DIRETRIZES PARA O DESENVOLVIMENTO DE INTERFACES DE BUSCA PARA CRIANÇA

GUIDELINES FOR DEVELOPING CHILD SEARCH INTERFACES

Cristiane Lucy Rodolfo Bonfeti1

Edberto Ferneda2

RESUMO

Os estudos sobre busca e recuperação de informação destinados às crianças ainda é um tema de pouco destaque na literatura acadêmica. Na maioria dos sites destinados ao público infantil observa-se a preocupação em construir interfaces utilizando uma profusão de cores e imagens, e a restrição de acesso a conteúdo inadequado. A maneira de buscar informações ainda permanece semelhante aos mecanismos de busca para adultos. Com o desenvolvimento das tecnologias de informação e os novos métodos pedagógicos, as crianças se tornaram um grupo de usuários em rápido crescimento na Internet. Entre as diversas atividades on-line, as crianças usam mecanismos de busca da Web para coletar informações relacionadas aos seus interesses pessoais e atividades escolares. Porém, o comportamento informacional, as habilidades cognitivas e motoras das crianças são diferentes dos adultos, sendo necessário o desenvolvimento de mecanismos de busca direcionados para elas, a fim de melhor apoiá-las em suas tarefas de pesquisa. O objetivo deste trabalho é estabelecer um conjunto de diretrizes para o desenvolvimento de interface de busca e recuperação de informação destinados a um público tão diverso e heterogêneo como são as crianças. A metodologia desta pesquisa se caracteriza por ser bibliográfica e exploratória, tentando abarcar artigos de periódicos, teses, dissertação e livros que abordam aspectos cognitivos, comportamentais e pedagógicos relacionados ao uso de tecnologias por crianças.

Palavras-chave: Busca de Informação. Cognição. Interfaces.

ABSTRACT

Studies on searching and retrieving information about children are still a topic of little prominence in the academic literature. On most sites, kids are watching and worrying about creating interfaces that use a wealth of cores and images, and a restricted access to allowed content. The way you search for information still remains similar to the adult search engine. With the development of information technologies and new pedagogical methods, how children can use a fast growing user group on the Internet. Among the many online activities, how children can use the web search feature to collect information related to their personal interests and school activities. However, informational behavior, such as cognitive and motor skills of children, is different from adults, and it is necessary to develop search engines aimed at them, in order to better assist their research tasks. The aim of this paper is to define a set of guidelines for the development of the search interface and retrieval of information used in such a diverse and heterogeneous audience as children. The methodology of this research is characterized by being bibliographic and exploratory, trying to cover articles from journals, theses, dissertations and books that address cognitive, behavioral and pedagogical aspects related to the use of technologies by children.

Keywords: Information Search.Cognition. Interfaces.

Artigo recebido em 02/09/2019 e aceito em 11/11/2019

1 INTRODUÇÃO

Com o propósito de mostrar como as tecnologias Web estão atingindo o usuário infantil, GOSSEN (2015, p.1), por meio de estudo alemão denominado KIM (acrônimo para Crianças e Mídia), examina crianças com idade entre seis e 13 anos. A conclusão foi que em média 62% das crianças alemãs usam a Internet. Este número aumenta com a idade: de 21% aos seis anos para 93% aos 13 anos. Os resultados mostram que 75% das crianças usam um mecanismo de busca (por exemplo, o Google) pelo menos uma vez por semana (BEHRENS; RATHGEB, 2012).

Através desses dados é notório o crescimento do usuário infantil, princípio pelo qual merece atenção maior sobre as necessidades das crianças em encontrar o que busca, visto que a maioria dos mecanismos de busca disponíveis na Web são de propósito geral, e visam atender um público adulto, com um conhecimento linguístico mediano.

Pensando em atender um público infantil, Soares (2006) levanta alguns questionamentos sobre os atuais mecanismos de busca:

Como são desenvolvidos os softwares para esse público alvo? Eles atendem às suas necessidades? Eles são fáceis de usar? Seus conteúdos e interfaces são apropriados à idade da criança ou jovem? Atendem às expectativas da criança ou jovem? São ambientes fechados ou permitem interação entre crianças, jovens e adultos? Que tipo de participação tem a criança ou jovem no desenvolvimento dessa nova tecnologia? (SOARES, 2006, p.121).

Em busca de respostas a essas questões, o objetivo desse trabalho é fazer um levantamento sobre as experiências de pesquisadores e pedagogos a fim de delinear um conjunto de diretrizes para o desenvolvimento de interface de busca e recuperação de informação direcionados para crianças.

2 MECANISMOS DE RECUPERAÇÃO DE INFORMAÇÃO DIRECIONADOS

Em 1951, Calvin Mooers criou o termo Information Retrieval (Recuperação de Informação) e definiu os problemas a serem abordados por esta nova disciplina.

Recuperação de informação abrange os aspectos intelectuais da descrição da informação e sua especificação para a busca, e também quaisquer sistemas, técnicas ou máquinas que são utilizadas para realizar a operação. (MOOERS, 1951, p. 25, tradução nossa).

Recuperar informação consiste em selecionar entre um conjunto de documentos aqueles que satisfazem a uma determinada necessidade de informação. Em seu princípio elementar, a recuperação de informação (RI) se efetiva por meio da comparação entre as representações dos documentos de um acervo e a representação da necessidade de informação do usuário que busca por documentos que venham atender tal necessidade. Um documento é recuperado se a sua representação coincidir total ou parcialmente com a representação da necessidade do usuário.

Entre os mecanismos de RI existe os que são projetados para atender os interesses de um grupo específico de usuários, como, por exemplo, os idosos, pessoas com algum tipo de deficiência, grupo infantil, entre outros, denominado mecanismo de RI direcionado.

GOSSEN (2015, p. 22) mostra as características dos usuários para a elaboração de mecanismos de recuperação de informação direcionados (Figura 1). Essas características são demonstradas pela autora da seguinte forma:

• Idade: as habilidades cognitivas e motoras, maturidade emocional, conhecimento e interesses de um homem de cinquenta anos, um adolescente de catorze anos e uma criança de sete anos são extremamente diferentes. Portanto, algumas pesquisas visam usuários de uma faixa etária específica (crianças). Em geral, seria mais específico abordar o estágio de desenvolvimento dos usuários do que a idade, porque a idade é um indicador difuso de habilidades. No entanto, informações sobre a idade são mais fáceis de obter.

• Necessidade de informação: as necessidades de informação dos usuários podem ser diferenciadas por tipo e domínio do conhecimento (educacional, médicos). O usuário pode ter diferentes tipos de necessidades de informação. Alguns usuários querem ter uma resposta para uma pergunta concreta, porém existem usuários que estão incertos sobre suas necessidades de informação.

• Requisitos: alguns usuários estão preocupados com sua privacidade. Cooper (2008) lista tais riscos de privacidade como acidentais ou maliciosos. Portanto, surgiram mecanismos como o duckduckgo.com que não colecionam ou compartilham informações pessoais do usuário. A segurança é outro requisito. Usuários preocupados com segurança querem receber resultados de pesquisa que não contêm material nocivo, como pornografia, violência ou spam. A Google quando lançou o Kiddle estava preocupado com acesso a conteúdo inadequado na internet, fazendo uma versão de seu famoso buscador adaptada para crianças. A diferença é que o motor de buscas filtra e bloqueia qualquer conteúdo adulto, além de manter a privacidade, visto que nenhum dado pessoal é coletado durante as pesquisas.

• Especialidade: Podemos distinguir entre usuários novatos e especialistas no que diz respeito a sua experiencia em busca de informações.

• Geografia: os usuários podem ter preferências para pesquisar usando um idioma específico e para receber documentos escritos em determinado idioma

Figura 1 - Características dos usuários que podem ser direcionados pelos mecanismos de pesquisa

Fonte: Adaptado GOSSEN (2015, p. 41)

Depois de uma análise criteriosa nos mecanismos de busca direcionado, é importante estudar a ciência cognitiva, e os paradigmas de recuperação de informação infantil, para o entendimento de como elaborar uma interface que satisfaça a necessidade apresentada pelas crianças através de suas pesquisas.

3 PARADIGMAS DE RECUPERAÇÃO DE INFORMAÇÃO PARA CRIANÇAS

Um paradigma de RI infantil é um conjunto de elementos que modelam o processo de uma criança que procura por informações depois de receber uma tarefa, ou seja, uma pesquisa específica. As estratégias e a interface de pesquisa são os componentes mais importantes desse paradigma.

RI para crianças não se limita a pesquisar ou navegar nas interfaces de pesquisas existentes. MANNAK (2008) explica que a criança primeiro deve ter uma tarefa de pesquisa específica para formular uma consulta, por exemplo: que tipo de comida os pássaros pequenos mais comem? Em seguida, a criança deve conceituar essa necessidade de informação, por exemplo, pensando em uma imagem de um pardal. Após formular uma consulta, por ex. “Comida de pássaro”, um sistema de recuperação de informações tentará corresponder essa busca a documentos relevantes (Figura 2).

Figura 2 - Paradigmas de recuperação de informação para crianças

Fonte: MANNAK (2008, p. 41)

Crianças de diferentes idades terão diferentes necessidades de informação. Se fizer uma comparação entre duas crianças da mesma idade a estratégia de pesquisa será diferente entre as duas. Uma criança que se depara com uma tarefa de busca baseada em fatos adotará uma estratégia de busca diferente de uma criança trabalhando em uma tarefa de busca autodirigida. Todas essas diferentes variáveis podem ser objeto de pesquisas sobre a recuperação de informações para crianças, a fim de obter uma melhor compreensão da natureza do comportamento de pesquisa delas. Nesse sentido Mammak (2008) elabora alguns questionamentos:

Quem são eles? A RI não se refere apenas a uma criança. Para comparar diferentes “grupos” de crianças, é importante agrupar crianças com as mesmas características, de modo que os efeitos encontrados podem ser associados às diferenças nessa característica particular. As caracteristicas podem ser no estágio de desenvolvimento, idade ou experiencia com o computador.

O que eles querem? Essa questão abre um leque para outras indagações, entre elas: Quais informações as crianças estão procurando? Ou seja, qual é a necessidade de informação de uma criança? Que tipos de pergunta que eles têm? Essas questões são principalmente auto-direcionadas ou impostas externamente? As perguntas são baseadas em fatos ou em pesquisa? Qual é o objetivo deles para uma tarefa de pesquisa: explorar, aprender ou se divertir? O efeito da mudança na necessidade de informações sobre o desempenho da pesquisa pode ser examinado pela comparação de diferentes tipos de tarefa de busca em experimentos de recuperação de informação. Um exemplo disso se aplica na Figura 2.

Como as crianças conceituam suas necessidades de informação? Para formular sua necessidade de informação em um enunciado ou consulta, primeiro, as crianças têm que formar um conceito concreto em sua mente. É por isso que, em primeiro lugar, é importante saber o que as crianças pensam. Em se tratando de criança fica um detalhe importante a resolver: a criança faz uma pergunta diferente à sua mãe do que para o computador? Eles podem alcançar os mesmos níveis de abstração que os adultos? Qual o papel das cores, formas, imagens ou fala?

Como as crianças formam uma consulta? Quais são suas estratégias? Uma consulta é um comando para uma fonte ou interface para encontrar informações relevantes para satisfazer a necessidade de informações da criança. Que tipo de consultas de pesquisa elas formam: conceitos únicos, múltiplos conceitos, frases ou linguagem natural? O termo “interface” aqui tem uma compreensão ampla; pode ser uma interface digital, mas também pode ser uma interface física, como uma estante de livros em uma biblioteca ou talvez até mesmo um pai ou mãe a quem uma criança faz uma pergunta.

Que tipo de interfaces existem e como as informações podem ser oferecidas através de uma interface para suportar o comportamento de pesquisa das crianças? As estratégias de pesquisa para crianças podem ser fortemente influenciadas pela maneira como a interface de um sistema é projetada.

Como um sistema de recuperação de informações pode manipular uma consulta para localizar documentos relevantes de dentro do mundo da informação “que satisfará as necessidades de informação da criança? A interface de pesquisa serve como uma capa acessível e acessível para uma criança interagir, mas na verdade a criança está interagindo com o sistema por trás da interface. Este sistema de pesquisa é denominado sistema de Recuperação de Informações e tal sistema executa a consulta para encontrar informações relevantes. Como o sistema pode selecionar melhor documentos para crianças?

Como um sistema de RI pode apresentar documentos relevantes? Depois que um sistema de RI executa uma consulta, ele encontra resultados relevantes. É importante examinar como esses resultados podem ser apresentados para crianças: na mesma página em que a criança está pesquisando (simultânea) ou em uma nova página (sequencial). Também é importante examinar quais resultados devem ser apresentados primeiro: os resultados mais relevantes pontuando e classificando os documentos correspondentes, ou os documentos que são mais referidos pelos outros. Finalmente o autor relata que as diferenças e semelhanças entre as preferências de adultos e crianças para todos esses aspectos tem que ser examinado para ajudar a decidir o que funciona melhor para as crianças.

O que é uma pesquisa bem-sucedida e o que é relevante para o grupo-alvo? O que é “a melhor escolha”, e o que é informação relevante para uma criança? Quais critérios que uma criança usa para determinar se um resultado é relevante? Uma criança pode determinar se um resultado vem ou não de uma fonte confiável? Que tipo de resultados de pesquisa vai satisfazer? Talvez algumas crianças fiquem satisfeitas com um resultado que nem sequer é relevante.

HIRSH (1999) através de seus estudos com crianças de 10 a 11 anos de idade em uma biblioteca, responde algumas dessas perguntas de Mannak. Ela descobriu que em geral, os alunos conseguiram articular suas razões para selecionar informações relevantes, e que os critérios mudaram ao longo do tempo durante a realização de uma tarefa de pesquisa ao longo de algumas semanas. Outra observação da autora foi que os alunos não pensaram em questionar a fonte da informação, as qualificações do autor, ou a precisão dos fatos. Através desses dados ela conclui que os alunos precisam de mais instruções sobre como pesquisar e navegar além de aprender como julgar a relevância dos resultados para atender às suas necessidades de informação.

Schacter et al. (1998) realizaram algumas pesquisas com crianças executando dois tipos de tarefas de pesquisa, comparando a busca de informações na internet para ambas: tarefas bem definidas e tarefas mal definidas. Trinta e duas crianças com idade entre 10 e 12 anos participaram deste experimento. A tarefa bem definida era uma tarefa fechada (isto é, orientada por fatos) e tinha uma definição clara do objetivo para resolver a tarefa. A tarefa mal definida era a tarefa era aberta (isto é, baseada em pesquisa): tinha objetivos vagos, um grande número de restrições abertas que exigiam resolução, muitas soluções possíveis e sem instruções claras sobre quando parar de resolver o problema. Os pesquisadores descobriram que as crianças pesquisavam de forma mais eficaz a tarefa mal definida do que a bem definida. As tarefas bem definidas eram difíceis porque exigem estratégias de busca analítica altamente qualificadas. As tarefas mal definidas eram mais fáceis, porque há mais respostas em potencial.

A conclusão de SCHACTER et al. (1998) foi que tarefas de pesquisa vagamente definidas são adequadas para pesquisas na Internet. Por outro lado, para tarefas que são bem definida e altamente específicas, a Internet pode não ser o recurso mais eficiente para ajudar a necessidade de informação. Em contrapartida a Schacter et al., Bilal (2000, 2001, 2002) pesquisou crianças usando Yahooligans!, e suas descobertas revelaram que as crianças tinham mais dificuldade com o aberto.

Bilal (2000, 2001, 2002) partiu do princípio que esses achados opostos podem ser causados pelas diferenças de idade das crianças entre os dois estudos, pois no seu estudo as crianças tinham de 12 a 13 anos. Em um estudo posterior, Bilal oferece um número de sugestões para projetistas de sistemas, que “devem desenvolver mecanismos de busca poderosos e navegação que se baseiam em comportamentos cognitivos e físicos para pesquisar, navegar e explorar. Ela propõe mais instruções, exemplos de pesquisa, uma interface de linguagem natural, classificação de saída, telas simples, ajuda sensível ao contexto, com um feedback eficaz e um tutorial on-line.

Para responder as questões citadas acima com o propósito de criar interfaces adequadas para as estratégias de pesquisa das crianças, seria necessário um estudo da mente das crianças, ou seja, estudar a parte cognitiva, como dito anteriormente, entendendo o comportamento diante da situação de busca por informações.

4 COGNIÇÃO HUMANA

As concepções sobre o homem e o seu processo de aprendizagem ou desenvolvimento têm sido um fator polêmico, pois são compreendidos a partir do olhar de vários estudiosos tanto das ciências naturais e biológicas, quanto das ciências humanas e sociais. Diante disso, este trabalho propõe-se apresentar as concepções de JEAN PIAGET (1896-1980) que desenvolveu estudos psicogenéticos objetivando compreender como o ser humano conhece o mundo (material e simbólico) e descobrir quais seriam os mecanismos cognitivos utilizados pelo homem para conhecer este mundo.

A teoria piagetiana preocupa-se em compreender a origem e a evolução do conhecimento humano e, diante desse objetivo, procura identificar quais são os mecanismos utilizados pela criança para conhecer o mundo. Piaget (1978) afirma que há uma diferença qualitativa entre a lógica infantil (mais simples), e a lógica do adulto (mais complexa), pois os processos de construção da cognição humana se tornam complexos com o passar do tempo. Através de suas pesquisas Piaget (1978) afirma que situações novas, desafiadoras e conflitantes causam desequilíbrio no ser humano, porém para reequilibrar-se, lança mão de alguns mecanismos fundamentais, encontrando a assimilação, que se manifesta quando o organismo procura significado a partir de experiências anteriores, para compreender um novo conflito.

Piaget (1996), para esclarecer o desenvolvimento da lógica infantil, elaborou as leis do desenvolvimento da inteligência, separando-as por faixa etária. Além dessas leis, Piaget (1978; 1990) relata que todo ser humano apresenta dois aspectos de desenvolvimento cognitivo: o aspecto psicológico (e/ou espontâneo), onde e a criança aprende por si mesma na sua relação com o ambiente; e o aspecto psicossocial que é representado por tudo aquilo que o indivíduo aprende por transmissão, a partir do outro ser humano.

Piaget (1978; 1990), afirma que é preciso esperar o tempo correto (o desenvolvimento) para submeter a criança a determinadas aprendizagens por transmissão (psicossociais). Diante dessas proposições, são apresentados quatro estágios de desenvolvimento cognitivo:

• sensório-motora: onde a criança pensa a partir do momento que tem imagens;

• desenvolvimento cognitivo: configura-se pela capacidade de representar um objeto por meio de um símbolo, de uma imagem mental (abstração);

• operações concretas: onde ocorre uma verdadeira revolução lógica no desenvolvimento da criança, possibilitando a execução de operações concretas e possibilitando relacionar, comparar, diferenciar e classificar;

• operações formais: nessa fase eles são capazes de raciocinar, de deduzir e de hipotetizar a partir de proposições verbais; é a lógica do discurso, dos raciocínios dedutivos e propositivos, na qual é possível uma reflexão a partir do ponto de vista do outro (PIAGET, 1978).

A teoria Piagetiana pode contribuir na construção de interfaces de recuperação de informação respeitando os níveis de desenvolvimento das crianças, considerando seus limites e possibilidades. Para completar, a teoria de Erikson, citada por GOSSEN (2015, p.115) revela que uma criança é imatura no domínio emocional e requer apoio emocional e sentimento de sucesso, visando confiança.

De acordo com as pesquisas de Mannak et al (2008), a maioria dos problemas que as crianças têm com a pesquisa e a navegação deve-se a interfaces de pesquisa que não levam em conta as habilidades motoras das crianças e suas diferentes abordagens em pesquisar e navegar em comparação com adultos. Isso ocorre porque a maioria das interfaces de pesquisa são projetadas por adultos e são, portanto, baseados em habilidades e preferências de adultos.

Por meio do estudo da psicologia cognitiva, os especialistas procuram entender os motivos pelos quais uma pessoa toma determinadas ações, faz certas escolhas e opta por determinados caminhos.

A criança não é um adulto em miniatura, portanto pensam de forma diferente. Se conseguir conhecer as características do pensamento das crianças, podemos tentar inferir o seu impacto na visão que elas têm das interfaces dos programas que utilizam.

Os estudos para sistemas de recuperação de informação devem explorar os benefícios da abordagem cognitiva não apenas na esfera do usuário, mas focalizar o profissional da informação também. Toma-se por base a prerrogativa de que a compreensão da cognição humana dos profissionais pode promover melhorias no processamento da informação nos diferentes domínios em que se apresenta. Adicionalmente, tem-se a cognição como um conhecimento necessário para que o profissional da informação compreenda a trajetória lógica de construção e apreensão do conhecimento.

Mano (2005) em seu trabalho, relata que em todos os projetos de construção de aplicações informáticas, existe quase sempre uma dualidade que é dificilmente resolvida: as pessoas que projetam o sistema não são os seus utilizadores finais.

Se o utilizador é uma criança e não um adulto THIOLLENT (1996) deixa a seguinte mensagem:

Quando as pessoas estão fazendo alguma coisa relacionada à solução de um problema seu, há condição de estudar este problema num nível mais profundo e realista do que no nível opinativo.

No caso de o sistema de Recuperação de Informação ser voltado para crianças, fica claro que a preocupação é advinda dos pais, que estão claramente preocupados com o setor segurança, não prevendo, portanto, a maneira que a criança irá interagir com a interface. Nessa interação é importante ressaltar que as categorizações da psicologia cognitiva, pois a mesma influencia na investigação da relação entre processos cognitivos e sistemas de Recuperação de Informação, como, por exemplo, na usabilidade na apresentação de imagens icônicas, na apresentação e forma de estruturação dos textos e símbolos.

De um modo geral, quem projeta recorrem a métodos de análise de usabilidade. Quando o projeto está numa fase que possibilita o teste de situações reais de utilização, o seu funcionamento é simulado por um grupo de utilizadores. A partir disso os problemas relacionados com a interface são detectados.

Mediante esse fato surge o seguinte agravante: A interface só pode ser testada quando o projeto está já numa fase adiantada ou mesmo completo. Este inconveniente, de acordo com MANO (2005), motivou a procura de métodos alternativos para a análise de interfaces que não obrigam à criação de protótipos de alta fidelidade do sistema e possam ser empregues antes mesmo de iniciar a programação. Entre os métodos existentes desenvolvidos está o Cognitive Walkthrough (LEWIS 1990; POLSON 1990), mesmo sendo ainda pouco estudado no contexto da interação criança-computador, ele possui na sua base teórica o cognitivismo, e porque é um método de avaliação de interfaces destinado especialmente a descobrir as dificuldades que um utilizador novato terá na manipulação do sistema. O método pretende responder a uma questão: até que ponto o sistema consegue guiar um utilizador não treinado na sua utilização, de modo a permitir-lhe atingir os seus objetivos?

O que se pretende é a realização de uma análise para verificar se esse método é válido quando aplicado a interfaces destinadas a crianças, para sanar as dificuldades que a mesma tem ao manipular as interfaces.

5 INTERFACE DE BUSCA PARA CRIANÇAS: PRINCIPIOS E DIRETRIZES

Gossen (2015, p.115) destaca através de suas pesquisas com crianças, sete desafios para o design de interface de recuperação de informação na web. O primeiro desafio é o apoio emocional que foi baseado na teoria do desenvolvimento psicossocial de Erickson. A criança desiste mais fácil que o adulto e possui um menor número de reformulações de consulta. A ideia para solucionar esse desafio é fornecer ajuda suficiente e bem projetada durante o processo de busca, evitando com isso a frustação.

O segundo desafio seria um suporte à linguagem, onde a interface de busca forneceria diferentes possibilidades para formularem suas necessidades de informações. Essas possibilidades poderão combinar pesquisa orientada por catálogo e consulta, usando um menu (com imagem e áudio). Um fator importante a ser levado em consideração, é que crianças precisam de muito mais tempo de pesquisa em comparação com adultos, sendo necessário optar pela simplificação de texto.

O terceiro desafio ocorre através das etapas de desenvolvimento de PIAGET (1996). Para que a criança entenda a interface, deve ser criado metáforas familiares a elas, onde elas possam fazer uma conexão com o mundo físico. As categorias projetadas na interface não devem ser abstratas, e deverá ser rasa.

No Suporte de memória (quarto desafio), o foco é na maneira com que as crianças processam as informações, elas podem esquecer as ações anteriores, como as consultas que já usaram ou quais documentos continham informações relevantes. Gossen (2015, p.118) conclui nesse desafio que as crianças podem aprender a planejar suas pesquisas e entender melhor o funcionamento do sistema, revisitando seu próprio histórico de pesquisa.

O Suporte de interação (quinto desafio) parte do princípio que a habilidade motora da criança deve ser alvo de estudo. Como proposta para a interação da interface Gossen (2015) propõe: elementos grandes, botões e interações simples, entrada e saída com o controle de voz e análise do estado emocional para uma orientação mais precisa.

O sexto desafio fica com o Julgamento da Relevância: As crianças também têm dificuldades para julgar a relevância dos documentos, sendo importante compreender quais recursos de uma página da Web são importantes para as crianças e como eles os visualizariam.

O sétimo desafio é o apoio à diversidade: as crianças passam por mudanças relativamente rápidas e as habilidades de uma determinada criança pode ser diferente das de outra criança, pois os limites de idade dos estágios de desenvolvimento são aproximados e a idade exata pode variar. Com isso é necessário adaptar a interface de busca às necessidades de cada usuário individual, denominado por Gossen (2015) de interface em evolução.

Para a aplicação desses desafios, a participação da criança no processo da elaboração de design seria de fundamental importância. Essa ideia tem origem nos trabalhos pioneiros de Druin (1999), que valoriza a participação da criança como parceira de designers e de educadores na elaboração de uma interface. O trabalho de Druin et al (2001) acontece através da interação de uma equipe formada por crianças e adultos, com diversas idades, experiências e competências disciplinares. DRUIN (1999), por meio de práticas participativas desenvolveu a Cooperative Inquiry: abordagem para desenvolvimento de novas tecnologias para crianças com crianças. As crianças são parceiras no processo de design, contribuindo com ideias, testes e desenvolvimento de novos protótipos do produto.

Outra técnica interessante composta por crianças e adultos foi a Mixing Ideas (GUHA et al, 2004), onde a mesma possibilita que a criança contribua no processo de design de tecnologia, propiciando a fusão de ideias individuais no design colaborativo através do brainstorming.

Essas técnicas, podem servir como diretrizes norteadoras para os desenvolvedores de interface para busca e recuperação de informação, pois a mistura de ideias pode ser o que está faltando para solucionar os problemas apresentados nesse trabalho.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os critérios de como projetar interfaces para um mecanismo de busca e recuperação de informação foram propostos e discutidos. Eles contribuem para atingir o objetivo principal que é o desenvolvimento de interface de recuperação de informações para as crianças.

Através dos mecanismos direcionados, Gossen (2015) deixou claro que as crianças são diferentes dos adultos. Elas possuem habilidades cognitivas, motoras e necessidades de informação muito diferenciada. Para enfatizar essas diferenças Piaget desenvolveu estágios e Mannak também verificou problemas nas habilidades demonstrando paradigmas a serem observados.

Mediante as experiências relatadas pelos autores, a criação de uma interface deveria seguir as fases do desenvolvimento humano, examinando em que nível de abstração as crianças desenvolvem conceitos, além de estudar grupos de crianças que possuem diferentes características, como idade, sexo, habilidades de leitura, experiência com computadores e estágios de desenvolvimento.

Considerando os desafios para o desenvolvimento de uma interface para a recuperação de informação, o caminho melhor seria o de utilizar esse misto de experiências juntamente com as contribuições das crianças em busca da solução de seus problemas, afinal o usuário é a criança.

REFERÊNCIAS

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1 Mestre em Ciência da Computação pelo Centro Universitário Euripedes de Marília, Brasil. professora da Faculdade de Ciências, Contabilidade e Administração de Tupã, Brasil. E-mail: cristiane.bonfeti@etec.sp.gov.br.

2 Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, Brasil. Professor Assiociado da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil. Bolsista de Produtividade e2 CNPq. E-mail: edberto.ferneda@unesp.br.

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