CRISE DA NARRATIVA SOB OS AUSPÍCIOS DA LOUCURA: IRONIA, INDECIBILIDADE E MINIMALISMO EM THE BUTCHER BOY (1992), DE PATRICK MCCABE, E EM SUA ADAPTAÇÃO PARA O TEATRO, FRANK PIG SAYS HELLO (1992)

Autores

  • Sandra Luna
  • Bruno Rafael de Lima Vieira

Resumo

Dentre as discussões que incidem sobre a arte contemporânea, debates sobre a crise da narrativa assumem posição de destaque. A recusa ao passado, anotada como tendência na estética pós-moderna, corre de par com a negação à lógica de causalidade que caracteriza as grandes narrativas e faz subsumir o tempo pretérito a estratégias diversas de presentificação. Essa subjugação do passado, instrumentalizado, apreendido sem nostalgia e para o bem de uma textualidade intensa, eufórica, não raramente culmina no que Jameson (1991) considera um “presente esquizofrênico”, um espaço, mais que um tempo narrativo, em que a práxis se manifesta como ansiedade, privilegiando o significante em associações enigmáticas, por vezes incompreensíveis, que ameaçam o tecido narrativo, produzindo formas discursivas que podem chegar a ser alucinógenas. Justamente por seus discursos fragmentados, minimalistas, essas narrativas primam por um caráter de indecibilidade, participando de uma estética que nem se rende à representação, nem se curva à opacidade da linguagem artística, antes desconstrói, por via da ironia e do sarcasmo, tanto concepções realistas quanto premissas das experimentações modernistas. Segundo Hutcheon (2002), a arte pós-moderna opera de forma a demolir, no seio mesmo da experiência estética, valores e formas herdados da tradição. Autor de uma obra em tudo marcada por traços de uma contemporaneidade artística que se enquadra nos parâmetros acima observados, o irlandês Patrick McCabe tem produzido romances, contos, peças de teatro e de rádio, assim como roteiros de filmes para o cinema. Dentre os temas que se sobressaem em seus escritos, a violência e a loucura contribuem para uma estética irônica e paródica, dominada pelo “humor negro”. A opção frequente por personagens excluídos, marginalizados, tipificados, respondem pela postura fortemente crítica do autor em relação à vida econômica, política e social de uma Irlanda pós-colonial, prenhe de conflitos e contradições ainda por serem compreendidas. Que a ironia e o sarcasmo sejam os meios por excelência de exposição das feridas de um passado histórico que não quer passar indicia nos textos do escritor irlandês o que Jameson (1991) consideraria o “retorno do recalcado”. É nesse enquadramento estético e histórico-literário que se situa The Butcher Boy, o premiado romance de McCabe, uma narrativa pós-moderna, ousada e irreverente, conduzida por um personagem louco, cujo discurso presentifica as memórias de sua infância. Não fosse o romance um exemplo primoroso dos traços acima anotados como emblemáticos de uma estética esquizofrênica, a adaptação da obra narrativa para o teatro produz um drama ainda mais fragmentado, lacunoso, minimalista, radicalizando a recusa à narratividade. O presente trabalho objetiva demonstrar como a própria crise da narrativa contemporânea se resolve em duas experimentações estéticas distintas, que traduzem, para o romance e para a cena, os dramas de Frank Pig, o menino-porco. Note-se, a propósito, que a estética radical e irreverente, antes de obliterar a significação, constrói-se como condição mesma para um pathos perturbador, porquanto tragicômico.

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Publicado

2017-09-27

Edição

Seção

Comunicações Longas Eixo Tradução Intersemiótica