EXPERIÊNCIAS DE SUJEIÇÃO CRIMINAL DE JOVENS EGRESSOS DA FUNDAÇÃO DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE PERNAMBUCO (FUNASE/PE): um olhar interseccional

EXPERIENCES OF CRIMINAL SUBJECTION OF YOUNG EX INTERNEES OF THE SOCIO-EDUCATIVE ATTENDANCE FOUNDATION OF PERNAMBUCO (FUNASE/PE):  an intersectional perspective

 

Elãine dos Santos Dias da Silva *

 

DOI: https://doi.org/10.46906/caos.n31.67597.p45-69

 

  

 

Resumo

Neste artigo, é proposta uma abordagem interseccional para analisar a experiência de jovens egressos da Fundação de Atendimento Socioeducativo (FUNASE) que enfrentam a criminalização. O foco central deste estudo reside na investigação do papel que categorias como raça e classe social desempenham na criminalização e incriminação desses ex-socioeducandos da FUNASE, bem como esses fatores afetam suas vulnerabilidades. As análises das narrativas apresentadas baseiam-se em entrevistas em profundidade realizadas com jovens egressos do sistema socioeducativo de Pernambuco, fruto da minha dissertação de mestrado (SILVA, 2022). A abordagem interseccional permitiu o reconhecimento das desigualdades estruturais que moldam a incriminação desses jovens, contribuindo para a perpetuação de estereótipos e preconceitos, ajudando, assim,  a compreender a complexidade e interconexão dos sistemas de opressão presentes na sujeição criminal. As observações realizadas demonstram como as complexas interações entre identidades e opressões influenciam a experiência de sujeição criminal, destacando questões, como estigmatização, obstáculos na reintegração social, dificuldades no acesso a oportunidades e direitos.

Palavras-chave: interseccionalidade; juventudes em conflito com a lei; sujeição criminal; sistema socioeducativo.

 

Abstract

This article proposes an intersectional approach to analyze the experience of young individuals who have emerged from the Fundação de Atendimento Socioeducativo (Foundation for Socioeducational Assistance) – FUNASE and their encounters with criminalization. The primary focus of this study lies in the investigation of how categories such as race and social class play a role in the criminalization and incrimination of these former socio-educational participants of FUNASE, as well as how these factors impact their vulnerabilities. The analyses of the narratives presented are based on in-depth interviews conducted — as part of my master's thesis (SILVA, 2022) — with young individuals who have left the socio-educational system in Pernambuco. Thus, the experiences of these young individuals are examined to unveil the complex ways in which identities and oppressions intersect and shape their experiences of criminal subjection, shedding light on issues such as stigmatization, challenges in social reintegration, difficulties in accessing opportunities and rights. Furthermore, the use of intersectionality helps us recognize the structural inequalities that influence the incrimination of these young individuals, contributing to the perpetuation of stereotypes and prejudices, as well as hindrances in accessing fundamental rights. It also aids in understanding the complexity and interconnection of oppression systems present in criminal subjection.

Keywords: intersectionality; youth in conflict with the law; criminal subjection; socioeducational system.

 

 

Introdução

 

A violência não pode ser atribuída exclusivamente a um tipo específico de crime ou infração, mas é um fenômeno complexo e socialmente construído. Ela resulta de um processo histórico de acumulação que envolve tanto as práticas criminais quanto a sua representação na sociedade. Em outras palavras, a forma como a violência urbana é retratada e compreendida está intrinsecamente ligada a condições específicas que permitem sua reprodução em larga escala, construindo, ao longo do tempo, uma “acumulação social da violência” (MISSE, 1999).

Na representação social, diferentes elementos da violência urbana se combinam, gerando sensação de insegurança e medo. Isso leva ao aumento da demanda por segurança pública e à defesa de medidas mais rígidas de punição e uso da força física contra os bandidos. Embora esses crimes não ocorram necessariamente próximos daqueles que se veem como possíveis vítimas, eles produzem um sentimento de medo e insegurança, o que os torna prioridades no combate à criminalidade.

Além disso, a associação desses crimes com a pobreza urbana reforça estereótipos e estigmatiza certos grupos, estabelecendo uma seleção social do crime que conecta violência, criminalidade e pobreza. Isso coloca determinados sujeitos sob suspeita, acusação e percepção de perigo, e gera o processo de sujeição criminal (MISSE, 2008). Essa conexão entre violência e pobreza perpetua um ciclo de criminalização que afeta de forma desproporcional indivíduos e comunidades marginalizadas.

É fundamental examinar a violência urbana não apenas do ponto de vista do crime em si, mas também compreender sua construção social e as implicações nas dinâmicas de sociabilidade, bem como seu impacto na formação das subjetividades individuais.

Este estudo tem como propósito, portanto, realizar uma análise com base interseccional que abranja as experiências de sujeição criminal do  jovens que anteriormente foram internos na Fundação de Atendimento Socioeducativo (FUNASE).

A FUNASE desempenha o papel, em Pernambuco, de promover uma política de atendimento para adolescentes submetidos a medidas socioeducativas que envolvem privação e/ou restrição de liberdade, visando garantir seus direitos fundamentais. O público atendido pela FUNASE abrange adolescentes de ambos os sexos, com idades entre 12 e 18 anos incompletos.

Para atingir os objetivos deste trabalho, utilizei um conjunto de entrevistas em profundidade, conduzidas durante o ano de 2021, que envolveram quatro jovens que passaram pela FUNASE, cujas identidades foram protegidas por meio do uso de nomes fictícios, a fim de preservar a confiabilidade e o respeito à privacidade dos participantes da pesquisa que serão mantidos em anonimato ao longo do texto.

As vozes e perspectivas dos entrevistados são cruciais para se compreender a intrincada natureza de suas vivências e explorar as maneiras pelas quais diferentes formas de opressão atuam em suas trajetórias. Esses jovens compartilharam relatos abrangentes que traçam suas histórias, desde a infância até o envolvimento em atos infracionais, passando pelas experiências durante a internação e os desafios enfrentados na reintegração à sociedade após deixarem o sistema socioeducativo. Essas questões estão interligadas a fatores estruturais de opressão, como raça e classe social (SILVA, 2022).

As narrativas desses jovens egressos fornecem uma perspectiva valiosa para compreender a intersecção de diferentes opressões e desigualdades que moldam suas experiências no sistema socioeducativo e além dele. Por meio dessas histórias individuais, é possível identificar os impactos da discriminação racial e das desvantagens socioeconômicas na trajetória desses jovens, bem como examinar como esses fatores se entrelaçam e se intensificam mutuamente.

Além disso, esses relatos permitem questionar as narrativas dominantes que estigmatizam e marginalizam esses grupos específicos, contribuindo para a reprodução de desigualdades sociais. Ao dar voz aos jovens egressos da FUNASE e compartilhar suas perspectivas e suas experiencias, que por vezes evidenciam a sujeição criminal presente em suas vivências, busca-se ampliar a compreensão sobre as complexas interações entre raça e classe social, a fim de promover uma análise mais crítica e sensível ao abordar essas questões.

Por meio dessa abordagem metodológica interseccional, espera-se contribuir com uma análise que leve em consideração as diferentes dimensões da identidade e as estruturas de opressão que afetam a vida desses jovens.

 

Sujeição criminal: as experiências dos egressos da FUNASE

 

Ao considerarmos a concepção de crime sob uma perspectiva durkheimiana, percebemos que ele é, em suma, o resultado de uma reprovação social. Em outras palavras, um ato não é considerado criminoso porque intrinsecamente ofende à consciência coletiva, mas sim porque é qualificado como tal pela própria sociedade (DURKHEIM, 2008). Por meio da tipificação dessas ações pela lei, a reprovação social é institucionalizada.

Os estudos de Becker (2008), por sua vez, tratam da noção social de desvio, revelando como ocorre o processo de rotulação de indivíduos considerados desviantes. Através das interações sociais, determinados grupos estabelecem normas para as quais a transgressão é categorizada como desvio. De acordo com Becker, assim como a concepção de crime proposta por Durkheim, o desvio não está fundamentado na qualidade intrínseca da ação em si, mas sim no resultado das sanções aplicadas ao transgressor, como resultado de uma acusação negativa por parte da sociedade em relação a esse indivíduo. Portanto, uma conduta é considerada desviante porque é definida como tal, e o indivíduo se torna desviante quando lhe é atribuído esse rótulo.

Dessa forma, tal qual a definição de Durkheim para o crime, Becker demonstra que o desvio é uma construção social, amplamente influenciada pela reprovação e pela rotulação provenientes da sociedade.[1] Através da tipificação legal e das interações sociais, a sociedade estabelece o que é considerado crime e desvio, determinando as consequências e sanções aplicadas aos transgressores.

Na perspectiva de Erving Goffman (1978), o desvio será abordado sob a forma de estigma, que se refere a um rótulo atribuído a certos indivíduos que carregam diferenças que os colocam em uma posição inferiorizada. Esse estigma impõe dificuldades adicionais para que o sujeito estigmatizado construa suas identidades pessoal e social, levando-o a desenvolver estratégias para manipular sua própria identidade. A manipulação do estigma envolve a simulação de uma normalidade que o indivíduo estigmatizado não possui, mas que pode ser adotada quando o estigma que carrega não é prontamente reconhecido.

Um aspecto relevante que emerge dos estudos sobre desvio é que nem todo indivíduo que comete um crime será rotulado como criminoso. Esse rótulo é atribuído somente a certos tipos de sujeitos, e para que isso ocorra, é essencial que haja uma reação negativa da sociedade em relação a esse indivíduo, considerando-o desviante nessa perspectiva. Sob essa lógica, fica claro que a mera existência de uma regra não garante sua imposição. Para que isso aconteça, é necessária uma acusação ou denúncia por parte dos agentes que se intitulam como detentores das regras (“empreendedores morais”) (BECKER, 2008).

Michel Misse (1999) resolveu essa questão ao diferenciar três conceitos fundamentais: “criminalização” (atribuir o status de crime a uma determinada ação), “criminação” (interpretar eventos como crimes por meio de acusações) e “incriminação” (classificar um sujeito como autor do crime). Sob essa perspectiva, tanto o desvio quanto o desviante são construções sociais baseadas em algum tipo de acusação social. O indivíduo acusado é rotulado de forma depreciativa, de modo que o crime se torna parte de sua essência e não apenas uma ação específica. Esse acusado é diferenciado negativamente em contraste com os demais sujeitos.

De acordo com Misse (1999), esse processo ocorre por meio de uma mudança na natureza da acusação, passando-se da infração para o infrator, algo que Foucault (2014) descreve como uma “passagem de lei à norma”. Isso resulta em um sistema de tipificação de um perfil social considerado suspeito, gerando assim uma subjetivação baseada na afirmação de uma personalidade transgressora do sujeito. Isto é,

 

o processo social pelo qual identidades são construídas e atribuídas para habitar adequadamente o que é representado como um “mundo à parte”, o “mundo do crime”. Há sujeição criminal quando há reprodução social de “tipos sociais” representados como criminais ou potencialmente criminais: bandidos. (MISSE, 1999, p. 71)

 

É, portanto, quando a lei age através da norma, que a punição é direcionada ao sujeito transgressor e não apenas à transgressão em si. A acusação passa a concentrar-se em meios de reafirmar o caráter transgressor desse indivíduo, rotulando-o como um ser criminal.

Há, contudo, um processo social que antecipa de forma preventiva o caminho para a incriminação. Mesmo que não haja a ocorrência de um evento que poderia ser considerado criminoso, inicia-se de maneira preventiva o processo de incriminação. Indivíduos são rotineiramente vistos como suspeitos, e, por consequência, ruas, favelas e bairros são amplamente considerados como áreas perigosas. A fixação do rótulo de criminoso em um indivíduo, a transformação de um evento possível em uma representação social do indivíduo como um criminoso em potencial, cria tipos sociais — aqueles que são preferencialmente vistos como suspeitos pelos agentes de controle social (MISSE, 2007).

A fim de compreender a dinâmica desse processo, é fundamental considerar as diversas dimensões que contribuem para a criminalização do indivíduo. Michel Misse identifica três dimensões-chave que ajudam a elucidar essa construção. Essas dimensões podem ser ilustradas pelos relatos dos jovens fictícios: Ricardo, Thiago e Fábio. Desses três indivíduos, os dois primeiros se autodeclaram negros, e Fábio se autodeclara branco, todos possuem ensino médio completo e residem em comunidades periféricas de Recife e Região Metropolitana de Recife, provenientes de origens socioeconômicas populares.

Primeiramente, há a dimensão da seleção, que envolve a escolha do agente com base em suas características pessoais, sugerindo a possibilidade futura de cometer delitos, a exemplo da fala de Fábio:

 

Tinha uns, tinha outros que tinha medo de ficar perto. Pensava que ia fazer alguma coisa, mas a maioria depois de um tempo eu consegui me enturmar, tudinho. Porque, tipo, pediam desculpa depois: “não, mano, eu pensava que vocês eram outra coisa”. Porque, tipo, ninguém vai imaginar quem é você antes de chegar pra lhe escutar. Porque, tipo, minha face mesmo, se eu botar cara feia ninguém chega perto de mim, não. Mas se eu… se a pessoa chegar pra dialogar comigo, tudinho. Eu sou um cara que quando eu não conheço, eu não sou de dar sorriso pra ninguém assim. Agora com a pessoa que eu conheço, eu já sou abertamente. Tipo, a pessoa que não me conhece vai me julgar o quê? Cara fechada. Aí, isso é que não pode. (informação verbal)[2] 

 

A segunda é a experiência que surge a partir do contato com as instituições de controle, desde a adolescência, seja em uma instituição socioeducativa ou após passar por uma prisão, como podemos observar no relato de Ricardo:

 

Não. Então, é...pra quem tá dentro também é a mesma situação. Quem chegou alí? Foi Ricardo. O cara é perigoso, o cara é errado. Então, quem tá lá dentro interno também, jovem, a pessoa que tá lá preso, eles criam isso também, a pessoa tem consideração, respeito. Entendeu? Sabe que você tem experiência. Sabe que você é vivido, que você já tem um tempo ali. Entendeu? [...] Então, tinha diferença, porque cada vez que você sai, cada vez que você é preso, cada vez que você se solta, você é mais considerado ainda. Entendeu? Então assim, a diferença é essa. A diferença é que, tipo assim, você pegar status, pegar fama, ser reconhecido: “Fulano foi preso de novo. Foi preso quantas vezes? Foi preso três. Então o cara tá envolvido. É um cara perigoso”. (informação verbal)[3]

 

A terceira dimensão compreende o autorreconhecimento, derivado da teoria do rótulo. É quando o indivíduo incorpora à sua identidade o rótulo de bandido, como evidenciado na história narrada por Thiago:

 

Uma pessoa que faz um ato desse, é se tornado, é reconhecido, tido como um bandido mesmo de verdade, e uma pessoa que faz outros ato como esse, roubar um pai de família ele é conhecido como maloqueiro. Hoje não, mas antes eu me via como bandido. (informação verbal)[4]

 

Nessa conjuntura, ocorre a internalização da visão estigmatizada atribuída à pessoa, sendo que Misse amplia essa ideia ao considerar o conceito de vulnerabilidade social. O sujeito criminal é retratado como a personificação estigmatizada do bandido, alguém corrompido e considerado incapaz de se reintegrar à sociedade. Essa visão negativa é tão enraizada que a vida do indivíduo é vista como descartável, levando à crença de que ele é intrinsecamente perigoso e irreversível. Vejamos outro exemplo por meio da experiência relatada por Thiago:

 

Quando eu me envolvi mesmo pesado, me aprofundei mesmo, que eu me considerei, que eu vi que eu tava bem e não podia mais voltar mais. Fazer tudo que era errado, tudo ao contrário. Já tava naquela linha de pensamento: como já tava tudo acabado, podia me acabar também. As pessoas também me viam como bandido, me deixava mais com ódio ainda. Quando eu passava as pessoas já não ficava no mesmo lugar, as pessoa se escondia, com medo de mim, e ali eu me sentia um bicho. (informação verbal)[5]

 

Assim, uma sensação de insegurança é gerada, composta por sinais de perigo social, que se somam a outras variáveis como pobreza, desigualdade, raça e estilo de vida, criando fantasmas e medos no cotidiano (MISSE, 1999). O medo social, fundamentado na sensação de insegurança, está relacionado a um tipo ideal de sujeito e encontra-se na diferença do Outro. Em outras palavras, se há a sensação de insegurança e medo, é porque existe algo que gera essa insegurança (a violência) e alguém que a produz (o Outro).

Principalmente, jovens negros e pobres são identificados como um tipo específico de sujeito capaz de gerar medo, sendo associados à violência e à transgressão. Essa relação articula desigualdades sociais em diversos níveis com o medo, que associa a pobreza urbana à violência, criando um perfil estereotipado do sujeito transgressor, cujo caráter é retificado como inerentemente violento.

Essas pessoas são vistas, antes de tudo, como potenciais criminosos. Não estamos lidando aqui com meras suspeitas. Trata-se de uma forma de suspeição que submete grupos de pessoas à vigilância e controle preventivo por meio do processo de criminação.

Como resultado, esses indivíduos são considerados suspeitos, gerando uma dicotomia entre “maus” e “bons”, entre quem merece viver e quem é matável. Disso decorre um processo de exclusão que nega ao indivíduo estigmatizado a plena cidadania, despojando-o de seus direitos e de sua humanidade, relegando-o a uma condição de incurabilidade e a uma “vida sem valor” (AGAMBEN, 2004). Essa desumanização possibilita que o estigmatizado esteja sujeito à tortura, humilhação e até mesmo  à exterminação, sem que isso provoque qualquer desconforto moral na consciência coletiva.

 

Trata-se de um sujeito que “carrega o crime em sua própria alma; não é alguém que comete crimes, mas que sempre cometerá crimes, um bandido, um sujeito perigoso, um sujeito irrecuperável, alguém que se pode desejar naturalmente que morra, que pode ser morto, que seja matável. No limite da sujeição criminal, o sujeito criminoso é aquele que pode ser morto. (MISSE, 2010, p.17)

 

Esses indivíduos, frequentemente, encontram-se em uma situação na qual têm dificuldade em visualizar outras opções disponíveis. Passam a interpretar suas vivências e experiências com base na ideia de que só têm duas alternativas extremas: a morte ou a prisão. Sentem-se presos em um ciclo no qual a noção de arriscar tudo se torna dominante, como se não houvesse mais nada a perder. Quando uma pessoa é colocada nessa posição, ela se torna uma espécie de vítima expiatória, como um “bode expiatório” (GIRARD, 1990), cujo sacrifício é dramatizado em rituais comemorativos, que visam uma purificação da comunidade.

A ideia mencionada anteriormente é reforçada mais uma vez na narrativa dos jovens. Fábio compartilha:

 

Então muita gente chegou pra mim: “tu não vai conseguir, tu não vai passar dos 18, tu não vai ver teus filhos crescer”. E eu tô contrariando as estatísticas, eu tô mostrando pra quem duvidou de mim, pra quem disse que eu não ia chegar[...] a maioria daqui quem era meus amigos, no passado, a maioria ou morreu, ou continua na mesma vida, tá preso. Mas a maioria tá morto, a maioria. Várias pessoas que cresceram comigo, que eu vi dentro de cadeia, que se tornaram amigos meus dentro de cadeia, quando eu vim pra rua e a gente se bateu... ou morreu, ou tá lá preso de novo. (informação verbal)[6]

 

Ricardo também acrescenta:

 

[...] como você é de uma facção, como você é do crime, a qualquer momento pode vir alguém querer matar você. E aí, se a família tiver perto, se um parente tiver perto, corre o risco. Então, o parente, o familiar não quer tá perto, pra não correr o risco também de morrer. (informação verbal)[7]

 

Thiago, em sua fala anterior, mencionou que sentia que sua única saída era matar ou morrer, e compartilhou: “Eu tive muito livramento. Passei de morrer muitas vez” (informação verbal).[8]

Cabe ressaltar ainda que a sujeição criminal não se baseia necessariamente na prática de um crime por parte do indivíduo, assim como nem todo indivíduo que comete um crime é automaticamente considerado sujeito criminal. Haja vista o que o trabalho de Grillo (2008) apontou quanto a indivíduos de classe média envolvidos no tráfico de drogas não serem percebidos como bandidos ou como traficantes, nem pelos outros, nem por si mesmos. Essa recusa em aceitar o rótulo de traficante ocorre devido à associação midiática dessa palavra com o estereótipo do bandido do morro, do qual eles fazem questão de se diferenciar. Os indivíduos de classe média envolvidos no comércio de drogas têm, assim, a vantagem de não se submeterem aos mesmos processos de sujeição criminal enfrentados pelos seus semelhantes de baixa renda.

 

[...] o jovem de classe média que se envolve com esse mercado ilegal pode até incorporar um rótulo que o estigmatiza entre seus pares, usuários de drogas ou não, ou entre os seus familiares, no entanto, lhe é oferecida a oportunidade de abandonar esse rótulo a partir de uma mera decisão de não mais traficar. O traficante “do morro”, por sua vez, assujeita-se ao rótulo, que lhe é cravado na carne e que sintetiza a sua existência numa acusação irreversível de “bandido”. (GRILLO, 2008, p. 91-92)

 

Gostaria de apresentar o caso de Samuel como exemplo, um ex-interno da FUNASE com quem conversei. Ao contrário dos demais, Samuel se identifica como branco e pertencente à classe média, além de ser oriundo do interior do estado de Pernambuco. No início de sua história, ele ressalta os privilégios aos quais teve acesso devido a sua boa educação, ter frequentado escolas particulares e ter tido acesso a bens e serviços proporcionados por sua família desde a infância. Apesar de ter cometido um ato infracional extremamente condenável socialmente, como o homicídio, Samuel constrói sua narrativa de maneira a não se sujeitar a uma imagem degradante que o rotule como bandido. Ele expressa em suas próprias palavras:  

 

eu tive meus motivos, sejam eles justificáveis ou não. Mas na verdade não são justificados, eles explicam. [...] para mim, eles explicam o porquê eu fiz isso. [...] o delegado colocou que foi motivo fútil ou torpe [...] talvez do ponto de vista dele como profissional, ele deveria colocar aquilo, mas eu não aceitava aquilo. [...] É um monte de gente que você nunca viu na vida e que falam de você, sobre você com a maior autoridade, como se conhecesse você. [...] falavam de mim “ele é altamente frio”, “ele é altamente calculista”. E tipo, eu não era frio, não era. Quem são vocês para falar quem eu sou, que eu sou calculista, que eu sou isso, que eu sou aquilo? (informação verbal)[9]

 

Além disso, a história de Samuel se destaca como um exemplo contrário à sujeição criminal, ao mesmo tempo em que confirma que a natureza estigmatizada da sujeição criminal está associada a certos tipos específicos de indivíduos. O jovem revela que, após deixar a FUNASE, conseguiu reconstruir sua vida e restabelecer sua imagem perante a família e a sociedade:

 

Eu me tornei homem do seguinte ponto de vista de responsabilidade, seja ela em trabalho, em família, sabe. Ainda não me formei, ainda, né. Parei faculdade, comecei, mas parei. Mas eu digo por toda essa visão hoje em dia, sabe. Porque graças a Deus, graças a Deus, eu sou visto assim pelas pessoas que me conhecem, a família, como um homem de responsabilidades, um homem de princípios, de conceito. Coisa que para um ex-presidiário conseguir chegar a esse nível é muito difícil. [...] eu sempre fui criado como referência. Eu sempre fui um menino mais estudioso da sala, isso porque ouvia dos outros, não porque eu me sentia. O mais bonzinho de questão de não dar muito trabalho, né, da salinha, dos amigos do bairro, era um menino que era coroinha da igreja. Então as pessoas tinham, eu acho, que uma visão de mim de santidade. O menino que desde os 6 anos aprendeu tocar teclado, e desenrolou e sempre tive muita facilidade em questão de coordenação motora. Então, sempre a minha vida toda eu fui botado lá em cima. Era o melhor nisso, o melhor naquilo, por mais que eu não fosse, mas eu era colocado como melhor. (informação verbal)[10]

 

Ao compararmos a narrativa de Samuel com a dos demais jovens, notamos que estes últimos frequentemente mencionam dificuldades financeiras, o desejo de consumir bens materiais, a falta de recursos para sustentar o uso de drogas e o acesso a amizades envolvidas em atividades criminosas. Esses aspectos são apresentados como justificativas para o cometimento de seus atos infracionais. É importante ressaltar que essas explicações estão relacionadas a situações de vulnerabilidade presentes ao longo da vida desses jovens, como a pobreza e as condições de moradia. Além disso, é possível observar que, diferentemente do caso de Samuel, que conseguiu reconstruir sua imagem sem grandes problemas, os demais jovens ainda enfrentam algum tipo de discriminação relacionada à experiência de internação. Fábio relata:

 

Fazia o curso no SENAI e era uma turma tudo de socio-reeducando, e a gente dava exemplo, querendo ou não, eu era de frente. Então, tipo, eu sei o que eu, a gente...a discriminação que a gente passava, todo mundo dizia: “oxe, óia os meninos da FUNASE e tal”. Só que a gente se punha no lugar da gente, a gente não... a gente falava com todo mundo, não vivia tirando liberdade, a gente fazia o serviço da gente. [...] Mas, tipo, ainda rola o preconceito não só de quem já passou pelo sistema. De tudo, de cor, da sua liberdade de expressão, do que você pensa, tudo é preconceito. E tipo eu sou muito julgado por quem eu era. Por quê? Porque eu era errado. Eu roubava, eu traficava, eu andava com quem matava, então eu fico... Hoje quem me vê assim diz, ainda... lembra do meu passado: “óia esse menino era tal coisa”. Nunca se esquece do passado, nem que a gente dê o exemplo no futuro, mas sempre tem um pra apontar seu passado, pra lembrar do seu passado e dizer: “óia, aquele menino ali era tal coisa”. (informação verbal)[11]

 

Thiago também compartilha sua experiência:

 

Não existe errinho, nem errão. Todos os erros são igual, né? Acha que nunca errou, que nunca teve uma falha, aí julga as pessoas, condena a pessoa pelo passado. [...] Teve algumas pessoas que me apoiaram, outras, quando soube realmente da história, ficaram meio assim, mas eu provei a ele diferente, que eu sou ser humano, eu também tenho direito de ser incruído. Ficaram meio balançado comigo. Pelo olhar eu pude identificar. [...] Tem alguns amigos que conhece a minha história e outros não conhece. Eu não conto para não, não dar aquele choque, né? Nem sempre há esse choque, mas a gente pensa da nossa parte, porque não foi uma história muito boa, né? (informação verbal)[12]

 

A construção do estereótipo criminal é sempre resultado de uma interpretação contextualizada entre os agentes envolvidos, relacionada às ações que são consideradas normais ou desviantes. Essa interpretação ocorre durante o processo e não antes dele. Incluir alguém em uma categoria legal reconhecida não é simplesmente um encaixamento direto, mas sim um complexo processo de interpretação, que também envolve poderes de definição da situação (MISSE, 2010).

No caso da sujeição criminal, esses processos são intensificados devido a um ambiente marcado por profunda desigualdade social e falta de recursos para resistir à estigmatização. Além disso, a identidade criminalizada acaba dominando todos os outros aspectos da vida do indivíduo, suprimindo suas demais características e papéis sociais.

Devemos, então, reconhecer que a classe social é uma variável de extrema importância nesse contexto. Esses estereótipos têm um impacto abrangente no sistema de justiça como um todo. Quanto mais distante dos valores da classe dominante um indivíduo se encontra, maior é sua vulnerabilidade a sofrer discriminação. Consequentemente, pessoas pobres têm mais chances de serem condenadas a penas ou medidas de internação. Para um réu pobre, sua classe social será tomada como um agravante criminal, servindo como base para a imposição de punições mais severas, conforme demonstra Adorno (1995): 

 

[...] há consenso quanto aos efeitos discriminatórios provocados pelo funcionamento das agências encarregadas de conter a criminalidade: a intimidação policial, as sanções punitivas e a maior severidade no tratamento dispensado àqueles que se encontram sob tutela e guarda nas prisões recaem preferencialmente sobre "os mais jovens, os mais pobres e os mais negros". São estes os grupos justamente desprovidos das imunidades que costumam beneficiar com menor rigor punitivo cidadãos procedentes das classes médias e elevadas da sociedade envolvidos em crimes, até mesmo em complexas organizações criminais. (ADORNO, 1995, p. 47-8)

 

Dessarte, a aplicação das leis criminais depende da posição social do indivíduo, de sua situação familiar, habitacional, ocupacional e das adversidades sociais acumuladas ao longo de sua vida (MELO, 2013).

Assim, podemos observar que a sujeição criminal é um processo complexo que envolve uma seleção social desigual no tratamento dado pela polícia a diferentes grupos sociais. Há uma clara disparidade na abordagem policial em relação a adolescentes e jovens de classes populares e negros, em comparação com aqueles de classe média alta e brancos. Essa disparidade resulta em uma maior vigilância, abordagens mais agressivas e maior propensão à criminalização por parte das autoridades policiais em relação aos grupos mais marginalizados.

Esse processo de incriminação é agravado quando o sujeito se encontra em situação de exclusão social, em que a falta de acesso a recursos, oportunidades e direitos amplia as chances de ser alvo da ação policial e da repressão. Além disso, o acúmulo de estereótipos e imagens preconcebidas, como a ideia de suspeitos habituais, contribui para a generalização de comportamentos criminais a determinados grupos sociais, perpetuando assim a sujeição criminal.

Desse modo, entende-se que a sujeição criminal é um fenômeno social complexo e multifacetado, que vai além da prática de crimes ou atos infracionais. Envolve a rotulação e estigmatização desses indivíduos como bandidos, resultando na perda de direitos, oportunidades limitadas e exposição a violências institucionais. Essa dinâmica não é estática, mas sim um processo variável no qual os indivíduos podem aceitar ou negar a identidade atribuída de bandido, porém, enfrentam obstáculos significativos devido à estigmatização social e às restrições impostas pelo sistema de justiça.

É fundamental compreender que a sujeição criminal afeta não apenas a vida dos indivíduos envolvidos no sistema de justiça, mas também sua interação com a sociedade em geral. Essa sujeição limita suas perspectivas de futuro, dificulta a reconstrução de suas vidas de maneira positiva e restringe suas oportunidades de transformação e reintegração social. Os relatos aqui apresentados das experiências dos jovens evidenciam as consequências negativas desse processo, incluindo a dificuldade em serem vistos além de seus passados criminais.

Ademais, compreende-se que a sujeição criminal não se resume apenas à culpabilização individual, mas é influenciada por fatores estruturais, como desigualdade social, discriminação racial e falta de acesso a recursos e oportunidades. De modo que certos grupos sociais, como jovens, pessoas negras, pobres e residentes de áreas periféricas, são alvos preferenciais da incriminação e do estigma, sendo mais propensos a serem rotulados como bandido.

 

Um olhar interseccional para a sujeição criminal

 

          Para uma compreensão mais abrangente da sujeição criminal, é essencial analisar as dinâmicas sociais, políticas e econômicas que contribuem para a marginalização desses sujeitos. Como mencionado anteriormente, a desigualdade social e a exclusão são fatores que alimentam a incriminação e perpetuam o ciclo de sujeição criminal. Adotar uma perspectiva interseccional como caminho metodológico para compreender como as dinâmicas da sujeição criminal se estabelecem de maneira desigual, considerando as experiências individuais dos jovens egressos, é, desse modo, um convite para se examinar as múltiplas dimensões de opressão e discriminação que afetam esses jovens, como raça, classe social, gênero e local de moradia.

Ao considerar a interseccionalidade, podemos compreender como essas identidades interagem e se cruzam, criando experiências únicas de sujeição criminal. Por exemplo, jovens negros de classe baixa podem enfrentar um maior estigma e maior vigilância policial em comparação a jovens brancos de classe média.

Destarte, nesta seção, iremos explorar a interseccionalidade como uma abordagem teórica e metodológica para compreender as experiências de sujeição criminal dos jovens egressos da FUNASE. A transição desses jovens para a vida fora da instituição apresenta diversos desafios, e a interseccionalidade se torna uma ferramenta fundamental para compreender as complexidades dessas experiências, levando em consideração as interações entre diferentes formas de opressão que podem impactar suas vidas. Isso nos permitirá reconhecer as desigualdades estruturais que influenciam a incriminação desses jovens e entender como essas dinâmicas contribuem para a reprodução de estereótipos e preconceitos, bem como para a dificuldade de acesso a direitos básicos, assim como também nos ajudará a compreender a complexidade e a interconexão dos sistemas de opressão presentes na sujeição criminal.

A interseccionalidade é uma abordagem teórica que surgiu no final da década de 1970 a partir do movimento feminista negro, que criticou o feminismo branco de classe média e heteronormativo que universalizava a mulher, negligenciando outras experiências. O termo interseccionalidade foi usado pela primeira vez em 1989 pela jurista Kimberlé Crenshaw, para abordar a interdependência das relações de poder envolvendo raça, gênero e classe. Nessa visão, esses marcadores sociais se entrelaçam e geram desigualdades, sendo representados como ruas que se cruzam em um ponto de intersecção.

          Desse modo, através da interseccionalidade, somos capazes de visualizar o encontro das estruturas e a interação simultânea das diversas dimensões identitárias (avenidas identitárias). Kimberlé Crenshaw (2002) destaca que a interseccionalidade é uma abordagem sensível que permite compreender a identidade e sua relação com o poder de forma simultânea. Essa perspectiva reconhece a complexidade das experiências individuais, levando em conta múltiplos marcadores sociais, como gênero, raça, classe e outros, que se entrelaçam e influenciam a vivência das pessoas.

 

A interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras. Além disso, a interseccionalidade trata da forma como ações e políticas específicas geram opressões que fluem ao longo de tais eixos, constituindo aspectos dinâmicos ou ativos do desempoderamento. (CRENSHAW, 2002, p. 177)

 

          Ao considerar essas interconexões, podemos compreender melhor as dinâmicas de opressão e discriminação que afetam diferentes grupos sociais, promovendo uma análise mais abrangente e inclusiva das questões relacionadas à identidade e ao poder.

A análise interseccional não se limita apenas a uma abordagem estrutural, que identifica dimensões como raça, gênero, sexualidade e opressão de classe; ela adota também uma perspectiva integrada. Através da utilização de termos como entrelaçamento,  essa análise concebe a opressão como o resultado das complexas interações entre os principais sistemas de opressão, tais como racismo, xenofobia, classismo, sexismo, que, juntos, formam uma intrincada estrutura social de desigualdade, que não atuam de maneira independente, mas de formas interconectadas, gerando um sistema de opressão que reflete o entrelaçamento de múltiplas formas de discriminação (COLLINS; BILGE, 2021).

A perspectiva interseccional é utilizada, assim, como um paradigma que nos permite compreender de forma mais precisa os fenômenos sociais, buscando analisar de modo inseparável estruturas do racismo, do capitalismo e do cisheteropatriarcado, revelando, assim, a experiência contínua do racismo que permeia a vida das pessoas e está enraizada em uma memória histórica de opressão racial, escravidão e colonização.

 

A interseccionalidade impede aforismos matemáticos hierarquizantes ou comparativos. Em vez de somar identidades, analisa-se quais condições estruturais atravessam corpos, quais posicionalidades reorientam significados subjetivos desses corpos, por serem experiências modeladas por e durante a interação das estruturas, repetidas vezes colonialistas, estabilizadas pela matriz de opressão, sob a forma de identidade. Por sua vez, a identidade não pode se abster de nenhuma das suas marcações, mesmo que nem todas, contextualmente, estejam explicitadas. (AKOTIRENE, 2019, p. 27)

 

Através do olhar interseccional, podemos observar os desafios enfrentados na política de atendimento socioeducativo, que se baseia em leis progressistas, mas é implementada por um sistema de justiça juvenil altamente seletivo e punitivo. Os dados do encarceramento nos fazem reconhecer que os indivíduos criminalizados compartilham características físicas, sociais, culturais e econômicas semelhantes, o que alimenta um processo de criminalização seletiva. Esse processo determina quais indivíduos, quando envolvidos em atos infracionais, devem ser punidos e quais merecem um tratamento diferenciado, que não envolva privação e restrição de liberdade.

De acordo com o último relatório do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente – SINASE (BRASIL, 2017), a maioria dos jovens e adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa vem de classes empobrecidas, reside nas periferias das cidades e possui baixa escolaridade. Esses dados evidenciam um problema de encarceramento seletivo. No Brasil, há mais de 26 mil jovens e adolescentes cumprindo medidas socioeducativas de restrição e privação de liberdade, sendo que a maioria é composta por adolescentes do sexo masculino, negros e provenientes de famílias de baixa renda. Os atos infracionais mais comuns estão relacionados a roubo (38,1%) e tráfico de entorpecentes (26,5%).

Ao analisar os dados específicos da população em cumprimento de medida socioeducativa de internação ou privação de liberdade na FUNASE, observamos que os números são semelhantes, conforme ilustrado nos gráficos abaixo.[13]

Pode-se entender, por meio desses dados, que o sistema socioeducativo opera dentro da lógica do encarceramento em massa, que evidencia a estratégia estatal de controle e segregação social, direcionada principalmente aos corpos jovens, negros e pobres. Essa dinâmica perpetua lógicas racistas dentro do sistema, conforme discutido por Alexander (2018) e Wacquant (2001). Com base nesses autores, podemos concluir que o racismo institucional se manifesta de forma repressiva, na qual a prisão é utilizada como uma referência para os guetos negros, considerados territórios habitados por grupos humanos inferiores e incompatíveis que precisam ser controlados.

 

Gráfico 1 – Cor/raça[14]

Gráfico, Gráfico de pizza

Fonte: Relatório anual FUNASE, 2021

 

 

Gráfico 2 – Idade e sexo

Gráfico

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Relatório anual FUNASE, 2021

 

 

Gráfico 3 – Renda Familiar (em salário-mínimo) dos internos da

Gráfico, Gráfico de barras

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Relatório anual FUNASE, 2021

 

Esta seletividade punitiva se insere no âmbito da necropolítica, conforme descrito por Mbembe (2018), atravessando e determinando as relações sociais, tendo como característica fundamental a conexão com o biopoder, de modo que a questão racial desempenha um papel crucial nessa dinâmica. Segundo Kilomba (2020), a experiência do racismo não deve ser encarada como um evento passageiro ou pontual, mas sim como um processo contínuo que atravessa a trajetória de vida do indivíduo. Essa experiência envolve uma memória histórica de opressão racial, escravidão e colonização, destacando a importância de compreender o racismo como uma realidade presente e estrutural da sociedade.

É significativo notar que, dentre os entrevistados deste estudo, dois indivíduos se autodeclararam brancos, um deles foi Samuel. Além disso, ele foi o único participante que mencionou ter vindo de uma família com condições financeiras mais privilegiadas em comparação aos demais. Esses dados ressaltam disparidades significativas nas características socioeconômicas e raciais dos entrevistados, as quais têm um impacto direto em suas experiências como ex-internos da FUNASE e nas dinâmicas de sujeição criminal que se manifestam em suas trajetórias.

Ao adotarmos uma perspectiva interseccional, percebemos que, embora Samuel tenha sido exposto às violências relacionadas a uma internação em uma instituição socioeducativa, ou seja, ao cárcere, e tenha enfrentado desafios ao sair da FUNASE, ele pôde transitar com mais facilidade nas dinâmicas sociais, valendo-se dos elementos que compõem sua identidade — ser branco e de classe média. Esses atributos, juntamente com sua imagem, linguagem e local de residência, permitiram-lhe negociar com mais tranquilidade os possíveis estigmas decorrentes de sua experiência infracional.

 

Eu tinha esse jogo de cintura dos dois lados, como se fossem duas personalidades. Mas isso é difícil, isso era cansativo, muito cansativo, porque até a sua forma de falar lá dentro com os meninos parece que você pega, as gírias, as formas de se expressar. [...] Então era uma personalidade [seu nome], era a personalidade de “ah, não sei o quê” [...]. E outra personalidade já com a coordenação, com a direção, de falar, de se expressar com as palavras corretas e não passar essa imagem, tu tá entendendo? Até para gerar o certo vínculo, certa confiança. (informação verbal)[15]

 

          Ao analisarmos a experiência de Samuel, podemos observar um aspecto relevante da interseccionalidade: a ênfase na construção social de identidades interseccionais, que podem se manifestar de maneiras diferentes em contextos diversos. No caso de Samuel, ele adaptava temporariamente sua personalidade para se relacionar de forma mais adequada com cada grupo inserido em sua dinâmica de sociabilidade. Conforme destacado por Collins e Bilge (2021, p. 211), “Em vez de uma essência fixa que a pessoa carrega de uma situação para outra, entende-se agora que as identidades individuais se aplicam de maneira diferente em diferentes contextos”.

É importante ressaltar, no entanto, que a interseccionalidade não se limita apenas a considerar múltiplas identidades, mas é uma abordagem analítica que examina as interações estruturais em seus efeitos políticos e legais. Através da interseccionalidade podemos compreender, por exemplo, como e quando os jovens negros enfrentam discriminação e são colocados em posições de desvantagem devido à intersecção de estruturas opressivas, em comparação com os jovens brancos, sem que isso implique em uma busca por hierarquizar opressões, mas sim compreender como diferentes formas de opressão se entrelaçam e afetam grupos sociais diversos de maneira desigual (AKOTIRENE, 2019).

Ao compararmos a experiência de Samuel com a de outro jovem entrevistado, Thiago, fica evidente a intersecção de raça e classe em sua trajetória e experiência de reintegração social após o cumprimento da medida socioeducativa. No entanto, destaco que as dificuldades enfrentadas por Thiago não estão relacionadas apenas à sua experiência de internação, mas também estão ligadas à sua vivência prévia, que o levou a acumular um conjunto de desafios e habilidades de enfrentamento específicos.

 

Eu fazia de tudo no trabalho pra não deixar nenhum rastro, porque convivendo onde eu tava, às vez saia uma palavra diferente, um gesto diferente [...] pra não falar uma gíria, algum gesto com a mão, o jeito de andar, como alguns faz. Hoje, graças a Deus, isso é algo que saiu da minha mente. No começo foi difícil pra mim, porque eu já tinha certa prática do passado, né? Eu tava convivendo com aquelas pessoas. Se eu não mudasse, eu não ia sair daquilo. Aí eu fui trabalhando. (informação verbal)[16]

 

Além do que já foi colocado, outro aspecto interessante a ser tratado é o fato de que Samuel se destaca entre os quatro entrevistados por sua firme recusa em aceitar qualquer estigma ou rótulo imposto a ele, rejeitando-os desde o início em sua imagem e subjetividade. Consequentemente, a experiência de sujeição criminal não faz parte da trajetória de Samuel. Embora tenha enfrentado desafios na construção de sua imagem nas relações interpessoais, essas dificuldades não estiveram relacionadas a suspeitas prévias baseadas em estereótipos de medo social. Pelo contrário, de acordo com sua narrativa, ele sempre foi bem-visto pelas pessoas e desfrutou de uma imagem positiva: “[...] as pessoas tinham, eu acho, que uma visão de mim de santidade”. Nota-se que esse jovem não carrega consigo as características que normalmente geram suspeição, de acordo com o estereótipo idealizado. Segundo sua narrativa, o ostracismo ao qual Samuel foi submetido estava estritamente ligado ao ato infracional que cometeu, conforme revelado por ele neste trecho:


Eu tinha convidado um ou outro da [nome da empresa que estava trabalhando]: um chefe meu e um supervisor para irem para audiência, para testemunharem e testificarem que eu estava indo bem, pra o juiz ver que não era conversa minha, que tinham outras pessoas falando por mim. [...] E daí, nessa audiência, rolou sobre o ato que eu cometi. E daí meu chefe lá, meu supervisor não sabiam, até então, e ficaram já cismados. [...]  E aí foi que tipo, que um medo mesmo, tudo que eu tinha construído até então foi quebrado. Então foi um processo de desconstrução de imagem de tudo, até voltar. As pessoas que falam comigo, que me abraçavam, que isso que aquilo, olhava para minha cara e, às vezes, até com raiva. Olhava assim e não falava mais. Quando eu ia falar: “Opa, fulano”, e a pessoa virava as costas. E tipo, negócio de filme, pô. [...] E passaram-se meses e meses, e muita gente se reaproximou de mim, entendeu e tal. (informação verbal)
[17]

 

Conforme descrito nas narrativas encontradas na seção anterior, os demais jovens entrevistados — Thiago, Fábio e Ricardo — enfrentaram dificuldades para romper com os estigmas negativos associados às suas imagens, e estão diretamente afetados pelo processo de sujeição criminal. Em contraste, Samuel não compartilha dessas dificuldades, pois sua narrativa revela uma experiência distinta e menos marcada pelos estigmas sociais.

A sujeição criminal revela uma seleção social que resulta em tratamentos diferenciados pela polícia e pelos amigos em relação a adolescentes e jovens provenientes de classes populares e negros, em comparação com indivíduos de classe média alta e brancos. É evidente que os indivíduos pobres e negros são alvo preferencial da ação policial e repressão (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2020)[18]. Esse processo de criminalização é intensificado quando o sujeito está inserido em níveis mais elevados de exclusão social. Conforme descrito por Misse (1999), esse processo é impulsionado pelo acúmulo ancestral de estereótipos negativos que a polícia desenvolveu ao longo dos anos, criando um conjunto de imagens estigmatizantes. Essas imagens são aplicadas a certos tipos sociais, que a polícia acredita conhecer e, portanto, pode incriminar antecipadamente, baseadas nas explicações lombrosianas sobre a existência de criminosos natos, que foi importada da Europa. Esses postulados positivistas acabaram sendo incorporados aos códigos e às leis, associando perfis raciais específicos a noções de periculosidade tanto para homens quanto para mulheres (SANTOS, 2014).

A sujeição criminal está intrinsecamente ligada à formação de um determinado tipo social, conectando-se à personalidade do indivíduo. De modo que afeta  apenas certos tipos sociais cuja morte pode ocorrer sem gerar comoção social. Essa dinâmica social tem graves consequências[19], que revelam um número alarmante de jovens negros assassinados, evidenciando a desigualdade nos índices de homicídio em relação aos jovens brancos (INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA, 2020).

A aplicação da lente da interseccionalidade ao processo de sujeição criminal enfrentado por esses jovens é viável, uma vez que:

 

Através desta articulação de raça, gênero, classe e território, em que os fracassos das políticas públicas são revertidos em fracassos individuais, ausências paternas na trajetória dos adolescentes e jovens são inevitavelmente sentenças raciais de mortes deflagradas pela suposta guerra às drogas (AKOTIRENE, 2019, p. 36).

 

As dinâmicas interseccionais presentes no sistema penal têm um impacto significativo na opressão enfrentada por jovens em conflito com a lei, especialmente quando a raça é considerada em conjunto com outras dimensões, como gênero e classe. Por essa razão, a importância dessa discussão teórica é destacada, pois chama atenção para a necessidade de se compreender as complexidades interseccionais enfrentadas pelos jovens egressos da FUNASE.

 

Conclusão

 

Ao considerar elementos como raça, classe social, gênero e local de moradia, a perspectiva interseccional revela a interação complexa e entrelaçada dessas identidades, gerando experiências singulares.

No contexto do sistema socioeducativo e da sujeição criminal, o uso de uma análise interseccional buscou nos possibilitar entender como as políticas e práticas afetam de maneira desigual os jovens egressos, levando em consideração as interações entre diferentes formas de opressão. Por exemplo, os dados apresentados mostram que jovens negros de classe baixa enfrentam maior estigma e vigilância policial e da sociedade em comparação com jovens brancos de classe média. Isso evidencia a forma como a interseção entre raça, classe e outros fatores influencia as experiências individuais de sujeição criminal dos jovens egressos da FUNASE.

Além disso, o uso da interseccionalidade buscou nos fazer reconhecer as desigualdades estruturais que influenciam a incriminação desses jovens, contribuindo para a reprodução de estereótipos e preconceitos, bem como para a dificuldade de acesso a direitos básicos. Também nos fez entender a complexidade e a interconexão dos sistemas de opressão presentes na sujeição criminal.

Contudo, é importante ressaltar que, ao analisar as experiências dos jovens egressos da FUNASE através de um olhar interseccional, não se buscou hierarquizar ou comparar as opressões, mas sim compreender como diferentes formas de opressão se entrelaçam e afetam de maneira desigual os grupos sociais aos quais esses jovens fazem parte. Adotar uma perspectiva interseccional para analisar a sujeição criminal, portanto, ajudou-nos a compreender melhor as dinâmicas de opressão e discriminação que afetam os sujeitos aqui observados, promovendo uma análise mais abrangente e inclusiva das questões relacionadas à identidade e ao poder.

Além disso, é necessário considerar que este estudo utilizou uma amostra limitada, que não se pretende representativa da diversidade de jovens em conflito com a lei na FUNASE. Portanto, futuros estudos podem se beneficiar da inclusão de análises mais amplas, a fim de contemplar qualitativa e quantitativamente as interações entre as dimensões interseccionais. A expansão da pesquisa para incluir diferentes contextos geográficos e estudos de acompanhamento a longo prazo também pode fornecer uma compreensão mais abrangente das experiências dos jovens em conflito com a lei.

 

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Recebido em: 02/08/2023.

Aceito em: 22/10/2023.

 

 



* Mestra em sociologia pela Universidade Federal da Paraíba, Brasil. E-mail: laine.s.dias@gmail.com.

[1] É importante mencionar que há uma escolha metodológica diferente na teoria de Durkheim e na de Becker: o primeiro oferece uma abordagem que considera o crime como um fato social e destaca sua função na sociedade; o segundo, por outro lado, segue um caminho metodológico distinto ao argumentar que seu objetivo não é relacionar o desvio a fatores sociais, mas sim fundamentá-lo a partir do conceito de estigma social.

[2] Trecho de entrevista realizada no dia 30 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com “Fábio”, jovem do sexo masculino, branco, 23 anos de idade.

[3] Trecho de entrevista realizada no dia 30 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com “Ricardo”, jovem do sexo masculino, pardo, 24 anos de idade.

[4] Trecho de entrevista realizada no dia 6 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com “Thiago”, jovem do sexo masculino, preto, 24 anos de idade.

[5] Trecho de entrevista realizada no dia 6 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com “Thiago”, jovem do sexo masculino, preto, de 24 anos de idade.

[6] Trecho de entrevista realizada no dia 30 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Fábio”, jovem do sexo masculino, branco, 23 anos de idade.

[7] Trecho de entrevista realizada no dia 30 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com “Ricardo”, jovem do sexo masculino, pardo, 24 anos de idade.

[8] Trecho de entrevista realizada no dia 6 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Thiago”, jovem do sexo masculino, preto, 24 anos de idade.

[9] Trecho de entrevista realizada no dia 7 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com "Samuel", jovem do sexo masculino, branco, 20 anos de idade.

[10] Idem.

[11] Trecho de entrevista realizada no dia 30 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Fábio”, jovem do sexo masculino, branco, 23 anos de idade.

[12] Trecho de entrevista realizada no dia 6 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Thiago”, jovem do sexo masculino, preto, 24 anos de idade.

[13] Mais informações em: https://www.funase.pe.gov.br/images/planejamento/Relat%C3%B3rio_Anual
_2021_compressed.pdf

[14] O critério de raça/cor estabelecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) classifica como negros aqueles que se autodeclaram pardos e pretos. No gráfico fornecido, onde se observa a categoria negros, é utilizada a equivalência para a categoria de pretos.

[15]  Trecho de entrevista realizada no dia 7 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Samuel”, jovem do sexo masculino, branco, 20 anos de idade.

[16] Trecho de entrevista realizada no dia 6 de outubro de 2021, pela autora, em Recife, com “Thiago”, jovem do sexo masculino, preto, 24 anos de idade.

[17] Trecho de entrevista realizada no dia 7 de outubro de 2021, pela autora, em Recife com, “Samuel”, jovem do sexo masculino, branco, 20 anos de idade.

[18] Nesse relatório, que tem como finalidade apresentar um amplo retrato da questão da segurança pública do Brasil a partir da coleta de dados fornecidos por fontes oficiais da Segurança Pública do país, naquilo que se refere ao uso da força por parte das polícias, demonstrou-se que, no ano de 2022, 23% das vítimas de intervenções policiais eram jovens, percentual supera à média dos demais homicídios, 76% dessas vítimas eram negras.

[19] Segundo dados do Atlas da Violência (INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA, 2020), no ano de 2019, 51,3% do total de homicídios no país foi de jovens, desses a sua maioria (77%) eram de negros.

 

 

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Desenho de um círculo

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