Violência doméstica em tempos de isolamento social: uma interpretação das estatísticas criminais
Resumo
Em finais de 2019 o mundo foi assolado por uma doença respiratória que a Organização Mundial de Saúde designou de Coronavirus disease 19 (COVID-19), causada pelo vírus SARS-CoV-2 (severe acute respiratory syndrome coronavirus 2). Com a expansão da doença, crescem relatos sobre o aumento de casos de violência doméstica como resultado do confinamento das pessoas em domicílio, o que aumenta o tempo de convivência entre a vítima e o agressor. Este artigo analisa as estatísticas de casos de violência doméstica atendidos pelos Gabinetes de Atendimento à Família e Menores Vítimas de Violência, na cidade e província de Maputo, durante o período anterior a Declaração de Estado de Emergência (DEE), Março de 2020 e Abril de 2019, e no período posterior a DEE, Abril a Junho de 2020, durante a pandemia da COVID-19. A análise visa compreender a incidência da violência doméstica e sua articulação com o isolamento e distanciamento social. A comparação de casos atendidos entre Abril de 2019 e Abril de 2020 revela um aumento de 94.4% nas ocorrências mensais de violência doméstica na Cidade de Maputo e, 4.6% na província de Maputo. O contacto permanente entre a vítima e o agressor influenciou a incidência da violência doméstica durante o isolamento e distanciamento social, tornando o lar um lugar de violência física, psicológica e sexual. O estabelecimento e divulgação de números telefónicos para promoção de denúncias, em tempos de pandemia da COVID-19, mostra a preocupação da polícia em oferecer alternativas à denúncia presencial. Todavia, não há evidências substanciais de denúncias telefónicas. A teoria das necessidades humanas de Maslow demonstra-se oportuna na explicação do recrudescimento da violência doméstica durante a pandemia da COVID-19, dado que com a pandemia surgem desequilíbrios económicos e sociais que interferem, sobremaneira, na satisfação das necessidades humanas previstas na pirâmide de Maslow.
Palavras-chave: COVID-19. Estado de emergência. Estatísticas criminais. Isolamento social. Violência doméstica.