A ANTIFICÇÃO ROMANESCA COMO COMPROMISSO COM A VERDADE, ATRAVÉS DA AUTOFICÇÃO E DO TESTEMUNHO
DOI:
https://doi.org/10.22478/ufpb.1516-1536.2023v25n1.64333Palavras-chave:
Ficção, Parresía, Antificção, Autoficção, TestemunhoResumo
O artigo observa o fenômeno da demanda pelo real na narrativa contemporânea a partir de uma de suas tendências mais experimentais: a autoficção como possibilidade de literatura de testemunho e de fixação da memória, como resistência à política do esquecimento. Para tanto, recorre-se ao compromisso da verdade das escritas de si, que Foucault chamava de parresía, pois, conforme Bakhtin, o romance tornou-se uma arte complexa ao assimilar gêneros em que o eu fala de si e passa a manifestar verdades que a narrativa impessoal não alcança. A noção de antificção, criada por Lejeune, é básica para que essa demanda seja vista como explicação para o que tem ocorrido com o romance. Em vez de se verem apenas as escritas de si como antificcionais, optou-se aqui pela ideia da antificção romanesca, partindo-se do conceito de ficção de Searle, que não a contrapõe à verdade, mas a vê como resultado de um pacto de leitura. A antificção como modelo de parresía menciona aqui diversas obras paradigmáticas, que vão da escrita de si ao romance, mas concentra-se, sobretudo, em Marcelo Rubens Paiva, Milton Hatoum e Patrick Modiano como modelares do testemunho que trata do trauma, daquilo que Finazzi-Agrò considera o inter-dito que desperta a empatia no leitor devido à verdade contida no passional.
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