GESTÃO E FLUXOS DE INFORMAÇÃO NA
PRODUÇÃO DE TEATRO MUSICAL1

MANAGEMENT AND INFORMATION FLOWS
IN THE PRODUCTION OF THE MUSICAL THEATER

Monnique São Paio de Azeredo Esteves Veiga2

Regina de Barros Cianconi3

RESUMO

Investiga a existência de práticas relacionadas à Gestão da Informação (GI) e Gestão do Conhecimento (GC) nos fluxos informacionais do processo de produção de espetáculos de Teatro Musical. As bases teóricas para o estudo foram constituídas pela literatura das áreas de Ciência da Informação e Artes Cênicas, abordando as temáticas de GI, GC, Produção Teatral e Teatro Musical. O campo empírico foi uma produção profissional de teatro musical de médio porte, utilizando como metodologia o acompanhamento e observação da produção desde o período de Ensaios, passando pela Montagem, até a Estreia; entrevistas com as equipes da produção e o mapeamento dos processos e fluxos de informação, com a metodologia para notação de modelagem de processos de negócios conhecida pela sigla BPMN (Business Process Model and Notation). Conclui que há a utilização de certas práticas associadas à GI e GC nos processos observados, entretanto sua execução se dá de forma intuitiva e não-coordenada. A produção teatral muito poderia se beneficiar da presença de um Gestor da Informação e da aplicação das práticas de GI e GC em seus processos.

Palavras-chave: Gestão da Informação. Gestão do Conhecimento. Mapeamento de Processos. Produção Teatral. Teatro Musical.

ABSTRACT

It investigates the existence of practices related to Information Management (IM) and Knowledge Management (KM) in the informational flows of the process of production in musical theater performances. The theoretical bases for the study were constituted by the literature of the areas of Information Science and Performing Arts, addressing the themes of IM, KM, Theater Production and Musical Theater. The empirical field was a professional production of medium-sized musical theater, using as methodology, the monitoring and observation of the production from the period of Rehearsals, through the construction and assembly of sets and props to the Premiere, interviews with the production teams and the process mapping and information flows, using the business process modeling notation methodology known by the acronym BPMN (Business Process Model and Notation). It concludes that although the use of certain practices associated with IM and KM were observed throughout the processes, the execution of such practices occurs in an intuitive and uncoordinated way. Theatrical production could greatly benefit from the presence of an Information Manager and the application of IM and KM practices in their processes.

Keywords: Knowledge Management. Information Management. Process Mapping. Theatrical Production. Musical Theater.

Artigo submetido em 24/01/2019 e aceito para publicação em 15/10/2019

1 INTRODUÇÃO

A produção teatral e as organizações de fora da indústria criativa têm semelhantes problemas mercadológicos e trabalham com o mesmo insumo fundamental para o sucesso de seus produtos: a informação. O Teatro Musical pode ser entendido como “uma forma de organização mais complexa, se comparada a outros gêneros teatrais, pois demanda mais equipamentos, mais pessoas e é caracterizado por linguagens artísticas e técnicas particulares, além de ser apresentado em temporadas maiores. ” (DUARTE, 2015, p. 271).

Todos os processos, artísticos ou não, que vão da geração ao uso da informação, precisam ser cuidadosamente gerenciados, conforme a Gestão da Informação (GI), que trata dos processos e fluxos de informação.

A execução de um espetáculo de Teatro Musical está intrinsecamente ligada às funções exercidas pelas diversas equipes de produção - iluminação, cenografia, sonoplastia, direção, elenco... - portanto, é essencial analisar o fluxo de informação entre tais equipes. No entanto, nem todas as informações geradas e utilizadas pelas equipes são registradas ou estão explicitadas de alguma forma. Assim, se faz necessário o uso de práticas que extrapolam a Gestão da Informação. É preciso utilizar princípios da Gestão do Conhecimento (GC), como a promoção de espaços (presenciais e/ou virtuais) como os que Nonaka e Konno (1998) denominam “ba”, de modo a incentivar o compartilhamento da informação e a criação do conhecimento. As soluções e modelos da GI e da GC são adaptáveis a qualquer organização e a produção de um espetáculo não se esquiva a esta regra. Assim, é possível utilizar estes conceitos e modelos para otimizar a realização de um espetáculo de Teatro Musical, evitando falhas, repetição de trabalho, desgaste interpessoal e os demais problemas que influenciam na qualidade do espetáculo desenvolvido.

Portanto, buscou-se, em uma dissertação de Mestrado, analisar o comportamento relativo à gestão de fluxos de informação em equipes de produção de Teatro Musical, procurando responder às seguintes questões: Como se estruturam os fluxos e processos de informação existentes em produções de teatro musical? E de que maneira ocorre a gestão destes fluxos e processos? Como objetivo geral, o estudo buscou compreender o funcionamento da Produção de Teatro Musical, através da identificação das principais equipes que a compõem, suas funções e o relacionamento entre elas, do mapeamento dos fluxos de informação e da identificação de atividades que possam ser caracterizadas como de Gestão da Informação e do Conhecimento. E como objetivos específicos: 1) identificar as atividades desenvolvidas na Gestão da Informação e na Gestão do Conhecimento que pudessem ser aplicadas à produção teatral; 2) identificar os papéis das equipes de produção e suas atribuições, e verificar quais deles apresentam aspectos úteis à Gestão da Informação e Gestão do Conhecimento e 3) mapear os fluxos de informação de uma produção de teatro musical.

Para tanto, a metodologia compreendeu as seguintes etapas: 1) revisão da literatura; 2) pré-levantamento do funcionamento das produções de teatro musical, através de entrevistas e palestras com profissionais expoentes da área; 3) observação participante de uma produção de teatro musical; 4) entrevistas semiestruturadas com integrantes das equipes da produção observada; 5) levantamento dos processos e mapeamento dos fluxos de informação percebidos. No presente artigo, os resultados são sintetizados, pela impossibilidade de detalhar os processos e os extensos fluxos identificados.

2 PROCESSOS E FLUXOS DE INFORMAÇÃO

Um processo é entendido como um conjunto de atividades estruturadas e medidas que recebe uma entrada (input), adiciona valor a ela e fornece uma saída (output) a um cliente ou mercado específico, onde tanto os inputs quanto os outputs - ou resultados- em questão podem consistir em bens e serviços concretos, físicos, ou de produtos da informação, ou mesmo de uma combinação dos dois. (GONÇALVES, 2000a; DAVENPORT, 1994).

Ao observar um processo, é preciso estar atento ao relacionamento entre suas atividades, ao fluir das ações, ou seja, ao fluxo do processo. Para melhor compreender o funcionamento deste fluxo, o processo, que é composto de várias atividades, pode ser dividido em subgrupos de processos com um mesmo objetivo final. Assim, os processos gerais são denominados macroprocessos, contendo diversos subprocessos, que são ligados aos demais através de suas entradas e saídas. A abordagem Business Process Management (BPM), utilizada neste estudo, emprega os termos Processo, Subprocesso e Tarefa. (MARANHÃO; MACIEIRA, 2004, p. 65).

Gonçalves (2000a) classifica os processos organizacionais em três categorias básicas. São elas: Processos de Negócio (ou de cliente), Processos Organizacionais e Processos Gerenciais. Os primeiros, Processos de Negócio, estão ligados à atuação da organização, dando origem aos produtos ou serviços propriamente recebidos pelos clientes. Os segundos, Processos Organizacionais, servem como apoio para os processos produtivos (são responsáveis por suprimento de materiais, por exemplo). Já os Processos Gerenciais incluem as ações e tomadas de decisão por parte dos gerentes para dar suporte aos processos de negócios.

Fazendo uma analogia, é possível classificar o universo teatral da seguinte maneira: considera-se o Espetáculo encenado como o produto final da organização - a Produtora Teatral. Os processos de negócios seriam aqueles que envolvem a realização do espetáculo: os ensaios, a montagem e as temporadas; os processos organizacionais seriam compostos pela confecção de figurinos, cenários, iluminação, sonoplastia e demais aparatos materiais que apoiam a cena; e os processos gerenciais seriam os formados pelas tomadas de decisão dos produtores, diretores e demais responsáveis quanto às escolhas - tanto criativas quanto técnicas- que dão forma aos demais processos, como seleção de elenco (casting), direcionamento criativo, estilo, técnicas aplicadas, além dos demais processos administrativos, de recursos humanos e financeiros.

Analisar os processos organizacionais implica identificar as diversas dimensões desses processos, como: “fluxo (volume por unidade de tempo), sequência das atividades, esperas e duração do ciclo, dados e informações, pessoas envolvidas, relações e dependências entre as partes comprometidas no funcionamento do processo.” (GONÇALVES, 2000b p.10).

Percebe-se a necessidade de identificar os fluxos de informação, assim como os responsáveis por cada tarefa a ser executada. Ou seja, a elaboração do mapeamento do funcionamento dos processos é fundamental para melhor compreender os seus fluxos e planejar o aperfeiçoamento de sua execução.

2.1 Fluxos de informação

Um fluxo de informação é definido por Barreto (1998, p. 122) como “uma sucessão de eventos de um processo de mediação entre a geração da informação por uma fonte emissora e a aceitação da informação pela entidade receptora”. É a partir dele que se dá o compartilhamento de informações em um determinado espaço de tempo, pois o fluxo informacional é o processo responsável pela transmissão de informações de um emissor para um receptor. (ALTÍSSIMO, 2009; ARAÚJO, INOMATA e RADOS, 2014).

Os fluxos informacionais, conforme Valentim (2008), podem ser divididos em dois tipos: fluxos formais do ambiente organizacional, ou seja, aquilo que está sistematizado, formalizado, explicitado em qualquer tipo de suporte (eletrônico, digital, papel etc.), e os fluxos informais, o que não está explicitado, formalizado, registrado (cultura, comunicação, comportamento, aprendizagem, valores, práticas, etc.).

Existem diversos modelos de mapeamento do ciclo informacional abordando diferentes aspectos dos processos e fluxos de informação a serem analisados. Devido às características específicas do escopo da pesquisa, envolvendo os processos realizados em produções culturais, foram selecionados para os fins desta investigação alguns modelos observados como os mais adequados à análise e mapeamento dos fluxos informacionais da Produção em Teatro Musical. Foram estes os modelos de Lesca e Almeida (1994), Davenport e Prusak (1998) e Choo (2003), acrescentando-se alguns aspectos da visão de Beal (2007).

No modelo de Lesca e Almeida (1994) a informação organizacional tem três tipos de fluxo de informação: 1) Coletado externamente e utilizado pela organização, 2) Produzido e utilizado internamente, e 3) Produzido pela organização e destinado ao mercado externo (clientes, fornecedores e concorrentes).

Davenport e Prusak (1998) compuseram seu modelo com quatro fases dispostas de maneira linear e sequencial. São elas: Determinação das exigências informacionais (define qual informação é necessária para qual finalidade); Obtenção da informação (inclui estratégias de busca e implantação); Distribuição da informação (considera os problemas informacionais e as barreiras ao fluxo); e Utilização da informação (recebimento da informação e seu uso na resolução de problemas).

Choo, em seu Modelo Processual de Gestão da Informação, acrescenta mais duas etapas entre a Obtenção e a Distribuição da informação, além de posicionar as atividades em um sistema de retroalimentação, descrevendo “um ciclo contínuo de seis atividades estreitamente ligadas: identificação das necessidades de informação, aquisição de informação, organização e armazenamento de informação, desenvolvimento de produtos e serviços de informação, distribuição de informação, utilização de informação” (CHOO, 2003, p. 58).

A Aquisição da Informação envolve avaliar constantemente as fontes e serviços de informação consultados no processo, bem como buscar novas fontes, sendo “ativada pelas necessidades de informação e deve responder a essas necessidades de forma adequada.” (CHOO, 2003, p. 58).

A etapa de Organização e Armazenamento da Informação tem por objetivo “criar uma memória organizacional que seja o repositório ativo da maior parte do conhecimento e perícia da organização.”(CHOO, 2003, p. 59). Para isso, o autor sugere a estruturação dos dados produzidos e recolhidos, organizando-os de forma que reflitam os interesses e modos de utilização da informação pela organização e seus membros.

A atividade Serviços e Produtos de Informação é responsável por ‘empacotar’ a informação adquirida e a informação proveniente da memória em diferentes níveis, dirigidos aos diferentes grupos de usuários, conforme as necessidades de informação da organização. Na realidade do Teatro Musical, um Diretor Musical poderia adquirir a versão em áudio de uma música e escrever a partitura para entregar aos instrumentistas, ou ao contrário, gravar em áudio o conteúdo de uma partitura para atores que não saibam realizar leitura musical, por exemplo.

A Distribuição da Informação tem como objetivo aumentar a disseminação de informação, pois uma distribuição ampla de informação catalisa a aprendizagem organizacional.

Por fim, a Utilização da Informação “destina-se à criação e aplicação de conhecimento através de processos de interpretação e decisão.” (CHOO, 2003, p. 59).

O modelo de Beal (2007) acrescenta uma preocupação que pode passar despercebida nos outros modelos: a destinação final da informação após o uso, que é o Armazenamento ou Descarte. A autora também utiliza o termo Tratamento ao invés de Organização da informação na terceira etapa, e desmembra o Armazenamento que, no modelo de Choo, faz parte da etapa de Organização. A etapa de Armazenamento visa garantir o reuso das informações em ocasiões futuras, através da representação da informação em dados registrados e da utilização de critérios que facilitem sua posterior recuperação; já o Descarte se refere ao destino das informações que deixam de ser úteis para a organização e não têm nenhum valor secundário que justifique a continuidade de sua guarda, sempre levando em consideração as normas legais, políticas operacionais e exigências internas da organização.

2.2 Mapeamento de processos informacionais

Segundo Davenport (1994), das atividades-chave para análise e melhoria de processos existentes, a primeira a ser desenvolvida é a documentação do fluxo do processo. O estudo dos fluxos, de acordo com o modelo selecionado ou desenvolvido conforme as características da organização, é conhecido como Mapeamento de Fluxos, e envolve a construção de mapas -ou fluxogramas- específicos para cada processo informacional que se deseja gerenciar.

Quanto ao processo de construção do mapeamento, Lousada e Valentim (2011, p.159) afirmam que “o mapeamento pode ser executado através da aplicação de questionários, entrevistas estruturadas ou não-estruturadas, a fim de identificar os possíveis produtores [de informação]. ”

Durante a elaboração do mapeamento, é imprescindível considerar a presença dos fluxos informacionais que permeiam os processos. “O fluxo informacional se encarrega pela troca contínua de informações entre fornecedores, clientes e pessoas envolvidas em processos no desenvolvimento de suas tarefas.” (ALTÍSSIMO, 2009, p. 129). Portanto, a atividade de mapear tais fluxos informacionais “[...] impede que as informações fiquem dispersas, divergentes, excessivas e em duplicidade.” (ALTÍSSIMO, 2009, p. 129).

Para compreender, analisar e mapear a complexidade dos fluxos, com todas as suas particularidades, existem algumas metodologias de mapeamento de processos. Neste trabalho, foi utilizada a Business Process Modeling (BPM), uma “abordagem para identificar, desenhar, executar, documentar, medir, monitorar, controlar e melhorar processos de negócio automatizados ou não para alcançar os resultados pretendidos consistentes e alinhados com as metas estratégicas de uma organização.” (CBOK, 2009. p. 30-32 apud SOBRAL 2013 p. 59). A representação gráfica foi baseada na Business Process Modeling Notation (BPMN), em que são “oferecidos recursos para mapeamento e modelagem de processos com” (SOBRAL, 2013, p. 52).

Outra metodologia utilizada, a ‘Árvore de processos’, é um instrumento em que os processos são observados em seus diferentes níveis de desdobramento - desde a floresta como um todo até cada uma das árvores - segundo o qual o mapeamento de processos é constituído das seguintes fases: 1- Delimitar o ambiente que será mapeado, composto pelo conjunto de processos objeto do mapeamento (organização/unidade/subunidade); 2- Conhecer a missão da organização/unidade/processo analisado; 3 - Elaborar a árvore de processos; 4 - Elaborar o Diagrama de Contexto (que deve conter os processos macro da Árvore de Processos); 5- Confirmar cada processo a ser analisado; 6- Levantar, pormenorizadamente, os dados sobre cada processo (ou sobre o conjunto de processos que compõem a unidade ou organização), utilizando formulário específico; 7- Identificar os fatores críticos do sucesso de cada processo e do contexto; 8- Identificar as oportunidades de melhoria de cada processo e do contexto. (MARANHÃO; MACIEIRA, 2004, p. 69).

3 O TEATRO MUSICAL

Para Dias (2015, p. 3), o Teatro Musical é um gênero híbrido que une três diferentes linguagens, cada qual com suas especificidades, necessidades e aspirações particulares, sendo elas a “linguagem teatral - texto, encenação, atuação; a linguagem musical - trilha musical, canto; a linguagem da dança - coreografia, movimentos cênicos.

É composto por uma sequência de músicas, canções e coreografias engendradas na construção de uma narrativa (GUINSBURG, 2006), e apresenta uma estrutura de cena específica, com características marcantes que envolvem: números musicais complexos, atores que dominam a dança e o canto, e cenas em que a música substitui o diálogo e tem um papel central no desenvolvimento da trama. (DEER; DAL VERA, 2013).

Além do teatro e da música, há um terceiro elemento que compõe o teatro musical: é o movimento, mais reconhecido pelo público quando representado pela dança coreografada, embora envolva muito mais do que a mera coreografia. Com esse último componente, percebe-se a figura completa do teatro musical ou, simplesmente, Musical: “Uma apresentação teatral onde o conteúdo da história é comunicado através da fala, música e movimento de forma integrada para criar um todo unificado.” (WOOLFORD, 2013, p. 15 apud OGANDO, 2016 p. 16).

Pavis (2011 p.76) afirma que o termo Produção Teatral, no contexto brasileiro, “engloba todos os procedimentos adotados para o levantamento material do espetáculo, abrangendo custos (a produção propriamente dita) e a operacionalização da encenação (contratação e administração de pessoal).” Além dos processos administrativos, o levantamento do material do espetáculo inclui o gerenciamento dos prazos e processos de confecção e montagem de cenário, figurino e demais elementos cênicos, alocação de teatro, entre outros, incluindo a mise-en-scène, ou seja “o processo de concepção e de montagem de um espetáculo que traduz ou constrói um texto, pondo-o em cena.” (AGUIAR, 2012, p. 85)

Diante da quantidade de atividades envolvidas no processo de produção, são designadas diversas equipes - ou departamentos (PIERCE, 2013) - com funções complementares, que no geral contam com especialistas na execução dos trabalhos necessários. A produção de Teatro Musical difere, nesse aspecto, de outros gêneros teatrais, como evidenciado pelo número de profissionais, investimentos e presença da tecnologia utilizada em seus projetos de som, luz, cenografia e gestão de palco.

A garantia de que o resultado do processo seja favorável para todos, principalmente para o público, está na comunicação entre as equipes. É primordial que se cuide de todos os detalhes, que todos os aspectos que fazem parte de um espetáculo tenham um responsável designado. (PIERCE, 2013).

O processo de produção engloba a criação e execução de um espetáculo, e pode ser dividido em 4 grandes etapas: Pré-produção, Ensaios - de elenco, de orquestra, técnicos e gerais, Montagem e Performance ou Temporada - as apresentações em si. (IONAZZI, 1992, p. 11; DUARTE, 2015, p. 139). É possível acrescentar ainda a Pós-Produção, ao final das apresentações, etapa que envolve os acertos de contas, destinação final dos materiais remanescentes - cenários, e figurinos, por exemplo - e demais questões administrativas.

A Pré-Produção envolve os processos: Escolha da Peça - Elaboração do Projeto - Contratação da Equipe - Escolha de elenco (Casting) - Organização dos locais e horários de ensaio. A Produção envolve: a) Ensaios - de cena, movimento e música - Ensaios Corridos (Integrando os três elementos) - Ensaios com Figurino e Cenário - Ensaios de Palco, b) Montagem de som e luz - Ensaio Técnico - Ensaio Geral, c) Temporada. Por fim, a Pós-Produção envolve os processos: Prestação de contas, Fechamento de Contratos, etc.

A Pré-Produção pode ser dividida em três partes: Pesquisa, Organização/Planejamento e Audições. A Pesquisa envolve o estudo do material e do ambiente de produção, visando o acúmulo de conhecimento essencial para o entendimento da peça e a organização necessária para realizá-la. O Planejamento e a Organização consistem da construção do quadro de trabalho para que a informação adquirida sirva de guia para o processo de produção, e as Audições consistem no processo seletivo destinado à escolha do elenco. (IONAZZI, 1992).

Pré-Produção, então, envolve diversas atividades iniciais como: escolha de texto, negociações relativas aos direitos autorais de montagem, captação de recursos variados, formação das equipes técnicas e artísticas, audições.

A Produção engloba os processos de Ensaios e Montagem, e consiste em pôr em prática planos e ações planejadas durante a pré-produção. (DUARTE, 2015, p. 111).

A fase de Ensaios se inicia durante a primeira leitura da peça, e é o período mais exigente das etapas da produção de um espetáculo. A presença de cronogramas definidos de ensaio e a manutenção de uma rotina consistente durante esse período são fatores cruciais para uma execução bem-sucedida quando for o momento de realizar as performances de fato. (IONAZZI, 1992).

O período de Montagem consiste da montagem propriamente dita da aparelhagem técnica necessária para a execução do espetáculo: aparatos de iluminação, sonoplastia, cenário e demais acessórios técnicos que precisam ser previamente preparados no espaço cênico.

A culminância destes processos se dá no período da Temporada, em que todos os trabalhos realizados são postos à prova, sendo apresentados ao seu cliente final: a plateia. Desta interação podem advir mudanças tanto da Direção quanto das demais equipes, em especial as técnicas, que dependem também da reação da plateia para avaliar o bom funcionamento de suas atividades.

Por fim, acontece a Pós-Produção, que por sua vez não interfere no trabalho primário do espetáculo, mas é quando são realizadas as funções administrativas essenciais para o cumprimento dos requisitos legais, de apoios e patrocínios e prestações de conta que se fizerem necessários.

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa se configurou como qualitativa, exploratória, cujo objeto foi uma produção de teatro musical brasileira de médio porte. Os instrumentos metodológicos foram:

Levantamento bibliográfico sobre as teorias de Gestão da Informação e do Conhecimento, Cultura Informacional e Processos e Fluxos de informação, bem como os conceitos, origens e evolução no Teatro Musical, enquanto gênero artístico no Brasil, bem como as teorias utilizadas na produção de espetáculos, em busca de modelos de funcionamento e administração da produção teatral que incluíssem aspectos de gestão de fluxos de informação, preferencialmente aplicados a peças de Teatro Musical.

Foram utilizadas, além de fontes da produção acadêmica da área de produção teatral, fontes adicionais para complementação do resultado, devido à escassez de produção científica no âmbito da produção de Teatro Musical, como artigos jornalísticos, palestras e entrevistas - tanto publicadas na mídia quanto conduzidas pessoalmente, na forma de entrevistas realizadas exclusivamente para os fins deste estudo, contendo relatos de experiência de produtores e demais membros de produções reconhecidas no meio artístico e representativas da realidade de teatro musical brasileiro.

Foi realizado ainda um estudo empírico, de investigação do fluxo de informações, que foi conduzido em uma produção carioca profissional de teatro musical, realizada por uma produtora que tem, em seu histórico, a realização de outros espetáculos musicais e, em sua equipe, profissionais especializados neste gênero de empreendimento cultural. Teve como métodos de coleta de dados: observação participante e entrevistas semiestruturadas aplicadas aos membros das equipes de produção da referida peça, que tiveram seus nomes substituídos pelo cargo exercido na produção estudada. Propositalmente o espetáculo e suas equipes não foram identificados por questão ética e de respeito à privacidade.

A observação se deu a partir do acompanhamento dos processos desenvolvidos pelas equipes de Direção (Direção Cênica, Direção Musical e Direção de Movimento), Figurino, Cenário e Adereços, Iluminação, Design e Operação de Som e Elenco. Tal acompanhamento ocorreu durante o período de Ensaios, Montagem e início da Temporada, e teve duração de aproximadamente 2 meses e meio, abarcando desde o início dos ensaios do espetáculo até a sua estreia, perpassando pela construção dos elementos e acessórios cênicos, ensaios e apontamentos da direção e elenco, e pela montagem dos elementos de cenário, equipamentos de som e iluminação.

Foram analisados apenas os fluxos informacionais presentes nas etapas de Produção e Montagem, devido à duração estendida e à incerteza que envolvem a pré-produção. A Temporada em geral tende a repetir - com pouquíssimas alterações - o mesmo esquema de fluxo informacional observado na estreia, e a pós-produção não depende mais de todas as equipes de produção, sendo geralmente executada pelos produtores e assistentes de produção, após o desligamento das demais equipes.

Para coleta dos dados foi utilizada ainda a elaboração de Diário de Campo, e o preenchimento de Formulário de Mapeamento de Processos, seguido da validação, pelos entrevistados, da descrição dos processos mapeados. Como resultado da análise e tratamento do material empírico e documental coletado, ou seja, dos dados obtidos durante as entrevistas e a observação, foi elaborado mapeamento representativo do funcionamento do processo de fluxo informacional da produção de teatro musical em questão, elencando as pessoas e seus cargos - vinculados às suas funções em cada equipe - responsáveis pela manutenção e gerenciamento dos fluxos informacionais.

Foram adotadas como base para o mapeamento dos processos informacionais as etapas do Ciclo da Abordagem por Processos, que consistem em: Identificar, Mapear, Modelar, Implementar, Medir/Avaliar e Melhorar os processos de trabalho. (MARANHÃO; MACIEIRA, 2004). O recorte da pesquisa foi direcionado para as duas primeiras etapas: Identificação e Mapeamento dos Processos.

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Além da revisão da literatura, a pesquisa envolveu, como previsto, o acompanhamento do processo de produção de teatro musical e o mapeamento dos processos e dos fluxos de informações da produção teatral analisada.

5.1 Acompanhamento do processo de produção

O estudo de campo consistiu no acompanhamento do processo de montagem de um espetáculo musical direcionado ao público infanto-juvenil, criado a partir da obra de um importante compositor da música popular brasileira, já falecido. O espetáculo dispôs de aproximadamente 70 minutos de duração e classificação livre. O elenco, formado por 5 atores-cantores-músicos e um instrumentista, executava todas as 26 músicas do espetáculo ao vivo. Contou com as seguintes equipes: Produção - composta por Diretor de Produção, Produtor Executivo, Assistente de Produção e Estagiário de Produção; Direção - Diretor e Assistente de Direção; Direção Musical - Diretor Musical; Direção de Movimento - Diretor de Movimento e Manipulador de Bonecos; Cenário - Cenógrafo, Assistente de Cenografia/Aderecista, Cenotécnicos, Designer de Bonecos, e Assistente de confecção de Bonecos; Figurino - Figurinista, Assistente de Figurino, Costureiros; Elenco - 5 atores multi-instrumentistas e 1 músico percussionista, Iluminação - Iluminador e Operador de Luz; Sonoplastia - Designer de Som, Operador de Som e Microfonista; Equipe de Palco - Camareiro e Contrarregra; além de equipes de Marketing, Administração, Programação Visual, do Autor do texto, contratado especificamente para a criação do roteiro do espetáculo, e alguns outros profissionais colaboradores de determinadas etapas específicas da produção.

Para analisar os processos e fluxos desta produção, foi elaborada uma árvore de processos, com base na Árvore de Processos que Maranhão e Macieira (2004, p. 14) com os principais processos envolvidos na realização de uma produção teatral e, foram descritos os processos fundamentais realizados na produção estudada, associando-os aos principais responsáveis pela sua execução, conforme a Figura 1, que é uma Árvore simplificada.

Figura 1 – Árvore de Processos de Produção de Teatro Musical

Processo Essencial

Subprocessos

Atividades/Tarefas

Produção e Apresentação de Espetáculos de Teatro Musical

Escolha do Espetáculo

Selecionar e Obter Roteiro

Adquirir direitos autorais

Contratação de Equipes

Montar Equipe de Produção

Fazer Seleção de Elenco (Casting)

 

Ensaiar elenco (Ensaios Cênicos, de Movimento e Musicais )

Ensaio de Espetáculo

Realizar Ensaios Técnicos e Gerais

Desenvolvimento de Infraestrutura Cenotécnica

Criar e Confeccionar Figurino

Criar e Confeccionar Cenário

Criar Design Iluminação

Criar Design de Som

Administração de Local, Pessoal e Finanças

Providenciar locais de ensaio e apresentações

Gerenciar finanças (pagamentos, compras, vendas de ingressos, etc)

Gerir Pessoas (atores, diretores e equipes de produção)

Divulgação do Espetáculo

Criar e Executar Campanha de marketing

Providenciar Registro Audiovisual para divulgação

Montagem do Espetáculo

Montar Cenário

Montar Som

Montar Luz

Apresentação do Espetáculo

Preparar Atores e Palco

Executar peça, com todos os aspectos artísticos, técnicos e contrarregragem

Fonte: elaborado pelo autor da pesquisa

A árvore de processos, apesar de oferecer um bom panorama dos processos envolvidos na produção teatral, não oferece espaço para associar cada tarefa aos agentes (ou atores, onforme a BMP) responsáveis por sua execução, mas serviu como base para a construção dos mapeamentos de processos e fluxos de informação.

5.2 Mapeamento dos processos

A partir das informações coletadas através das entrevistas e da observação da produção de um espetáculo, explicitadas no modelo SIPOC, foi realizado o mapeamento dos fluxos de informação, utilizando o software livre Bizagi, voltado à modelagem de processos de negócios, em conformidade com a anotação gráfica BPMN para a construção do mapeamento, baseado no modelo de fluxograma Cross-functional, em que as etapas dos processos são relacionadas diretamente aos responsáveis pela sua execução. Nem todos os processos apresentados na figura anterior foram mapeados, sendo retirados os de cunho administrativo, de marketing e os realizados no período de pré-produção. Foram apenas mapeados os processos que envolveram Ensaiar Espetáculo, Providenciar Infraestrutura Cenotécnica, Montar Espetáculo e Apresentar Espetáculo, da forma como se apresentaram na produção observada. Com isso, os processos mapeados receberam as seguintes nomenclaturas: Da Concepção de cena ao Ensaio Cênico Corrido, Da Marcação de Cenas ao Ensaio de Movimento, Da Concepção ao Ensaio de Arranjo Musical, Da Criação do Design à Operação de Som, Da Criação do Design à Operação de Luz, Da Criação à Confecção de Figurino, e Da Criação à Confecção de Cenário.

Quanto aos modelos para mapeamento dos processos e fluxos informacionais, foram selecionados: a ferramenta SIPOC (Supplier-Input-Process-Output-Consumer), retirada da metodologia Six Sigma, para montagem da visão geral do processo, e as técnicas de BPMN para a construção do mapeamento de fluxos propriamente dito, permitindo identificar os fornecedores, entradas, processamento, saídas e clientes presentes em cada processo. (MARANHÃO, MACIEIRA, 2014, p.148).

Os mapeamentos realizados envolveram 7 processos, aqui considerados fundamentais para o desenvolvimento da parte artística e técnica da produção de um espetáculo de teatro musical, nomeadamente os processos de: Ensaio Cênico, Ensaio de Movimento, Criação de Arranjo e Ensaio Musical, Concepção de Design/Operação de Luz, Concepção de Design/Operação de som, Concepção/Confecção de Cenário e Concepção/Confecção de Figurino, caracterizados pelo conjunto das atividades das equipes de Produção, Direção Cênica, Direção Musical, Direção de Movimento, Iluminação, Sonoplastia, Cenografia, Figurino e Elenco.

Os mapeamentos resultantes foram validados pelos responsáveis de cada processo, e apresentados juntamente com uma breve descrição da função exercida pelo responsável maior de cada processo, bem como das informações mais relevantes coletadas nas entrevistas e na observação feita pela pesquisadora, não sendo os fluxos aqui apresentados pela falta de espaço, porém entre os principais resultados, destacam-se:

Foi percebido, na produção observada, que os processos realizados pelas equipes destacadas - artísticas e técnicas - se dão de forma interdisciplinar, interdependente e, muitas vezes, simultânea. Destes processos depende inteiramente a realização e execução do espetáculo. Sua gestão, no entanto, ocorre de maneira intuitiva e sem uma figura claramente responsável pela coordenação e acompanhamento da totalidade dos fluxos informacionais existentes.

Apesar de grande parte das atividades realizadas e reconhecidas como de gestão informacional ter sido realizada pelo Diretor Cênico, algumas destas atividades e os registros informacionais decorrentes delas ficaram somente a cargo da diretoria ou da assistência de Produção, dos agentes responsáveis por sua realização ou das equipes que fizeram uso das informações produzidas.

É interessante observar que, apesar de a gestão da informação advogar a manutenção da memória, através do registro e armazenamento inalterado das informações construídas ao longo da produção, o teor artístico envolvido nos processos apresenta certos comportamentos que surpreendem por ser, de certa maneira, opostos ao que se esperaria. Por exemplo, o Diretor de Movimento optou por não ter nenhum registro de suas marcações em suportes tradicionais de informação, como o papel ou o audiovisual; pelo contrário, afirmou que prefere que as marcações de cena sejam registradas no ‘corpo’ do ator, ou seja, os registros são feitos unicamente através da memória corporal do elenco, ficando gravados seus movimentos devido às várias repetições durante os ensaios. Dessa forma, o movimento criado vai, aos poucos, incorporando modificações e interpretações (por vezes até mesmo inconsciente) deste corpo ao longo da duração dos ensaios e apresentações, sendo um registro mutável e vivo da informação inicialmente criada.

Essa informação que é mutável, fluida, e registrada em um suporte ‘humano’, ao invés dos mais tradicionais suportes e formatos de documentos, é por si só um campo notavelmente fértil para novas pesquisas no campo da informação e do conhecimento.

Outra questão relevante quanto ao armazenamento de documentos e à manutenção da memória teatral é o quesito que envolve o espaço físico que seria necessário para tal empreendimento. Deve esse armazenamento ser de responsabilidade de cada agente, com os registros de um espetáculo separados em pedaços entre os arquivos pessoais do Diretor, Iluminador, Sonoplasta? Ou caberia à produtora arquivar todos os documentos em sua posse? Nesse caso, por quanto tempo, e como custear tal armazenamento?

Dessa forma, pode-se dizer que algumas atividades e práticas de gestão informacional que seriam adequadas para estimular o compartilhamento do conhecimento foram observadas, mas são realizadas de forma intuitiva, orgânica, e reconhecidas meramente como atribuições do exercício de uma função de maneira ‘organizada’, oriundas da prática e de experiências anteriores - em sua maioria traumáticas- dos membros da produção. Muitas dessas experiências anteriores envolvendo atrasos, erros e inviabilidade de execução de certos aspectos do espetáculo pela perda de materiais, documentos, arquivos de mixagem de som e iluminação, dentre outros.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procurou-se investigar como se estruturam os fluxos e processos de informação existentes em produções de teatro musical e de que maneira ocorre a gestão destes fluxos e processos. Como resultado da pesquisa realizada, foi possível chegar às seguintes conclusões:

Tanto a literatura quanto a observação participante realizada na produção teatral apontaram responsáveis por atividades diretamente ligadas à Gestão de Informação, a saber: o Diretor - monitorando a comunicação entre equipes em prol da unidade do espetáculo, e organizando cronogramas de ensaio; a Produção - gerenciando cronogramas gerais e de montagem, providenciando material e locação de ensaios e apresentação e disseminando essas informações para que os membros das equipes cheguem ao lugar certo na hora certa. No entanto, apesar de existentes, essas atividades isoladas não podem ser encaradas como uma prática efetiva de Gestão da Informação, especialmente pela falta de uma figura que exerça a coordenação de tais atividades - um Gestor Informacional.

Apesar de teoricamente as funções de organização, geração de documentos e até mesmo organização e destinação dos mesmos parecerem vinculadas a quase todas as equipes da produção, atividades descritas vagamente como ‘organizar inventário’ e ‘providenciar transporte de material para dentro e fora do teatro’ não determinam, por exemplo, o padrão de informações que devem ser contidas em tal inventário a ser produzidos, nem mesmo a destinação final da informação registrada nos materiais transportados, que podem ser encarados, de certa forma, como suportes de informação.

Foi percebida a necessidade da presença de um gestor capaz de identificar, gerir e registrar os fluxos da informação produzida e compartilhada entre as equipes de produção, ainda que a função “gestão de fluxos informacionais” não esteja relacionada diretamente como responsabilidade de nenhum dos cargos existentes na literatura da produção teatral.

Foi possível identificar, dentre os cargos existentes e as funções a eles atribuídas, uma figura que, potencialmente, poderia abarcar a função de gestor de informação nas produções teatrais: o Stage Manager, figura constante nas montagens importadas, embora a maioria das produções nacionais não aponte esse cargo como essencial para a realização de espetáculos de médio e pequeno porte.

A importância da utilização de estratégias de gestão da informação e do uso de ferramentas como o mapeamento dos processos é ressaltada pela perceptível lacuna entre a entrevista sobre as principais fontes de informação utilizadas e a descrição de seus processos de trabalho. Muitas vezes, uma troca de informação salientada por um entrevistado como essencial para o desenvolvimento de suas atividades não era sequer mencionada quando o mesmo entrevistado realizava a descrição do passo a passo de seu processo de trabalho.

Diferente do que foi observado com as atividades da Gestão da Informação, algumas práticas da Gestão do Conhecimento são realizadas de forma bastante condizente com os aspectos destacados pela literatura da Ciência da Informação, ainda que de forma intuitiva e sem a utilização dessa nomenclatura. O ambiente de produção é acolhedor e propicia, a todo momento, a socialização entre membros de equipes e formações variadas, onde a experiência e o conhecimento tácito são compartilhados de forma natural e encorajada.

O papel da produção na formação de seus membros foi percebido a partir das entrevistas, que apontaram um ponto comum entre a cultura organizacional presente nas mais variadas produções em que trabalharam anteriormente, e que também foi observado durante esta pesquisa: a produção teatral é um ambiente de compartilhamento empírico altamente propício à geração de conhecimento.

Esse comportamento é essencial, especialmente no campo do teatro musical, que tem tantos de seus profissionais ‘formados’ empiricamente, ou seja, funciona constantemente como sala de aula para todos os envolvidos no projeto, quer sejam os mais experientes, que estão sendo observados ou treinando seus auxiliares, assistentes e futuros substitutos; quer sejam os que estão aprendendo por observação, imitação e até mesmo cometendo seus próprios erros e desenvolvendo seu arsenal de conhecimento empírico que levarão consigo para as próximas produções de que participarem. Apesar de não existir um ambiente unificado em que essas pessoas construam seu conhecimento, existe claramente a socialização do conhecimento, para além figura do Diretor, que atua a todo momento como mediador das informações trocadas entre as equipes.

Durante a pesquisa, também foram observados problemas na realização de atividades que podem ser diretamente ligados à falta de um gestor cuja responsabilidade primária fosse o planejamento, monitoramento, avaliação e controle dos processos de informação e da obtenção, distribuição e uso da informação. Não existem políticas de armazenamento e recuperação da informação ao longo do processo de produção, o que acaba ocasionando barreiras ao fluxo informacional.

No levantamento bibliográfico realizado, percebeu-se que raras vezes são mencionados os desafios do armazenamento e recuperação das informações para uso imediato e corrente nas produções teatrais, ou para utilização futura, como registro documental da história da produção teatral que ali se realizou. Entretanto, a necessidade do armazenamento e a importância da disponibilidade das informações utilizadas em um espetáculo para a realização de temporadas posteriores foi assunto unânime entre todos os entrevistados.

A revisão de literatura do campo da produção teatral aponta a crença de que, devido ao contexto sempre variável das companhias e produtoras teatrais, a formação de estruturas informais de organização impede a antecipação de problemas e o aprendizado com experiências anteriores. No entanto, a partir de trabalhos como este, que façam o esforço de acompanhar e documentar os processos da produção, analisando seus problemas e também as soluções empregadas para superá-los, pode ser desenvolvida uma memória teatral que se torne um posterior embasamento para a resolução de problemas semelhantes em outras produções, ou mesmo para o desenvolvimento de novos métodos de realizar as mesmas tarefas, antecipando problemas e evitando que os mesmos erros se repitam em novas produções.

Importante ressaltar que, devido à particularidade das produções de Teatro Musical, em que cada peça tem sua realidade de produção única, é inviável presumir a possibilidade de uma generalização do gerenciamento de processos e fluxos informacionais. Espera-se que esta pesquisa venha se juntar a muitas outras, tanto na área de Ciência da Informação, quanto nas artes cênicas, produção cultural e quantas mais puderem se perceber como parte integrante do fazer teatral e, em especial, deste gênero maravilhosamente complexo e interdisciplinar que é o Teatro Musical.

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1 Pesquisa financiada pela Capes

2 Bibliotecária Chefe da Biblioteca da Unidade Rio das Ostras. Universidade Federal Fluminente, Brasil. ORCID https://orcid.org/0000-0003-2204-2706. E-mail: monniquespa@gmail.com

3 Docente permanente no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. Universidade Federal Fluminente, Brasil. ORCID https://orcid.org/0000000279118313. E-mail: rcianconi@id.uff.br

relato de pesquisa