Homens cordiais, filhotes da ditadura

uma leitura da escalada do poder dos Delegados de polícia federal na virada do século XX para o XXI

Autores

DOI:

https://doi.org/10.22478/ufpb.2317-6725.2022v27n47.63881

Palavras-chave:

Polícia Federal, Delegados, Autoritarismo, Repressão, Direitos humanos

Resumo

Nosso objetivo é realizar uma abordagem histórica da ascensão classista dos Delegados da Polícia Federal (PF) a partir da transição política em 1985, e de como alguma forma a busca de poder por eles perdida na disputa entre federalistas e centralistas no século XIX, com a separação das funções de juízes de paz e de delegados, que ainda se faz presente, vez que perderam parte de sua capacidade judiciária e ficaram em desvantagem financeira em relação ao judiciário e hoje, ainda em relação ao Ministério Público. Essa busca é visível pela PF, por ser justamente a associação classista dos delegados federais que impulsiona a luta dos delegados estaduais. Identificaremos os elementos histórico-culturais que configuram essa persona, o delegado, e analisaremos sua disputa pelo poder dentro do Departamento de Polícia Federal (DPF) desde então. Até 1985 o órgão criado pela ditadura como pilar do governo militar havia sido conduzido apenas por oficiais do Exército. Entre os governos José Sarney e Fernando Henrique Cardoso houve uma acirrada disputa entre os Delegados e militares pela capacidade de influência dentro do órgão. Não obstante a vitória do corporativismo dos primeiros, o legado cultural e político da ditadura se manteve, contribuindo para a configuração do que ora se apresenta e marca uma distância hierárquica entre as distintas funções da carreira do DPF: Escrivães, Papiloscopistas e Agentes (EPAs) de um lado, Delegados do outro. Disputa marcada pelo debate em torno do plano de carreira e da eficiência do “inquérito policial”, tido como fundamental para justificar a existência dos delegados, mas como um mecanismo atrasado, anti-democrático e ineficiente pelos EPAs, pelo Ministério Público (MP), pela academia modo geral.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Priscila Carlos Brandão, Universidade Federal de Minas Gerais

Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (2005), e pós-doutora pela National Defense University (USA/2010), pela Universidade de Burgos (Espanha/2011) e pela Universidade Federal Fluminense (2020). É Professora Associada da Universidade Federal de Minas Gerais, onde entrou em 2006. Possui experiência na área de História, com ênfase em História das Instituições Políticas Contemporâneas, atuando principalmente nos temas sobre ditadura militar, comunidade de inteligência, Abin, América Latina e Inteligência de Segurança.

Referências

ADPF, Associação Nacional dos delegados de Polícia Federal. Faz diferença ser federal. Prisma. Brasília, 2014.

AGÊNCIA ESTADO. Juiz Condena quatro por contas fantasmas baianas. O Estado de São Paulo. São Paulo, 25 de outubro de 2001.

AGÊNCIA ESTADO. PF sem dinheiro para dar proteção a candidatos. O Estado de São Paulo. São Paulo, 10 de julho de 2002.

ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO. Brasil: Nunca Mais. Petrópolis, Vozes, 2013.

ASKOUL, Marco Antonio. A polícia e sua função constitucional. São Paulo: Ed. Oliveira Mendes, 1998.

BONELLI, Maria G. “Perfil Social e de Carreira dos Delegados de Polícia”. In: SADEK, Maria Tereza (Org.). Delegados de Polícia. São Paulo: Sumaré/Fundação Ford, 2003.

BRANDÃO, Priscila. Amerino Raposo e a Polícia Federal: quando o medo do esquecimento se traduz na obsessão pela imposição de uma narrativa. FACES DA HISTÓRIA, Assis, v.6, nº1, p.246-270, janeiro a junho de 2019.

BRANDÃO, Priscila. “A Polícia Federal no processo de transição: o desafio da Justiça de Transição e da superação dos valores autoritários, analisados a partir da gestão do delegado Romeu Tuma”. Revista Tempo, 28 (1), Jan-Apr 2022. DOI: https://doi.org/10.1590/tem-1980-542x2022v280106

BRASIL. Presidência da República. Lei 261, de 03 de dezembro de 1841. Reforma o Código de Processo Criminal.

BRASIL. Presidência da República. Regulamento no 120, de 31 de janeiro de 1842. Regula a execução da parte policial e criminal da Lei nº 261 de 3 de Dezembro de 1841.

BRASIL. Presidência da República. Lei no 4.483, de 16 de novembro de 1964. Reorganiza o Departamento Federal de Segurança Pública, e dá outras providências.

BRASIL. Presidência da República. Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências.

BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 6493, de 25 de novembro de 2009. Dispõe sobre a organização e o funcionamento da Polícia Federal. Projetos de Lei e Outras

Proposições, 2009.

BRAZ, Nívio Boelter. Como destruir uma Instituição respeitável?. FENAPEF. Brasília, 30 de outubro de 2012.

BRITTO, Ângela. A polícia política na década de 1920: a gênese e atuação da 4a Delegacia Auxiliar. Rio de Janeiro, 2011. 218p. Tese. CPDOC/FGV.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Lei no 4.242, de 17 de julho de 1963. Fixa novos valores para os vencimentos dos servidores do Poder Executivo, Civis e Militares.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Decreto nº 70.665, de 2 de Junho de 1972. Altera, em caráter provisório, a estrutura do Departamento de Polícia Federal e dá outras providências.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto-lei 6.493, de 25 de novembro de 2011. Dispõe sobre a organização e o funcionamento da Polícia Federal.

CANCELLI, Elizabeth. A organização policial. O mundo da violência. Brasília, Editora UNB, 1994.

CHAVEAU, Agnès e TETARD, Philippe (org.). Questões para a história do presente. São Paulo, EDUSC, 1999.

COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. Lista oficial de Torturadores da Ditadura Militar. Brasília, 10 de dezembro de 2014.

DA HORA, José Roberto Sagrado. “Reflexões sobre a Reestruturação”. ADPF, 10 de janeiro de 2013.

EDITORIAL A NOITE. “Graves irregularidades na Polícia de Brasilina”. A noite. 31 de dezembro de 1960.

EDITORIAL VEJA. Confiança Torturada. São Paulo, 8 de janeiro de 1986.

DPF, Departamento de Polícia Federal. Departamento de Polícia Federal: 60 anos a serviço do Brasil. Brasília, 2004.

FENAPEF, Federação Nacional de Policiais Federais. Protocolo No 4 completa um ano de existência. Brasília, 01 de outubro de 2012.

FERNANDES, Josias. “Os coronéis da Polícia Federal”. FENAPEF, 07 de março de 2012.

FORTES, Leandro. A polícia contra a caserna. Época. Brasília, 13 de dezembro de 2010.

GARISTO, Francisco. Fenapef divulga nota para repudiar possível indicação de Lacerda. Consultor Jurídico. Brasília, 31 de dezembro de 2002.

GLASS et al. Entrevista com Francisco Garisto. Caros Amigos. São Paulo, março de 2000.

HAHN, José Antônio. História mal contada. Revista SIN-DPF. Brasília, julho a agosto de

p. 22.

HERDY, Thiago. Comissão da Verdade convocará agentes estaduais para depor. O Globo. Rio de Janeiro, 4 de fevereiro de 2014.

LAPAGESSE, Eugênio. “A Polícia Federal do Brasil”. Revista Do Serviço Público, 103(2), 2017. DOI: https://doi.org/10.21874/rsp.v0i2.2665

HOLLANDA, Sérgio Buarque de. O homem cordial. In: Raízes do Brasil. 26a Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

HOLLOWAY, Thomas H. Polícia no Rio de Janeiro: repressão e resistência numa cidade do século XIX. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1997.

LIMA, Roberto Kant de. Direitos Civis, Estado de Direito e "Cultura Policial": A Formação Policial em Questão. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 41, p. 241-256, 2003.

MACEDO, Fausto. A Dilma não comprou os delegados, afirmam policiais. Estadão. São Paulo, 18 de dezembro de 2014.

MALAQUIAS, Roberto A. PEC 412: O EGOCENTRISMO CORPORATIVISTA NA ADVERSIDADE DA SEGURANÇA PÚBLICA SOB O IMPACTO DA CRISE SANITÁRIA CORONAVÍRUS COVID-19. FENAPEF. Brasília, 28 de abril de 2020.

MENEZES, Enzo. Sem acordo!: Delegados e peritos ganham aumento e agentes mantêm a greve. Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal. Brasília, 01 de setembro de 2012.

NEDEL, José Carlos. Polícia Federal Fardada. SINPEF/MS. Campo Grande, 09 de fevereiro de 2009.

OLIVEIRA, Nilo. A configuração do sistema nacional de repressão no governo JK. (1956 a 1961). São Paulo, 2013. Tese. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2013. 344p.

RODRIGUES, Azelma. Agentes da Polícia Federal iniciam greve por tempo indeterminado. Valor Online. Rio de Janeiro, 07 de agosto de 2012.

SALLY, Alexandre. Decreto que uniformiza tratamento pode melhorar ambiente de trabalho nas polícias. Consultor Jurídico. Brasília, 04 de maio de 2019.

SANTOS, Célio Jacinto dos. A Gênese das grandes operações investigativas da Polícia Federal. Revista Brasileira de Ciências Policiais. Brasília, v. 8, n. 2, p. 11-68, julho a dezembro de 2017. DOI: https://doi.org/10.31412/rbcp.v8i2.526

SILVA, Antônio José Moreira da. Fogo Amigo – As disputas internas na Polícia Federal analisadas no contexto do debate sobre a reforma das instituições policiais e da investigação criminal no Brasil. Chapecó, 2018. Dissertação. Universidade Federal da Fronteira do Sul. 255 p.

SINPEFMG, Sindicato da Polícia Federal do Estado de Minas Gerais. Relatório das represálias contra os agentes, escrivães e papiloscopistas da Polícia Federal de Minas Gerais em razão da greve de 2012. Belo Horizonte, 2013.

SINPEFRS. Sindicato dos Policiais Federais do Rio Grande do Sul. Plebiscito: 4.100 policiais votaram e 91,8% rejeitaram Lacerda. Porto Alegre, 29 de setembro de 2003.

SOARES, Silmária. Entre dados e controvérsias: A influência dos militares na criação e institucionalização de uma polícia federal brasileira. Belo Horizonte, 2015. Dissertação. Universidade Federal de Minas Gerais. 159p.

THOMPSON, Edward. A miséria da teoria. Rio de Janeiro, 1988.

WILSON ROMÃO (Wilson Brandi Romão). In: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Centro de Pesquisa e Documentação Contemporânea, 2019.

ZAVERUCHA, Jorge. Inquérito: ícone de poder da Polícia Judiciária. A questão social no novo milênio. VIII Congresso Luso-Brasileiro de Ciências Sociais. Coimbra, 2004.

Downloads

Publicado

2023-02-25

Como Citar

BRANDÃO, P. C. Homens cordiais, filhotes da ditadura: uma leitura da escalada do poder dos Delegados de polícia federal na virada do século XX para o XXI. Sæculum - Revista de História, [S. l.], v. 27, n. 47 (jul./dez.), p. 284–305, 2023. DOI: 10.22478/ufpb.2317-6725.2022v27n47.63881. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/srh/article/view/63881. Acesso em: 7 dez. 2024.

Edição

Seção

Dossiê História da Polícia no Brasil