacional, sua visão ainda é marcada por uma percepção aristocrática e alienada das atrocidades que foram cometidas no regime colonial. A dualidade do masoquismo e sadomasoquismo em sua obra acentua o caráter ambíguo da escravidão, dando ares de humanidade ao regime violento e estruturante que formou a sociedade brasileira e desumanizou grupos, etnias e a cultura afro-brasileira.
Assim, a tentativa de compreensão da questão da miscigenação em Casa-grande & senzala é uma das formas de compreender as particularidades cotidianas e atuais que permeiam as relações sociais e raciais no Brasil. Como destaca Verônica Toste Daflon (2017), falar sobre a mestiçagem é um esforço contínuo para não cair em uma visão biologicista ou superficial do que seria a complexa rede que são as relações raciais no Brasil e suas imbricações.
Como destacou Gildo Marçal Brandão (2010), as “linhagens de intelectuais” que se propuseram a pensar o Brasil, fizeram-no muitas vezes a partir de suas próprias concepções, como no caso do ensaio de Freyre, ou com profundo teor acadêmico como foi atestado posteriormente com Florestan Fernandes. Ainda assim, essa obra, publicada em 1933, suscita inúmeros debates, e a ela se atribuem distintas perspectivas que possibilitam novas leituras ou releituras a partir de infindáveis interpretações, seja na questão racial, ambiental, ecológica, moral, política e de gênero.
Ela foi tantas vezes editada, republicada e até anunciada como “livro que todo brasileiro deveria ler” (Hélio, 2000). Não deixa de ser atual, quando lida no contexto histórico e intelectual no qual foi escrita, já que hoje muitos dos seus argumentos são objetos de críticas e superados cientificamente. Mesmo com tal percepção, ainda choca os novos leitores que se defrontam com uma enorme densidade textual, escrita em estilo simples e informal. Salienta-se ainda que umas das maiores contribuições da obra e “uma das virtudes de Gilberto Freyre, e que contribui para a singular importância de seus ensaios, está em que convida insistentemente ao debate e provoca, não raro, divergências fecundas” com sua obra e persona política (Hélio, 2000, p. 27).
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Recebido em: 01/02/2024.
Aceito em: 25/03/2024.
DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n32.69276.p16-35
[1] Parte substancial deste trabalho está de maneira integral na monografia intitulada: Gilberto Freyre e a interpretação da mestiçagem em Casa-Grande & Senzala (2022), agraciada com menção honrosa no Prêmio Florestan Fernandes da coordenação do curso de Ciências Sociais da UFPB. Agradeço a leitura e conversas atentas de Anna Kristyna, Giovanni Boaes, Jórissa Danilla, Esdras Bezerra e Ismael Cardoso, sem a qual este trabalho não teria galgado esse reconhecimento.
* Graduado em ciências sociais pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: andersondsc97@gmail.com.
[2] O debate em torno das considerações sobre raça, enquanto conceito reivindicado pela sociologia, não é novo na história da disciplina. Ao longo dos séculos XIX e XX, foram diversos os embates em torno da categoria/conceito no uso social, seja para distanciamento e definição das fronteiras do campo sociológico ou como variável do ramo da biologia para mostrar as diferenças entre os seres humanos. Segundo Antonio Sérgio Alfredo Guimarães (2021, p.25) “as raças são, cientificamente, uma construção social e devem ser estudados por um ramo próprio da Sociologia ou das Ciências Sociais, que trata das identidades sociais”. Para detalhes deste debate, recomendo as leituras de Banton (2010), Guimarães (2021) e Wieviorka (2007).
[3] Esse recorte histórico se dá de maneira metodológica, para o fim que este trabalho se propõe. Ao longo das décadas seguintes os estudos raciais ficaram evidenciados pelo Projeto Unesco no Brasil, sendo também uma constante dentro dos estudos sociológicos, antropológicos, históricos e políticos, a questão do racismo no Brasil. Sobre esse tema ver mais em Maio (1999) e Guimarães (2009).
[4] “A população mista do Brasil, terá, portanto, que ter, em um século, um aspecto muito diferente do atual. Com as correntes de imigração europeia, aumentando a cada dia, o elemento branco desta população terminará, depois de um certo tempo, por sufocar os elementos em que ainda persistirem algumas características do negro.” (Tradução nossa).
[5] Daqui em diante utilizarei a abreviação CGS para me referir ao livro Casa-grande & senzala.
[6] Neste livro, Como e porque sou e não sou sociólogo (1968), o autor discorre sobre as fases e momentos do processo de escrita de Casa-grande & senzala. Ele também aborda o teor literário da obra, onde alguns capítulos são escritos em terceira pessoa. Um exemplo é o capítulo 6, intitulado Como e porque escrevi Casa-grande & senzala.
[7] A tese, como era referida na época, foi intitulada Life In Nineteenth-Century Brazil. Foi defendida em 1922 na Universidade de Columbia, o que concedeu a Gilberto Freyre o título de Master of Arts. A banca incentivou que atese fosse expandida e se tornasse um livro. No Brasil, foi publicada pela primeira vez apenas em 1964, sob o título de Vida social no Brasil em meados do século XIX.
[8] A análise de conteúdo levou em consideração a edição de Casa-grande & senzala da Editora Global (2006). Estes números podem sofrer mudanças, considerando-se as inúmeras versões e edições que obteve nestes 90 anos.
[9] Dei destaque ao termo indígena, por ser mais adequado à argumentação deste trabalho, além de ser o que é utilizado com mais frequência pelo autor, apresentando-o como título em CGS. Ressalta-se, porém, que Freyre utiliza também os termos índios e índias ao longo da obra. O termo índia é frequentemente utilizado para se referir às questões sexuais no processo de miscigenação, semelhante ao que ocorre com o termo negra, conforme mencionei anteriormente.
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