CONSTRUÇÃO DO NARRADOR EM WUTHERING HEIGHTS: UMA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE LIVRO E FILME

Autores

  • Suzane Gomes da Cunha

Resumo

A obra prima de Emily Brontë foi adaptada várias vezes para o cinema. E dentre os vários aspectos interessantes a se contrastarem entre uma adaptação fílmica e a obra que serviu de inspiração está o narrador. Brontë construiu de forma bastante elaborada o processo narrativo em sua obra literária, deixando-a complexa e desafiadora para o leitor. Como parte dessa elaboração, podemos mencionar a substituição da narração de Mr. Lockwood (que é uma narração intradiegética) por Nelly (que é uma narração extradiegética), que no final volta para Mr. Lockwood, é um componente representativo da construção da tessitura narrativa como um todo. Herman (2005) nos ajuda a compreender o processo de narração de Brontë e também a entender como a narração de Nelly pode não ser confiável, pois só temos a versão dela dos fatos. Sem contar que ela, às vezes, se aproxima e, às vezes, se distancia durante sua narração. Nesse sentido, questionamos como a figura do(s) narrador(res) de Wuthering Heights é reescrita na adaptação fílmica homônima de 1970 dirigida por Robert Fuest. Ao assistir as adaptações cinematográficas, como explica ABBOTT (2008), o espectador já tem a informação visual, ou seja, a própria atuação dos atores já seria um processo narrativo; e é esse o motivo de esse elemento específico da narrativa quase desaparecer. É o que METZ (2007, p.34) chama, parafraseando Albert Laffay, de ‘foco linguístico virtual’, que corresponderia à instância-narradora. ABBOTT (2008) também trata da questão de adaptações não precisarem ser fidedignas às obras que foram seu ponto de partida (questões também tratadas nos textos de BENJAMIN (1989) e MILTON (2002). Outro fato discutido por ABBOTT (2008, p.124) é a ‘Focalização’, que tem a ver com a recepção e a maneira como ela é influenciada. Se, no drama, o receptor constrói sua percepção da narrativa a partir do ato de ver, no cinema é um pouco diferente, uma vez que o receptor é conduzido pela câmera, ou seja, a recepção é manipulada; o espectador vê através dos recortes que o diretor faz. A partir dessa discussão, este trabalho tem como objetivo analisar a construção do narrador no romance Wuthering Heights, Emily Brontë e na sua correspondente adaptação fílmica dirigida por Robert Fuest. Para tal, utilizaremos, além de princípios teóricos sobre análise literária já citados acima, pontos mais específicos sobre estudos de cinema e adaptação fílmica: AUMOND (1995), CATTRISSE (1992: 1994) Para fazermos essa análise, contrastamos em detalhes excertos da obra literária e da adaptação fílmica, tendo em vista três categorias: tempo, modo e voz. Pudemos perceber que o narrador em primeira pessoa (Mr. Lockwood) que aparece no livro nem aparece no filme, e o narrador em terceira pessoa (Nelly Dean) do livro aparece no filme (na forma de narração em voice-over em boa parta da narrativa mas desaparecendo e sendo substituído pelo ‘foco linguístico virtual’. Assim, podemos concluir que o narrador, que é tão importante para a composição narrativa de Emily Brontë, e inclusive influencia na recepção da obra pelo leitor, não tem a mesma força nem aparece do mesmo modo na adaptação fílmica. Mesmo que o filme nos confirme a impressão de que Nelly está narrando a história (até porque ela é uma personagem recorrente durante o filme), reconfigura-se o jogo de narração que Brontë pretendeu criar no livro que escreveu. Tal jogo diz respeito a não confiabilidade de Nelly como narradora, exatamente porque só temos a versão da empregada sobre os fatos que ocorreram na casa até Mr. Lockwood chegar. Assim como o fato de que mesmo que Nelly tenha estado presente em muitas das situações que narra, ela ouviu de terceiros a maioria destas situações. E ainda que haja divergências, como apontamos acima, uma convergência que chama atenção é que, tanto no filme quanto no livro, a perspectiva da narração da história de Heathcliff e Catherine é a de Nelly; é a empregada que nos conduz na história.

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Publicado

2017-09-27

Edição

Seção

Comunicações Breves Eixo Tradução Intersemiótica