Modernismo decapitado: a reantropofagia musical do Arandu Arakuaa

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Palavras-chave:

modernismo, decolonial, música, Arandu Arakuaa, antropofagia

Resumo

Para além do século que separa e liga a Semana de arte moderna de 1922 ao nosso período social, busca-se aqui pensar a ilusória, porém persistente seclusão entre o moderno, o modernismo, e a modernidade, a qual permeia boa parte da historiografia e dos estudos culturais nestes 100 anos, marcados por apagamentos e apropriações da presença indígena em expressões literárias e estético-culturais no contexto da Semana e da vertente antropofágica, e em fazeres artísticos que o sucederam. Através do enfoque na música como expressão cultural que se relaciona poética e historicamente com a literatura e outras artes, são abordadas produções distintas: textuais (José de Alencar, Mário de Andrade, Oswald de Andrade) e musicais (Carlos Gomes, Villa-Lobos); a discussão então adentra movimentos culturais que dialogam com o modernismo, como a Tropicália, e gêneros musicais híbridos. Por fim, são abordadas manifestações contemporâneas de autoria indígena na literatura, nas artes plásticas e na música. São manifestações que resgatam a presença indígena, reantropofagizando (como propõe Denilson Baniwa) o modernismo, libertando a arte indígena de limitações textuais e simbólicas, e manifestando a relação entre o fazer artístico indígena e uma história de resistência política e epistemológica. Tal articulação é abordada no contexto da banda de heavy metal Arandu Arakuaa, em termos melódicos (reapropriando estilos ocidentais e incorporando sonoridades locais) e discursivos (na perspectiva decolonial de resgate e cura de elementos epistemológicos indígenas).

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Biografia do Autor

Claudia Lima, Universidade Federal de Santa Catarina

É titular de teoria literária na Universidade Federal de Santa Catarina. Possui graduação em Filosofia e Teorias da Comunicação - Michigan State University (1985), mestrado em Teorias da Comunicação - Michigan State University (1987) e doutorado em Cultural Studies - University of Illinois em Urbana (1998). Foi professora visitante na University of California, Santa Cruz (EUA) e na University of Massachusetts, Amherst (EUA), onde lecionou disciplinas nos respectivos departamentos de Feminist Studies e Women, Gender and Sexuality Studies. Realizou pós-doutoramento na University of California, Santa Cruz e na University of Massachusetts, Amherst. Foi vice-presidente e presidente da seção Cultura, Política e Poder da Associação de Estudos Latino-Americanos (LASA), na qual também exerceu várias outras atividades em comitês julgadores específicos. Co-organizou o livro "Translocalities / Translocalidades: Feminist Politics of Translation in the Latin/a Américas" (Duke University Press, 2014) e a antologia "Traduções da cultura: perspectivas críticas feministas (1970-2010)" (Editora Mulheres; Editora UFSC; Edufal, 2017). Atualmente é bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq e atua na área de Letras, com ênfase na interseção entre as teorias feministas, traducão cultural e as teorias pós-coloniais e descoloniais nas Américas.

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Publicado

16.01.2023

Edição

Seção

VOLUME "AHEAD OF PRINT"