A PARTICIPAÇÃO DISCURSIVA DO TRADUTOR NA TRADUÇÃO PÚBLICA

Autores

  • Valéria Brisolara

Resumo

A tradução é uma prática social, cultural e historicamente situada e inserida em um sistema cultural complexo (EVEN-ZOHAR, 2012). A chamada tradução pública ou juramentada é uma tradução de documento investida de fé pública. Apesar de sua grande circulação na sociedade, ainda parece ser objeto de poucos estudos no campo dos Estudos da tradução, principalmente com relação a aspectos discursivos. Uma tradução pública, diferentemente de grande parte das traduções, é feita para o pareamento do texto de partida e de sua tradução. Enquanto tradução pública, é uma tradução de um texto que precisa ser utilizado e ter efeito em um outro sistema cultural, às vezes em um âmbito específico como o jurídico ou o educacional. Assim, enquanto prática, levanta questionamentos não só a respeito de como traduzir um texto, mas também de como traduzir um texto de modo a que funcione em outra cultura ou sistema cultural. Essas considerações remetem às teorizações em A invisibilidade do tradutor (1995) de Venuti. Nesse livro, o autor apresenta os conceitos de tradução estrangeirizante e tradução domesticadora, a partir de uma releitura de Schleiermacher. Na sua visão, estas seriam diferentes posturas discursivas adotadas pelo tradutor no processo tradutório. A opção pela domesticação ou a estrangeirização dependeria das circunstâncias e das obras a serem traduzidas enquanto produtos de culturas. Na obra, Venuti também alerta para a aparente invisibilidade discursiva do tradutor na tradução, o que colaboraria para o aumento gradativo de uma invisibilidade cultural e social do tradutor. Na tradução pública, diferentemente de outros tipos de tradução, o tradutor é sempre visível. A sua presença discursiva é marcada pelas suas constantes intermissões ou comentários. Sua voz mistura-se à voz do autor ou dos autores dos documentos ou textos que traduz. Embora a atividade predominante do tradutor público seja a tradução de documentos, tais como escolares e jurídicos, grande parte deles sem autoria declarada, o tradutor juramentado também traduz manuais, folders, cartas rogatórias, petições e contratos, documentos nos quais é chamado a interferir discursivamente a todo o momento e a escolher entre opções mais domesticadas ou estrangeirizadas, a fim de que o documento traduzido mantenha aspectos da sua função no sistema cultural no qual é produzido no sistema cultural no qual será inserido. Assim, suas escolhas tornam-se marcadas e sua presença discursiva é evidente e a tradução pública configura-se como uma prática autoral cujas escolhas têm implicações éticas e grande responsabilidade no sistema cultural. Além disso, as traduções públicas são assinadas e é a assinatura e o nome do tradutor que lhe conferem o poder de interferir na tradução e que fazem o texto circular. No entanto, qual o limite e o escopo dessa intervenção? Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é refletir sobre as traduções públicas ou juramentadas no Brasil e sua organização discursiva, enfocando a participação discursiva do tradutor no documento traduzido. Espera-se que as reflexões possam chamar atenção para a relevância da tradução pública e do tradutor público, enquanto interventor cultural, na sociedade contemporânea, especialmente em um momento em que se debate a respeito da atividade do tradutor público em ambientes fora da academia, com projetos e documentos relacionados à atividade tramitando em instâncias governamentais.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Downloads

Publicado

2017-09-27

Edição

Seção

Comunicações Longas Eixo Tradução, Transferência Cultural e Circulação