Programa de educação integral na Paraíba: uma análise da política educacional sob a égide da racionalidade neoliberal
Resumo
A dissertação trata da implementação do Programa de Educação Integral na Paraíba, que, desde 2016, é a principal política educacional de tempo integral para o ensino médio no Estado. O trabalho analisa o envolvimento da política educacional com a racionalidade neoliberal a partir da introdução das lógicas de mercado e as novas formas de poder gerencial dentro das escolas. Como abordagem metodológica, as informações foram coletadas a partir de métodos qualitativos, incluindo revisão de literatura, pesquisa documental e pesquisa de campo realizada em duas escolas do município de João Pessoa – PB.
A pesquisa tem relevância dada à importância social e científica do ensino em tempo integral no Brasil, considerando a meta seis do Plano Nacional de Educação 2014-2024 de oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, cinquenta por cento das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, vinte e cinco por cento dos (as) alunos (as) da educação básica; e, considerando ainda, que não há muitas pesquisas desenvolvidas sobre o Programa de Educação Integral na Paraíba.
A dissertação mostrou que o ensino em tempo integral, apesar das experiências marcantes na história da educação brasileira, como os Centros Educacionais Carneiro Ribeiro, criados por Anísio Teixeira na década 1950 na Bahia e os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), fundados por Darcy Ribeiro na década de 1980 no Rio de Janeiro, ainda é um enfoque recente e desafiador na perspectiva da articulação das políticas públicas educacionais.
Afinal, só em meados dos anos 2000, que esse tema volta à agenda das políticas educacionais, e dessa vez com propostas direcionadas para o ensino médio a partir de um conjunto de resoluções, decretos, leis e propostas, como criação da modalidade de Ensino Médio Integrado à educação profissional e técnica de nível médio, a criação do Programa Ensino Médio Inovador (PROEMI), a ampliação de recursos com a criação, em 2007, do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), entre outras medidas que, no seu conjunto, se dirigem às diferentes instâncias do ensino de nível médio: currículo, expansão, financiamento, diretrizes, além de propostas para reformulação na direção da educação de tempo integral.
E é nesse cenário de reformas, que o ensino em tempo integral foi se tornando um grande e urgente desafio a ser pensado na agenda das políticas educacionais brasileiras. Além de estar contemplado no Plano Nacional de Educação 2014-2024, também é um tema de relevante presença na lei nº 13.415/2017, conhecida como reforma do ensino médio que reestrutura a agenda da educação em tempo integral para este nível de ensino, mesmo com o teto para os gastos públicos e o congelamento das despesas do governo federal instituída pa Emenda Constitucional nº 95/2016.
A dissertação também evidencia a atuação do setor privado, através organizações como ONGs, institutos, fundações, etc., que firmam parcerias público-privadas com governos para a provisão de políticas públicas educacionais. Em particular, o trabalho apresenta uma organização ainda pouco estudada, porém muito atuante nas políticas educacionais de todo território nacional que é do Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE), que firmou convênio junto ao Governo do Estado da Paraíba para a implantação do Programa de Educação Integral.
Dessa forma, com este cenário de mudanças, a pesquisa de mestrado foi realizada e a dissertação estruturada em cinco capítulos. O capítulo 1 – “As políticas públicas sob a lógica da racionalidade neoliberal” aborda os elementos de natureza teórica a partir dos estudos de Dardot e Laval (2016) e Laval (2012), para compreender as influências da racionalidade neoliberal que atua no processo de formulação e implementação das políticas públicas educacionais que vem colonizando o campo educativo e empregando na escola uma cultura empresarial. Neste capítulo é discutido como o neoliberalismo enquanto racionalidade, institui uma normatização da vida na sua totalidade a partir de valores referenciais que passam a organizar as instituições e a própria subjetividade do indivíduo.
O capítulo 2 – “Diretrizes neoliberais para as políticas educacionais no Brasil”, localiza a presença da racionalidade neoliberal em um conjunto de normas legais da educação brasileira onde a jornada de tempo ampliada está inserida, em particular, a partir dos anos 1990 quando as diversas reformas educacionais passaram a serem afetadas por diretrizes dos organismos internacionais como o Banco Mundial, quando a perspectiva neoliberal ganhou maior força a partir de uma concepção cada vez mais privatista de caracterização da educação pública.
O capítulo 3 – “Percurso metodológico” apresenta os procedimentos utilizados na pesquisa para a coleta de dados, bem como esclarece a construção da problemática pesquisada. O Estudo de campo, que teve duração de aproximadamente quatro meses (de março de 2018 até meados de junho do mesmo ano), foi realizado em duas das primeiras escolas que passaram a oferecer o ensino em tempo integral em João Pessoa. Neste capítulo são descritas as principais características dessas duas escolas, tal como os desafios e dificuldades para acessar o campo de estudo. Também foram realizadas entrevistas com professores, alunos e gestores, fazendo uso de questionário semi estruturado para a posterior montagem do banco de dados da pesquisa. As escolas, alunos, gestores e todos que colaboram com a pesquisa não são identificados por seu nome na pesquisa, como forma de preservar as suas identidades.
O capítulo 4 - “Programa de Educação Integral na Paraíba: apropriações do ideário neoliberal” analisa os documentos relacionados ao Programa de Educação Integral na Paraíba, buscando identificar os nexos dessa política com o setor privado e com as orientações dos organismos internacionais. Também é descrita a trajetória de implementação do Programa que se deu em um campo de disputa entre os atores da comunidade escolar e o Estado.
Já o capítulo 5 - “Práticas e contradições no cotidiano das escolas em tempo integral da Paraíba” apresenta os dados colhidos na pesquisa de campo e as entrevistas, fazendo uma análise de dois dos três modelos de escola que compõe o Programa de Educação Integral, quais sejam, a Escola Cidadã Integral e a Escola Cidadã Integral Técnica.
Por fim, as considerações finais sintetizam alguns elementos destacados na pesquisa e conclui que a parceria público-privada para a provisão da política pública educacional, imprime uma lógica mercantil na educação pública, como vem acontecendo no cenário paraibano, onde a parceria estabelecida entre o Governo da Paraíba e o Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE), atrela a elaboração e execução da política educacional às diretrizes oriundas da consultoria privada, tanto no controle da gestão quanto no controle do próprio processo formativo da juventude (objetivo, métodos e conteúdos), pois ambos os aspectos são fundamentais para o controle ideológico da escola e seu alinhamento à lógica das necessidades do aparato produtivo.