Poder local e gestão pública

dimensões para análises da governança municipal

Autores

  • Anderson Rafael Nascimento UFPB
  • Eduardo Grin FGV

DOI:

https://doi.org/10.22478/ufpb.2525-5584.2021v6n3.62726

Palavras-chave:

Dossiê, Poder local, Gestão Pública

Resumo

Esse dossiê propõe a análise das relações entre o poder local e a gestão pública. Os estudos sobre o poder local possuem uma longa tradição no pensamento político, remontando a autores como Maquiavel, Tocqueville e Stuart Mill, ora enfatizando seu papel como escola de democracia, ou então como meio mais eficiente de prover serviços públicos. A proximidade entre governantes e cidadãos era vista como fundamental para a constituição de laços políticos, senso de coletividade e eficiência alocativa.

O caso brasileiro é emblemático para compreender essas relações, já que os municípios foram alçados ao nível de ente federativo, portanto, com suas autonomias preservadas. O discurso municipalista sintonizava descentralização e democratização que passaram a ser palavras-chave da nova Constituição.

O poder local sempre remete à esfera municipal. Contudo, isso não ocorre como um limite. O local não está restrito aos municípios. Seja porque o poder local pode estar associado com dimensões intraterritoriais que podem ser subdivisões políticas do espaço municipal. Ou porque, o poder local pode abranger mais de um município, portanto, o local associado ao regional.

O município, a compreensão de sua gestão e de suas políticas públicas são cenários desafiadores que possibilitam verificar maneiras como o poder local ocorre e, principalmente, quais os impactos que geram nas capacidades estatais locais e na governança municipal. A questão que se coloca é que aqueles dois efeitos virtuosos, na visão dos teóricos da política moderna, gerados pelo poder local, podem não ocorrer de forma sinérgica e simultânea e a gestão pública é parte desse contexto. Ou seja, uma maior democratização pode não gerar efeitos na qualidade da provisão de serviços públicos, e vice-versa.

No caso brasileiro, os estudos clássicos compreenderam o poder local como esforços realizados por atores políticos para a preservação e o predomínio de seus interesses, que em geral podem ser classificados como privados. Nesse contexto, o poder local pode ser visto de forma antagônica à noção de Estado republicano se lógicas patrimonialistas ainda persistem no funcionamento dos governos locais. Estas são questões que ainda impactam os municípios brasileiros, principalmente os micro e pequenos, nos quais fenômenos de oligarquização do poder ainda existem, como é o caso das famílias que se sucedem no comando da política local. Este tipo de realidade, se não impede, torna mais difícil analisá-los com base nos referencias das políticas do urbano que pressupõem debate público e a participação de atores e processos que influenciam a produção das políticas nas cidades (Marques, 2018)..

A gestão pública pressupõe métodos impessoais e racionalidades próprias para a condução do Estado em busca da eficiência. No contexto das relações patrimonialistas cujo poder local emergia, a gestão pública ficava impossibilitada de trilhar seus caminhos burocráticos, convivendo com a precariedade e a descontinuidade. Ficavam assim estabelecidas relações de conflitos e disputas entre poder local e gestão pública.

O governo local ganha evidência nessas relações, pois tem o duplo desafio: (1) criar interfaces e conexões entre a porosidade do poder local, para ser uma representação executiva das forças políticas locais e (2) promover a constância que a gestão pública pressuporia, já que o governo local atua com propósitos definidos em uma jurisdição territorialmente delimitada.

Esse texto, assim como aqueles que são apresentados no Dossiê, busca avançar no desafio de delimitar as relações entre os conceitos de poder local e gestão pública. Como tal, o tema do governo local passa a ser um tema transversal que busca costurar as análises e conceitos. 

Esse texto está organizado em quatro seções, além desta introdução. A primeira parte discute o conceito de autonomia local para compreender aspectos centrais relacionados com a política. A segunda lança um breve olhar sobre o poder local no Brasil para compreender aspectos históricos e contemporâneos sobre o conceito. A terceira parte apresenta um debate sobre os impactos que as relações entre poder local e gestão pública geram na governança urbana contemporânea. Por fim, a última parte apresenta os textos que compõem o Dossiê.

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Publicado

2022-04-26