O PLANEJAMENTO NA CURADORIA DIGITAL

PLANNING IN DIGITAL CURATION

Sandra de Albuquerque Siebra1

RESUMO

Reflete sobre o planejamento no contexto da curadoria digital. Esta é uma pesquisa descritiva e qualitativa, que faz uso da pesquisa bibliográfica e documental. Como resultados, foram definidas seis dimensões que devem ser exploradas no planejamento e os elementos dentro delas, independente do tipo de objeto digital a ser curado, foram elas: infraestrutura, recursos financeiros, recursos humanos, ações relacionadas com preservação digital, questões legais e éticas e questões relacionadas ao acesso e uso dos objetos digitais. Foram indicados documentos que devem ser produzidos durante o planejamento para orientar as equipes do projeto, como o Plano de Preservação Digital e, também, foi ressaltada a importância da participação da comunidade alvo do projeto de curadoria nesta etapa. Por fim, foi verificado que as descrições sobre planejamento, na maioria dos modelos de curadoria digital é ainda sucinta, técnica e superficial e podem não dar apoio suficiente para a realização do planejamento da curadoria por parte das instituições/organizações. Conclui-se que é necessário que os profissionais da informação estejam aptos a elaborar materiais para suprir essa lacuna e para orientar a implementação de projetos de curadoria digital.

Palavras-Chave: Planejamento para Curadoria Digital. Modelos de ciclos de vida. Curadoria Digital. Etapa de Planejamento. Preservação Digital.

ABSTRACT

Reflects on planning in the context of digital curation. This is a descriptive and qualitative study, which uses bibliographic and documentary research. As a result, six dimensions were defined that should be explored in the planning and the elements within them, regardless of the type of digital object to be cured, they were: infrastructure, financial resources, human resources, actions related to digital preservation, legal and ethical issues and issues related to access and use of digital objects. Documents were indicated that must be produced during the planning to guide the project teams, such as the Digital Preservation Plan and, also, the importance of the participation of the target community of the curation project at this stage was emphasized. Finally, it was found that the descriptions of planning, in most digital curation models, are still succinct, technical and superficial and may not provide sufficient support for the realization of curatorship planning by institutions / organizations. It is concluded that it is necessary that information professionals are able to develop materials to fill this gap and to guide the implementation of digital curation projects.

Keywords: Planning for Digital Curation. Lifecycle Models. Digital Curation. Planning Stage. Digital Preservation.

Artigo submetido em 26/11/2020 e aceito para publicação em 09/12/2020

1 INTRODUÇÃO

O avanço tecnológico ocorrido nos últimos anos, associado: 1) ao fato que o usuário da atualidade é produtor e consumidor de dados e informações em diferentes sistemas, aplicativos e plataformas, e valoriza a colaboração e o reuso de dados; 2) ao aumento exponencial na produção de objetos digitais; 3) à obsolescência tecnológica decorrente da evolução das tecnologias; 4) aos riscos diversos aos quais os objetos digitais estão submetidos (ex: falha de hardware e vírus), tem ampliado a discussão da importância de se ter garantida a preservação e acesso a longo prazo aos objetos digitais, sejam eles documentos (arquivísticos, multimídia, sonoros, etc) ou dados (governamentais, de pesquisa, etc).

Porém, organizar, armazenar, gerenciar, preservar e dar acesso à dados e informações digitais, de forma eficiente e eficaz, com a garantia de autenticidade e integridade, apesar de ser uma necessidade, é um desafio. O que endossa o destacado por Siebra, Borba e Miranda (2016, p.3) que urge “a aplicação de ações e estratégias efetivas que possibilitem a preservação e acesso a longo prazo às informações digitais”, e, segundo os mesmos autores, também urge a “preparação de recursos humanos capacitados, em quantidade suficiente para enfrentar os desafios de gerenciar um grande volume de informação digital, em formatos e suportes diversos” (p.3).

Neste cenário, ressalta-se a importância da curadoria digital que envolve a gestão planejada e intencional, adição de valor e a preservação de objetos digitais durante todo o ciclo de vida destes, tendo como perspectiva o desafio de promover o acesso, uso e reuso, a fim de atender às gerações atuais e futuras (TIBBO; HANK; LEE, 2008; ABBOT, 2008; SIEBRA; BORBA; MIRANDA, 2016;  SAYÃO; SALES, 2020). O que faz com que a curadoria digital englobe ações gerenciais, técnicas, tecnológicas e políticas.

Para a implementação da curadoria digital vem sendo utilizados modelos de ciclos de vida, sendo um dos mais famosos o do Digital Curation Centre – DCC (DCC, c2004-2020). Porém, nos modelos existentes observa-se a falta de detalhamento das ações a serem realizadas em cada etapa do ciclo, o que pode fazer com que as instituições tenham dúvidas sobre como colocar em prática algum destes modelos. Além disso, alguns modelos não explicitam ou são muito sucintos e/ou técnicos em uma etapa que é fundamental para o sucesso e eficácia de todas as demais etapas de um ciclo de curadoria digital: o planejamento.

O planejamento na curadoria digital pode ser definido como o processo pelo qual as necessidades gerais e específicas relacionadas à curadoria de uma coleção/acervo/conjunto de dados são identificadas, prioridades são determinadas e os recursos para implementação do ciclo de curadoria digital, como um todo, são definidos (KUMAR, 2011). Logo, esta pode ser considerada uma etapa basilar e engloba a definição e especificação de questões relacionadas à recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos; a documentação de questões legais e éticas; além da seleção e adoção de políticas, definição de procedimentos, dos meios e dos métodos necessários para alcançar os objetivos previamente definidos para um projeto de curadoria (CHIAVENATO, 2014).

Assim, compreendendo a importância do planejamento para a curadoria digital, questiona-se: Que ações necessitam ser realizadas nesta etapa? Quais documentos precisam ser produzidos? Como os ciclos de vida para curadoria digital abordam a etapa de planejamento? Nesse contexto, o objetivo geral desta pesquisa foi refletir sobre o planejamento no contexto da curadoria digital.

Como contribuição social, espera-se que esta pesquisa possa colaborar para a implementação da etapa de planejamento da curadoria em instituições e/ou organizações e trazer esclarecimentos sobre esta etapa para os profissionais envolvidos em projetos de curadoria digital. Como contribuição para a área de Ciência da Informação, esta pesquisa colabora com material sobre o planejamento para curadoria digital. Pois, como afirmam Sanchez, Vidotti e Vechiato (2017, p. 14-15), “Curadoria Digital dentro do cenário da Ciência da Informação é ainda um assunto novo e em expansão, que necessita da realização de estudos para aprofundamento no tema”. Realmente, há escassez de material em língua portuguesa sobre curadoria digital, em especial sobre planejamento para curadoria. Até a presente data, foi encontrada apenas uma iniciativa de detalhamento do planejamento em Mello (2020), que o descreve brevemente e ainda de forma superficial esta etapa na sua proposta de modelo para a preservação e curadoria digital de objetos digitais de centros de pesquisas oncológicas.

2 CURADORIA E PRESERVAÇÃO DIGITAL

Em 1997, Hedstrom definiu preservação digital como “o planejamento, alocação de recursos, e aplicação de estratégias de preservação e das tecnologias necessárias para garantir que a informação digital de valor permaneça acessível e passível de uso” (p. 190). O que é endossado por Flores (2017, p. 74) quando afirma que “A preservação digital caracteriza-se no desenvolvimento teórico e na aplicação de técnicas capazes de viabilizar a permanência, garantindo o acesso e a autenticidade dos objetos digitais”. A partir de meados de 2004, o conceito de preservação digital passou a ser trabalhado dentro de um contexto mais amplo, o da curadoria digital, que engloba, também, questões relacionadas à gestão dos objetos digitais, à adição de valor a eles e ao arquivamento digital dos mesmos (SIEBRA; BORBA, 2018).

Assim, a curadoria digital abrange “o que vem antes da preservação e o que vem depois - ou seja, como os dados são criados e como são usados [...] e como serão usados e por quem, no futuro” (HARVEY, 2010, p. 16). O que é reafirmado por Yakel (2007) e Caplan(2011), quando registram que a curadoria digital engloba todo o ciclo de vida dos objetos digitais, sendo a preservação um ponto específico deste ciclo.

A curadoria digital foi concisamente definida por Rusbridge et al. (2005, p. 3) como “a gestão ativa dos dados ao longo do ciclo de vida de interesse acadêmico e científico; é a chave para a reprodutibilidade e reutilização”. Para Abbott (2008), a curadoria digital é o gerenciamento e preservação de dados digitais a longo prazo e envolve atividades de gerenciamento, desde o planejamento da criação de dados e informações, passando por melhores práticas em digitalização e documentação, pela garantia de disponibilidade e adequação para descoberta e reutilização no futuro. O que coaduna com as definições dadas, posteriormente, por Tibbo, Hank e Lee (2008, p. 235), que colocam a curadoria como “gestão ativa e preservação de recursos digitais ao longo do seu ciclo de vida completo”. E, também pela National Academy of Science (2015), que define curadoria como o gerenciamento ativo e o aprimoramento de ativos de informação digital, para uso atual e futuro. Pode-se dizer que essas definições foram unidas por Oliver e Harvey quando especificam que

A curadoria digital está preocupada com o gerenciamento ativo de dados, enquanto continuar a ser de interesse acadêmico, científico, de pesquisa, administrativo e / ou pessoal, com o objetivos de dar suporte a reprodutibilidade, reutilização e agregação de valor a esses dados, gerenciá-los desde o seu ponto de criação até que seja determinado que ele não será mais útil, e garantir sua acessibilidade, preservação, autenticidade e integridade ao longo do tempo. (OLIVER; HARVEY, 2016, p. 8).

Em todas essas definições é possível ver a menção à curadoria como uma gestão ativa ou a menção explícita ao planejamento. Para National Academy of Science (2015) e Siebra, Borba e Miranda (2016), a gestão ativa indica que as ações devem ser planejadas, intencionais, sistemáticas, objetivas e direcionadas, de forma que tornem as informações digitais adequadas a um propósito. Assim, a gestão ativa acaba por envolver atividades coordenadas que permitam aos usuários compreender e explorar a informação digital. Além de atividades gerenciais, técnicas, tecnológicas e políticas que busquem garantir a integridade das informações digitais, e, também, que elas permanecerão encontráveis, acessíveis, autênticas e passíveis de serem usadas, enquanto os usuários em potencial tiverem a necessidade ou o direito de usá-las (NATIONAL ACADEMY OF SCIENCE, 2015). Destaca-se que este tipo de gestão “ajuda a garantir que a autenticidade de um recurso informacional sobreviva no tempo, apesar das transformações tecnológicas, com uma perda mínima de conteúdo informativo, de funcionalidade e de acessibilidade” (TAMMARO; SALARELLI, 2008, p.196).

Porém, fazer uma gestão intencional e ativa demanda um planejamento meticuloso (OLIVER; HARVEY, 2016). O que já é considerado em diversos modelos de ciclo de vida, que vem sendo utilizados para guiar/orientar a realização das atividades de curadoria digital, que explicitam, mesmo que de forma superficial, uma etapa de planejamento. Modelos tais como o JISC - Joint information systems committee model (BEAGRIE, 2004); Digital Curation Lifecycle Model do Digital Curation Centre (DCC, c2004-2020); DCC&U – Extended digital curation lifecycle model (CONSTATOUPOULOS et al., 2009); UK Data Archive Data Lifecycle (2010) e DataOne Data Lifecycle (2012). Além do Open Archival Information System – OAIS, o qual foi tomado como base pela maioria dos modelos de ciclo de vida, e que tem o planejamento da preservação (preservation planning) como um dos seus elementos (LAVOIE, 2014).

Observa-se que “os modelos são estruturalmente desiguais quanto a sua complexidade e detalhamento, no entanto desempenham funções similares quando se trata de procedimentos curatoriais” (SILVA; SIEBRA, 2017). E, apesar do planejamento dever ser tomado como um pré-requisito para o gerenciamento e administração da curadoria e preservação de objetos digitais, para garantir a longevidade dos objetos, sua autenticidade e que eles permaneçam acessíveis a longo prazo, nem todos os modelos detalham essa etapa, como será visto posteriormente neste artigo. Porém, antes, na seção a seguir, serão definidos conceitos básicos sobre planejamento.

3 NOÇÕES BÁSICAS SOBRE PLANEJAMENTO

O planejamento é definido como um processo que considera os objetivos e os recursos, visando alcançar uma situação desejada, da maneira mais eficiente e efetiva (MAXIMINIANO, 2010; OLIVEIRA, 2018). Ele deve nortear a organização para seguir o rumo traçado, de forma a buscar uma situação almejada, diferente da atual, empregando todo o potencial disponível (OLIVEIRA, 2018).

Para Chiavenato (2014), o planejamento possibilita a definição dos objetivos organizacionais em função dos recursos necessários para alcançá-los, de maneira eficaz. De fato, o planejamento auxilia na organização de um projeto, principalmente “na seleção e adoção da política, dos procedimentos, dos meios e dos métodos necessários para alcançar os objetivos previamente definidos”. (CHIAVENATO, 2014, p.105). Por isso mesmo, o planejamento deve ser tido como a primeira etapa de qualquer projeto e, se bem realizado, pode auxiliar na redução dos riscos e desafios a serem superados.

De acordo com Maximiano (2010), o processo de planejamento compreende três etapas: análise, avaliação de opções e seleção do curso da ação, onde cada uma delas requer decisões dos responsáveis pelo planejamento. E fatores como a disponibilidade de informações sobre cenários, contexto, produtos, equipes, recursos irão influenciar as decisões a serem tomadas. Logo, a fim de realizar o planejamento, é preciso ter informações sobre o projeto a ser realizado e o conhecimento de técnicas e modelos de planejamento em si. É preciso projetar cenários futuros e registrar como agir em cada um deles, considerando ameaças, oportunidades e riscos. Por fim, o processo de planejamento em si pode ser realizado e decisões poderão ser tomadas e registradas em planos que devem englobar desde os objetivos do projeto em si, até questões relacionadas à infraestrutura, à adoção de padrões, recursos financeiros e humanos, assim como a especificações de critérios de avaliação do projeto, para ver o quanto o planejamento foi efetivo ou não.

Além disso, é importante frisar que um processo de planejamento adequado deve prever treinamentos necessários e a disponibilização de ajuda técnica aos profissionais envolvidos, além de fomentar debates na organização para ajustar o ambiente ao desenvolvimento do trabalho, de forma adequada e produtiva. Adicionalmente, destaca-se que todas as definições e decisões tomadas devem ser documentadas, pois “a documentação é parte do planejamento” (ICPSR, 2005, p.5).

A aplicação de um modelo/ciclo de curadoria pode ser considerado um projeto dentro das instituições e, como tal, requer planejamento. E este planejamento deve atender aos objetivos da instituição/organização; às políticas nela existentes; aos recursos e tempo disponíveis e às especificidades dos acervos a serem curados (ex: tipo de material, público alvo, etc). Só assim o projeto de curadoria poderá ser implementado de forma eficiente e com o mínimo de imprevistos.

4 METODOLOGIA

De caráter qualitativa, se caracteriza quanto aos fins como descritiva e quanto aos meios como bibliográfica (MICHEL, 2015). O levantamento bibliográfico na pesquisa descritiva cria o conhecimento necessário para realizar o estudo, ao se propor a verificar e explicar problemas e fatos da vida real, observar e fazer relações e conexões à luz da influência que o ambiente exerce sobre estes problemas e fatos (MICHEL, 2015).

Para o levantamento bibliográfico, foram utilizadas as bases de dados: BRAPCI (para ter um panorama do contexto nacional) e SCOPUS (para um panorama estrangeiro) com a delimitação de período temporal de 2008 a 2020, e o tipo de documento artigo, anais de evento, livro e capítulo de livro. Também foram consultados livros internacionais que abordavam a temática pesquisada, adquiridos em formato de ebook. Foram utilizados os termos de busca planejamento e curadoria digital e, também, planejamento e preservação digital, em inglês e em português.

Os materiais que se mostraram alinhados com a temática de pesquisa foram selecionados, conforme pode ser visto no Quadro 1, a partir da leitura do título, resumo (abstract), palavras chaves e, algumas vezes, da introdução do artigo (se o resumo não era informativo o suficiente).

Quadro 1 – Artigos Recuperados no Levantamento Bibliográfico

Termos

SCOPUS

BRAPCI

Recuperados

Selecionados

Recuperados

Selecionados

Digital curation and Planning

23

9

1

1

Curadoria Digital e Planejamento

2

0

4

3

Digital Preservation and Planning

1

1

0

0

Preservação Digital e Planejamento

2

0

17

5

Fonte: Dados da Pesquisa, 2020

Na SCOPUS, os nove artigos selecionados abordavam o planejamento de maneiras diversificadas: planejamento em curadoria digital, planejamento em gerenciamento de dados, planejamento da custodia de dados e planejamento dos custos para curadoria digital.

Destaca-se que na BRAPCI, os artigos selecionados em português para os termos curadoria digital e planejamento exploram o planejamento de maneira muito breve e superficial. Os termos preservação e planejamento em português recuperaram 17 artigos, porém três já estavam na busca anterior e um estava representado duas vezes na base. Assim, dos 13 restantes apenas 5 se relacionavam à temática. O uso dos termos em inglês trouxe apenas um artigo diferentes dos que já haviam sido recuperados.

Os materiais selecionados foram lidos na íntegra. O levantamento bibliográfico e as leituras foram realizados no período de setembro a outubro/2020. Adicionalmente, foi realizada uma análise documental em manuais, guias, normativas e planos de preservação digital para complementar o embasamento teórico desta pesquisa. A partir de todas as informações levantadas, foram definidos elementos a serem contemplados no planejamento de projetos de curadoria digital e foi analisada a etapa de planejamento dos modelos de ciclo de vida mais citados na literatura consultada.

5 PLANEJAMENTO NA CURADORIA DIGITAL

De acordo com Oliver e Harvey (2016), o planejamento de cada etapa de um ciclo de vida de curadoria é essencial. Isso engloba: o planejamento do que é necessário em cada etapa do ciclo; desenvolver planos de ação para todas as etapas do ciclo, assim como definir uma periodicidade para revisar e atualizar os procedimentos de curadoria planejados e as decisões que foram tomadas. De fato, o planejamento deve ser a primeira etapa de qualquer projeto de curadoria e/ou preservação digital, independente da natureza dos objetos curados (SANTOS; FLORES, 2015). Ele precisa contemplar todas as atividades relacionadas à curadoria destes objetos, desde a inserção deles no processo de curadoria até a sua destinação final, abordando elementos relacionados à gestão, representação da informação, preservação, elaboração de políticas e normativas e às tecnologias que se façam necessárias. Além da definição de recursos financeiros e humanos (GRÁCIO, 2011), de padronizações e questões legais como as relacionadas aos direitos autorais (FERREIRA, 2006), como também a definição de critérios para seleção e avaliação dos objetos passíveis de preservação (CAVALCANTI; SALES, 2016). Adicionalmente, é importante na etapa de planejamento realizar uma análise de riscos (BARATEIRO et al., 2010; TAVARES, 2014), de forma que eles possam ser identificados e sejam definidas ações para mitigá-los. Um risco refere-se à probabilidade de ocorrência de um evento que pode conduzir a organização a um resultado desfavorável (TAVARES, 2014).

Antes de partir para o detalhamento do que deve ser abordado na etapa de Planejamento de um projeto de curadoria digital, é preciso que sejam definidos os objetos digitais que serão curados, pois o tipo dos objetos digitais (ex: documentos arquivísticos, dados de pesquisa, etc), sua quantidade e suas especificidades tem impacto direto nas decisões que precisarão ser tomadas. Também é preciso ter claramente especificados quais são os objetivos da instituição/organização com a curadoria deste objetos, além de ser importante conhecer as políticas e normativas já existentes na instituição que possam afetar o planejamento do projeto de curadoria (ex: política de informação, política de preservação digital, etc). Outro ponto que pode contribuir com o planejamento é conhecer a comunidade alvo que se beneficiará com a curadoria dos objetos, pois isso contribuirá com a melhor definição das formas de promover o acesso e uso dos objetos curados.

A seguir serão definidas as dimensões a serem contempladas no planejamento e que elas envolvem.

5.1 Dimensões do Planejamento

Nesta pesquisa as questões de planejamento foram divididas em dimensões: infraestrutura, recursos financeiros, recursos humanos, ações relacionadas com preservação, questões éticas e legais e questões relacionadas ao acesso e uso dos objetos digitais. Todas elas serão descritas a seguir.

• Infraestrutura Física – relaciona-se com o espaço físico onde o projeto de curadoria digital se desenvolverá que deve estar, a priori, longe de áreas de riscos (ex: áreas passíveis de inundação). Tanto o espaço que será ocupado pelos recursos humanos que comporão a equipe do projeto, quanto o espaço que será reservado para acomodar a infraestrutura tecnológica. Esse ambiente físico, em especial este último, deve estar sob temperaturas adequadas (uso de ar-condicionado), estar protegido contra o acesso de pessoas não autorizadas, ter instalações elétricas e de dados segundo normas estabelecidas, de forma a evitar problemas e, sempre que possível ter equipamentos extras de segurança para o ambiente tais como: detectores de fumaça, nobreaks, câmeras de monitoramento, geradores de energia e fechadura com trava elétrica ou reconhecimento por digital para restrição do acesso (GRACIO, 2011). Adicionalmente, é importante que procedimentos de manutenção sejam definidos e sua periodicidade registrada, em especial procedimentos de manutenção preventiva. Registra-se que esse é um ponto geralmente crítico, especialmente em instituições públicas.

• Infraestrutura Tecnológica – refere-se a toda a infraestrutura de hardware e software (ex: ferramentas, sistemas, scanners se for necessária a digitalização do acervo), inclusa a infraestrutura de redes de computadores e conexão com a internet, de armazenamento e para disseminação da informação (ex; repositórios digitais ou repositórios digitais confiáveis). Também, a especificação de rotinas de backup confiáveis e a especificação de mecanismos de segurança (ex: controle de acesso, uso de senhas, etc), capazes de atender às demandas técnicas necessárias para preservar os objetos digitais selecionados (GRÁCIO, 2011). Engloba a infraestrutura de preservação que visa preservar os objetos digitais e seus metadados; e a infraestrutura de acesso voltada para atender às buscas realizadas pelos usuários.

• A definição de padrões (ex: padrões de metadados, padrão de nomenclatura para os arquivos, formatos de arquivos padrão para cada tipo documental), de metodologias, de procedimentos (ex: critérios para análise e seleção de objetos para entrar no ambiente de curadoria) e de fluxos de trabalho (OLIVER; HARVEY, 2016; HARVEY, 2010). Chama-se a atenção aqui para a importância da escolha do padrão de metadados, a fim de garantir acesso e reutilização ao longo do tempo (KOWALCZYK, 2018). Realmente, o planejamento é necessário para escolher o metadado mais adequado a cada tipo específico de objeto digital e, assim, representa-lo de forma entendível, facilitando a busca pelo mesmo. (OLIVER, HARVEY, 2016). Destaca-se. Aqui, também que os formatos de arquivos utilizados devem ser formatos de arquivo abertos, uma vez que eles são mais adequados do que os fechados ou chamados formatos proprietários, porque a maneira que eles codificam o conteúdo é transparente (RIMKUS et al, 2014). Adicionalmente, ressalta-se que é preciso definir o uso de identificadores persistentes para proporcionar uma melhor encontrabilidade do objeto digital.

• A documentação dos fluxos de trabalho em cada etapa do processo de curadoria (por exemplo: qual o fluxo de trabalho para digitalizar fotografias, qual o fluxo para recebimento dos dados advindo de outros sistemas, como se deve realizar a descrição/contextualização dos objetos, ou seja, como deve ser o passo a passo destes procedimentos);

• A elaboração de políticas que incluam ou excluam a informação do ciclo de curadoria (select e appraise)

• A escolha da(s) estratégia(s) de preservação a serem adotados (ARELLANO, 2004), sua periodicidade e possíveis “gatilhos” (eventos que acabam por antecipar a aplicação de estratégias de preservação, tal como uma nova tecnologia que surge, que dispara a necessidade de mudança da mídia de armazenamento);

• A criação de templates de documentos para deixar o processo mais padronizado, (por exemplo: modelo de termo de custódia, termo de cessão de direitos autorais, entre outros).

• E, adicionalmente, riscos que podem atingir o projeto e os objetos digitais foco da curadoria devem ser mapeados, analisados e geridos, para assim, sanar os possíveis problemas que possam surgir. Para cada risco identificado deve ser mensurada a sua probabilidade de ocorrer e que medidas serão tomadas, caso ele ocorra (TAVARES, 2014).

Adicionalmente, entende-se que, após a realização de um planejamento inicial, que deve envolver além da equipe multidisciplinar do projeto de curadoria, representantes do público alvo que se beneficiará da preservação e disponibilização dos objetos digitais, é preciso descrever e acompanhar as atividades sendo implementadas. E, a partir daí, alterar e corrigir as falhas e registrar as lições aprendidas, após a execução. Também, é preciso que seja especificada uma periodicidade de reavaliação de todo o processo de curadoria e, como indica Kowalczyk (2018), documentar todas as mudanças ocorridas. Ressalta-se que a aplicação de estratégias de preservação, a mudança no licenciamento do objeto digital ou nos direitos autorais do objeto, devem ser acompanhadas da atualização dos metadados afetados por esta.

5.2 Documentos a serem produzidos

Alguns documentos orientadores são importantes de serem produzidos como resultado do planejamento, justamente porque abrangem boa parte das informações descritas na seção anterior. Aqui, destacam-se três deles.

O primeiro documento é o Plano de Preservação Digital (PPD) que é um documento estratégico que

... leva em consideração as políticas de preservação, obrigações legais, restrições organizacionais e técnicas, requisitos de usuários e objetivos de preservação e descreve o contexto da preservação, as estratégias de preservação avaliadas e a decisão resultante por uma estratégia, incluindo o raciocínio que levou a essa decisão. Também especifica uma série de etapas ou ações (chamadas de plano de ação de preservação), juntamente com responsabilidades, regras e condições para execução na coleção. Desde que as ações e sua implantação, bem como o ambiente técnico, permitam isso, esse plano de ação é uma definição de fluxo de trabalho executável. (PLANETS, 2006, p.3).

O PPD possui uma abordagem mais concreta e específica, constituindo, como já mencionado, um plano de ação a fim de garantir as condições mínimas de preservação para um determinado conjunto de objetos digitais de instituição/organização específica, levando em conta tantos as particularidades destas, quanto as especificidades dos objetos digitais sendo curados. Um guia útil para orientar a elaboração de planos de preservação digital foi elaborado pela Direção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB) (2019) e um bom exemplo de plano de preservação digital em vigor é o da Fundação Oswaldo Cruz (NASCIMENTO, 2020). Ressalta-se que a produção de um PPD deve ser o resultado de um esforço de colaboração entre a unidade orgânica responsável pela criação dos objetos digitais, profissionais da Ciência da Informação e área de Tecnologia, com a participação de representantes de todas as unidades orgânicas afetadas pelo processo de curadoria digital.

O segundo documento é um Manual, Cartilha ou Guia que oriente a descrição, representação da informação e contextualização dos objetos digitais a serem curados. Ou seja, oriente o preenchimento dos metadados de acordo com o padrão adotado para o projeto de curadoria (FORMETON, 2015) e com as especificidades dos objetos a serem curados. Metadados são informações estruturadas que descrevem, explanam, localizam, ou facilitam recuperar, usar ou gerenciar um recurso de informação (HODGE, 2000). Este documento se faz necessário para que haja uniformidade na compreensão das informações que precisam ser documentadas sobre os objetos sendo curados e o formato de preenchimento de cada elemento de metadados, de acordo com o padrão adotado. Um exemplo de documento deste tipo foi elaborado pela Fundação Oswaldo Cruz (2020).

E, por fim, no caso dos objetos digitais a serem curados serem dados de pesquisa, um documento orientador recomendado é o Plano de Gestão de Dados (PGD), que

... descreve, de uma forma geral, que dados serão processados, coletados ou gerados; quais as metodologias e padrões que serão utilizados nesses processos; se, como e sob que condições esses dados serão compartilhados e/ou tornados abertos para a comunidade de pesquisa; e como eles serão curados e preservados (SAYÃO; SALES, 2015, p. 15).

Para compreender o contexto da gestão de dados de pesquisa e iniciar os estudos neste sentido, recomenda-se o Guia de Gestão de Dados de Pesquisa para Bibliotecários e Pesquisadores (SAYÃO; SALES, 2015). Ressalta-se que todos esses documentos precisam ser atualizados periodicamente, visto que o cenário em que são utilizados é dinâmico, como já mencionado.

Adicionalmente este é um bom momento para que sejam desenvolvidas políticas e normativas para todos os aspectos do processo de curadoria digital, de forma que sejam estabelecidos, de forma não ambígua, princípios, valores, papéis e intenções. Pois, desta maneira, decisões consistentes poderão ser tomadas com base no que estiver previamente estabelecido, contribuindo com a efetividade do processo de curadoria digital (HARVEY, 2010; OLIVER; HARVEY, 2016). De fato, ter políticas vigentes relacionadas à curadoria pode contribuir para a organização desenvolver estratégias para a curadoria digital e para que sejam realizados planejamentos coerentes de programas e projetos de curadoria digital.

Apesar do conteúdo das políticas poder diferir de acordo com a missão e as necessidades de cada instituição/organização, em geral, elas estabelecem: o que é permitido e o que não é; como a política será monitorada e quem é o responsável por este monitoramento. Elas também linkam outras políticas relevantes relacionadas e estabelecem procedimentos para realização das atividades de curadoria. Por fim, a política também precisa registrar a periodicidade de revisão dela própria, pois o contexto de sua aplicação é dinâmico (o contexto tecnológico evolui, o perfil do público-alvo pode mudar, etc) e pode requerer ajustes (OLIVER; HARVEY, 2016; BRASIL, 2019). Recomendações sobre como políticas de preservação podem ser elaboradas podem ser encontradas em BRASIL (2019) e um exemplo de política de preservação é a desenvolvida pelo Arquivo Nacional (BRASIL, 2016).

5.3 A Abordagem da Etapa de Planejamento em Alguns Modelos de Curadoria Digital

Tomando como base as dimensões definidas para o planejamento, verificou-se como a etapa de planejamento vem sendo abordada em alguns do principais modelos de ciclo de vida utilizados para curadoria digital, conforme o levantamento bibliográfico realizado.

O Open Archival Information System (OAIS) (OLIVEIRA, 2012; LAVOIE, 2014) é um modelo conceitual que descreve o ambiente, os componentes funcionais e os objetos de informação associados a um sistema responsável pela preservação de longo prazo. Neste modelo, a função de Planejamento da Preservação (preservation planning) engloba o desenvolvimento de estratégias de preservação, monitoramento da tecnologia adotada e outras atividades políticas e de planejamento. Apesar de não estar definido em um único lugar todas as dimensões do planejamento, sua estrutura de pacotes e a união dos modelos que o compõe trazem diversos dos elementos daquelas dimensões como o planejamento da criação dos objetos digitais e do acesso e uso dos mesmos.

O Joint information systems committee model (JISC) foi utilizado primariamente para publicação acadêmica e resulta de algumas adaptações e simplificações do modelo OAIS (BEAGRIE, 2004). Este modelo captura o objeto digital, garante seu armazenamento local e a replicação do mesmo em um armazenamento remoto (sistema de informação distribuído confiável), possui uma etapa de planejamento da preservação e, finalmente, promove o acesso ao objeto digital curado, sempre que ele for requisitado (BEAGRIE, 2004). O modelo aborda apenas o planejamento da preservação por meio da definição de estratégias de preservação, de como serão aplicadas, com que periodicidade e quem se responsabilizará pela sua aplicação (BEAGRIE, 2004). Apesar da escolha da estratégia impactar em questões de infraestrutura e recursos humanos, essas questões não são explicitamente especificadas. De fato, o modelo descreve de forma muito sucinta a etapa.

O Modelo de Ciclo de vida do DCC (c2004-2020) foi utilizado primeiramente para dados de pesquisa, mas é considerado um modelo genérico que pode ser adaptado a qualquer contexto. Tem o objeto digital em seu centro e usa uma abordagem em forma de ciclo de vida, subdividida em três tipos de ações: para toda vida, sequenciais e ocasionais. Frisa que nem todas as ações precisam ser realizadas, dependendo do contexto da instituição/organização. No modelo do DCC a etapa de planejamento está atrelado explicitamente à ação para toda vida de planejamento da preservação, onde devem ser criados planos para o gerenciamento e administração de todas as ações envolvidas nesta etapa, a revisão dos procedimentos curatoriais, a criação de políticas públicas que assegurem o desenvolvimento do projeto de curadoria, bem como, o levantamento dos gastos necessários à aplicação do projeto e a importância da gestão dos riscos e sua aplicação para garantir acesso ao longo do tempo aos objetos digitais. Todas essas prerrogativas devem ser elucubradas antes da iniciação de um projeto de curadoria. (OLIVER, HARVEY, 2016). Além disso, nas demais ações para toda vida são realizadas definições que serão aplicadas nas ações sequenciais e, que mesmo não explicitamente descritas ou mencionadas de forma sucinta, abordam elementos de praticamente todas as dimensões de planejamento anteriormente descritas (ex: planejamento da descrição e representação dos objetos digitais e o planejamento de como fornecer o acesso à informação). Um ponto interessante destacado no modelo é a ideia de envolver a comunidade alvo no processo de curadoria, desde o planejamento. Também no modelo é definida uma ação ocasional de reavaliação, onde o planejamento pode ser revisado.

DCC&U – Extended digital curation lifecycle model (CONSTATOUPOULOS et al., 2009) - É uma extensão do modelo do DCC, que considera e valoriza a informação contextual como forma de agregar valor ao objeto digital. Além disso, nesse modelo também acrescentou-se o registro das interações entre os usuários e os recursos digitais e os efeitos dessas interações, a fim de utilizar essa informação para aprimorar a disponibilização dos objetos digitais aos usuários. (CONSTANTOPOULOS et al., 2009). Como é uma extensão do modelo do DCC, a etapa de planejamento tem as mesmas características da do DCC, acrescido do fato que é levado em conta no planejamento os feedbacks obtidos a partir do uso do ambiente de disseminação da informação, de forma que melhorias possam ser incorporadas ao processo.

O UK Data Archive Data Lifecycle (2010) foi utilizado inicialmente para dados de pesquisa e é composto por seis etapas: a criação, processamento, análise, preservação, acesso e reutilização dos dados. Este modelo apresenta o planejamento acoplado à ação de criação de dados, como uma subatividade, em paralelo com diversas outras, tais como localizar os dados existentes, coletar dados, capturar e criar metadados, entre outras. A subatividade “Planejar o gerenciamento dos dados (formatos, armazenamento, suporte, outros)” e “Compartilhamento do Planejamento” são as que diretamente mencionam o planejamento e focam, mesmo que parcialmente, no planejamento da preservação. Um possível problema do modelo é a ação ocorrer no mesmo momento em que elementos de planejamento devem ser definidos.

DataOne Data Lifecycle (2012) é utilizado para dados de pesquisa. O modelo possui oito etapas: planejar, coletar, garantir/assegurar a qualidade dos dados, descrever os dados, preservar, descobrir dados úteis, integrar esses dados e analisa-los. Na etapa Planejar é especificada a necessidade de definir quais dados serão gerenciados, qual repositório será utilizado, quanto do orçamento será destinado ao processo de curadoria, quem serão as pessoas responsáveis e pelo que estarão responsáveis e, assim, estabelecer as ações a serem colocadas em prática nas etapas seguintes (SILVA; SIEBRA, 2017). Verifica-se que o especificado nessa ação remete à criação do Plano de Gestão de Dados, condizente com a origem de aplicação do modelo, que são os dados de pesquisa. Também este modelo não aborda todas as dimensões do planejamento.

Verificou-se que os modelos de curadoria digital (SILVA; SIEBRA, 2017), talvez por terem suas bases no OAIS, focam muito mais no planejamento relacionado à preservação digital, deixando de fora a descrição explícita de questões voltadas para infraestrutura, recursos humanos e financeiros, assim como o planejamento do acesso aos dados. O que pode levar a um planejamento incompleto. Também verifica-se que, com exceção dos modelos DCC e DCC&U, não é explicitada a importância da participação da comunidade alvo no planejamento. Essa participação pode ser um diferencial, visto que a comunidade alvo pode contribuir no planejamento com a descrição e contextualização dos objetos digitais, assim como com o planejamento do acesso e uso dos mesmos.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A curadoria digital não envolve apenas questões tecnológicas, mas diversos aspectos dos quais alguns se relacionam com práticas e compromissos administrativos já presentes na maior parte das instituições/organizações, tais como a gestão de recursos humanos e financeiros, as iniciativas de transparência ativa, a gestão de documentos, entre outros (PIRES; ROCHA, 2020). Justamente devido à diversidade de elementos envolvidos em um projeto de curadoria, este precisa ser bem planejado, de modo a mitigar os riscos de problemas ocorrerem ou do projeto não ser sustentável a longo prazo. O que poderia ser um grande problema visto que, a priori, projetos de curadoria devem ser desenvolvidos “para toda a vida”, uma vez que podem existir objetos digitais que requerem preservação permanente.

Dessa forma, o planejamento pode direcionar a preparação, organização, estruturação e implementação de projetos de curadoria. Ele deve abranger questões técnicas, tecnológicas, legais e a definição dos recursos necessários (infraestrutura, humanos e financeiros), a fim de minimizar ou contornar possíveis problemas que possam se apresentar durante a implementação de projetos de curadoria. Para contribuir neste sentido, neste artigo foram apresentadas seis dimensões que devem ser exploradas no planejamento para curadoria digital, independente do tipo de objeto digital a ser curado, foram elas: infraestrutura, recursos financeiros, recursos humanos, ações relacionadas com preservação digital, questões legais e éticas e questões relacionadas ao acesso e uso dos objetos digitais. Também foram indicados documentos que devem ser produzidos durante o planejamento, a fim de orientar as equipes do projeto e foi ressaltada a importância da participação da comunidade alvo do projeto de curadoria nesta etapa, visando auxiliar nas decisões a serem tomadas (por exemplo, formas de descrição dos objetos, de disponibilização para o acesso, usos que podem ser feitos dos objetos digitais, etc). Além do fato que a comunidade alvo, em especial os produtores da informação, detém o conhecimento necessário para realizar a descrição e representação da informação, de forma a aprimorar sua recuperação e uso.

Adicionalmente foi verificado que as descrições sobre planejamento, na maioria dos modelos de curadoria digital (considerando os artigos sobre os mesmos e os sites de referência), é ainda sucinta e superficial e podem não dar apoio suficiente para a realização do planejamento por parte das instituições/organizações. Logo, é necessário que os profissionais da informação estejam aptos elaborar materiais para suprir essa lacuna e para orientar a implementação de projetos de curadoria digital.

Como trabalho em andamento estão sendo analisadas e detalhadas todas as principais etapas que existem em comum nos ciclos de curadoria, visando deixá-los mais claros e compreensíveis para quem necessite implementá-los na prática.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

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1 Docente no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. Universidade Federal de Pernambuco, Brasil. ORCID https://orcid.org/0000-0002-0078-6918. E-mail: sandra.siebra@gmail.com

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