CAPITALISMO PERIFÉRICO E A MATERIALIDADE IDEOLÓGICA DA BRANQUITUDE NO BRASIL

PERIPHERAL CAPITALISM AND THE IDEOLOGICAL MATERIALITY OF WHITENESS IN BRAZIL

 

Fernanda Zeni de Avila *

Carla Macedo Martins **

 

DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n33.70541.p134-152

 

Resumo

O artigo analisa a branquitude como ideologia na formação social do Brasil e seu papel na reprodução das relações sociais capitalistas. O texto parte da revisão do tratamento do tema pela literatura nacional, destacando, nesta bibliografia, as discussões sobre racismo, caráter dependente do capitalismo brasileiro e superexploração. A seguir, nossa análise materialista da branquitude se subsidia na categoria ideologia, definida como processo discursivo de reprodução da forma social hegemônica, conforme tratada por Eagleton (1997). Como resultado, o artigo conclui que a branquitude oferece formas ilusórias para universalizar representações, inclusive racial-fenotípicas, de ser sujeito humano; transforma desigualdades em efeitos de traços projetados como naturais; unifica classes sociais em torno da necessidade da reprodução da sociedade tal como ela se apresenta; racionaliza desigualdades e opressões; orienta práticas concretas; e legitima as relações sociais existentes sob o capital na periferia. Em última instância, o estudo aponta que a branquitude contribui para a reprodução das relações sociais no capitalismo periférico.

Palavras-chave: branquitude; racismo; ideologia; superexploração.

 

Abstract

The article analyzes whiteness as an ideology in the social formation of Brazil and its role in the reproduction of capitalist social relations. It starts from a review of the treatment, in national literature, of the theme of whiteness, highlighting in this literature the discussion about racism, the dependent character of Brazilian capitalism and overexploitation. Next, the materialistic analysis of whiteness is supported by the category “ideology” defined as a discursive process of reproducing hegemonic social form, as presented by Eagleton (1997). In summary the essay concludes that whiteness offers illusory ways to universalize representations, including racial-phenotypic ones, of being a human subject; transforms inequalities into effects of natural traits; unifies social classes around the need to reproduce society as it presents itself; rationalizes inequalities and oppression; guides concrete practices; and legitimizes the social relations existing under peripheral capital. Ultimately, the study demonstrates that whiteness contributes to the reproduction of social relations in peripheral capitalism.

Keywords: whiteness; racism; ideology; overexploitation.

Introdução

 

Este artigo é derivado de pesquisa anterior e pretende aprofundar os argumentos emitidos outrora, tendo como objetivo analisar o funcionamento ideológico da branquitude para a reprodução do racismo e para a legitimação da exploração do trabalho no capitalismo periférico brasileiro. Visando ser parte do conjunto de estudos críticos que contribuem para a compreensão das relações étnico-raciais no país, nossa pesquisa pressupõe a discriminação sistemática com base na raça como fenômeno inerente à sociabilidade capitalista, logo, estruturante das relações econômico-sociais e ideológicas no Brasil.

Para o surgimento da sociedade capitalista contemporânea, a ideologia do racismo foi e ainda é essencial, pois esse sistema econômico e social se reproduz também a partir da legitimação da exploração, inclusive desigual, de trabalhadores — no Brasil, em especial, do segmento de mulheres trabalhadoras negras e indígenas. Autores como Rodrigues (2022, p. 151) compreendem que a ideologia racista atua na vida concreta, determinando, inclusive, o movimento do real, sem deixar de ser determinado por ele. Esse pressuposto configura uma complexa relação, que deve ser analisada do ponto de vista da totalidade, a qual precisa considerar as questões raciais. Portanto, ao invés de considerarmos um processo de mão única entre reprodução da vida material e constituição de ideias, podemos analisar a complexidade social a partir da perspectiva de que o movimento do real é também condicionado pelo racismo em uma relação entre duas dimensões, denominadas, em termos heurísticos, de base material e ideologia.

A par de o racismo constituir uma forma de sociabilidade estruturada a partir de relações materiais e ideológicas no modo de produção capitalista, tem-se, na construção imaginária do ideal de humanidade, a ideologia da branquitude como uma das protagonistas da manutenção das desigualdades raciais (Schucman, 2020, p. 157). A sociedade contemporânea se baseia em um universal branco, ancorada na ideia de superioridade e pureza racial, hierarquizando silenciosamente a atribuição de status social, de acordo com a aproximação com o modelo ideal de brancura (Schucman, 2020, p. 157).

A branquitude é um conceito oriundo da teoria crítica da raça “com o objetivo de enunciar as estruturas sociais que produzem e reproduzem a supremacia branca e o privilégio branco, resultado da expansão colonial” (Schucman; Conceição, 2023, p. 52, grifo nosso). Assim, os autores indicam que a branquitude, de forma semelhante ao racismo (Almeida, 2021), não está circunscrita a indivíduos ou determinadas instituições, constituindo-se, na verdade, como uma questão estrutural. Ademais, ao se vincular à expansão colonial, o conceito também aponta para uma desigualdade entre territórios do globo, condicionada pelo desenvolvimento capitalista. Os autores apontam ainda uma polissemia do termo, pois pode significar tanto uma identidade racial branca (o que poderíamos chamar de um contraponto à negritude) quanto uma construção discursiva, uma posição de poder, ou ainda uma ideologia (Schucman; Conceição, 2023, p. 52).

Embora consideremos os dois sentidos interligados, é a esta última direção que o presente artigo se vincula; mais propriamente, buscamos analisar a branquitude não “apenas” como uma projeção identificatória “falsamente” universal (Schucman; Conceição, 2023, p. 54), mas também como algo determinado materialmente pela divisão social do trabalho, de forma particular, no Brasil. Nosso propósito é, assim, situar tal ideologia como parte estruturante do tipo de exploração produzida e reproduzida na periferia do capital, para contribuir para a compreensão de seu funcionamento.

O artigo se organiza, além das considerações finais, em três itens. No primeiro, discutimos a literatura nacional sobre branquitude no Brasil à luz da formação social do país; no segundo, apresentamos o racismo — e sua ideologia — como determinado pela condição subordinada do capitalismo periférico do Brasil; e, no terceiro, embora tenhamos tecido considerações sobre nosso objeto central também ao longo dos itens anteriores, dedicamo-nos especificamente a analisar o funcionamento da branquitude como ideologia no capitalismo periférico.

 

A branquitude na formação social do Brasil

 

O tema branquitude não é recente na literatura sociológica nacional, contemplando distintas abordagens e teorias[1]. Para Schucman e Conceição (2023, p. 54), quatro autores seriam cruciais para a compreensão do tema: Alberto Guerreiro Ramos, Gilberto Freyre, Florestan Fernandes e Paulo Freire. A despeito da relevância destes intelectuais, no entanto, nossa discussão, neste item, estará centrada em autores mais recentes.

Como marco da discussão no Brasil, o trabalho de Maria Aparecida Silva Bento se destaca. A autora introduz a expressão “pacto narcísico da branquitude”, utilizado para explicar o consenso entre pessoas brancas estruturado na negação do racismo e na desresponsabilização pela sua manutenção (Bento, 2002, p. 7). Logo, sendo a branquitude consciente para pessoas negras, Bento (2002, p. 07) defende que esta é um lugar de privilégios raciais, econômicos e políticos, em que a racialidade não é nomeada, mas carrega valores, experiências e identificações afetivas. Em seus estudos, descreve o depoimento de uma mulher branca que se refere sempre a ter pensado sobre o racismo como uma opressão que causava desvantagem em uma parcela da população, mas nunca sobre o aspecto dos resultados vantajosos de privilégios e dominância para o seu grupo racial (Bento, 2014, p. 43). Desse modo, a branquitude coloca os sujeitos brancos em um lugar de normatividade não explicitada na estrutura social racializada — como um universal não nomeado.

Bento (2014) conclui também que, para uma compreensão sobre a branquitude no Brasil, é necessário relacionar esse processo a uma “projeção do branco sobre o negro, nascida do medo, cercada de silêncio, fiel guardião dos privilégios” (Bento, 2014, p. 39). Para a autora, analisar “[...] o branqueamento versus perda de identidade é fundamental para o avanço na luta por uma sociedade mais igualitária [...]” (Bento, 2014, p. 54).

Podemos afirmar que, no Brasil, a branquitude não se confunde, mas se relaciona com a construção de um modelo de brancura e até mesmo, posteriormente, de mestiçagem. É relevante reiterar que, após a abolição da escravidão negra no país, o projeto de desenvolvimento nacional colocado em prática pelo Estado brasileiro envolvia um apagamento social de negros e indígenas, por meio de um embranquecimento da população.

Segundo Munanga (2004), no período pós-abolição do fim do século XIX e das três primeiras décadas do século XX, havia uma preocupação com a suposta influência negativa da herança inferior do negro na construção da identidade étnica do país, tornando o debate em torno da raça central no pensamento da elite brasileira, que desejava um país branco, espelhado no continente europeu (Munanga, 2004, p. 54). O projeto de embranquecimento nacional, influenciado pelas ideias racistas das teses eugenistas das três raças (darwinismo social), via na miscigenação a responsabilidade por uma suposta degeneração nacional, que só poderia ser limpa pelo embranquecimento.

Igualmente importante em nossa análise é destacar que, posteriormente, no entanto, esta perspectiva foi superada, projetando a mestiçagem como ideal de unificação de uma identidade nacional carregada de ideologia. Para melhor compreender o processo ideológico por trás do projeto de embranquecimento nacional, tomamos como base as discussões de Munanga (2004) que, ao resgatar os estudos de Francisco José de Oliveira Viana, concorda com este no que se refere às origens da política de divisão racial no Brasil. Para Munanga (2004, p. 70-72), a política de dividir como forma de melhor dominar mestiços e negros, tratada anteriormente por Viana como oriunda da criação de uma noção de “mulato inferior” e “mulato superior”, a partir de determinados cruzamentos entre brancos e negros, dificultou a criação de uma identidade comum entre mestiços e negros. Assim, historicamente essa divisão contribuiu para o apagamento da identidade negra e para a sua circunscrição a um lugar racializado e supostamente minoritário. Em nossa perspectiva, essas definições sobre a proximidade ou distanciamento do ideal de brancura e o regramento social nos termos descritos contribuem substancialmente para a manutenção da hegemonia ideológica da branquitude.

A branquitude, entretanto, não se restringe ao projeto de branqueamento e à projeção de mestiçagem analisados por Munanga (2004). Para Schucman e Conceição, “os estudos de branquitude iniciados no Brasil na década de 1990 têm buscado enfrentar a ausência do branco nas análises do problema racial” (Schucman; Conceição, 2023, p. 56). Um dos destaques dessa abordagem se encontra em Cardoso (2020), que estudou a produção acadêmica por pesquisadores brancos que elegem o negro como objeto de pesquisa, contribuindo para a projeção do branco como lugar universal.

Ainda sobre o ideal de brancura, Schucman (2020) refere que há um favoritismo em diversos níveis sociais para pessoas mais próximas a esse ideal, ou seja, àquelas fenotipicamente “mais brancas” que as tornam mais “belas”, “desejáveis” e “admiráveis” (Schucman, 2020, p. 157). Neste sentido, a branquitude, segundo Schucman (2020, p. 51) é “um constructo ideológico de poder, em que os brancos tomam sua identidade racial como norma e padrão, e dessa forma outros grupos aparecem ora como margem, ora como desviantes, ora como inferiores”.

Cabe observar, também em Schucman (2020), como a branquitude se define como uma ideologia, embora a autora não se dedique, mais detalhadamente, a desdobrar esta afirmação operando com a categoria nos termos definidos pelo materialismo histórico. A autora enfatiza as estruturas de poder concretas em que as desigualdades raciais se ancoram desde o colonialismo, e destaca que é necessário que os sujeitos brancos compreendam as estruturas de poder — que os beneficiam em algum nível e que sustentam ideologicamente o racismo — e se responsabilizem tanto individualmente quanto coletivamente (Schucman, 2020, p. 60).

Em razão disso, Schucman (2020, p. 73) destaca alguns pontos da branquitude mundial. Dos pontos trazidos pela autora em seus estudos, consideramos essenciais para a análise da realidade no Brasil, aquele que trata da complexidade de camadas que envolvem a construção da identidade branca em diferentes territórios e o ponto relativo ao eixo de privilégios que modulam o desenvolvimento histórico dessa identidade. A autora compreende que os brancos são subjetivados pela ideologia do branqueamento, a partir de uma posição de privilégios materiais e simbólicos, gerados pelo colonialismo e imperialismo. Dessa forma, em nossa perspectiva, é necessário tratar a ideologia da branquitude no Brasil considerando os diversos marcadores sociais que compõem a classe trabalhadora brasileira (Avila, 2023, p. 16).

Outra autora que discute a complexidade social da definição e constituição da branquitude é Silva (2017, p. 26). Contudo, essa autora discute branquitude como a identidade racial do branco baseada na construção ideológica de poder que nasceu no contexto do projeto moderno de colonização europeia, destacando, assim como os demais autores, a ideologia como central à análise do tema. Em nossa análise, a partir das discussões trazidas por essas e outras autoras, para pessoas brancas, não é necessário que a branquitude seja mencionada, a não ser que lhes convenha, pois é uma identidade neutra, o que faz com que sua força ideológica esteja calcada no imaginário social como natural e universal, permeando todos os campos da vida social (Avila, 2023, p. 16).

A partir da literatura produzida sobre a branquitude no Brasil, retomamos, neste ponto, o objeto deste artigo: o funcionamento ideológico da branquitude para a reprodução do racismo e para a legitimação da exploração do trabalho no capitalismo periférico brasileiro. Como ideologia (Eagleton, 1997), a branquitude necessariamente envolve processos de identificação, sendo fundamental buscar estabelecer seu caráter estrutural na sociabilidade capitalista, a par de sua constatação como fenômeno individual e institucional. Essa perspectiva se coaduna com os movimentos mais recentes na análise do tema; conforme apontam Schucman e Conceição (2023, p. 53, grifo nosso): “dentro da área de conhecimento há um esforço para primeiro caracterizar o que é branquitude e, posteriormente, para compreender seu funcionamento na estruturação das desigualdades raciais e globais”.

Para tal, parece-nos relevante mobilizar as teorias sobre a determinação do racismo no Brasil pelas relações de trabalho e pela produção de classe trabalhadora no capitalismo periférico, objeto do próximo item.

 

Racismo e trabalho no capitalismo periférico brasileiro

 

Conforme já afirmado, a análise dos processos ideológicos da branquitude, objeto de nosso artigo, exige a compreensão da produção do racismo no desenvolvimento e na reprodução do capital — na nossa perspectiva: das formas de exploração do trabalho e de suas mediações simbólicas — na sua singularidade periférica. Em específico, o tema do racismo na periferia e suas determinações materiais, na literatura sociológica brasileira, se institui como um vasto campo de reflexões, sustentadas na relação entre desigualdade e desenvolvimento capitalista e na consideração das singularidades e particularidades (Netto, 2011, p. 57) da reprodução do capital.

No âmbito do pensamento social brasileiro, o desenvolvimento capitalista no país e seus impactos na formação do mercado de trabalho em termos de raça foram tratados pelos importantes intelectuais Clóvis Moura e Florestan Fernandes. Os sociólogos introduziram uma interpretação dialética da escravidão no Brasil e expuseram suas perspectivas sobre a luta de classes brasileira, chegando a importantes convergências e divergências entre si (Queiroz, 2021).

Para os propósitos de nosso estudo, enfatizaremos duas convergências primordiais entre os dois intelectuais. Embora o negro ocupe, em Florestan, primordialmente um papel de agente econômico base da acumulação capitalista e, em Moura, adicionalmente, o de agente político nas lutas por liberdade, os dois estudiosos partiram de uma interpretação materialista do mito da democracia racial brasileira para elucidar a função de apaziguamento e dominação racial-classista assumida por esta expressão ideológica, como parte fundamental da exploração capitalista (Queiroz, 2021). Quanto ao mercado de trabalho, ambos consideravam que sua formação, no capitalismo dependente brasileiro, deu-se a partir de um contexto de extrema desigualdade racial, relacionando-se precisamente com construções ideológicas centrais à nação.

Discutimos (Avila, 2023) os estudos mais recentes sobre a análise materialista das ideologias racistas brasileiras, que captam o funcionamento da divisão racial (e sexual) do trabalho, estratégia do capitalismo para ocultar o trabalho não pago (expropriado) e rebaixar o “preço do trabalho para abaixo do valor da força de trabalho” (Ferreira; Fagundes, 2021, p. 70). Para os autores citados, a opressão racial incide direta e constantemente no rebaixamento do valor do trabalho e nas condições de vida de toda a classe trabalhadora, considerando, obviamente, que é a parcela negra e indígena da classe trabalhadora que vive sob as piores condições. Nesse sentido, concordamos com os autores quando eles tratam do racismo articulado à exploração contemporânea na periferia do sistema capitalista, para contribuir na efetivação e naturalização das diversas manifestações dessa exploração (Ferreira; Fagundes, 2021, p.70 apud Avila, 2023).

Na mesma direção, autoras como Souza (2022) buscam analisar a dinâmica de dominação e exploração capitalista contemporânea, interligando as condições materiais de vida e as expressões ideológicas (Avila, 2023, p. 28). Ao analisar o capitalismo dependente brasileiro, Souza (2022) aponta a existência de uma enorme massa de trabalhadores, muito além do exército industrial de reserva (Souza, 2022, p. 39). Nesse sentido, “a desigualdade e o desemprego fazem parte da estrutura da reprodução do capital na economia dependente, com uma radicalidade sui generis” (Souza, 2022, p. 39). A exploração da classe trabalhadora brasileira é condicionada, assim, pela enorme oferta da força de trabalho, fundamental para o desenvolvimento dependente, evidenciando, dessa forma, o racismo como um aspecto estruturante do capitalismo no Brasil.

Diante da existência desse vasto exército industrial de reserva, protagonizado pela população negra e determinante das condições de toda a classe trabalhadora, Fagundes (2020) evidencia a relevância da categoria superexploração[2] do trabalho, gestada no interior da teoria marxista da dependência e vinculada às particularidades “de uma economia dependente e com alto padrão de subordinação” (Fagundes, 2020, p. 146-147). Logo, a superexploração se torna chave para a compreensão de como o capital opera com o racismo para explorar, de forma intensa, a classe trabalhadora brasileira, assim como as dos demais países da periferia do sistema capitalista. Fagundes (2020) reforça que a essência desse tipo de exploração, sistematicamente reproduzida no capitalismo brasileiro, está no aprofundamento do desgaste da força de trabalho, inibindo a sua reposição e produzindo um rebaixamento do seu valor.

Deste modo, abre-se a questão de como a superexploração será vivenciada materialmente por homens e mulheres trabalhadoras. Os processos ideológicos contaram e contam com a produção simbólica de fissuras na classe trabalhadora através do racismo. Para Pereira e Sampaio (2018, p. 444), “essa fratura funciona duplamente, isto é, serve para criar formas de opressão que maximizam a exploração e, tragicamente, para produzir uma desconfiança no interior da própria classe trabalhadora”. Tal processo social-subjetivo enfraquece a classe trabalhadora “politicamente enquanto sujeito capaz de promover a revolução” (Pereira; Sampaio, 2018, p. 444).

O racismo como ideologia é analisado, de forma aprofundada, por Almeida (2021) e Rodrigues (2022). Almeida (2021, p. 25), em seu conhecido estudo, estabelece o que poderíamos denominar de uma crítica da economia política do racismo, ao historicizar a gênese do conceito de raça por volta do século XVI, a partir da sociabilidade estabelecida pela modernidade e pelo capitalismo. O racismo, portanto, cria sujeitos racializados, considerando que “nossa relação com a vida social é mediada pela ideologia" (Almeida, 2021, p. 67, grifo nosso). O imaginário social que antecede à formação da consciência é o primeiro contato que temos com os valores desta sociedade. Neste sentido, o racismo como construção social não é uma opção individual, mas estruturante do conjunto da sociedade capitalista — o que não elimina a necessidade de combate às práticas racistas individuais, mas define que “a responsabilização jurídica não é suficiente para que a sociedade deixe de ser uma máquina produtora de desigualdade racial (Almeida, 2021, p. 50-51).

A racialização define o lugar do outro racializado e de um eu marcado por uma contradição, pois “só se é ‘branco’ na medida em que se nega a própria identidade enquanto branco, que se nega ser portador de uma raça. Ser branco é atribuir identidade racial aos outros e não ter uma. É uma raça que não tem raça” (Almeida, 2021, p. 78). Ao não se identificar como branco, a raça aparece como um problema dos outros, visto que são os outros que não se enquadram no padrão de humanidade imposto pela branquitude. São estes outros que precisam se preocupar com sua cor, fenótipo, cultura e demais traços que os diferenciam da suposta verdadeira humanidade. Almeida (2021) nos lembra ainda que as condições de ser negro e ser branco dependem de circunstâncias históricas, políticas, regionais, sendo estas experiências distintas, de acordo com a formação cultural, político-institucional e econômica de cada país e continente.

Ainda em Almeida (2021), é importante destacar que, para nossos propósitos aqui, o enquadramento dos grupos discriminados e suas culturas em uma versão de humanidade que possa ser controlada pelos interesses do capital é uma forma de adaptá-las ideologicamente. Nas palavras do autor, “em vez de destruir a cultura, é mais inteligente determinar qual o seu valor e seu significado” (Almeida, 2021, p. 73). O racismo só pode ser discutido a partir das teorias críticas sobre a supremacia branca como hegemonia:

 

uma forma de dominação que é exercida não apenas pelo exercício bruto do poder, pela pura força, mas também pelo estabelecimento de mediações e pela formação de consensos ideológicos. [Tendo como efeito a perspectiva de que] as desigualdades, a violência e a discriminação racial são absorvidas como componentes da vida social [...] (Almeida, 2021, p. 07).

 

A mais conhecida formulação da obra em tela se encontra nas três distintas concepções de racismo: individualista, institucional e estrutural. A concepção individual trata o racismo como um fenômeno puramente ético, como uma irracionalidade, ou ainda como apenas como um preconceito de alguns indivíduos agindo isoladamente ou em grupo, deixando de lado sua natureza política; as suas principais formas de combate seriam a educação, conscientização e estímulo a mudanças culturais, pois, nessa pseudoteoria, essa forma de opressão está ligada ao comportamento humano. Quanto à concepção institucional do racismo, Almeida a considera um importante avanço nas teorias sobre o tema, pois trouxe para discussão o poder como elemento central da relação racial, inserindo essa discussão no campo da dominação (Almeida, 2021 apud Avila, 2023, p. 48). Nessa concepção, o racismo é visto dentro de um conflito social de disputa de poder, na tentativa da manutenção do grupo racial privilegiado (branco). Nesse sentido, para Almeida “[...] o racismo não se resume a comportamentos individuais, mas é tratado como o resultado do funcionamento das instituições [...]” (Almeida, 2021, p. 37). O autor destaca que as instituições são responsáveis pela formulação de regras e padrões que “[...] privilegiam o grupo racial branco, um exemplo disso é a exigência de ‘boa aparência’ para se candidatar a uma vaga de emprego, que simultaneamente é associada a características estéticas próprias de pessoas brancas (...)” (Almeida, 2021, p. 46). Entretanto, para o autor, ainda que as instituições reproduzam as condições e manutenção da ordem social, não são elas que criam o racismo, pois há uma estrutura social na qual o racismo é orgânico; “[...] dito de modo mais direto: as instituições são racistas porque a sociedade é racista [...]” (Almeida, 2021, p. 47). “O racismo se expressa concretamente como desigualdade política, econômica e jurídica [...]” (Almeida, 2021, p. 50), definindo o denominado “racismo estrutural”, terceira concepção de racismo.

Nem toda psicologia é individualista; tal abordagem pode, inclusive, perpassar o campo da sociologia, por exemplo. Nosso destaque, neste ponto da obra, incide sobre o caráter ideológico não só do racismo, mas também de determinadas teorias explicativas. A teoria individualista, ao se limitar ao campo comportamental e moral, é uma teoria ideológica que tenta ocultar o funcionamento real do racismo na sociedade de classes. A teoria do racismo institucional também seria uma expressão ideológica, pois apresenta uma compreensão limitada sobre o papel das instituições no combate ao racismo, ao não abarcar a totalidade das contradições sociais, expressando, por exemplo, que apenas a presença de pessoas negras ou não brancas nas instituições já seria suficiente.

É na direção de analisar os processos ideológicos racistas que caminha o estudo de Rodrigues (2022): o racismo, de forma articulada, apaga tanto sua história, enquanto parte crucial da forma social capitalista, quanto oculta seu caráter estrutural, por exemplo, através do mito da democracia racial, no caso do Brasil, e das pseudoteorias individualizantes. Assim, Rodrigues (2022) salienta que “[...] o racismo surge no processo de formação do capital e não antes [...]. É esse processo que cria as bases para uma internacional divisão racial do trabalho, a base real sobre a qual se ergue o monumental edifício ideológico do racismo. Não foi qualquer escravidão que produziu esse cenário, mas a escravidão negra moderna (Rodrigues, 2022, p. 153). Ademais, o autor enfatiza que a ideologia do racismo é fundamental em todo o ciclo de crises e saída das crises do capitalismo (Rodrigues, 2022, p. 163).

Retomando a crítica encontrada no pensamento social brasileiro, para Rodrigues (2022), na análise da realidade brasileira, a mediação encontrada pela ideologia para ocultar o rígido sistema classificatório fenotípico é o mito da democracia racial. Nas suas palavras, “a ideologia do branqueamento combinada com o mito da democracia racial constitui [...] uma singularidade da ideologia do racismo no Brasil” (Rodrigues, 2022, p. 164). Tal mito cumpre uma das funções fundamentais do racismo, que reside precisamente no apagamento dos rastros históricos e contemporâneos de sua constituição, “sua funcionalidade no processo de valorização de valor, eixo econômico central do modo de produção capitalista” (Rodrigues, 2022, p. 164).

Na mesma perspectiva de Almeida (2021), o autor aponta tais apagamentos ideológicos como relevantes na constituição das pseudoteorias já mencionadas, pois “torna-se possível apresentar o racismo como uma simples irracionalidade, como puro ódio, autonomizando o momento ideal” (Rodrigues, 2022, p. 156-157). Em outras palavras, o racismo é representado como uma exceção circunstancial no quadro do desenvolvimento capitalista; tal processo permite ainda simbolizar o racismo como um fenômeno ahistórico, “abrindo margens para a caracterização eterna — para o passado e/ou para o futuro — desse particular e historicamente determinado fenômeno, naturalizando-o” (Rodrigues, 2022, p. 156-157). Na totalidade social, o racismo é o particular, enquanto produto histórico do capital e no seu funcionamento ideológico, mas é apresentado como uma característica social universal, portanto, imutável e desconectada do modo de produção em tela.

A ideologia do racismo inverte, oculta, justifica, naturaliza e apresenta o particular enquanto universal (Rodrigues, 2022, p. 164). A construção do universalismo colonial branco, que criou o outro — o não universal, o negro, o indígena, o não branco — está a serviço da reprodução da sociedade de classes. O racismo é uma expressão particular dessa sociedade, que o tem como base material e ideológica universal de um tipo ideal de ser humano[3]. No próximo item, voltamos nossa análise para a branquitude.

 

A branquitude como ideologia do capital no capitalismo periférico

 

Considerando o objetivo de nosso estudo, nosso propósito, neste item, consiste em investigar como a branquitude na periferia opera para ocultar a superexploração e mistificar relações entre grupos racializados — por exemplo, via inferiorização e em termos de cisão intraclasse trabalhadora. Para isso, tomamos o conhecido estudo de Eagleton (1997). Como marxista, Eagleton considera a ideologia ligada à materialidade da vida social; portanto “[...] de nada adianta lembrar a mim mesmo que sou contra o racismo quando me sento em um banco no parque onde se lê ‘só para brancos’; ao sentar nele, apoiei e perpetuei a ideologia racista. A ideologia, por assim dizer, está no banco, não em minha cabeça [...]” (Eagleton, 1997, p. 47). Portanto, a ideologia não está apenas no plano das ideias ou da educação dos indivíduos; ela é forma oriunda da relação entre as classes sociais no capitalismo, cuja continuidade se relaciona à produção de um sujeito social que perpetua a dominação por meio de linguagens, narrativas, discursos, decisões políticas e produção cultural, por exemplo.

Assim, para Eagleton (1997), a noção de ideologia remete a “legitimar o poder de uma classe ou grupo social dominante” (Eagleton, 1997, p. 19), afirmação que indica a centralidade da classe no funcionamento da ideologia e na reprodução da forma social capitalista. Para o autor, embora não possamos recair na perspectiva psíquico-cognitivista de ideologia como mera “ilusão” desconectada de qualquer objetividade da existência social, a categoria contempla a noção de mistificação: “uma camuflagem ou repressão dos conflitos sociais, da qual se origina o conceito de ideologia como uma resolução imaginária de contradições reais (Eagleton, 1997, p. 19). Por fim, um último aspecto relevante na definição da categoria consiste em seu caráter como discurso — e não como língua —, o que implica dizer que não se trata meramente de constatar a veracidade de dada afirmação e, sim, de seu funcionamento discursivo (Eagleton, 1997, p. 22) na direção de aplacar contradições sociais, cujo enfrentamento real exigiria uma superação da forma social hegemônica.

Portanto, tais formas discursivas tendem a ocultar a realidade contraditória da sociabilidade capitalista, contribuindo para sua reprodução. Nesse sentido, as ideologias podem ser universalizantes, naturalizantes, unificadoras, racionalizantes, orientadas para a ação e legitimadoras (Eagleton, 1997, p. 50), compreendendo que tais traços funcionam de maneira articulada na construção discursivo-ideológica.

A universalização é o processo segundo o qual “[...] valores e interesses que são na verdade específicos de uma determinada época ou lugar são projetados como valores e interesses de toda a humanidade” (Eagleton, 1997, p. 60). Ao desistoricizar as ideias e crenças, a universalização oculta que elas sejam específicas de uma determinada época, lugar e grupo social (Eagleton, 1997, p. 62-3). Há uma neutralidade da branquitude em relação à sua racialização exatamente porque o branco se projeta como universal. Entretanto, sob análise, ainda que se mostre supostamente neutra, a branquitude molda uma identidade marcada racialmente. A diferença em relação aos sujeitos racializados como negros e indígenas — maioria significativa da população brasileira — reside no fato de que, aos sujeitos brancos, é dado o poder de escolher evidenciar essa racialização ou não.

A naturalização, de forma semelhante à universalização, é o trabalho ideológico que desistoriciza a ideologia; a naturalização, contudo, investe a ideologia com a perspectiva de que “não é possível ser diferente”, uma vez que nela se representam fenômenos naturais (Eagleton, 1997, p. 62). Assim, a branquitude, como ideologia, sustenta a promoção da ocupação de espaços de poder por brancos sobre os traços fenotípicos, como cor de pele, largura do nariz, tipo de cabelo. Ao estigmatizar em estereótipos racistas uma grande parcela da população brasileira que não é branca, a ideologia da branquitude também busca convencer esses mesmos sujeitos de que sua condição de desigualdade racial é natural.

As ideologias são unificadoras pois “[...] conferem coesão aos grupos ou classes que as sustentam, fundindo-os em uma identidade unitária ainda que internamente diferenciada, o que lhes permite talvez impor uma certa unidade ao conjunto da sociedade [...]” (Eagleton, 1997, p. 50). Assim, o autor entende que uma ideologia bem-sucedida deve funcionar em termos práticos e teóricos, abrangendo desde um sistema de pensamento elaborado até as minúcias da vida cotidiana (Eagleton, 1997, p. 53)[4]. Para unificar a sociedade capitalista em torno de crenças e valores racistas, a ideologia da branquitude busca cimentar as contradições sociais e raciais, bastante agudas no contexto das nações do capitalismo periférico.

Sobre a característica da racionalização, Eagleton entende que as ideologias podem ser lidas como tentativas de produzir explicações e justificativas plausíveis para defender o indefensável (Eagleton, 1997, p. 56-7 apud Avila, 2023, p. 61). Sob esse ponto de vista, o autor compreende também que a racionalização, na ideologia, está intimamente ligada ao conceito de legitimação, sobre o qual discorreremos mais adiante e que tem relação com o processo de aceitação pragmática das condições a que são impostas aos grupos por parte dos dominantes (Eagleton, 1997, p. 58). Assim, ao promover discursos como jovens negros são mais propensos ao crime, pois são a maioria no sistema penitenciário, por exemplo, a ideologia tenta obscurecer, via racionalização, a realidade social, para que a estrutura social não seja questionada e as contradições desta sociedade não sejam expostas. Em suma, a racionalização, neste caso, busca argumentar que há diferenças cognitivas e sociais inerentes com base no pertencimento étnico-racial, e tais diferenças explicam a sociedade de classes, sobretudo em um contexto de superexploração do trabalho.

A orientação para a ação é uma característica ideológica que enfatiza a dimensão prática da ideologia, ou seja, sua capacidade de “prover seus adeptos de metas, motivações, prescrições, imperativos” (Eagleton,1997, p. 52), esvaziando uma perspectiva metafísica em torno da categoria. No caso da branquitude, essa ideologia conduz os sujeitos sociais a praticarem cotidianamente atos racistas, em uma formação social de forte componente negro e indígena.

Por fim, no que diz respeito à característica da legitimação, a branquitude justifica, primeiramente, uma superioridade de um grupo racial; a realidade de desigualdades de toda ordem é, assim, legitimada pela ideologia da branquitude. Porém, o processo ideológico não se restringe a esse ponto; em segundo lugar, a branquitude também legitima as relações sociais existentes sob o capital na periferia: a superexploração a que se submetem os trabalhadores racializados, como negros, negras e indígenas é justificada, assim como o valor rebaixado do trabalho é racionalizado de forma compensatória pelos trabalhadores e trabalhadoras brancos, nos termos da noção de racionalização acima descrita.

 

Considerações finais

 

A ideologia da branquitude oferece formas discursivo-sociais para explicar as contradições reais da sociedade de classes; a branquitude, nesses termos, sustenta o apagamento intelectual da contribuição negra no país, entre outras violências materiais e simbólicas que ocorrem sistematicamente contra populações negras e indígenas que vivem nas grandes cidades e no meio rural (Avila, 2023).

Se a sustentação simbólica da desigualdade de raça e de classe é necessária para o capitalismo, a ideologia da branquitude oferece formas ilusórias para universalizar representações, inclusive racial-fenotípicas, de ser sujeito humano; transformar desigualdades em efeitos de traços naturais; unificar classes sociais em torno da necessidade da reprodução da sociedade tal como ela se apresenta; racionalizar desigualdades e opressões; orientar práticas concretas; e legitimar as relações sociais existentes sob o capital. Em poucas palavras, a ideologia da branquitude disputa para si o processo de consciência de trabalhadores e trabalhadoras.

Analisar a branquitude é também compreender suas particularidades e singularidades em dado território. Assim, pensar sobre a ideologia da branquitude no Brasil é considerar não só os legados da escravidão e as tentativas de embranquecimento, mas também as relações de trabalho na periferia do capital e suas formas materiais e simbólicas de legitimação e reprodução. Tal abordagem da branquitude supera, portanto, aquelas individualistas ou institucionais, que circunscrevem a branquitude à defesa de privilégios por grupos brancos específicos ou ao mau funcionamento de aparelhos sociais[5], alçando-a a uma questão de caráter estrutural.

Tais relações de trabalho se condicionam pelo fato de o Brasil estar inscrito no conjunto de países cuja classe trabalhadora é superexplorada, enquanto um capitalismo de economia periférica. Em outras palavras, uma perspectiva materialista sobre branquitude aponta como questão central, na discussão de raça, as formas de exploração do trabalho no Brasil e suas formas ideológicas. O capitalismo dependente brasileiro se desenvolveu deixando a parcela negra da classe trabalhadora na informalidade do mercado de trabalho. O apagamento da contribuição negra na construção do Brasil, o projeto de embranquecimento do país, no fim do século XIX e início do XX, e a administração regulada da identidade e cultura negra funcionaram como parte do desenvolvimento particular do capitalismo no Brasil, como o racismo e a branquitude atuais parecem permanecer operantes para sua reprodução, apontando para a pertinência de analisar a relação classe, raça e trabalho sob o capital na periferia.

Em suma, a ideologia da branquitude serve, segundo nossas conclusões, para ocultar e elaborar simbolicamente as raízes das desigualdades e da superexploração. Incide particular e diretamente na qualidade de vida das trabalhadoras negras, negros e indígenas. Contudo, enfatizamos que a branquitude e o racismo, enquanto ideologias, não são apenas ideias de brancos, ou uma questão individual de alguns grupos, mas sim uma elaboração da materialidade vivenciada na sociabilidade capitalista.

Obviamente que a fração não branca da classe trabalhadora é a que mais sofre sob a ideologia da branquitude. Entretanto, ao colaborar para a manutenção de uma sociabilidade racial que atribui privilégios e vantagens quanto mais próximo se está, ou se consegue chegar, das características da identidade branca, a branquitude também aprofunda a exploração de grupos não-racializados da classe trabalhadora. A precariedade do trabalho e o rebaixamento das condições da reprodução social também afetam a parcela branca da classe.

 

Referências

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Recebido em: 19/06/2024.

Aceito em: 16/10/2024.

 

DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n33.70541.p134-152

 

 



* Mestra em Educação profissional em Saúde pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Brasil. E-mail: fernanda.zenideavila@gmail.com.

** Pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Brasil. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional em Saúde da FIOCRUZ. Doutora em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: carla.martins@fiocruz.br.

[1] Nossa revisão da literatura a respeito da branquitude e do racismo brasileiros, neste item, não se limita a autores e autoras inscritas na tradição marxista. A distinção entre as diferentes ontologias, epistemologias e teorias em torno destes temas, inclusive mesmo entre aquelas tributárias dos marxismos, exigiria outra pesquisa.

[2] Para Luce (2018), “a categoria da superexploração deve ser entendida [...] como (1) conjunto de modalidades que implicam a remuneração da força de trabalho abaixo do seu valor e o esgotamento prematuro da força físico psíquica do trabalhador; (2) e que configuram o fundamento do capitalismo dependente junto com a transferência de valor e a cisão entre as fases do ciclo do capital” (Luce, 2018, p. 122). Ainda sobre o tema, no capitalismo economicamente dependente, Luce (2018, p. 182), aponta que “[...] se o salário não alcança, de modo recorrente, a quantia suficiente para o trabalhador repor o desgaste de sua força de trabalho, estaremos diante da superexploração [...]”.

[3] O universal aqui não se confunde com o horizonte social apontado por Franz Fanon, abordado por Rodrigues (2022).

[4] Este funcionamento será retomado mais adiante ao discutirmos o traço da “orientação para ação” (Eagleton, 1997).

[5] Esta afirmação não elide a necessidade de pesquisas — assim como de reformas — de instituições, por exemplo, dos campos da saúde e da educação.

 

 

 

 

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