A VIRADA SEXUAL NA CRÍTICA DOS FILMES HERITAGE
Resumo
Um intenso debate sobre a representação do passado no cinema britânico fez surgir, na década de 1980, o termo heritage (patrimônio) para designar filmes que adaptavam a história e a literatura canônica do país num momento de grande instabilidade social e de contestação política. A Merchant Ivory, companhia até então pouco conhecida, formada pelo diretor James Ivory, o produtor Ismail Merchant e a roteirista Ruth Prawer Jhabvala, exerceu um papel central para o reconhecimento e popularização dessas narrativas. Segundo Higson (2003), os filmes heritage distinguem-se de outras produções de época pelo amplo recurso à “estética da exposição”, que seria a concentração da câmera em imagens do patrimônio cultural inglês, de modo a transformar o espaço da narrativa em espaço heritage. Ou seja, os filmes ofereceriam ao público o espetáculo das grandes propriedades do passado ao invés de privilegiar a representação de histórias. A crítica feminista, por outro lado, percebe nos filmes o início de uma importante discussão sobre sexo e gênero através de “jornadas pessoais e de descoberta sexual” (MONK, 2001), e de investigações em torno de identidades contemporâneas e relações de poder refratadas por um passado imaginado e mutável (PIDDUCK, 2012). Considerável parte da crítica identificou em filmes como Uma Janela para o Amor (1985) e Maurice (1987), ambos dirigidos por Ivory e adaptados da obra de E. M. Forster (1879-1970), um problemático recurso à nostalgia, que homogeneizava classe e raça. Além de centrar seus enredos numa elite branca, os filmes amparavam-se no que Higson (2003) denomina como “discurso de autenticidade” para a reconstituição de época. Esse discurso se estabeleceria a partir da adaptação da literatura e da história nacional, a enfatizar o tom do livro ou do autor adaptado, e de exterioridades que reproduzem imagens de determinado período. Assim, mesmo filmes que claramente criticavam a subjugação da mulher, o preconceito de classe e o heterossexismo, como é o caso dos filmes de Ivory, foram apontados como produções conservadoras. Neste trabalho, apresentamos a discussão crítica dedicada aos filmes heritage com enfoque para a revisão e reformulação do valor cultural das produções a partir de leituras feministas e queer. A mudança revela um gênero fílmico mais flexível do que supôs parte da crítica especializada. Contextualizamos o termo crítico heritage para designar produções fílmicas e as leituras que identificaram tais produções com um discurso conservador. Apresentamos as mudanças ocorridas através principalmente dos estudos feministas, que enfocaram o viés libertário das representações de gênero e sexo nos filmes. Além disso, tecemos uma breve discussão sobre as codificações sexuais do cinema hollywoodiano e a relação que a indústria do cinema estabelece com abordagens diferentes quanto à expressão do desejo sexual realizadas pelos heritage. Esse trabalho é um breve recorte de uma pesquisa em curso sobre a adaptação da obra de E. M. Forster pelo diretor James Ivory.Downloads
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Publicado
2017-09-27
Edição
Seção
Comunicações Longas Eixo Tradução Intersemiótica