O emergentismo como alternativa teórica para o problema mente-corpo
DOI:
https://doi.org/10.18012/arf.v8iesp.60016Palavras-chave:
Emergência e mente corporificada, Irredutibilidade, Relações todo-partes, Relações corpo, cérebro e ambienteResumo
Por meio do presente artigo, propomos defender a tese de que o emergentismo é uma alternativa teórica plausível e profícua tanto para o equacionamento das relações mente-corpo quanto para as investigações concernentes ao ‘espaço’ ocupado pela consciência no mundo natural. A partir daí, queremos advogar a tese de que os postulados emergentistas nos descortinam uma alternativa teórica importante diante das limitações que inerem às abordagens reducionistas em seus modos de equacionar a natureza, a origem e a dinâmica da vida mental. Referimo-nos especialmente às concepções de que (i) a realidade é estratificada em diversos níveis e/ou camadas de complexidade, cada qual exigindo uma ciência própria, e de que (ii) a consciência é uma propriedade emergente que não se explica aditivamente, isto é, pela soma das partes. Nossa hipótese mais básica é a de que a perspectiva emergentista é irreversivelmente naturalista e, ainda assim, não se compromete com a pauta redutivista, a qual está fundamentalmente ancorada em um paradigma cerebralista. Dado que uma abordagem emergentista da consciência se baseia na crença de que complexas relações entre as propriedades do sistema (‘todo’) e de seus componentes (‘partes’) não apenas existem, mas são relevantes na constituição de sistemas, o emergentismo, acreditamos, estrutura uma robusta metafísica de processos, imprescindível, enquanto tal, para dar conta do fenômeno da consciência e de suas relações com as atividades neurais substrativas da mente. Acreditamos, também que a perspectiva emergentista de consciência é compatível com a tese de que a mente consiste de uma novidade ontológica de nível superior do sistema a qual resulta das relações de interação e integração entre cérebro, corpo e ambiente. Através do diálogo promovido entre a teoria emergentista e as posições basilares das teorias da mente corporificada, ambicionamos apresentar uma alternativa para o problema das relações entre a mente e o corpo capaz de superar a perspectiva defendida pelo paradigma cerebralista sem recair no dualismo, risco no qual uma teoria das propriedades incorre. Para atender a esse propósito, nosso artigo envolve, primeiramente, a apresentação dos rudimentos históricos do emergentismo, desde o equacionamento do problema todo-parte em sistemas complexos até o soerguimento do chamado ‘emergentismo fraco’, tal qual formulado por Stephan (1998, 1999). Em seguida, buscaremos demostrar em que sentido o emergentismo se opõe ao reducionismo, e, a partir daí, a relação entre as noções de composição e decomposição nas teorias emergentistas. Procuraremos também relacionar emergentismo e o naturalismo biológico de Searle (1992), e, por fim, trataremos da determinação descendente, isto é, da influência das propriedades sistêmicas sobre suas partes constituintes.
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