TRANSFERÊNCIA LINGUÍSTICO-CULTURAL EM “UM BRASILEIRO EM BERLIM” DE JOÃO UBALDO RIBEIRO: CASOS DE TRADUÇÃO DO SUFIXO –INHO DO PORTUGUÊS PARA O ALEMÃO

Autores

  • Pedro Paulo Nunes da Silva
  • Thiago Fernandes Dantas

Resumo

A “tradução interlingual” ou “tradução propriamente dita” (JAKOBSON, 1959) é a interpretação de signos de uma língua para outra, portanto, a tradução abordada nesta pesquisa. Entretanto, essa tradução é indissociável, por exemplo, de aspectos literários e culturais (GENTZLER, 2009), indo além de uma simples operação linguística (OUSTINOFF, 2011), tratando-se, por isso, de uma transferência simultaneamente cultural e linguística (AUBERT, 1995; AZENHA JÚNIOR, 2010; ÖGEYIK, 2008). O livro “Um brasileiro em Berlim”, de João Ubaldo Ribeiro, é uma coletânea de crônicas escritas inicialmente para uma coluna mensal no jornal alemão Frankfurter Rundschau, as quais tornaram-se, em 1994, no livro “Ein Brasilianer in Berlin”. O autor, a pedido do jornal alemão, escreveu em formato de crônicas a sua experiência familiar, na cidade de Berlim, na década de 1990. Logo, as crônicas não só apresentam diversas experiências culturais do autor com sua família, como também a estrutura linguístico-textual evidencia estar intimamente relacionada à realidade brasileira (tendo em vista que, no Brasil, a crônica é um gênero textual popularmente conhecido). Por consequência, a tradutora Ray-Güde Mertin, ao traduzir as crônicas escritas do português brasileiro para o alemão, teve que lidar com os textos nas línguas de partida e de chegada, ao passo que se tornou uma mediadora entre duas culturas, muito mais do que entre duas línguas (BLUME e HUMMITZSCH, 2009). Esta pesquisa, por sua vez, apresenta de forma descritiva, e não prescritiva, as decisões dessa tradutora ao lidar com palavras culturalmente determinadas (HATJE-FAGGION, 2011) no português brasileiro, neste caso, palavras/expressões com o sufixo –inho, por exemplo: “peninha”, “velhotinha”, “tomar um solzinho” ou “marquinho” (referência à antiga moeda oficial da Alemanha), todas presentes no corpus analisado. Abordado amplamente no funcionalismo linguístico, o princípio de iconicidade trata da relação entre forma (código linguístico) e função (significado) (CUNHA et al., 2015), no caso do sufixo –inho, há uma forma, porém diversas funções. Portanto, tal sufixo indica não somente flexão de grau (noção de tamanho), como também pode sinalizar, por meio de sua adição, uma derivação, o que proporciona diversas funções novas às palavras (OLIVEIRA e WILSON, 2015). Embora a simples adição do sufixo –inho não implique ser uma palavra culturalmente determinada, ao se utilizarem desse afixo, muitas palavras apontam transferência do âmbito flexional para o âmbito lexical, ou seja, elas não mais indicam a noção de diminutivo, mas palavras lexicalizadas pelo –inho (CARVALHO, 2012), as quais apresentam mudanças tanto morfossintáticas, quanto semânticas. Em vista disso, este estudo verificou que, nas crônicas analisadas de João Ubaldo Ribeiro, o autor utilizou-se do sufixo nominal –inho para sinalizar a flexão de grau de substantivos e adjetivos, bem como para indicar função de afetividade, ironia, pejoratividade, entre outros fatores que causaram alterações morfossintáticas e semânticas, o que é comum e característico no português do Brasil (FREITAS e BARBOSA, 2013). Ao buscar por palavras/expressões adicionadas a esse sufixo, esta pesquisa constatou a presença de 82 ocorrências em 15 das 16 crônicas que compõem o livro, o que indica, a priori, uma leitura com expressividade linguístico-cultural tipicamente de e para brasileiros. Todavia, como descrito anteriormente, o público inicial eram os leitores do jornal alemão Frankfurter Rundschau e, para isso, foi necessário o uso de mediação da comunicação por meio da tradução. Diante disso, analisou-se quais as escolhas da tradutora para esses termos culturalmente determinados, lexicalizados pela afixação do –inho. Os tradutores, no decorrer do seu trabalho, encontrarão situações como essas, na qual não há correspondentes perfeitos na língua de chegada (ORTIZ ALVAREZ, 2011). Para a solução, ou ao menos amenização dessa problemática, Mona Baker (1992) sugere desde a substituição da expressão idiomática (por uma com significado e forma semelhante no texto de chegada) até a omissão dela. Neste estudo, percebeu-se, através de uma análise textual contrastiva no par português-alemão, que a tradutora realizou distintas tomadas de decisões para as mais diversas funções que o sufixo –inho desempenha no texto literário ora analisado. Uma vez que a tradutora necessitou levar em consideração fatores linguísticos e culturais no seu processo tradutório, algo inerente à área da tradução (BELL-SANTOS et al., 2011), ela optou tanto pelos usos analíticos e sintéticos do diminutivo no alemão; passando pela omissão dessa flexão/derivação; e decidiu, até mesmo, pela eliminação da palavra/expressão no texto de chegada.

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Publicado

2017-09-27

Edição

Seção

Comunicações Breves Eixo Tradução e Análise Textual